Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Tenho herança para receber mas não tenho dinheiro para pagar o Imposto Causa Mortis (ITD) nem as custas do Cartório. E agora?

Agenda 17/11/2023 às 18:00

POR FORÇA DE LEI, tão logo constatado o falecimento o patrimônio do titular agora falecido é imediatamente transferido para os seus herdeiros, ainda que os mesmos não tenham notícia do óbito, nem saibam da existência de patrimônio que virará herança. A transferência independente de Inventário inclusive. Esse formidável e interessante fenômeno é conhecido dentro do "Direito das Sucessões" como SAISINE (ou "droit de saisine") e tem base legal no artigo 1.784 do Código Civil de 2002. Ele visa não deixar que a massa patrimonial fique um só instante sem titular (acéfala). A explicação é do notável jurista ITABAIANA DE OLIVEIRA (Tratado de Direito das Successões. 1936) que ensina no português original daquela época:

"Aberta a successão, o domínio e a posse da herança transmittem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentarios, sem necessidade de acto algum do seu successor e ainda que este ignore, autorisando este facto que o herdeiro entre na posse da herança da pessoa fallecida como seu continuador. Esta providencia legal, que se destina a salvaguardar os bens hereditarios das invasões e usurpações de terceiros, é consequencia da acquisição da herança, e limita-se a manter um estado de cousas, que, fundado na presumpção a favor do herdeiro, decorre de seu titulo hereditario".

O artigo 1.784 do CCB/2002 (que mantém a mesma ideia do art. 1.572 do CCB/1916) determina:

"Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários".

Ainda que desnecessária a realização do INVENTÁRIO para a transferência do patrimônio, como se viu acima, sabemos que o INVENTÁRIO é necessário para permitir a regularização dos bens, a publicidade da nova titularidade (através da inscrição da regularização nos Registros Públicos, por exemplo) assim como para permitir a DISPONIBILIDADE - ou seja, para que o novo titular (herdeiro) possa por exemplo vender regularmente seus bens, ou lhe dar a destinação desejada, dentro que a Lei autoriza.

Como também sabemos, INVENTÁRIO - tanto o Judicial quanto o EXTRAJUDICIAL - envolve diversos custos. Um grande problema pode ocorrer quando os herdeiros têm bens a receber mas não possuem dinheiro para por exemplo pagar as custas judiciais ou extrajudiciais, o IMPOSTO devido (ITD ou ITCMD, como queira) além de outras despesas.

Inicialmente é preciso observar que tanto na seara JUDICIAL quanto na EXTRAJUDICIAL é plenamente possível postular a concessão da GRATUIDADE para isentar de muitos custos, além do PARCELAMENTO. Sobre esses aspectos recomendamos os diversos artigos que escrevemos com frequência para orientar sobre essas possibilidades. Judicialmente sempre foi possível postular ao Juiz do processo a autorização para levantamento de quantias para fazer frente às despesas judiciais do processo e inclusive do IMPOSTO "CAUSA MORTIS". A venda dentro do Inventário nessa intenção também sempre foi possível, mediante autorização judicial, todavia vender um bem nem sempre é a melhor das medidas.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Desde 2022 por ocasião da RESOLUÇÃO 352/2022 do CNJ tornou-se possível em sede de INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL requerer o levantamento de quantias componentes do acervo hereditário para justamente o pagamento de despesas do emolumento para a lavratura da Escritura de Inventário assim como o pagamento do Imposto "Causa Mortis". A referida Resolução 352/2022 do Conselho Nacional da Justiça incluiu três importantes parágrafos ao artigo 11 da Resolução 35/2007 do CNJ que trata da nomeação do Representante do Espólio (muito parecido com a figura do Inventariante):

"§ 1º O meeiro e os herdeiros poderão, em escritura pública anterior à partilha ou à adjudicação, nomear inventariante.

§ 2º O inventariante nomeado nos termos do § 1º poderá representar o espólio na busca de informações bancárias e fiscais necessárias à conclusão de negócios essenciais para a realização do inventário e no LEVANTAMENTO DE QUANTIAS para pagamento do IMPOSTO devido e dos EMOLUMENTOS do inventário.

§ 3º A nomeação de inventariante será considerada o termo inicial do procedimento de inventário extrajudicial".

Ve-se com isso que a solução já existe extrajudicialmente para o levantamento de quantia para o pagamento das referidas despesas e tudo diretamente em Cartório. Não sendo o caso de levantamento de quantias (porque por exemplo o Espólio não tem quantias mas apenas bens móveis ou imóveis) uma outra solução inaugurada pelo Código de Normas Extrajudiciais do Rio de Janeiro (Provimento CGJ/RJ 87/2022) pode ser aquela do art. 453 que permite a "VENDA ANTECIPADA DE BENS DO ESPÓLIO" sem autorização judicial inclusive:

"Art. 453. É possível a alienação, por escritura pública, de bens integrantes do acervo hereditário, independentemente de autorização judicial, desde que dela conste e se comprove o pagamento, como parte do preço:

I – da totalidade do imposto de transmissão causa mortis sobre a integralidade da herança, ressalvado o disposto no artigo 669, II, III e IV, do CPC; e

II – do depósito prévio dos emolumentos devidos para a lavratura do inventário extrajudicial".

Já não há, portanto, necessidade de buscar a via judicial para a resolver mais essa hipótese de Inventário. De toda forma é sempre importante recordar e respeitar a facultatividade que assiste às partes de resolver seu caso de INVENTÁRIO tanto pela via judicial quanto pela via extrajudicial, afastando-se eventual alegação de "falta de interesse de agir" por ocasião da adoção da via judicial mesmo que presentes os requisitos que autorizem a via extrajudicial - como aponta com costumeiro acerto a jurisprudência mineira, senão vejamos:

"TJMG. 10000190969691001/MG. J. em: 04/02/2020. INVENTÁRIO. PARTES MAIORES. VIA ADMINISTRATIVA. OPÇÃO. AÇÃO JUDICIAL. INTERESSE DE AGIR PRESENTE. SENTENÇA CASSADA. - A Lei nº 11.441/07 conferiu nova redação ao art. 982, CPC, prevendo a possibilidade de se fazer o inventário e a partilha por escritura pública, se todos os interessados forem capazes e concordes. Por conseguinte, facultou-se aos interessados optar pela via administrativa ou judicial.

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!