Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Os Meios de Impugnações de Decisões Judiciais

Agenda 17/11/2023 às 20:03

O ordenamento jurídico brasileiro prevê diversas formas de impugnar uma decisão judicial.

A forma mais conhecida e mais tradicional de se insurgir contra um pronunciamento judicial é o recurso.

Os recursos têm como objetivo a reforma, anulação ou integração (no caso dos embargos de declaração por omissão) de uma determinada decisão judicial, sendo um ato postulatório que prolonga o direito de ação, mas que não inaugura nova relação jurídica, tratando-se apenas de uma nova fase da mesma relação processual ainda não terminada, impedindo a formação da coisa julgada. Importante mencionar que isso não significa que os autos processuais devem ser os mesmos, pois o recurso pode ser autuado em processo próprio, como por exemplo o agravo de instrumento, mas integralizando o mesmo processo.

Recurso é o remédio voluntário e idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo, a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração da decisão judicial que se impugna1.

Também, o recurso é um ato voluntário da parte, ele deve ser interposto de acordo com o artigo 996 do Código de Processo Civil, ou seja, o recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica.

Os recursos são pautados por princípios. Vejamos.

O princípio do duplo grau de jurisdição diz respeito à submissão da decisão judicial a um reexame derivado de uma impugnação interposta pela parte. Contudo, não há previsão expressa de duplo grau de jurisdição na Constituição Federal, tratando-se, portanto, de mero princípio (e não garantia constitucional), sendo que o legislador infraconstitucional pode criar leis limitando as hipóteses recursais e os cabimentos.

Estando a parte diante de uma hipótese em que tanto a lei como a jurisprudência e a doutrina não sabem expressar qual o recurso cabível na situação, aplica-se o princípio da fungibilidade recursal. Inexiste previsão explícita do princípio no CPC, contudo a doutrina e a jurisprudência admitem a sua aplicação, desde que observados determinados requisitos: (1) existência de dúvida objetiva sobre qual é o recurso cabível; (2) divergência na doutrina e jurisprudência; (3) quando o juiz profere um pronunciamento no lugar de outro; (4) ausência do chamado “erro grosseiro”.

O princípio da voluntariedade estabelece que aquele que detém legitimidade e interesse de recorrer, sob pena de preclusão e coisa julgada, deverá se manifestar nos termos do procedimento especifico de cada recurso. Ou seja, o interessado deve, voluntariamente, no prazo legal, exteriorizar a sua inconformidade com a decisão proferida apresentando nos autos o recurso cabível.

A unirrecorribilidade (unicidade recursal ou singularidade recursal) significa dizer que para cada decisão judicial é cabível somente a interposição de um recurso por cada uma das partes.

Destaque-se, também o princípio da proibição da reformatio in pejus aplicável aos recursos. Esse princípio evita que o cenário do recorrente piore em razão de seu próprio recurso interposto. A única exceção seria na hipótese de matéria de ordem pública, que pode ser conhecida a qualquer momento e, uma vez reconhecidas pelo Tribunal, podem prejudicar o recorrente.

O princípio da colegialidade das decisões determina que toda vez que for interposto um recurso ou uma ação de competência originária do Tribunal, a regra é que um órgão colegiado profira a decisão. Se for um recurso de apelação ou um agravo de instrumento, o princípio determina que ele seja julgado por três desembargadores. Na hipótese de embargos de declaração contra acordão do Tribunal ou ação rescisória, o julgamento também será por três embargadores, ou seja, uma decisão proferida por um órgão colegiado. Porém, desde a reforma de 1994/95 do CPC/1973 foram criadas situações de decisões proferidas apenas pelo Relator que, atualmente, estão previstas no artigo 932 do CPC/15. Trata-se, portanto, de uma relativização do princípio da colegialidade das decisões.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Por fim, destaca-se o princípio da sanabilidade dos vícios, o qual tem relação com o princípio da primazia do julgamento de mérito, os quais estão previstos no artigo 317 do CPC que determina que antes de proferir decisão sem resolução de mérito, o juiz deverá conceder à parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício. Esses princípios são aplicáveis, inclusive, em grau recursal, uma vez que o parágrafo único do artigo 932 determina que antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível.

Os outros meios de impugnação de decisões judiciais são: os sucedâneos recursais e as ações impugnativas autônomas.

As ações impugnativas autônomas também atacam uma decisão judicial, porém elas criam um novo procedimento com uma autuação de um novo processo. Portanto, a decisão judicial é impugnada por meio de uma nova ação. São exemplos de ações autônomas de impugnação o mandado de segurança, a ação rescisória, a ação anulatória, a reclamação, a ação de querela nullitatis e os embargos de terceiro.

A diferença entre as duas modalidades de impugnação – recursos e ações autônomas de impugnação – é que os recursos são interpostos na mesma relação jurídico-processual, enquanto que as ações impugnativas autônomas criam uma nova relação processual, por isso são chamadas de autônomas. Portanto, os recursos são endo processuais e as ações impugnativas são autônomas.

Os sucedâneos recursais parecem e fazem a função de recurso, porém não podem ser chamados de recurso.

Como enquadrar um ato da parte em sucedâneo recursal?

Como regra, há no ordenamento jurídico o princípio da taxatividade dos recursos, o qual estabelece que para que seja considerado recurso aquele ato da parte que visa impugnar uma decisão judicial é obrigatório a sua previsão expressa em lei federal. Há, portanto, um rol de recursos previsto, por exemplo, no Código de Processo Civil e na Lei do Juizado Especial Cível, sendo que o artigo 22, inciso I, da Constituição Federal estabelece que somente a lei federal pode criar recursos no sistema processual civil vigente.

Assim, para enquadrar um ato da parte em sucedâneo recursal deve ser feita análise por exclusão e de acordo com o princípio da taxatividade. Trata-se, então, de todo meio de impugnação que não é um recurso (por ausência de tipicidade no ordenamento jurídico) e nem se enquadra como ação autônoma de impugnação (por ausência de criação de uma nova relação jurídica).

Integram a modalidade denominada sucedâneos recursais o pedido de reconsideração e a remessa necessária (também chamado de duplo grau obrigatório ou reexame necessário).

O pedido de reconsideração não tem previsão legal e não tem natureza recursal, podendo ser utilizado nas hipóteses em que não é cabível a interposição do agravo de instrumento. Mesmo não existindo previsão legal para o pedido de reconsideração, não há dúvidas de que ele produz efeitos no processo, contudo, ele não interrompe o prazo para a interposição de algum recurso previsto em lei. E a decisão proferida no pedido de reconsideração não pode, via de regra, ser impugnada por meio de agravo de instrumento.

A remessa necessária, também conhecida como reexame necessário ou duplo grau obrigatório, também não tem natureza recursal e está prevista no artigo 496 do Código de Processo Civil. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público; e a sentença que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal. Mesmo que não haja recurso, por um impulso oficial do juiz, o processo irá para segunda instância para que o Tribunal julgue a causa novamente.

Todos os meios de impugnação previstos no ordenamento jurídico tentam rediscutir a decisão judicial que foi impugnada, sendo que a única que não depende de atuação da parte prejudicada é a remessa necessária.

Assim, resumindo: quando a parte quer impugnar uma decisão judicial dentro do mesmo processo em que ela foi proferida, tem-se o recurso; quando é instaurada outra ação com objetivo de impugnar uma decisão que foi proferida no processo anterior, há uma ação autônoma de impugnação, como por exemplo a ação rescisória e o mandado de segurança contra ato judicial; e os sucedâneos recursais que não são um recurso por falta de taxatividade, mas que fazem a função de um recurso.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 10 ed. v. 2. São Paulo: Saraiva Jur, 2020.

BRUSCHI, Gilberto Gomes; COUTO, Mônica Bonetti, Recursos cíveis. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 4. ed., vol. III, São Paulo: Malheiros, 2004.

Primeiros comentários ao novo código de processo civil: artigo por artigo / coordenação Teresa Arruda Alvim Wambier – 1º ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.


  1. José Carlos Barbosa Moreira, Comentários ao Código de Processo Civil. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. v. V

Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!