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A aplicação da medida de segurança para inimputáveis e semi-imputáveis: a periculosidade do agente

A medida de segurança busca tratar inimputáveis e semi-imputáveis, considerando sua periculosidade, sem recebimento de pena.

Resumo: A medida de segurança é uma das ferramentas adotadas pelo judiciário. A mesma consiste em buscar a cura para pessoas consideradas inimputáveis ou semi-imputáveis, as quais são portadoras de doenças mentais ou desenvolvimento incompleto, e, por isso atribuem alguma periculosidade para a sociedade, praticando fatos tipificados no Código penal como algo ilícito. Como esses agentes não podem receber uma pena, atribui-se a medida de segurança, através de tratamentos ambulatoriais ou internações em hospitais de custódia, para casos mais delicados e de caráter permanente. Com esse viés o presente artigo, traz para o leitor uma análise qualitativa sobre o tema, com pesquisas bibliográficas através de doutrinas, jurisprudências e o ordenamento jurídico brasileiro, enfatizando como vem a ser a aplicação da medida de segurança, como é avaliada e certificada a periculosidade do agente, as espécies dessas medidas, bem como a duração do tratamento e a finalidade específica da mesma. Com isso, será possível que o leitor entenda a importância desses tratamentos e também o trajeto que se percorre para aplica-lo dentro da sociedade.

Palavras-chave: Medida de segurança; Inimputáveis; Semi-imputáveis; Tratamento.


Notas introdutórias

O presente artigo tem o intuito de mostrar meios de medidas de segurança direcionados a inimputáveis e semi-imputáveis, como forma de proteção à integridade tanto dos mesmos, como da própria população, visando a periculosidade e as condutas praticadas por eles, em seu momento de surto ou de seus transtornos diários.

Para que se concretize a inimputabilidade ou a semi-imputabilidade, são realizadas perícias médicas para a constatação do estado de saúde de cada autor, e a partir desse laudo, será atribuído o tratamento mais adequado, seja ele o ambulatorial ou a internação em hospitais de custódia. Esse procedimento, consistem geralmente em prevenções especiais, sendo sua duração determinada, quando possui tempo mínimo, e indeterminada, quando possui tempo máximo.

Para que seja exercida dentro dos conformes legais e tenha eficácia à sociedade, a medida de segurança possui alguns princípios a serem seguidos, dentre eles estão a legalidade, anterioridade e jurisdicionalidade.

A legalidade ocorre porque apenas a lei cria as medidas de segurança, assim elas não podem ser vinculadas de medidas provisórias. A anterioridade é aquela que somente reconhece a aplicação da medida de segurança, quando a pratica da infração penal vier antes da previsão legal, ligando-se também ao princípio da irretroatividade da lei penal, que compõe o art. 5º, XL, da Constituição Federal de 1988. E o da jurisdicionalidade diz respeito a medida de segurança que só pode ser aplicada pelo Poder Judiciário, observando o devido processo legal.


1. Aspectos relevantes para o entendimento da medida de segurança

A medida de segurança é uma forma adotada pelo direito penal, do artigo 96 ao 99, para punir um indivíduo inimputável, ou seja, pessoas que portam doenças mentais, desenvolvimento mental incompleto ou retardado e por isso não possuem consciência da ilicitude dos atos praticados, durante o momento da ação, sendo assim, não são considerados criminosos. Os inimputáveis e semi-imputáveis, são reconhecidos por meio da Classificação Internacional de Doenças – CID, a qual disponibiliza uma lista com os transtornos mentais, e essa é seguida pela justiça para que haja essa diferenciação.

O atual Código Penal, acatou o sistema biopsicológico ou biológico-psíquico, que nada mais é do que, a análise da higidez mental do indivíduo, por meio de critérios estabelecidos, e embasando-se no artigo 26 do Estatuto Repressivo, o qual fala sobre a isenção da pena para o agente que é portador de doença mental ou desenvolvimento retardado/incompleto.

Segundo Nucci (2016), o inimputável é aquele que,

O inimputável (doente mental ou imaturo, que é o menor) não comete crime, mas pode ser sancionado penalmente, aplicando-se-lhe medida de segurança, que se baseia no juízo de periculosidade, diverso, portanto, da culpabilidade. O autor de um fato típico e antijurídico, sem compreensão do que fazia, não merece ser considerado criminoso – adjetivação reservada a quem, compreendendo o ilícito, opta por tal caminho, sofrendo censura –, embora possa ser submetido a medida especial cuja finalidade é terapêutica, fundamentalmente. (NUCCI 2016, P. 268).

Já os semi- inimputáveis, seguem a linha de raciocínio do artigo 26, parágrafo único do Código Penal, onde os mesmos podem sofrer pena, mas serão reduzidas de um a dois terços, se no dia do ato, o indivíduo estiver em surto e sem condições de entender a gravidade e o caráter ilícito do fato.

Para elenca as possíveis atitudes de implementação da medida de segurança, o artigo 96 do Código Penal divide-as em duas: a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico. Na falta desses locais, é possível que a sanção seja aplicada em outro estabelecimento adequado. Existe também a sujeição de tratamento ambulatorial.

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Com relação as espécies dessa prática de segurança, pode-se elencar: a detenção – designada para a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, levando em consideração o caráter excepcional da medida, seguindo a resolução nº 113, art. 17 do CNJ, a qual visa buscar, em sua maioria, a implementação da medida antimanicomiais.

E a restritiva, que são os tratamentos ambulatoriais, o qual parte de uma absolvição imprópria, onde mesmo que o réu seja absorvido pela sua inimputabilidade, o mesmo pode ser reconhecido como o autor do crime e pode ser internado em um hospital psiquiátrico, ou, permanecer em liberdade caso não transmita perigo diante do meio social. Sendo assim, o Brasil aplica uma medida detentiva/privativa de liberdade.

Apesar dos entendimentos dos doutrinadores, as decisões jurisprudenciais dos tribunais superiores, impõem que deve ser observada a necessidade da internação, devendo ela, por tanto, ser excepcional. Sendo assim, só deve ser realizada a internação em último caso, quando realmente o indivíduo traz riscos, caso não haja essa periculosidade, deve-se priorizar a vivencia social e familiar, como forma de ajudar na recuperação do mesmo.

Segundo Cleber Masson (2022),

“Periculosidade é a efetiva probabilidade, relativa ao responsável por uma infração penal, inimputável ou semi-imputável, de volta a envolver-se em crimes ou contravenções penais. Extrai-se da natureza e da gravidade do fato cometido e das circunstâncias indicadas na legislação nacional. É considerada socialmente perigosa a pessoa que cometeu o fato, quando é de temer que pratique novos fatos previstos na lei como infrações.”1 (MASSON 2022, P. 757).

Seguindo os princípios da adequação, razoabilidade, e proporcionalidade, a interpretação do processo não poderá acontecer de modo literal, assim, a decisão de atribuir pena de reclusão para as pessoas inimputáveis, fica facultada ao juiz, de modo que o magistrado não estaria preso apenas a internação voltada para tratamento psiquiátrico, podendo assim, direciona-lo para um tratamento ambulatorial, caso ache necessário de acordo com seu entendimento e análise do caso.

Esse assunto foi palco de divergências entre a 3º seção do Supremo Tribunal de Justiça, que aprovou unanimemente a transferência de um tratamento para outro, e a 5º e 6º Turma, onde a 5º não aceitava a substituição e a 6º considerava possível de acontecer a troca. Mas de acordo com o Código Penal isso é meramente possível de acontecer, e permanece a decisão do juiz.

Esse método de segurança, possui caráter de prevenção especial (tratar um certo indivíduo), e não de prevenção geral (prevenir que novos crimes de mesmo seguimento venham acontecer novamente), até porque se tratar de pessoas inimputáveis, e para esses indivíduos, não se busca a reprovação e sim um tratamento, almejando sempre sua cura, para que o mesmo esteja apto para conviver novamente na coletividade, ou seja, para ele volte a ser reinserido na sociedade.

A medida de segurança, segundo a doutrina, possui tempo mínimo de 1 a 3 anos para que seja cessada essa periculosidade do agente para a sociedade, mas essa prática encontra-se em desuso no Brasil, pois segundo o julgamento e entendimento do STF, o que vale é o limite da pena máxima cominada para o crime, ou seja, se olha para a pena atribuída aquele indivíduo, e só assim se estabelecerá um período de tempo para a cessação do perigo, e caso dentro desse período o Estado não se manifestar no tratamento dessa pessoa, o tempo irá prescrever e não será mais possível aplicar esse tipo de punição ao inimputável.

As medidas de segurança não podem ter caráter perpétuo, tendo em vista que existe um teto de 40 anos, logo, é muito difícil uma pessoa que possui uma doença definitiva sair do seu internamento, pois o paciente só sairá por ordem judicial ou alta dada pelo médico responsável, e é aí que está o ponto chave. O médico torna-se garantidor do sentenciado, então, se o mesmo ofertar alta para o indivíduo e o mesmo voltar a cometer condutas ilícitas, será ele quem irá responder pelo fato.

Para a aplicação dessas medidas, são necessários os preenchimentos alguns requisitos, tendo em vista que só o fato do agente ser perigoso para a sociedade, não caracteriza e nem permite a incidência do método, sendo assim, será necessário que haja uma comprovação inequívoca de autoria do agente, como forma de demonstrar a tipicidade e ilicitude da conduta. Vale salientar ainda que, contravenções penais também são aceitas para que seja aplicado o tratamento. Além disso, o interessante é que seja demonstrado que o indivíduo está propenso a praticar crimes, assim como o seu grau de periculosidade.


2. Execução

Conforma o artigo 171, da Lei de execução penal - LEP, após ser realizado o trânsito em julgado da sentença, o juiz irá expedir um guia para execução do agente, para que assim ele consiga ser internado em hospital ou consiga realizar seu tratamento, sendo assim a guia torna-se imprescritível para o seu cumprimento de sentença.

Para aquele que é submetido ao tratamento de internação, obrigatoriamente terá que passar por exame criminológico. Já aqueles submetidos a tratamento ambulatorial, o exame torna-se facultativo, assim como é redigido na LEP. Ademais, durante esse período de cumprimento, o sentenciado pode optar também por contratar algum médico que seja de sua segura e confiança para que o mesmo acompanhe o seu tratamento e caso o médico contratado tiver opiniões divergentes do médico da justiça, o juiz da execução decidirá por meio do laudo de um terceiro perito que será contratado para análise do paciente.

Para obter dados relacionado a cessação da periculosidade, o juiz pedirá o exame após o termino mínimo da medida, ou até mesmo antes, se for manifestado interesse pelo Ministério Público, procurador ou até mesmo pela defensoria pública. Caso seja constatada a cessação do perigo a sociedade, o juiz suspenderá a medida de segurança, determinando assim a liberação (para os casos de medida restritiva) ou a desinternação (para casos de medida detentiva), sendo essas condicionadas, ou seja, devem seguir as mesmas condições de um livramento condicionado.

Nessa óptica, ao ser liberado ou desinternado, o sentenciado pode está sujeito a condições obrigatórias, como comunicar periodicamente ao juiz suas ocupações, ou pode ser submetido a condições facultativas, como não mudar de residência sem comunicar ao juiz e a autoridade incumbida de observância cautelar e de proteção, assim como trás o art. 178 da LEP.

A liberdade pode ser revogada caso o agente antes de 1 ano, venha a cometer algum fato, não precisando esse ser infração penal em si. Essas pessoas que recebem a liberdade pelo período de 1 ano, a partir do momento que sai do estabelecimento, são chamadas de egresso, conforme o art. 26, inciso I da LEP.

Salienta-se ainda, que durante o tratamento ambulatorial, em qualquer fase do processo, o juiz pode determinar a internação a pessoa, ou seja, pode haver uma troca desde que seja com fins curativos, ou se caso o indivíduo não for compatível com a medida atribuída a ele.


3. Como se dar a convenção de uma pena para uma medida de segurança?

Se ao longo do tempo em que o condenado esteja pagando sua pena privativa de liberdade, por exemplo, ele vier a apresentar casos de doenças mentais ou surtos, transtornos e perturbações mentais, o mesmo será encaminhado para uma medida de segurança que melhor se adeque ao seu caso, após o requerimento do Ministério Público ou da autoridade administrativa.

Enfatiza, portanto, que esses casos de substituição, só serão aplicados em casos de doenças mentais permanentes, porque caso o condenado venha a ter um surto, ele será conduzido para o seu tratamento, mas após a cura, ele voltará para cumprir o restante da sua pena no cárcere, até porque só poderá ser efetuada essa convenção durante o período de pena, necessitando assim de perícia médica para a constatação.

Para o Supremo Tribunal de Justiça – STJ, em casos de substituição à pena corporal, a medida de segurança deve ter a duração ligada ao período estipulado como restante para o cumprimento da privativa de liberdade, sob pena de ofensa a coisa julgada, ou seja, deve seguir o que rege a sentença condenatória.


3. Conclusão

Pode-se concluir, desse modo que, é muito necessário a prática da medida de segurança no Brasil, tendo em vista que aqueles que não podem sofrer pena/sanções, por não entenderem a gravidade dos seus atos no momento em que comete a ação, precisam de alguma forma serem tratados para que seja promovida segurança para a sociedade, e de certo modo, preservar a saúde do autor, tentando encontrar a cura ou pelo menos a melhora do seu grau de transtorno.

Também é necessário que se observe pontualmente o local de tratamento em que o indivíduo se encaixa, ofertando assim uma recuperação mais rápida e eficiente, para que o mesmo retorne para a sociedade conseguindo ter uma vida normal, perto de seus familiares e amigos.

Isso também preserva a dignidade da pessoa humana, tratar os desiguais igualmente, ofertando a eles o direito de acesso à justiça, além dos direitos e garantias expressos na Constituição Federal, por isso a precisão e o cuidado que o juiz tem na hora de executar um inimputável ou semi-imputável para seu tratamento, não devendo romantizar sua conduta, mas buscar a ajuda necessária e ideal para que se alcance a cura desse autor. Além de observar se o mesmo é perigoso ou não a sociedade, e caso não seja, não o executar para o tratamento, e sim libertá-lo.


Referências bibliográficas

GOMES, Luiz Flávio. O que se entende por medida de segurança?. Jusbrasil, 2011. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/o-que-se-entende-por-medida-de-seguranca/121927194. Acesso em: 18 out. 2023.

A aplicação das medidas de segurança sob o crivo do STJ. Stj.jus.br, 2022. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/03042022-A-aplicacao-das-medidas-de-seguranca-sob-o-crivo-do-STJ.aspx. Acesso em: 18 out. 2023.

Juiz pode encaminhar inimputável para tratamento ambulatorial em vez de internação. Conjur, 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-abr-22/juiz-encaminhar-inimputavel-tratamento-vez-internacao. Acesso em: 08 nov. 2023.

MASSON, Cleber. Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120). 16º ed. Rio de Janeiro: Método,2022.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.


Nota

  1. MASSON, Cleber. Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120). 16º ed. Rio de Janeiro: Método,2022.


Abstract: Security measures are one of the tools adopted by the judiciary. It consists of seeking a cure for people considered unattributable or semi-imputable, who have mental illnesses or incomplete development, and therefore pose some danger to society, carrying out acts typified in the Penal Code as something illicit. As these agents cannot receive a sentence, a security measure is assigned, through outpatient treatments or hospitalizations in custodial hospitals, for more delicate and permanent cases. With this bias, this article brings to the reader a qualitative analysis on the topic, with bibliographical research through doctrines, jurisprudence and the Brazilian legal system, emphasizing how the application of the security measure comes to be, how the security measure is evaluated and certified. dangerousness of the agent, the types of these measures, as well as the duration of the treatment and its specific purpose. With this, it will be possible for the reader to understand the importance of these treatments and also the path taken to apply them within society.

Keywords: Security measure; Unaccountable; Semi-imputable; Treatment.

Sobre os autores
Rilawilson José de Azevedo

Dr. Honoris Causa em Ciências Jurídicas pela Federação Brasileira de Ciências e Artes. Mestrando em Direito Público pela UNEATLANTICO. Licenciado e Bacharel em História pela UFRN e Bacharel em Direito pela UFRN. Pós graduando em Direito Administrativo. Policial Militar do Rio Grande do Norte e detentor de 19 curso de aperfeiçoamento em Segurança Pública oferecido pela Secretaria Nacional de Segurança Pública.

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