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Transgênero: mudança de nome e de gênero nos documentos pessoais

Agenda 28/11/2023 às 11:26

RESUMO

Muito se discute sobre pessoas transgênero, que em determinado momento da vida descobrem não mais se identificar com o seu sexo biológico e optam por modificar legalmente os seus documentos pessoais a fim de que o seu nome social e o gênero sejam reconhecidos e registrados nos documentos oficiais de identificação. Nessa vertente, tomando como base o contexto social, onde o preconceito e a desigualdade se inserem, objetiva-se no estudo quantificar/organizar informações de indivíduos transgênero, que decidiram oficialmente – em um Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais, de uma pequena cidade da região Sul do Estado de Minas Gerais – mudar de nome e de gênero. Para tanto, trata-se de metodologia quantitativa, com embasamento bibliográfico, que envolve pesquisa de campo no cartório em questão. O resultado aponta que apenas que oito pessoas aderiram ao processo.

Palavras chave: Transgênero. Nome. Gênero. Documentos.

ABSTRACT

Much is discussed about transgender people, who at a certain point in their lives discover that they no longer identify with their biological sex and choose to legally modify their personal documents so that their social name and gender are recognized and registered in official documents. of identification. In this aspect, based on the social context, where prejudice and inequality are inserted, the objective of the study is to quantify/organize information from transgender individuals, who officially decided - in a Civil Registry of Natural Persons, in a small town from the southern region of the State of Minas Gerais – change name and gender. Therefore, it is a quantitative methodology, with bibliographic basis, which involves field research in the registry office in question. The result shows that only eight people joined the process.

Keywords: Transgender. Name. Genre. Documents.

INTRODUÇÃO

O número crescente de pessoas que assumem ser transgênero acelera o debate social sobre a categoria, já que buscam a regulamentação do assunto no direito brasileiro. Importa dizer, que as minorias já se beneficiam a partir do ordenamento jurídico, que reconhece a inclusão social ao que se referem. E diante disso, pergunta-se: qual é o amparo legal para os transexuais fazerem a mudança do nome e de gênero?

Nessa perspectiva, a metodologia quantitativa sob pesquisa de campo, justifica-se em virtude de o Instituto Brasileiro da Família, IBDFAM, (2022), divulgar que aproximadamente, 2% da população adulta brasileira corresponde a pessoas transgênero, o que representa hoje 3 milhões de indivíduos.

IDENTIDADE DE GÊNERO

Como uma pessoa se sente em relação ao seu gênero, compreende a sua identidade e se percebe não necessariamente com o sexo biológico, denotando um autoconhecimento e como deseja ser reconhecida pelo outro, sendo, portanto, gênero com o qual uma pessoa se identifica, que pode ou não concordar com o gênero que lhe foi atribuído quando de seu nascimento. Diferente da sexualidade da pessoa. Identidade de gênero e orientação sexual são dimensões diferentes e que não se confundem. Pessoas transexuais podem ser heterossexuais, lésbicas, gays ou bissexuais, tanto quanto as pessoas cisgênero.3 (JESUS, 2012, p. 14).

Neste caso, o ser não se enxerga em conformidade com o seu sexo biológico, podendo ele ter sua identidade de gênero como: masculina, feminina, mulher, homem, trans, travesti, dentre outras formas de expressão. De acordo com Butler:

Não há nada em sua explicação que garanta que o “ser” que se torna mulher seja necessariamente fêmea. Se, como afirma ela, “o corpo é uma situação”, não há como recorrer a um corpo que já não tenha sido sempre interpretado por meio de significados culturais; consequentemente, o sexo não poderia qualificar-se como uma facticidade anatômica pré-discursiva. Sem dúvida, será sempre apresentado, por definição, como tendo sido gênero desde o começo. (BUTLER, 2003, p. 27).

Além disso, “não há identidade de gênero por trás das expressões do gênero; essa identidade é performativamente constituída” (BUTLER, 2003, p. 48, grifo do autor), pois muitos pensam que gênero está relacionado à anatomia dos órgãos genitais, mas se refere ao desejo; o jeito em que a pessoa se veste, comunica-se ou comporta-se, que, em verdade, é o fator que mais impacta, já que ela se define conforme a percepção de si mesma. De fato, é pelo que se enxerga/visualiza, que a sociedade discerne o tipo de gênero que o outro ajusta-se.

Por vezes, pessoas que não se identificam com seu próprio gênero, são caladas por medo e insegurança em assumi-lo pelo fato de não saber como a sociedade irá reagir diante de tal situação. Ressalta-se, pois, que em muitos momentos, a instauração de preconceitos ocorrem em núcleos familiares – ainda que implicitamente –, a partir de exemplos comportamentais por parte dos genitores ou responsáveis pelas crianças, que ali se desenvolvem.

De acordo com Richartz (2019), Butler defende que a identidade não é dada por ocasião do nascimento, mas é performativamente constituída. A identidade não é biológica, mas depende da performance do sujeito em sociedade, pois não se justifica afirmar que um bebê é homem ou mulher pela estrutura corporal, ou ainda simplesmente pela genitália desse recém-nascido. E nesse viés, o desejo é considerado por Butler (2003) fundamental na expressão de gênero, porque a identidade não é dada por ocasião do nascimento, mas ela é performativamente constituída. Depende da performance do sujeito em sociedade, pois é para onde o seu desejo está direcionado. A teoria da performatividade indica que a repetição das normas impostas de forma ritualizada pela sociedade cria sujeitos que são frutos dessas repetições, mas que não necessariamente vão se identificar com o que lhes foi imposto. Assim, a identidade de gênero quase sempre é fabricada pelo que aparece na superfície dos corpos e por meios discursivos reiterados de geração em geração. No limite, as noções binárias homem/mulher ou masculino/feminino não são exclusivas, mas a maioria se enquadra nessa categoria, pois a repetição da norma e do discurso heterossexual cria sujeitos heterossexuais. (RICHARTZ; SANTANA, 2021, p. 56)

Transgênero pode se referir também, não só àquele que não se identifica com o seu sexo biológico. É um “conceito ‘guarda-chuva’ que abrange o grupo diversificado de pessoas que não se identificam, em graus diferentes, com comportamentos e/ou papéis esperados do gênero que lhes foi determinado quando de seu nascimento”. (JESUS, 2012, p. 15).

Segundo Maria Berenice Dias o transexual se caracteriza por:

eventual incoincidência entre o sexo aparente e o psicológico que gera problemas de diversas ordens. Além de um profundo conflito individual, repercussões acabam ocorrendo nas áreas médica e jurídica, pois o transexual tem a sensação de que a biologia se equivocou com ele. Ainda que reúna em seu corpo todos os caracteres orgânicos de um dos sexos, seu psiquismo pende, irresistivelmente, ao sexo oposto. Mesmo sendo biologicamente normal, nutre um profundo inconformismo com o sexo biológico e intenso desejo de modificá-lo, o que leva à busca de adequar a externalidade à alma. (DIAS, 2006, p. 102).

E nesse patamar, além dessas alterações documentais, indivíduos transgênero adquirem o direito quanto à modificação de seu órgão genital através de procedimentos cirúrgicos.

No que tange à esfera desses procedimentos, no ano de 2008 foram permitidas harmonizações e modificações corporal e genital com acompanhamento profissional, no entanto, os passos iniciais para se avançar nessa opção é dirigindo-se a um Centro de Unidade Básica ou até mesmo em um consultório médico particular, onde o paciente recebe todas as informações pertinentes a essa caminhada. Nessa perspectiva, o processo transexualizador se refere a um processo pelo qual a pessoa transgênero passa, de forma geral, para que seu corpo adquira características físicas do gênero com o qual se identifica. Pode ou não incluir tratamento hormonal, procedimentos cirúrgicos variados (como mastectomia, para homens transexuais) e cirurgia de redesignação genital/sexual ou de transgenitalização. (JESUS, 2012, p. 16)

E além,

a transexualidade envolve a experiência da transição de gênero, que é o processo de compor o gênero de identificação, envolvendo vivências que são eminentemente subjetivas ainda que ocorram em contextos sociais. Nesse sentido, a transição significa assumir socialmente o gênero com o qual a pessoa trans se identifica, o que pode incluir ou não cirurgias de alteração genital (transgenitalização), terapias hormonais e outras modificações corporais. (MINAS GERAIS, 2016, p. 32)

Muito se ouve que pessoas transgênero optam pela mudança de sexo pelo fato de, durante a infância ou mesmo na vida adulta, passarem por processos traumáticos mergulhados em preconceito e discriminação, todavia, ressalta-se que a identidade de gênero vem desde o nascimento, e a consciência de sexualidade do ser ocorre quando este consegue se autoconhecer e expressar quem realmente é.

FUNDAMENTAÇÃO LEGAL DA ALTERAÇÃO DO NOME E DO GÊNERO NOS DOCUMENTOS PESSOAIS E O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA

A fundamentação legal para a pessoa fazer as alterações em seus documentos pessoais de identificação data do ano de 2018, visto que, anterior a esse tempo, apenas a mudança no corpo físico através de procedimentos cirúrgicos não bastava para se garantir a dignidade da pessoa humana em virtude da discriminação social se processava, a exemplo, quando aquela se mostrava com um corpo feminino e apresentava registros documentais que a identificavam no masculino por conta do seu sexo de nascimento. E diante disso, a seguir discorrer-se-á sobre o amparo legal aos que são transgênero e os procedimentos que por eles devem ser realizados.

Em verdade, a nossa Carta Magna de 1988 prevê o direito à igualdade e à dignidade da pessoa humana já prevista na Constituição de 1988; em seu art. 3º esse direito à igualdade concerne, em termos específicos, à diferença, à diversidade, e não à discriminação, como explícito em: “IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” (BRASIL, 1988, s. p.). Já em seu art. 1º, III, garante-se a dignidade do ser humano, inerente ao direito do transexual, à cidadania e à posição de sujeito de direitos na sociedade, respeitando as diferença e garantindo a não discriminação. “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” (BRASIL, 1988, s. p.).

Quanto ao regulamento específico garantindo essa igualdade e dignidade de maneira efetiva, recorre-se ao artigo 2º do provimento do Conselho Nacional de Justiça, que prevê o direito de pessoas maiores de 18 anos requererem a averbação do prenome e do gênero a fim de adequá-los à identidade autopercebida, a saber:

Art. 2º Toda pessoa maior de 18 anos completos habilitada à prática de todos os atos da vida civil poderá requerer ao ofício do RCPN a alteração e a averbação do prenome e do gênero, a fim de adequá-los à identidade autopercebida.

1º A alteração referida no caput deste artigo poderá abranger a inclusão ou a exclusão de agnomes indicativos de gênero ou de descendência.

2º A alteração referida no caput não compreende a alteração dos nomes de família e não pode ensejar a identidade de prenome com outro membro da família.

3º A alteração referida no caput poderá ser desconstituída na via administrativa, mediante autorização do juiz corregedor permanente, ou na via judicial. (BRASIL, 2018, s. p.).

Acredita-se que o Conselho Nacional de Justiça, ao reconhecer em 2018 o direito de as pessoas trans modificarem o nome e o gênero em seus registros, tenha avançado significativamente, porém, ainda se encontre uma adesão pouco expressiva entre os transexuais por conta dos preconceitos ainda existentes na sociedade.

Para a retificação de nome e/ou do gênero na certidão de nascimento, pode-se solicitá-la em qualquer cartório de registro, de posse de todos os documentos e certidões, mas o procedimento ocorre na unidade em que a pessoa foi registrada pela primeira vez. O art. 4º do provimento 73/2018 e seus incisos, especifica todos os requisitos que alguém precise cumprir para realizar as retificações em questão:

Art. 4º O procedimento será realizado com base na autonomia da pessoa requerente, que deverá declarar, perante o registrador do RCPN, a vontade de proceder à adequação da identidade mediante a averbação do prenome, do gênero ou de ambos.

§ 1º O atendimento do pedido apresentado ao registrador independe de prévia autorização judicial ou da comprovação de realização de cirurgia de redesignação sexual e/ou de tratamento hormonal ou patologizante, assim como de apresentação de laudo médico ou psicológico.

§ 2º O registrador deverá identificar a pessoa requerente mediante coleta, em termo próprio, conforme modelo constante do anexo deste provimento, de sua qualificação e assinatura, além de conferir os documentos pessoais originais.

§ 3º O requerimento será assinado pela pessoa requerente na presença do registrador do RCPN, indicando a alteração pretendida.

§ 4º A pessoa requerente deverá declarar a inexistência de processo judicial que tenha por objeto a alteração pretendida.

§ 5º A opção pela via administrativa na hipótese de tramitação anterior de processo judicial cujo objeto tenha sido a alteração pretendida será condicionada à comprovação de arquivamento do feito judicial.

§ 6º A pessoa requerente deverá apresentar ao ofício do RCPN, no ato do requerimento, os seguintes documentos:

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  1. – certidão de nascimento atualizada;

  2. – certidão de casamento atualizada, se for o caso; III – cópia do registro geral de identidade (RG);

IV – cópia da identificação civil nacional (ICN), se for o caso; V – cópia do passaporte brasileiro, se for o caso;

VI – cópia do cadastro de pessoa física (CPF) no Ministério da Fazenda; VII – cópia do título de eleitor;

IX – cópia de carteira de identidade social, se for o caso; X – comprovante de endereço;

  1. – certidão do distribuidor cível do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);

  2. – certidão do distribuidor criminal do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);

  3. – certidão de execução criminal do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);

  4. – certidão dos tabelionatos de protestos do local de residência dos últimos cinco anos;

  5. – certidão da Justiça Eleitoral do local de residência dos últimos cinco anos;

  6. – certidão da Justiça do Trabalho do local de residência dos últimos cinco anos;

  7. – certidão da Justiça Militar, se for o caso.

7º Além dos documentos listados no parágrafo anterior, é facultado à pessoa requerente juntar ao requerimento, para instrução do procedimento previsto no presente provimento, os seguintes documentos:

  1. – laudo médico que ateste a transexualidade/travestilidade;

  2. – parecer psicológico que ateste a transexualidade/travestilidade;

  3. – laudo médico que ateste a realização de cirurgia de redesignação de sexo.

8º A falta de documento listado no § 6º impede a alteração indicada no requerimento apresentado ao ofício do RCPN.

9º Ações em andamento ou débitos pendentes, nas hipóteses dos incisos XI, XII, XIII, XIV, XV, XVI e XVII do § 6º, não impedem a averbação da alteração pretendida, que deverá ser comunicada aos juízos e órgãos competentes pelo ofício do RCPN onde o requerimento foi formalizado. (BRASIL, 2018)

Após serem apresentados todos os documentos exigidos pelo art. supracitado, ao RCPN, prossegue-se com a análise e por fim, a retificação, que, quando finalizada, emitir- se-á a nova certidão de nascimento constando os novos nome e gênero. Seguidamente, o próprio RCPN comunicará a todos os demais órgãos emitentes quanto à realização da mudança em seu registro, e encerrado esse trâmite, o autor da solicitação será notificado e poderá dar início à alteração dos demais documentos pessoais a partir de sua certidão de nascimento já atualizada. No entanto, importa mencionar que a nova lei estabelece a alteração de tão somente o nome e o gênero, devendo permanecer o sobrenome, a fim de manter a identidade da família. E além do exposto e tão importante quanto, o requerente deverá expressar a sua vontade de realizar tal alteração, mediante averbação do prenome, gênero, tendo também, obrigatoriedade de declarar a inexistência de processos judiciais que tenham por objeto a alteração pretendida.

Antes de qualquer alteração, deverá o autor estar ciente de que poderá realizar a retificação somente uma única vez, visto que em caso de arrependimento, não poderá voltar a usar seu nome biológico, a não ser que opte por uma ação judicial. Existindo alguma ação judicial, deverá comprar o arquivamento antes de solicitar a retificação diretamente em cartório.

Desta forma, ter um nome é imprescindível, de extrema importância para a vida social, e conforme o novo Código Civil brasileiro, “art. 16 – Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.” (BRASIL, 2002, s. p.)

Maria Berenice Dias afirma “que todos têm direito ao nome, bem como à identificação de sua origem familiar e eles sobrevivem mesmo após a morte, de tal maneira que: Todos têm direito a um nome.” (2015, p. 113).

Nesse contexto, para a proteção do nome, o Código Civil de 2002 dispõe sobre o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, Inciso III, da Constituição Federal:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui- se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana; (BRASIL, 1988, s. p.)

Com a aprovação do Supremo Tribunal Federal, os ministros invocaram o princípio da dignidade humana; sancionada a lei pela mesma Corte, determinou-se também, que os cartórios devem respeitar o sigilo de tal retificação.

Diante disso, quanto à certidão primeira de nascimento, deve ser arquivada e se emite uma nova certidão, proibindo-se fornecer qualquer cópia da original ou qualquer tipo de informação a terceiros sem a autorização do autor. Em caso de descumprimento, o cartório responderá judicialmente pelos danos causados, pelo motivo da dignidade da pessoa humana e não mais como preconceito. Devendo-se, portanto, respeitar o novo nome e não mais fazendo uso do primeiro.

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MATERIAL E MÉTODO

O estudo se desenvolveu a partir de metodologia quantitativa, sob pesquisa realizada em um Cartório localizado em uma cidade de 28.556 mil habitantes, pertencente ao Estado de Minas Gerais, quando um levantamento foi feito nessa seção acerca de todos os casos de mudança de registro, desde que o provimento do Conselho Nacional de Justiça entrou em vigor, no ano de 2018, até a data de 5 de setembro de 2022. E neste caso, inexiste margem de erro da pesquisa, já que foram mensurados todas as ocorrências registradas na localidade.

RESULTADO E DISCUSSÃO

Conforme pesquisa feita em um Cartório de uma cidade do interior de Minas Gerais, oito pessoas fizeram a mudança de nome e gênero em seus registros, desde que a Lei entrou em vigor no ano de 2018.

Os dados coletados, sugerem que o preconceito, especialmente em municípios pequenos, pode explicar a baixa procura para tais mudanças, já que, historicamente, a população transgênero é estigmatizada, marginalizada e perseguida, em decorrência da crença de que o natural é que o gênero atribuído ao nascimento seja aquele com o qual as pessoas devam se identificam e, portanto, espera-se que elas se comportem de acordo com o que se julga ser o adequado para esse ou aquele gênero.

Quem opta pela mudança, muitas vezes sofre com violências que se iniciam em seus lares, pois que, mudar o nome mexe com valores arraigados na família que, no passado, escolhera com carinho o nome do bebê, sendo, então, a troca do nome, de alguma forma, uma afronta aos valores familiares.

A transfobia que é o “preconceito e/ou discriminação em função da identidade de gênero de pessoas transexuais ou travestis” (JESUS, 2012, p. 29), trata-se a uma espécie de discriminação ou ódio gerado contra transgênero, podendo, também, ser explicada como fator que leva à baixa procura pela mudança de nome e gênero. Nessa linha, poderá ser superada quando o debate sobre o direito à igualdade e à luta pela dignidade da pessoa avançar e chegar a um discurso compartilhado e validado, levando em conta a opinião e os argumentos de todos os envolvidos, desde as pessoas trans até os outros setores da sociedade.

CONCLUSÃO

A mudança de nome e de gênero ainda é um assunto espinhoso que precisa ser mais debatido. Apesar de ser um direito legal, mudar os documentos, conforme visto acima, impacta em valores, dentre eles, a correspondência automática entre sexo e gênero dada ao nascer e para tanto, ainda poucas pessoas fazem esse processo, especialmente, em cidades pequenas, onde muitos desejam mudar seus nomes, gêneros ou até mesmo seu jeito de se vestir. Sentem-se envergonhadas ou constrangidas por não saberem como o outro reagirá, considerando-se preconceitos e estigmas instaurados, enraizados em municípios menores, quando muitos se conhecem.

Existem inúmeras formas de violência no cotidiano e muitas vezes, causadas pela transfobia e apresentadas de forma desrespeitosa. Quem as praticam, geralmente inserem- se em grupos sociais que consideram a heterossexualidade como a única forma de viver e expressar o amor, já que nesta modalidade, a relação afetivo-sexual é direcionada a pessoas de gêneros opostos.

Por conseguinte, para avançarmos em relação a este direito, faz-se necessário criar políticas públicas mais abrangentes a fim de contribuir para que a sociedade discuta e chegue a um consenso sobre a importância de respeitar a diversidade sexual e de gênero nos meios sociais mais pluralizados, uma vez que, a lei sem discussão acaba não tendo o efeito esperado pelos legisladores e almejados por grupos contemplados pela norma.

REFERÊNCIAS

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MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M.. Metodologia do trabalho científico. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1992.

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RICHARTZ, T.; SANTANA, Z. Gênero, intersubjetividade e performatividade. Curitiba: Appris, 2021.

Nota

3 Cisgênero é a pessoa “que apresentam sexo e gênero alinhados (por exemplo, mulheres queforam categorizadas como fêmeas pelo saber médico ao nascer e se identificam como mulheres)” (MINAS GERAIS, 2016, p. 20).

Sobre a autora
Ana Paula Silveira

Aluna do Curso de Direito da Faculdade CNEC de Varginha /MG.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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