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A relativização da coisa julgada em matéria tributária.

Impactos na segurança jurídica brasileira e o prisma econômico

Decisões do STF sobre tributos em trato continuado perdem efeito de coisa julgada, gerando insegurança jurídica e impacto econômico.

Introdução

A Constituição Federal de 1988 (art. 5°, XXXVI) celebrou ao plano constitucional a impossibilidade de a lei prejudicar a coisa julgada, tal como o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Quando uma decisão transita em julgado, ela acaba de se tornar um julgamento definitivo e, portanto, não cabem mais recurso dessa decisão para discutir o mérito. A coisa julgada é uma garantia fundamental para a segurança jurídica e a estabilidade das relações sociais, pois permite que as partes envolvidas no processo tenham certeza de que a decisão final será respeitada e cumprida. Além disso, impede que as partes usem o processo como instrumento de litigância de má-fé ou para buscar vantagens indevidas.

Em fevereiro deste ano, foi a julgamento ao Supremo Tribunal Federal (STF) os Recursos Extraordinários RE 955227 (Tema 885) e RE 949297 (Tema 881). O plenário do STF considerou que a coisa julgada, sobre tributos recolhidos de forma cotinuada (aqueles cuja cobrança se renova periodicamente), perde seus efeitos caso o Supremo se pronuncie em sentido contrário. A discussão acaba se tornando de grande relevância quando se tem em mente a grande quantidade de contribuintes que foram contemplados ou ainda serão com decisões favoráveis em seus pleitos judiciais. Dessa forma, tal decisão acaba não afetando apenas o Direito em si, mas também pelo prisma econômico.


Resultado e Discussão

O fato gerador da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) é a apuração do lucro líquido, a partir do lucro contábil, com as adições e exclusões estabelecidas em lei.

A CSLL foi criada pela Lei Ordinária n° 7.689/89. Na época, houve uma grande discussão se essa lei poderia criar tal contribuição. Muitas empresas entraram com ações e ganharam decisões favoráveis que não precisariam recolher a CSLL, mas somente em 2007, após longos 18 anos é que o STF foi declarar constitucional o recolhimento, por intermédio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n° [15].

É evidente que nesse ínterim houveram diversas decisões favoráveis e não favoráveis ao contribuinte, é aqui que entra a questão econômica e da imparcialidade que o Direito Tributário deveria ter na concorrência comercial.

Antes de falarmos disso, vamos a outro debate: os efeitos da coisa julgada serão cessados de forma automática, não sendo necessário que a União ajuize alguma ação; seja rescisória, revisional, é saber que teremos o efeito da alteração de jurisprudência sendo aplicado no caso concreto automaticamente, o que acabará gerando uma enorme insegurança jurídica.

O ministro do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Gomes de Barros, no proferimento do seu voto-vista no Agravo Regimental em Recurso Especial n° 382.736/SC, pontuou em relação às decisões dos tribunais superiores, que estas também podem ser erradas e inseguras, segue o trecho de sua fala:

“Nós somos os condutores, e eu – ministro de um Tribunal cujas decisões os próprios Ministros não respeitam – sinto-me, triste. Como contribuinte, que também sou, mergulho em insegurança, como um passageiro daquele vôo trágico em que o piloto que se perdeu no meio da noite em cima da Selva Amazônica: ele virava para a esquerda, dobrava para a direita e os passageiros sem nada saber, até que eles de repente descobriram que estavam perdidos: O avião com o Superior Tribunal de Justiça está extremamente perdido. Agora estamos a rever uma Súmula que fixamos há menos de um trimestre. Agora dizemos que está errada, porque alguém nos deu uma lição dizendo que essa Súmula não devia ter sido feita assim.

Nas praias de turismo, pelo mundo afora, existe um brinquedo em que uma enorme bóia cheia de pessoas é arrastada por uma lancha. A função do piloto dessa lancha é fazer derrubar as pessoas montadas no dorso da bóia. Para tanto, a lancha desloca-se em linha reta e, de repente, descreve curvas de quase noventa graus. O jogo só termina, quando todos os passageiros da bóia estão dentro do mar. Pois bem, o STJ parece ter assumido o papel do piloto dessa lancha. Nosso papel tem sido derrubar os jurisdicionados.”

É importante frisar que ficou certo que as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem, automaticamente, os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas relações de trato continuado, devendo ser observada a irretroatividade, a anterioridade anual e a anterioridade nonagesimal, dependendo da natureza do tributo. Em contrapartida, as decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo.

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Entretanto, o STF, em julgamento não modulou os efeitos, ou seja, não protegeu a segurança jurídica e o interesse social, fazendo com que a decisão retroaja. Empresas como Samarco, Brankem, Embraer e o Grupo Pão de Açúcar, comunicaram que têm decisão transitada em julgado que possibilita o não recolhimento da CSLL, para o Pão de Açúcar, tal decisão tem 31 anos, sendo a modulação dos efeitos de tais processos desde 2007, a partir da ADI 15, retroagirá a partir dessa data, somando mais de R$ 290 milhões de dívida de CSLL, o impacto total das disputas tributárias envolvendo contribuintes e a União poderá vir a ser pelo menos R$ 1,4 trilhão.

Nessa explanação a economia não pode ser jamais deixada de lado. O que acontece com o STF é que para saber se a coisa julgada foi ou não violada, é necessário analisar em dois âmbitos, mesmo sendo uma garantia fundamental, quem interpreta a Constituição Federal é ele mesmo, dessa forma, não pode ser violado aquilo que ele (STF) interpreta, ele só esclarece sua opinião. Se olharmos pelo aspecto econômico, a decisão não parece equivocada, quanto parece no aspecto do direito. Com a não modulação dos efeitos, quem pagou o CSLL, pagou e quem não pagou vai ter que pagar, sendo uma forma de reequilibrar a economia e acaba trazendo novamente uma competitividade. Vamos imaginar a seguinte situação, que não é utópica; uma empresa que paga mais tributo consequentemente vai ter que cobrar mais caro o seu produto, já a que não contribui, acaba se sobressaindo no preço, cobrando mais barato e atraindo mais clientes.

Sabemos que a segurança jurídica é um quesito importantíssimo para atrair investidores e o desenvolvimento da economia, o país precisa disso para ter um crescimento de oportunidades de empregos e investimentos. Hamilton Sobreira, presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB/CE, afirma o seguinte em uma entrevista para o Diário do Nordeste:

"Com todo o respeito ao STF, a gente entende que isso, sim, fere o direito adquirido. Coloca em risco o investidor estrangeiro, que espera um poder judiciário não apenas justo, não é isso que se discute, mas que não ande na corda bamba, onde você tem uma sentença transitada em julgado e na matéria tributária isso pode ser revertido”


Conclusão

De acordo com o exposto, tendo em vista que, conforme já discorrido anteriormente, no ponto de vista economico, acredito que tenha sido correto o posicionamento do STF, haja vista o impacto que o tributo tem simplesmente sobre TODOS os produtos que são vendidos, usados e etc, acarretando um ajustamento economico e livrando o âmbito tributário na concorrência comercial.

Em relação a modulação, o STF seria muito feliz se tivesse modulado os efeitos, o contribuinte apenas estava seguindo uma decisão ganha lá atrás, não tendo culpa alguma sobre os efeitos da decisão desse ano, como disse o Ministro Edson Fachin cita uma frase no seu voto falando o seguinte: “Se no Brasil o futuro é incerto, o passado é duvidoso”, ou seja é necessário a proteção da coisa julgada.

É certo que sobre esse assunto ainda haverá outras pautas, uma delas é de como será a cobrança, será se somado as multas, juros e correção monetária. Já existem propostas de possíveis possibilidades de parcelamento, mas ainda não é algo concreto.

Há um certo receio por parte dos juristas que essa decisão foi no âmbito tributário, podendo posteriomente se estender para as outras áreas do Direito, podendo trazer um problema ainda maior.


Referências

BIFANO, Elidie Palma. Quem sabe quais são os reflexos da decisão sobre a coisa julgada do STF?. Consultor Jurídico, 2023. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-fev-22/consultor-tributario-quem-sabe-quais-sao-reflexos-decisao-coisa-julgada-stf. Acesso em: 27 de mar. de 2023.

Entenda a decisão sobre “coisa julgada” na área tributária tomada pelo STF. Supremo Tribunal Federal, 2023. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=502140&ori=1. Acesso em: 27 de mar. de 2023.

UTUMI, Ana Cláudia; TAPIAS, Camila Abrunhosa. CSLL: o que é, como funciona e como é cobrada. Jota.info, 2021. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/csll-o-que-e-20082021. Acesso em: 27 de mar. de 2023.

SCAFF, Fernando Facury. Os novos contornos da coisa julgada tributária e seus impactos no mercado. Consultor Jurídico, 2023. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-fev-13/justica-tributaria-novos-contornos-coisa-julgada-tributaria-impactos. Acesso em: 27 de mar. de 2023.

BARRETO, Eduardo Monteiro. Temas 881 e 885 de repercussão geral: segurança jurídica e coisa julgada. Jota.info, 2023. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/temas-881-e-885-de-repercussao-geral-inseguranca-juridica-e-coisa-julgada-em-materia-tributaria-31012023. Acesso em: 27 de mar. de 2023.

TRIBUTOLOGIA: O fim da coisa julgada em matéria tributária. Gabriel Quintanilha. Spotify, 2023. Podcast. Disponível em : https://open.spotify.com/episode/7fuO6MdpIGR7FpFA17BBrc?si=fn8a3iqGQu-xa-7zijeWpw. Acesso em: 27 de mar. de 2023.

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