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Uso de videoconferência nos procedimentos policiais

RESUMO

Analisando a atuação da Polícia Judiciária no contexto contemporâneo, nota-se que o uso de videoconferência nos procedimentos policiais oferece vantagens no desenrolar dos procedimentos a serem desenvolvidos pelo delegado, seguindo novo modelo de formalização e instrução dos atos praticados na Delegacia de Polícia, possibilitando ao delegado atuar em vários distritos policiais ao mesmo tempo, gerando economia de tempo e recursos públicos, conferindo agilidade nos procedimentos investigativos e melhorando a atuação da segurança pública para a sociedade. É por meio desta atuação que se materializam as funções de polícia judiciária, auxiliando também o Poder Judiciário no cumprimento de suas decisões, por meio do processo investigatório, abrindo caminho para uma nova interação entre o campo investigativo e a parte envolvida na investigação, e permitindo não apenas o trabalho à distância dos atos processuais escritos, mas também a adaptação do tradicional modelo presencial físico para um modelo virtual. Para este trabalho, utilizou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica, com auxílio a livros, revistas e sites especializados sobre a matéria.

Palavras-chaves: Investigação; Polícia Judiciária; videoconferências.

ABSTRACT

Analyzing the work of the Judicial Police in a contemporary context, it can be seen that the use of videoconferencing in police procedures offers advantages in the course of the procedures to be carried out by the delegate, following a new model of formalization and instruction of the acts carried out at the Police Station, enabling the delegate to act in several police districts at the same time, generating savings in time and public resources, speeding up investigative procedures and improving the performance of public security for society. It is through this action that the functions of the judicial police materialize, also assisting the Judiciary in complying with its decisions, through the investigative process, opening the way for a new interaction between the investigative field and the party involved in the investigation, and allowing not only the remote work of written procedural acts, but also the adaptation of the traditional physical face-to-face model to a virtual model. The methodology used for this work was bibliographical research, using books, magazines and specialized websites on the subject.

Keywords: Investigation; Judicial Police; videoconferencing.

INTRODUÇÃO

Os avanços tecnológicos têm contribuído em vários campos sociais, e para o desenvolvimento das atividades policiais não poderia ser diferente. Com o propósito de demonstrar a utilização do sistema de videoconferência dentro das Delegacias de Polícia, analisam-se no presente trabalho os benefícios e desafios da utilização das tecnologias para o cumprimento de procedimentos realizados pelos órgãos policiais, seja na fase investigativa, com interrogatórios à distância, lavratura de auto de prisão em flagrante, como a análise e manutenção da prisão, entre outros aspectos que contribuem para uma investigação criminal mais célere, atendendo às necessidades de redução de tempo, proteção do erário público e cumprimento do papel da instituição.

Para tanto, far-se-á uso como metodologia de referências bibliografias, como livros, sites e revistas, além de informações contidas em periódicos que abordam o assunto, expondo os pontos positivos e negativos, demonstrando os benefícios e desvantagens existentes na aplicação dessa modalidade tecnológica no âmbito policial, abordando o uso das ferramentas tecnológicas disponíveis para agilizar diversos atos praticados pela polícia judiciária.

Com o devido aproveitamento dos meios tecnológicos, nesse caso a videoconferência, a atividade policial possui um instrumento a mais, capaz de dar celeridade no desempenho de suas funções, levando em consideração todos os aspectos de aperfeiçoamento, com os devidos cuidados para que não restem prejuízos aos procedimentos e nem às partes envolvidas, tais como autores, vítimas, testemunhas, preservando todos os direitos e garantias fundamentais, individuais e judiciais.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

CONTEXTO HISTÓRICO NA FASE INICIAL DA POLÍCIA JUDICIÁRIA

Ao analisar o contexto histórico dos procedimentos policiais brasileiros, percebe-se que, desde a criação do CPP - Código de Processo Penal de 1941, em seu artigo 304, já existia a previsibilidade de apresentação do suspeito de ter cometido uma infração penal à autoridade competente de forma presencial, para regular deliberação sobre a lavratura do auto de prisão em flagrante ou outros procedimentos que compõem as partes do IP – Inquérito Policial, referindo-se à condução do preso à presença de um juiz.

No entanto, o processo de reformas do CPP que ocorreram ao passar dos anos trouxe essa atribuição aos delegados de polícia, que deveriam receber e autuar todos aqueles que se encontrassem em situação de cometimento de crime para a apreciação da legitimidade da prisão, isso de forma presencial, a fim de que o inquérito policial fosse instaurado, originariamente escrito, conforme se verifica no art. 9° do CPP, vigente nos dias atuais: “Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade.”

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Analisando a atuação da polícia judiciária dentro de um contexto contemporâneo, nota-se que há a indispensabilidade constitucional desse encaminhamento imediato do conduzido à unidade de polícia, para que o delegado possa avaliar a legalidade dessa condução, o que, no entanto, pode ser objeto de revisão, a partir do contexto tecnológico atual que oferece vantagens no desenrolar dos procedimentos a serem desenvolvidos pelo delegado de polícia, dando novo modelo de formalização e instrução desses atos relacionados à prisão, o que está bem exemplificado no Art. 5° da Instrução Normativa da SSP/TO, número 02 de abril de 2020, que dispõe:

Fica autorizado o uso do sistema eletrônico de gravação por videoconferência para realização de procedimentos policiais e administrativos incluindo autos de prisão em flagrante, termos circunstanciados de ocorrência, procedimentos disciplinares e cartas precatórias procedentes da PC/TO, nos casos em que os envolvidos estejam em município diverso da sede onde se encontre e a autoridade policial responsável pela formalização do procedimento.

Isso corrobora com o entendimento de que as novas tecnologias estão cada vez mais presentes para facilitar os procedimentos dentro das instituições, e que, neste caso, oferecem pontos vantajosos para a Polícia Judiciária, que, com auxílio de uma equipe, possibilitam ao delegado de polícia atuar em vários distritos policiais ao mesmo tempo, gerando economia, agilidade, melhorando a atuação da segurança pública para a sociedade, conforme autorização contida no Art. 1 da Instrução Normativa da SSP/TO, número 04 de setembro de 2020: “O delegado de polícia poderá ser escalado para cumprir plantão, de forma presencial, em uma Central de Atendimento, e, simultaneamente, de forma remota, em uma ou mais Centrais de Atendimento”.

VANTAGENS DA VIODEOCONFERÊNCIA NOS ATOS POLICIAIS

A sociedade reclama por atendimento mais célere por parte das instituições públicas, principalmente daquelas ligadas à área da segurança pública. Percalços e contratempos cotidianos sucatearam o desenvolvimento da atividade policial, impedindo que a polícia civil, efetivamente, possa exercer todas as funções constitucionalmente declinadas. É através desta atuação que se cumprem não somente as funções de polícia judiciária, auxiliando o Poder Judiciário a ver cumpridas suas decisões, por meio do processo investigatório.

Destarte, a prática de atuação inquisitória no decorrer do Inquérito Policial por videoconferência oferece maior celeridade ao processo, proporcionando justiça com eficiência, e, assim, atendendo aos anseios da sociedade, que requer uma postura ágil por parte do Estado, demonstrando a capacidade de fazer justiça por meio de suas instituições.

Ocorre que, diante de um cenário pandêmico, e tendo a necessidade de dar continuidade aos trabalhos investigativos, as instituições foram obrigadas a reinventar suas rotinas laborais, principalmente com medidas tecnológicas, superando o ambiente físico, o que não foi diferente nas delegacias. Neste sentido, novas regras foram editadas, especialmente pelo Conselho Nacional de Justiça, abrindo caminho para essa nova interação entre o campo investigativo e a parte envolvida na investigação, permitindo não apenas a prática à distância dos atos processuais escritos, mas também a adaptação do tradicional modelo presencial das oitivas, por videoconferência.

Na prática, é possível perceber os vários benefícios trazidos pela tecnologia, podendo ser facilmente identificados como: oferta de um atendimento célere; maior segurança para os policiais e os envolvidos no procedimento policial; possibilidade de atendimento em locais distantes e desprovidos de servidores; captação de imagem e som em tempo real de coisas e pessoas, permitindo a análise individual do julgador; dispensa de deslocamento de policiais e viaturas por muito tempo, viabilizando o trabalho de forma remota; e economia para o Estado, poupando recursos públicos.

Em que pese diferentes balanços quanto aos avanços e retrocessos deste sistema penal digital, resta a percepção generalizada sobre a inevitabilidade da modalidade virtual para a realização de oitivas, mesmo em um quadro pós-pandemia, observando que a introdução tecnológica nos atos processuais se tornou necessária. Porém, há algumas dificuldades a serem superadas, para que nem o procedimento e nem a parte sejam prejudicados.

OS DESAFIOS APRESENTADOS PELA VIDEOCONFERÊNCIA

Como em todo processo de mudança existem causas a serem superadas, para que a oferta dos benefícios seja capaz de atender à necessidade social, pois não basta apenas apresentar um serviço célere, mas também confiável. Nesse sentido, é importante garantir que a videoconferência seja realizada de forma segura e confiável, para evitar problemas com a comunicação ou com a gravação dos procedimentos, reduzindo ao máximo as margens de erro para que as partes não restem prejudicadas.

Além disso, a videoconferência pode dificultar a interação entre todos os envolvidos no ato policial. A distância física pode dificultar a comunicação e o estabelecimento de confiança, o que pode prejudicar a investigação ou o processo judicial.

Todavia, faz-se de suma importância garantir que a privacidade dos envolvidos nos procedimentos seja preservada, evitando a divulgação de informações sigilosas, principalmente dos conteúdos investigados, já que uma informação sigilosa, se divulgada, colocará todo o trabalho da polícia em risco, podendo causar prejuízo social irreparável.

Em suma, a videoconferência é uma ferramenta que pode ser útil no âmbito policial, mas é importante estar ciente dos riscos associados ao seu uso. As autoridades devem tomar medidas para minimizar esses riscos, garantindo a segurança das informações, a confiabilidade das imagens e a interação entre os envolvidos.

Aqui estão exemplos de algumas medidas que podem ser tomadas para mitigar os riscos associados à videoconferência no âmbito policial:

  1. Utilizar redes de comunicação seguras e protegidas;

  2. Utilizar equipamentos de alta qualidade;

  3. Treinar os policiais para fazer uso das ferramentas tecnológicas;

  4. Garantir a privacidade dos envolvidos.

Ao tomar essas medidas, as autoridades podem ajudar a garantir que a videoconferência seja usada de forma segura e eficaz no âmbito policial, cumprindo, assim, com o papel social pretendido, que é oferecer serviços de qualidade, seja dentro da instituição policial, seja como forma de dar respostas de maneira célere para a sociedade.

No entanto, em sentido contrário, percebe-se que tudo o que é novo causa choque, e entre os operadores do Direito não seria diferente, principalmente para aqueles que se apegam a um garantismo exagerado, segundo entendimento de Greco (2020, p. 143):

Quando a possibilidade de monitoramento eletrônico chegou ao Brasil, os hiperbólicos diziam, [...], que aquele recurso era ofensivo à dignidade da pessoa humana, porque o preso ficaria identificado, entre seus pares, como alguém condenado [...] pela Justiça Penal.

No entanto, aqui se tem uma questão de estratégia para o bom cumprimento das funções policiais, especificamente no que diz respeito a um atendimento célere, seguro e econômico para todos os envolvidos. Nesse sentido, Silva Filho (2020, p. 2) em artigo intitulado A atuação remota do Delegado de Polícia, afirma que:

[..] exemplos de experiências exitosas na realização de autos de prisão em flagrante realizados totalmente por intermédio do sistema de videoconferência, seja em razão da falta de efetivo, seja em razão da distância a ser percorrida pelos responsáveis pela captura dos sujeitos em situação de flagrância. A adoção do sistema de videoconferência durante a investigação criminal aperfeiçoa e acelera a conclusão das investigações, pela eliminação de despesas referentes ao deslocamento, de cartas precatórias, além de beneficiar o erário público, poupando recursos hoje despendidos, além de se aproveitar, de forma lícita, dos meios tecnológicos que podem ajudar a Polícia Judiciária no esclarecimento das infrações penais.

Seguindo essa mesma linha de raciocínio, pode-se dizer que novos tempos requerem novas estratégias de desenvolvimento de trabalhos complexos, como os desempenhados nos departamentos de polícia, e as novas tecnologias estão ao alcance para que possam ser utilizadas da melhor forma possível, permitindo que a cadeia jurídica, como um todo, dê resposta rápida e eficiente no combate à criminalidade, na defesa dos seus cidadãos, de modo que tal eficiência não seja sinônimo de agressão a direitos e garantias fundamentais de quem foi preso e apresentado à autoridade policial.

Isso, por óbvio, não se limita à fase judicial, mas alcança necessariamente toda a atuação policial na etapa pré-processual, inclusive na forma dos autos de prisão em flagrante, afinal de contas, a realidade tecnológica está à nossa frente, fazendo dessa tecnologia não apenas um fator comum, mas, acima de tudo, uma necessidade que, por si só, já justifica a aplicação da técnica de oitiva por meio de videoconferência por parte das polícias judiciárias no país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A utilização de videoconferência não significa retrocesso, e sim solução tecnológica apta a apoiar a prestação jurisdicional célere e desburocratizada, em atenção aos direitos humanos e necessidades que aparecem cotidianamente. A pandemia apenas acelerou uma realidade que se desdobraria naturalmente com os avanços tecnológicos, envolvendo recursos que auxiliam significativamente a atividade laborativa das práticas policiais, maximizando tempo e recursos.

Essa tecnologia deve estar presente no âmbito da segurança pública, contribuindo para a instrução processual, seja no princípio, com a realização das diligências elencadas nas atribuições do delegado de polícia, seja em audiências, cumprindo com o propósito finalístico de oferecimento de serviço de qualidade para a justiça e a sociedade.

No entanto, é preciso fazer adequações no sentido de que haja preparação, tanto de recursos humanos, como também de investimentos em recursos tecnológicos por parte do Estado, de modo que todos os atos sejam validados, e, assim, essa forma contributiva da tecnologia alcance todos os campos jurídicos, desde a fase inicial da investigação até os procedimentos aplicados pela justiça.

REFERÊNCIAS

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em números 2021. Brasília/DF: CNJ, 2021.

GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Da prova. Código de Processo Penal Comentado. 2. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2019.

GRECO. Rogério. Da possibilidade de utilização de videoconferência na fase investigativa. [online] disponível em: <https://www.rogeriogreco.com.br/post/da-possibilidade-de-utiliza%C3%A7%C3%A3o-de-videoconfer%C3%AAncia-na-fase-investigativa> acesso em: 05 de setembro de 2023.

GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim; PARCHEN, Andrelize Guaita Di Lascio. Videoconferência na inquirição de testemunhas em tempos de Covid-19: prós e contras na percepção dos atores processuais penais. Revista de Direito Público, Brasília, v. 17, nº 94, p. 493-521, jul./ago. 2020.

Instrução Normativa da Secretaria de Segurança Pública do Tocantins n°. 004, de 11 setembro de 2020.

Instrução Normativa da Secretaria de Segurança Pública do Tocantins, n°. 002 de 03 abril de 2020.

Código de Processo Penal. Decreto lei nº 3.689 (Brasil,1941). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del3689.htmacessado em 10.10.2023.

SILVA FILHO, Antônio Onofre Oliveira da. A atuação remota do Delegado de Polícia. In: https://emporiododireito.com.br/leitura/a-atuacao-remota-do-delegado-de-policia, acessado em 05 de setembro de 2023.

Sobre os autores
Tarsis Barreto Oliveira

Doutor e Mestre em Direito pela UFBA. Professor Associado de Direito da UFT. Professor Adjunto de Direito da UNITINS. Professor do Mestrado em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos da UFT/ESMAT. Membro do Comitê Internacional de Penalistas Francófonos e da Associação Internacional de Direito Penal.

Denubia Lopes Lima

Escrivã de Polícia Civil do Estado do Tocantins. Graduada em Direito pela Unirg. Especialista em Política e Gestão em Segurança e Pública pela Universidade Federal do Tocantins.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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