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Responsabilidade do fornecedor após o período de garantia

Agenda 04/01/2024 às 11:35

O que é garantia nas relações de consumo?

No que concerne a garantia nas relações de consumo, pode ser definida como o método pelo qual o consumidor se resguarda de que o bem adquirido, realmente cumpre o prometido pelo fornecedor. Assim, caso o bem que está sendo comercializado não esteja apto a função a qual se destina, ou apresente algum defeito dentro de um período, o consumidor terá direito de reaver o valor pago, troca do produto por outro igual, ou ainda a manutenção adequada.

Garantia legal

A garantia legal, está prevista no código de defesa do consumidor, com previsão de 30 (trinta) dias para produtos não duráveis, e 90 (noventa) dias para produtos duráveis, a partir da data que você detém a posse do bem. Importante asseverar que se o defeito no produto for de difícil constatação, esse prazo se inicia quando da descoberta do problema. Artigo 26 do CDC:

“Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

§ 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

§ 2° Obstam a decadência:

I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;

II - (Vetado).

III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.

§ 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito.”

Assim, o prazo de garantia legal resta devidamente esclarecido pelo próprio código de defesa do consumidor.

Garantia contratual

De início, é importante deixar consignado que a garantia contratual não é obrigatória, no entanto, caso o fabricante ou fornecedor do produto se comprometa com tal garantia, ela vinculará a relação negocial até o fim do prazo estabelecido.

A própria garantia contratual também possui previsão legal no código de defesa do consumidor, com vistas a evitar situações desfavoráveis ao próprio consumidor, cometidas por quem as concede. Vejamos:

“Art. 50. A garantia contratual é complementar à legal e será conferida mediante termo escrito.

Parágrafo único. O termo de garantia ou equivalente deve ser padronizado e esclarecer, de maneira adequada em que consiste a mesma garantia, bem como a forma, o prazo e o lugar em que pode ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor, devendo ser-lhe entregue, devidamente preenchido pelo fornecedor, no ato do fornecimento, acompanhado de manual de instrução, de instalação e uso do produto em linguagem didática, com ilustrações.”

Assim, a interpretação que é dada a referida garantia, é que ela é complementar. Assim, existe a garantia legal que não deve ser ignorada, e somente após findado o prazo de tal garantia, é que se inicia o prazo da garantia contratual.

Exemplo: Caso consumidor adquira um produto durável com garantia do fabricante de 1 (um) ano, o prazo de garantia para este produto será de 1(um) ano e 3 (três) meses, pois, soma-se a garantia legal com a contratual.

Da responsabilidade fora do período de garantia

Embora exista previsão no CDC em relação a garantia legal, e a garantia contratual esteja devidamente documentada em termo assinado pelas partes, ainda assim, é possível a responsabilização do fabricante pelo defeito de produtos ocorridos fora desse período.

Ocorre que, tratando-se de produtos duráveis, aqueles cuja aquisição se dá com a intenção de que o produto tenha uma duração razoável, não é crível que estes produtos pereçam logo após o prazo de escoamento da garantia.

Pensando nessa duração média, o IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), divulgou um estudo acerca da vida útil média de cada produto. Dentre outras finalidades, este estudo técnico realizado, esclarece ao consumidor, por exemplo: não é justo que ele adquira um produto que possua uma vida média de 4 (quatro) anos, e o produto pereça, sem sua culpa, dentro de um período muito inferior, por exemplo ¼ da sua vida útil média, e ainda assim, não tenha nenhum direito garantido, por considerar apenas o prazo de garantia.

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Link do estudo técnico divulgado pelo IDEC:

https://www.idec.org.br/uploads/testes_pesquisas/pdfs/market_analysis.pdf

Diante dessa situação, o consumidor pode e deve pleitear a troca do produto ou ressarcimento pela perda, pois, fere a boa-fé objetiva comercializar bens que presumem-se ter uma vida útil durável, quando na verdade, perecem logo após o esgotamento do curto prazo de garantia oferecido.

Nessa seara, é importante analisar o julgamento do Superior Tribunal de Justiça, no Resp. nº1787287 SP. Vejamos:

“RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. VÍCIO DO PRODUTO. RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR. TEORIA DA VIDA ÚTIL DO PRODUTO. ACÓRDÃO RECORRIDO. FUNDAMENTAÇÃO. PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NEGATIVA. AFASTAMENTO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. A questão controvertida resume-se à verificação da responsabilidade do fornecedor por vícios apresentados em eletrodomésticos durante a denominada "vida útil do produto". 3. Não o se reconhece a negativa de prestação jurisdicional alegada quando o Tribunal de origem se pronuncia a respeito de todos os pontos levantados pela recorrente, ainda que de forma sucinta, afastando os argumentos deduzidos que, em tese, seriam capazes de infirmar a conclusão adotada. 4. Não há julgamento extra petita quando o acórdão recorrido, acolhendo argumento da parte pleiteando a inaplicabilidade da Teoria da Vida Útil do Produto à hipótese, afasta a responsabilidade pelos vícios surgidos após o período de garantia contratual. 5. O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 26, § 3º, ao tratar dos vícios ocultos, adotou o critério da vida útil do bem, e não o da garantia, podendo o fornecedor se responsabilizar pelo vício mesmo depois de expirada a garantia contratual. Precedentes. 6. No caso, os vícios observados nos produtos adquiridos pela recorrente apareceram durante o período de vida útil do produto, e não foi produzida nenhuma prova de que o mau funcionamento dos eletrodomésticos decorreu de uso inadequado pelo consumidor, a evidenciar responsabilidade da fornecedora. 7. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.

(STJ - REsp: 1787287 SP 2018/0247332-2, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 14/12/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/12/2021)”

O julgado acima se aplica perfeitamente nos casos em que os bens comercializados, possuem descrições e características singulares que impulsionam a compra de tais produtos, no entanto, ao serem submetidos as situações, as características se mostram ineficazes, conforme será exemplificado.

Exemplo: Consumidores que adquirem smartphones ou celulares, com a característica de resistentes ou a prova d'água. Alguns consumidores adquirem esses produtos, todavia, não possuem oportunidade para expor esses produtos a água. Principalmente aqueles que compram para utilizarem nas férias em praias, rios, lagos e clubes aquáticos. Ocorre que durante o período de garantia o aparelho funcionou normalmente sem oferecer qualquer problema, pois, não foi exposto a água ou a outros líquidos. O problema acontece quando finalmente o aparelho é submetido a água, aí se descobre que não é resistente ou a prova d'água, momento em que o aparelho fica inutilizado. Nesses casos, está perfeitamente configurada a quebra da boa-fé objetiva, pois, o aparelho que deveria resistir a água, logo no seu primeiro contato apresenta defeitos, na maioria das vezes irreparáveis. A duração média de um celular ou smartphone é de 3 (três) anos.

O caso exemplificado acima, é bastante corriqueiro, haja vista, disputa entre as empresas para comercializar produtos que tem o preço elevado, e que mesmo assim, são disputados, até mesmo os mais caros, por todas as classes sociais brasileiras.

Portanto, produtos duráveis como os eletrônicos, devem manter seu funcionamento além da garantia legal e contratual, pelo menos por um prazo razoável, considerando a vida útil divulgada pelo IDEC, antes de começarem a apresentar defeitos naturais pela sua utilização, sob pena de quebra da boa-fé objetiva, e consequentemente a obrigação de indenizar ou ressarcir o bem.

Sobre o autor
Hidan de Almeida Teixeira

Advogado. Pós-graduado em direito bancário. Militante na área bancária e consumerista desde o ano de 2015. Responsável pela área bancária do escritório Nascimento de Oliveira Advocacia S.S.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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