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É verdade que posso perder meu direito à Adjudicação Compulsória se demorar muito para procurar meus direitos?

Agenda 19/01/2024 às 17:51

A PRETENSÃO de quem pagou por um imóvel e almeja sua regularização (com "RGI" em seu nome, principalmente) não se perde com o passar do tempo, VIA DE REGRA, porém, como se verá adiante, pode sim ser consumida por outra pretensão, muito mais abrangente que também é espécie de um importante fenômeno existente no direito: a prescrição. Antes de adentrar no assunto especificamente, é importante recordar alguns aspectos sobre a prescrição, principalmente da importante distinção que deve ser feita entra prescrição AQUISITIVA e prescrição EXTINTIVA.

A didática explicação a qual abraçamos vem do magistério do mestre ARNALDO RIZZARDO (Prescrição e Decadência. 2018) para quem,

"O Código Civil, seguindo a orientação da maioria dos sistemas existentes, distingue a prescrição em EXTINTIVA ou liberatória e AQUISITIVA. Há a força extintora e a força geradora de direitos. Na primeira, extingue-se a ação reservada ao titular, ficando eliminado o direito porque desaparece a tutela legal, em virtude, já na visão de Antonio de Almeida Oliveira, 'da inação do credor e o tempo que decorre sem que ele exija o seu pagamento'. Na segunda, surge o direito como FRUTO DO TEMPO QUE PASSA, tornando-se modo de adquirir a propriedade pela posse prolongada. Está marcada aquela pela força negativa, acarretando a perda da ação reconhecida a um direito pela falta de uso ou exercício durante um lapso de tempo previsto; a última traz uma força positiva que leva a adquirir um direito, sendo o caso típico do USUCAPIÃO".

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Como aponta a melhor doutrina, a pretensão de regularizar o imóvel em seu nome, que é exatamente o que move o compromissário comprador que pagou tudo que devia baseado numa PROMESSA DE COMPRA E VENDA não pode mesmo se perder por conta da sua inação, ainda que passados muitos anos; não é realmente justo. Nesse sentido também a lição do especialista VALTER FARID ANTONIO JUNIOR (Compromisso de Compra e Venda. 2009):

"Decerto, não faria sentido negar ao adquirente o direito à obtenção da escritura pública se já tiver pago todo o preço, ainda que tardasse exageradamente a acionar a estrutura judiciária. Ter-se-ia a TERATOLÓGICA situação em que o alienante em mora conservaria a propriedade do bem mesmo após receber, na íntegra, a contraprestação devida pelo adquirente que, por sua vez, exerce posse sobre imóvel como se fosse seu, desde a celebração do negócio aquisitivo".

Efetivamente se deve prestigiar o CARÁTER PERPÉTUO do direito de propriedade que se pretende constituir com a ação de adjudicação compulsória (ou mesmo pelo pedido EXTRAJUDICIAL que, como sabemos, pode ser feito independentemente de ação judicial direto no Tabelionato de Notas e no Cartório do RGI, nos termos do art. 216-B da Lei de Registros Públicos). Não fosse assim, lamentavelmente seria obrigado o compromissário comprador, ainda que tendo PAGO pela aquisição do imóvel valer-se, se preenchidos os requisitos, da Ação de Usucapião (ou mesmo do reconhecimento extrajudicial da Usucapião) para adquirir o imóvel pelo qual pagou - o que não se reputa justo, ainda que seja mesmo essa uma alternativa para dar solução ao caso já que a promessa de compra e venda é considerada "justo título" para embasar a ação de usucapião. PORTANTO, o direito de buscar a regularização - ou seja, a pretensão baseada na Adjudicação Compulsória - é imprescritível, TODAVIA, um cuidado muito importante que deve ter o compromissário comprador é de acautelar-se para que outrem não arvore sobre seu imóvel a PRESCRIÇÃO AQUISITIVA fazendo com que os requisitos para a Usucapião permitam que esse terceiro possa propor uma Ação de Usucapião (ou mesmo o reconhecimento extrajudicial, sem processo judicial, nos moldes do art. 216-A da mesma Lei de Registros Publicos), uma vez que a prescrição aquisitiva pode sim aniquilar o direito baseado na adjudicação compulsória, como inclusive já reconheceu com exemplar acerto o STJ em duas oportunidades:

"STJ. REsp: 369206/MG. J. em: 11/03/2003. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. Escritura definitiva. Adjudicação. Prescrição. Não prescreve o direito de a promissária compradora obter a escritura definitiva do imóvel, direito que só se extingue frente ao de outrem, amparado pelo usucapião. Recurso não conhecido" .

"STJ. REsp: 1489565/DF. J. em: 05/12/2017. RECURSO ESPECIAL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ) 2. O objetivo da ação de adjudicação compulsória é a constituição de um direito real, fruto de compromisso de compra e venda, com a transferência da propriedade ao promitente comprador após a quitação integral do preço. 3. O direito de obter a escritura definitiva do imóvel somente pode ser atingido pela prescrição aquisitiva decorrente de eventual ação de usucapião intentada por terceiro, não se submetendo aos prazos previstos no artigo 177 do Código Civil de 1916. 4. Recurso especial não provido".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

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