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Filtros recursais: engessamento do poder judiciário ou efetiva celeridade e qualidade na prestação da tutela jurisdicional?

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Agenda 23/01/2024 às 15:48

“Aplausos, quando os não fundamenta o mérito, afagam certamente o espírito, e dão algum verniz de celebridade, mas quem tem vontade de aprender e quer fazer alguma cousa, prefere a lição que melhora ao ruído que lisonjeia.”

(Machado de Assis)

LISTA DE ABREVIATURAS

AR Carta com aviso de recebimento

Art. Artigo

Arts. Artigos

CC Código Civil

CF Constituição Federal

CPC Código de Processo Civil

CRFB Constituição da República Federativa do Brasil, de 5.10.1988

DF Distrito Federal

EC Emenda Constitucional

OAB Ordem dos Advogados do Brasil

p.ex. Por exemplo

PR Paraná

PSV Proposta de Súmula Vinculante

RE Recurso Extraordinário

REsp Recurso Especial

RITJSP Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São Paulo

RISTF Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal

RISTJ Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça

STM Superior Tribunal Militar

TJDFT Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios

TJMG Tribunal de Justiça de Minas Gerais

TJRS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

TSE Tribunal Superior Eleitoral

TST Tribunal Superior do Trabalho

RESUMO

O presente trabalho monográfico tem o escopo de analisar o novel sistema de filtros recursais sob o enfoque da celeridade prenunciada pelo Poder Público. Tenciona-se, à luz da análise da teoria geral dos recursos cíveis, dos princípios norteadores, dos recursos cíveis em espécie e seus pressupostos de admissibilidade a possível constatação do engessamento ante ao sistema de filtros recursais. Tomadas em suas grandes linhas, examinam-se os seguintes filtros: Súmulas Vinculantes; Súmulas Impeditivas de Recursos; Repercussão Geral; e os Recursos Repetitivos. Abordar-se-á a inserção dos referidos filtros no Poder Judiciário perante os princípios processuais constitucionais, e seu cotejamento para a concepção do novo Código de Processo Civil. Para tanto, utilizar-se-á metodologia de pesquisa bibliográfica e análise de dados estatísticos dos Tribunais Superiores.

Palavras-chave: filtros recursais, celeridade, pressupostos de admissibilidade, princípios processuais constitucionais.

ABSTRACT

The scope of this paper aims to analyze  the novel recusal filter systems under the  celerity of the Public Authority. This work intent to verify the possible lack of flexibility under the recusal filter systems from the guiding principles, the civil appeals and their assumptions of admissibility, on the Civil Appeals General Theory. Taken broadly, it examines the following filters: Binding abridgement, Overviews hampers abridgement,

General Effect, Repetitive Appeals. It will address the inclusion of such filters on the Judiciary on the constitutional procedural principles and its mutual comparison to design the new Civil Process Code. For this, it will use the methodology of literature search and analysis of statistical data from the Superior Courts. 

Key words: recusal filters, celerity, assumptions of admissibility, constitutional procedural principles.

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO

1 TEORIA GERAL DOS RECURSOS E RECURSOS EM ESPÉCIE
1.1 Princípios

1.1.1 Princípios Processuais Constitucionais

1.1.1.1 Princípio do Duplo Grau de Jurisdição

1.1.1.2 Princípio do Devido Processo Legal

1.1.1.3 Princípio da Inafastabilidade do Judiciário

1.1.1.4 Princípio da Isonomia Processual

1.1.1.5 Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa

1.1.1.6 Princípio do Juiz Natural

1.1.1.7 Princípio da Publicidade

1.1.1.8 Princípio da Motivação

1.1.1.9 Princípio da Inadmissão da Prova Ilícita

1.1.2 Princípios Recursais Fundamentais

1.1.2.1 Princípio da Taxatividade

1.1.2.2 Princípio da Unirrecorribilidade

1.1.2.3 Princípio da Fungibilidade

1.1.2.4 Princípio da Voluntariedade

1.1.2.5 Princípios da Irrecorribilidade em Separado das Interlocutórias

1.1.2.6 Princípio da Vedação Legal da “reformatio in pejus

1.1.2.7 Princípio da Dialeticidade e da Complementaridade

1.2 Recursos Cíveis

1.2.1 Apelação

1.2.2 Agravo

1.2.3 Embargos Infringentes

1.2.4 Embargos de Declaração

1.2.5 Recurso Ordinário

1.2.6 Recurso Extraordinário e Recurso Especial

1.2.7 Embargos de Divergência em REsp e em RE

1.2.8 Recurso Inominado

2 JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

2.1 Pressupostos de Admissibilidade

2.1.1 Pressupostos Intrínsecos

2.1.1.1 Cabimento

2.1.1.2 Legitimidade para recorrer

2.1.1.3 Interesse em recorrer

2.1.2 Pressupostos Extrínsecos

2.1.2.1 Tempestividade

2.1.2.2 Regularidade formal

2.1.2.3 Preparo

3 O NOVO SISTEMA DE FILTROS RECURSAIS E SUAS ESPECIFICIDADES

3.1 Filtros Recursais

3.1.1 Súmulas Vinculantes

3.1.2 Súmulas Impeditivas de Recursos

3.1.3 Repercussão Geral

3.1.4 Recursos Repetitivos

3.2 Filtros Recursais frente aos Princípios Processuais Constitucionais

3.3 Filtros Recursais: engessamento do Poder Judiciário ou efetiva celeridade processual, um projeto para o novo CPC

CONSIDERAÇÕES FINAIS

REFERÊNCIAS


APRESENTAÇÃO

O sistema recursal brasileiro sofre, há anos, críticas da sociedade e dos operadores do direito. Tais críticas passaram a existir ante os prazos extensos em que são decididos os processos sob a tutela do Poder Judiciário. A grande quantidade de recursos disponibilizados às partes corrobora ao prolongamento. Logo, diante do crescente descontentamento surgiram possíveis soluções com o fim de desonerar os Tribunais Superiores. Às soluções arriscou-se denominar “Sistemas de Filtros Recursais”. Dentre os filtros citem-se a Súmula Vinculante, as Súmulas Impeditivas de Recursos, a Repercussão Geral, e os Recursos Repetitivos.

Em contrapartida surgiram correntes abordando o provável engessamento do Poder Judiciário diante da aplicação desses filtros recursais. Abordam, ainda, a possível ofensa a princípios processuais constitucionais.

De outra banda, há o entendimento de que os filtros recursais concretizam a celeridade e a qualidade na prestação da tutela jurisdicional.

Ante ao exposto, é o intento do presente trabalho a investigação do Sistema de Filtros Recursais. Buscar-se-á breve análise dos resultados práticos por meio de estatísticas oficiais, sem, contudo, elaborar estudo de caso. Interessa aqui, a possível identificação da ocorrência de engessamento do Poder Judiciário ou, em contrapartida, a efetiva celeridade e, até mesmo, a qualidade na prestação jurisdicional.

A discussão sobre os resultados efetivos da aplicabilidade dos filtros recursais é extremamente importante, já que estes podem configurar real ofensa aos princípios processuais constitucionais, como aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do duplo grau de jurisdição. Por conseguinte, a abordagem sobre os efeitos dos filtros recursais tem extrema relevância social e científica. A relevância social se justifica na presumível ofensa aos direitos e garantias constitucionais de todo cidadão. No mesmo sentido a relevância científica, pois diante da ofensa se fará necessária ampla revisão aos Sistemas Recursais.

Assim, questiona-se: O Sistema de Filtros Recursais constitui engessamento do Poder Judiciário ou efetiva celeridade e qualidade na prestação jurisdicional? São hipóteses: a) o engessamento do Poder Judiciário; b) a ausência de engessamento com a efetiva celeridade e qualidade na prestação da tutela jurisdicional. Na hipótese de engessamento há que se questionar, sempre haverá ofensa aos princípios processuais constitucionais? Adianta-se que prevalecerá a ofensa aos princípios nos casos de engessamento.

Por outro lado, o simples fato de não ocorrer o engessamento, não quer dizer que inexistirá ofensa aos princípios processuais constitucionais, assim como a qualidade da prestação da tutela jurisdicional.

A qualidade poderá ser interpretada de duas formas. Primeiramente que o resultado seja favorável apenas ao Poder Judiciário, sem, contudo, incidir efetiva justiça ou qualidade na prestação jurisdicional. Neste caso o resultado será célere, mas “injusto”. A segunda dar-se com resultados favoráveis às partes, com efetiva celeridade, qualidade e resultado justo, o que se demonstra de análise arriscada, e que somente o tempo dirá. Cabe ressaltar, entretanto, que o presente trabalho não tem o escopo de avaliar casos concretos, mas apenas verificar a provável ocorrência de engessamento do Poder Judiciário. Assim, são os objetivos gerais ponderar o Sistema de Filtros Recursais, seus resultados, buscando relaciona-lo à celeridade, e à qualidade. Por outro lado, consistem os objetivos específicos em comparar os resultados atuais diante do novo sistema de freios recursais e os pretéritos.

Cumpre gizar que o primeiro capítulo abordará a teoria geral dos recursos cíveis, seus princípios e cabimentos.

O segundo avaliará os pressupostos de admissibilidade recursais, tanto os genéricos, como os específicos.

Cabe destacar o terceiro capítulo onde serão tratados os novos filtros recursais em suas peculiaridades. A título de exemplificação abordar-se-á as Súmulas Vinculantes, as Súmulas Impeditivas de Recursos, o novel instituto da Repercussão Geral e a proibição, ou obstáculo dos Recursos Repetitivos. Finalmente, avaliar-se-á o sistema de filtros recursais sob o enfoque do engessamento do Poder Judiciário ou, ao contrário, a ocorrência efetiva da celeridade na prestação da tutela jurisdicional, e mais, far-se-á perfunctória análise da influência desses no anteprojeto do novo CPC.


  1. TEORIA GERAL DOS RECURSOS CÍVEIS E RECURSOS EM ESPÉCIE

O termo recurso traz em seu bojo a idéia de instrumento utilizado no intuito de obter uma alteração em uma decisão. Elpídio Donizetti Nunes conceitua recurso como o “meio idôneo para provocar a impugnação e, consequentemente, o reexame de uma decisão judicial, com vistas a obter a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração do julgado”1.

Recurso, do mesmo modo, poderá ser conceituado como o “meio processual utilizado pela parte perdedora em primeira instância para pedir o reexame da causa ao próprio órgão que a decidiu ou à instância superior”2, ou ainda, “meio empregado pela parte litigante a fim de defender o seu direito; meio de provocar, na mesma instância ou na superior, a reforma ou a modificação de uma sentença desfavorável”3.

Cabe destacar as considerações de Sandro Marcelo Kozikoski sobre recursos cíveis.

Partindo-se da noção etimológica da palavra, é possível averiguar que “recurso” origina-se do verbo recusare que, em latim, traz a noção de correr para trás, apontando, por conseguinte, no sentido de um “novo curso”, ou seja, repetição de um movimento já praticado. É exatamente por isso que, na técnica jurídica, a idéia de recurso traz em si, implícita, a noção de reiteração de um pedido ou reclamação perante órgãos do Poder Judiciário, diante daquilo que já se decidiu anteriormente.4

O recurso apresenta-se, então, como o meio adequado cujo emprego visará à defesa de um direito. Em tese, há um direito não observado na decisão, cabendo ao suposto prejudicado interpor, respeitando-se o princípio da voluntariedade, o remédio processual adequado. Por conseguinte é notória a voluntariedade recursal, já que não há o instituto da obrigatoriedade em recorrer. Logo, ante a qualquer prejuízo cabe à parte o ônus recursal, mas não a obrigação de recorrer.

Ao observar os possíveis conceitos do termo “recurso” depara-se com o questionamento sobre sua natureza jurídica. Não há unanimidade doutrinária quanto ao tema, mas duas correntes. A primeira aborda recurso como ação autônoma, e, a segunda, como continuação do exercício de ação5. O importante é atentar-se para os ensinamentos da doutrina dominante6 que corrobora a ideia de continuação do procedimento judicial.

De outra banda, Araken de Assis alerta para a necessidade de se observar que nem todos os meios impugnativos são recursos. Existem “duas linhas mestras, ora constituindo ações que formam outro processo, ora recursos. [...] não integram a categoria ‘recurso’ os remédios porventura utilizáveis contra provimentos transitados em julgado. Exemplo de ação impugnativa dessa natureza é a rescisória (art. 485)”7. O que não se consideram recursos, denominam-se sucedâneos recursais.

De toda forma, para que se dê a melhor compreensão do que consiste cada meio recursal é necessário obter ciência sobre os princípios que interferem diretamente sobre os mesmos.

1.1 Princípios

Conceituar o termo princípio é matéria deveras abstrusa, pois, apesar de não se tratar de norma objetiva, deve ser entendido como preceito, ou mesmo, verdadeira norma jurídica detentora de dimensão ético-política de conduta. Em verdade, é o “conjunto de regras ou preceitos que se fixaram para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica”8.

Gomes Canotilho elenca algumas diferenças entre princípios e regras. Dentre elas o grau de abstração, que nos princípios demonstra-se elevado, enquanto as regras mantêm grau relativamente reduzido.

Grau de determinalidade: na aplicação do caso concreto: os princípios, por serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras (Do Legislador? Do juiz?), enquanto as regras são suscetíveis de aplicação direta;

Caráter de fundamentalidade no sistema das fontes de direito: os princípios são normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex.: princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (ex.: princípio do Estado de Direito);

‘Proximidade’ da idéia de direito: os princípios são ‘standards’ juridicamente vinculantes radicados nas exigências de ‘justiça’ (Dworkin) ou na ‘ideia de direito’ (Larenz); as regras podem ser normas vinculantes com um conteúdo meramente funcional;

Natureza normogenética: os princípios são fundamentos de regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ‘ratio’ de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.9

Dentre o conglomerado de princípios a serem observados no direito pátrio, o que se verifica é o embasamento de todas as disciplinas processuais nos princípios constitucionais. A Lei Maior funciona como “plataforma comum que permite a elaboração de uma teoria geral do processo”10. Assim, os princípios constitucionais interligam-se e impulsionam as normas.

Pode-se afirmar que, a partir da Carta de 1988, o constituinte brasileiro buscou assegurar aos brasileiros, independentemente do governante e, em qualquer tempo, o respeito e a dignidade que todos merecem. Por conseguinte, elevou-se ao estado de princípio fundamental do Estado Maior o princípio da dignidade da pessoa humana, que tem como principal escopo a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades11. Tal entendimento traz à discussão o porquê da necessidade de assegurar a todos, dentro da Norma Maior, os princípios processuais.

1.1.1 Princípios Processuais Constitucionais

O direito processual constitucional consiste em uma nova fonte do processo civil inserido diretamente na Constituição Federal. Implantaram-se na Carta Magna princípios processuais, ofertando ao processo status processualis. Conforme observado, esse status de norma constitucional garante proteção contra o legislador, já que há, então, restrição a mudanças. Do mesmo modo, abonam proteção pelo controle de constitucionalidade e projeção às demais áreas jurídicas12.

São os princípios processuais constitucionais: duplo grau de jurisdição, devido processo legal, inafastabilidade do judiciário, isonomia processual, contraditório e ampla defesa, juiz (promotor) natural, publicidade dos atos, motivação das decisões, inadmissão da prova ilícita. Tais princípios serão abordados concisamente, aprofundando-se, apenas, àqueles diretamente atrelados ao sistema de filtros recursais.

1.1.1.1 Princípio do Duplo Grau de Jurisdição

O princípio do duplo grau de jurisdição possibilita a revisão das causas julgadas em primeira instância por órgãos de instância superior. Atrela-se à possibilidade de interposição recursal.

Interessante notar que este princípio encontra disposição legal entre os princípios processuais constitucionais e, entre os princípios recursais fundamentais. Todavia, há divergência doutrinária13 quanto à fixação deste princípio entre os princípios processuais inseridos na Constituição Federal. Alguns entendem pela inexistência de previsão expressa na Carta Maior. Entretanto, há aqueles14 que o consideram inserido na Constituição, mais claramente no artigo 5º, inciso LV15, e artigos 102 e 105.

[...] quando a Constituição Federal estabelece que os tribunais do País terão competência para julgar causas originariamente e em grau de recurso (v. arts. 102 e 105), ela indiretamente consagra o princípio do duplo grau de jurisdição, que é um dos princípios vetores do sistema recursal.16

Trata-se de nova oportunidade de reexame da decisão judicial oferecida ao vencido. A principal justificativa é a de que os tribunais de segundo grau, por se formarem, em tese, por juízes mais experientes e órgãos colegiados, oferecem maior segurança. Logo, o simples fato de haver a possibilidade de reexame causa, no juízo de primeiro grau, certa “interferência” psicológica no sentido de apresentar maiores cuidados em seu julgamento. 17 Araken de Assis adverte que o reexame visa corrigir o “vício de juízo (error in iudicando) ou o vício de atividade (error in procedendo), lançando novas luzes sobre a matéria contenda”18.

Importante esclarecer que o princípio do duplo grau tem base política e está, portanto, previsto na Carta Política. Entretanto, cabe informar a divergência doutrinária no concerne ao imperativo. Nelson Nery Junior19 afirma que o referido princípio é apenas uma previsão, já Djanira Maria Radamés de Sá20 o entende como um direito fundamental. Para Araken de Assis21 o duplo grau estará subordinado à iniciativa da parte, sendo, por conseguinte, mera possibilidade. Segundo Araken existem situações especificas ao aproveitamento do duplo grau.

(a) proferida sentença terminativa (art.267), o órgão ad quem julga diretamente o mérito; (b) examinada uma das questões do mérito (v.g., a prescrição), o órgão ad quem, rejeitando a conclusão do órgão a quo, debruça-se sobre o pedido (art. 515, § 1º); (c) formulado pelo autor cúmulo eventual de pedidos (art. 289), o órgão judiciário de primeiro grau acolhe o primeiro e julga prejudicado o segundo, mas o órgão ad quem rejeita o primeiro e acolhe o segundo, ou vice-versa [...]; (d) o órgão a quo omite o julgamento de um dos pedidos formulados em cumulação sucessiva e o órgão ad quem corrige o vício, julgando o pedido preterido [...].22

Alexandre de Moraes23 assevera que não há a obrigatoriedade de duplo grau de jurisdição. Emerge da Carta Maior a garantia do duplo grau, no entanto, essa garantia não é absoluta. Existem, por exemplo, as ações de competência originária dos tribunais.

Ante o exposto, o princípio do duplo grau encontra-se atrelado ao sistema recursal.

1.1.1.2 Princípio do Devido Processo Legal

O princípio do devido processo legal encontra disposição legal no artigo 5º, inciso LIV, da Carta Magna. Apresenta-se como uma garantia de todos os cidadãos, localizando-se na Constituição, fomentando o Estado Democrático de Direito.

Constitui um dos princípios mais amplos do ordenamento jurídico, já que dele derivam outros (v.g., juiz natural, isonomia, contraditório...). Deriva do duo process of law24 e configura dupla proteção ao cidadão. Opera no âmbito material (v.g., liberdade), e formal (v.g., defesa técnica, publicidade...) 25.

A Constituição Federal de 1988 foi a primeira Constituição brasileira a tratar expressamente do devido processo legal, o que se justifica pela “ansiedade do povo, que saía de um regime ditatorial, por direitos a serem opostos contra o próprio Estado”26. No entanto, a doutrina afirma que já se encontrava implícito nas Constituições anteriores27.

Apresenta-se como verdadeira garantia, ou melhor, garantias. Assegura a todos a garantia de participar de todas as etapas de um processo, legalmente previstas.

Alexandre Mariotti28 informa ser o princípio do devido processo legal um sobreprincípio que se sobrepõe a outros, assim denominados subprincípios. São subprincípios daquele o contraditório e a ampla defesa. Por conseguinte, a melhor interpretação daquele estará dependente da relação com estes.

1.1.1.3 Princípio da Inafastabilidade do Judiciário

Outro princípio processual constitucional é o princípio da inafastabilidade do judiciário, também denominado princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, incluído na CRFB no inciso XXXV do art. 5º29.

Constitui verdadeira garantia ao acesso à justiça, subdividida em garantias da ação e da defesa. Notório destacar, ante o princípio da inafastabilidade, não poderá a jurisdição retirar do cidadão o seu direito de ver tutelado pelo Poder Público qualquer contenda. Assim, ao ser chamado para intervir, “o Poder Judiciário, no exercício da jurisdição, deverá aplicar o direito ao caso concreto”30.

Não é demasiado lembrar a inexistência da chamada jurisdição condicionada, também reconhecida como instância administrativa de curso forçado. Logo, inexiste a necessidade de buscar a via administrativa, para somente depois procurar a solução através do Poder Judiciário. O próprio CPC, em seu art. 126, impõe o domínio ao Poder Judiciário, quando afirma que o “juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei”31.

No que concerne à inafastabilidade de jurisdição interpretada em conjunto com o duplo grau, Araken de Assis apresenta solução ao problema quando afirma que o “princípio do duplo grau pressupõe uma resolução já tomada, relativamente ao mérito de uma demanda, operando no mesmo processo”32. O duplo grau, como sobredito, é um convite ao reexame.

Contrários ao entendimento acima exposto, Barbosa Moreira, Ada Grinover, Oreste Laspro e Silvânio Covas33, para os quais o duplo grau de jurisdição “é fenômeno jurídico que, além de assegurar a decisão de reexame, também garante a decisão de exame de primeira instância”. Tal argumento se deve à possibilidade de o tribunal ad quem tomar diretamente a decisão de mérito (art. 515, § 3º, do CPC)34, o que, para àqueles, fere o duplo grau de jurisdição.

Entre essas e outras discussões sobre o princípio do duplo grau, como se consiste ou não um direito absoluto, o STF já pacificou entendimento. Assim, em que pesem os argumentos abordados pelos doutrinadores, dispõe o STF de forma diversa, para o qual os princípios fundamentais não são direitos absolutos.

1. As alegações de desrespeito aos postulados da ampla defesa e do devido processo legal consubstanciam ofensa reflexa à Constituição do Brasil, circunstância que não viabiliza o acesso à instância extraordinária. Precedentes. 2. Inexistem garantias e direitos absolutos. [...] 35 (Grifo nosso).

Nesse sentido, os ensinamento de Luiz Marinone numa análise à garantia recursal (REsp) contra causas decididas em última instância nos tribunais Estaduais ou Federais.

[...] a Constituição, ao afirmar o direito ao recurso especial contra causas decididas em última instância pelos referidos tribunais, não garante o direito ao recurso contra toda e qualquer decisão, mas apenas o direito ao recurso – desde que preenchidos, evidentemente, os seus pressupostos – contra as causas decididas em única e última instância pelos mencionados tribunais. 36 (Grifamos).

Por todo exposto, evidenciada a ausência do caráter absoluto no que concerne à aplicação dos princípios, e, portanto, ao duplo grau de jurisdição.

1.1.1.4 Princípio da Isonomia Processual

O princípio da isonomia processual estabelece no caput do art. 5º, e seu inciso I da CRFB a igualdade de todos perante a lei. Impõe-se tratar os iguais de forma igual, e os desiguais de forma desigual, a fim de atingir a igualdade proposta pelo Diploma Legal. Assim, cabe ressaltar a tríplice finalidade do princípio da igualdade: a limitação ao legislador, ao interprete, ou autoridade pública e ao particular37.

Em termos processuais as partes e seus procuradores devem merecer tratamento igualitário, no sentido de garantir e, portanto, fazer valer iguais oportunidades em juízo38. Há uma ordem legal visando à igualdade entre as partes litigantes diante da necessidade de efetuar concessões ou limitações a uma das partes, no sentido de aumentar, ou mesmo, reduzir o poder postulatório39. Dessa forma, o próprio Poder Judiciário, na pessoa do magistrado, poderá conceder diversidades no trato processual no sentido de reestruturar o processo.

1.1.1.5 Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa

A Carta Magna previu os princípios do contraditório e da ampla defesa no inciso LV do art. 5º. Apesar da disposição comum no referido inciso, os dois princípios não se confundem. Alexandre de Moraes esclarece a diferença entre os institutos.

Por ampla defesa, entende-se o asseguramento que é dado ao réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de omitir-se ou calar-se, se entender necessário, enquanto o contraditório é a própria exteriorização da ampla defesa, impondo a condução dialética do processo (par conditio), pois a todo ato produzido pela acusação, caberá igual direito da defesa de opor-se-lhe ou de dar-lhe a versão que melhor lhe apresente, ou, ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor. 40

Como anteriormente disposto, os princípios do contraditório e da ampla defesa são considerados subprincípios do devido processo legal.

A ampla defesa se perfaz na possibilidade real de as partes, ou interessados na administração da justiça, em deter o direito de se defender, seja apresentando alegações, propondo e produzindo provas, por exemplo. Já o contraditório é a efetivação do direito de se defender. Logo, uma decisão judicial deve pressupor a intervenção anterior das partes.

De modo geral, poder-se-ia justificar a ampla defesa e o contraditório como sendo aquele o mundo das ideias, e este o mundo dos fatos. É claro que não se deve sentir a ampla defesa como algo inexistente, mas como um direito que se realiza apenas através do contraditório. Converge desse entendimento Vicente Greco Filho41, que aponta o contraditório como instrumento técnico para a efetivação da ampla defesa.

Impõe ressaltar, finalmente, que os dois princípios são primordiais ao primado da justiça.

1.1.1.6 Princípio do Juiz Natural

O Princípio do juiz natural encontra disposição legal nos incisos XXXVII e LIII do art. 5º da CRFB42.

O juiz natural é o “magistrado agregado ao Poder Judiciário, revestido das garantias e de competência anteriores aos casos que vier a decidir”43. Leonardo Greco define juiz natural como o legalmente competente, “aquele que a lei confere in abstrato o poder de julgar determinada causa”44. É evidente, como afirma Greco, que a competência para o julgamento dar-se-á previamente, e não de forma discricionária àquela causa.

A doutrina45 apresenta duplo significado ao princípio do juiz natural. Primeiramente como o juiz (melhor seria o juízo) investido de jurisdição e, em segundo como barreira à criação de tribunais ad hoc ou de exceção.

1.1.1.7 Princípio da Publicidade

O princípio da publicidade dos atos consiste verdadeira garantia do processo democrático. Encontra disposição legal no art. 5º, inciso LX, e art. 93, inciso IX, ambos da CRFB.

Art. 5º.

[...]

LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem.

Art. 93.

[...]

IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

Após a Revolução Francesa, ocorrida por volta de 1789, surgiu a preocupação de fornecer à sociedade informações relacionadas aos processos, reagindo-se, portanto, a qualquer caráter secreto e inquisitivo. Logo, foi demonstrada a importância das informações sobre as decisões tomadas em juízo. O povo tornou-se o juiz dos juízes. A publicidade é a regra. Todavia, existe exceção. Ocorre que o princípio da publicidade, assim como o juiz natural, também apresenta subdivisão. Inicialmente confere ao princípio a publicidade genérica, comum a todos, ou seja, autoriza a presença do público nas audiências e o exame dos autos por qualquer pessoa46. Por outro lado, a publicidade especial adquire contorno de exceção47. Cabe destacar, contudo, conforme o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)48, mesmo nos casos em que se decrete o segredo de justiça, não poderá haver restrição ao acesso aos autos do processo aos advogados das partes. Aliás, tal restrição configura verdadeira ofensa aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal.

O direito à publicidade dos atos processuais, apesar de apresentar restrições, reveste-se de garantia política. A finalidade dessa garantia é o controle da opinião pública nos serviços da justiça49.

1.1.1.8 Princípio da Motivação

O art. 93, IX, da CRFB, traz em seu bojo o princípio da motivação das decisões. A segunda parte do inciso impõe a obrigatoriedade de fundamentação de todas as decisões advindas dos julgamentos do Poder judiciário, sob pena de nulidade.

Importante gizar que, apesar dispositivo supramencionado, a imposição legal também se dá às decisões administrativas.

ADMINISTRATIVO. SUNAB. AUTO DE INFRAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO. - AS DECISOES ADMINISTRATIVAS, NOTADAMENTE AS DE CUNHO PUNITIVO, DEVEM CONTER EM SUA MOTIVAÇÃO A EXPOSIÇÃO DAS RAZOES QUE LEVARAM A ADOÇÃO DA MEDIDA. 50 (Grifamos).

Destarte, todas as decisões, sejam judiciais ou administrativas, devem ser fundamentadas. A fundamentação corrobora ao controle de legalidade das decisões, proporcionando às partes maiores informações para a propositura de impugnação ou a busca por sua revogação.

No tocante ao grau da motivação, este não deve ser apenas sobre a base legal, ou seja, o dispositivo. Deve envolver os fatos e a base jurídica, demonstrando os motivos legais da decisão.

1.1.1.9 Princípio da Inadmissão da Prova Ilícita

O último princípio processual constitucional é o princípio da inadmissão da prova ilícita. Este princípio encontra-se inserido na CRFB, no inciso LVI51 do art. 5º. É considerada ilícita a prova obtida em desacordo com o direito material vigente.

Alexandre de Moraes alerta para a confusão entre a prova ilícita e as provas ilegais e ilegítimas.

As provas ilícitas não se confundem com as provas ilegais e as ilegítimas. Enquanto [...] as provas ilícitas são aquelas obtidas com infringência ao direito material, as provas ilegítimas são obtidas com desrespeito ao direito processual. Por sua vez, as provas ilegais seriam o gênero do qual as espécies são as provas ilícitas e as ilegítimas, pois, configuram-se pela obtenção com violação de natureza material ou processual ao ordenamento jurídico.52 (Grifo nosso).

Já Marinoni e Arenhart divergem desse entendimento. Para os autores a prova ilícita viola tanto o direito material, quanto o direito processual. 53

Veja, por exemplo, que a mera gravação clandestina não configura prova ilícita. Eis os ensinamentos do Ministro Cezar Peluso no julgamento do RE 402.717/PR, e da Ministra Ellen Gracie na ementa do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 578.858-9/RS, respectivamente.

[...] Como gravação meramente clandestina, que se não confunde com interceptação telefônica, objeto de vedação constitucional, é lícita a prova consistente no teor de gravação de conversa telefônica realizada por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, se não há causa legal específica de sigilo nem de reserva da conversação, sobretudo quando se predestine a fazer prova, em juízo ou inquérito, a favor de quem a gravou. 54

CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. GRAVAÇÃO. CONVERSA TELEFÔNICA FEITA POR UM DOS INTERLOCUTORES, SEM CONHECIMENTO DO OUTRO. INEXISTÊNCIA DE CAUSA LEGAL DE SIGILO OU DE RESERVA DE CONVERSAÇÃO. LICITUDE DA PROVA. ART. 5º, XII e LVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A gravação de conversa telefônica feita por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, quando ausente causa legal de sigilo ou de reserva da conversação não é considerada prova ilícita. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido. 55

Diante de todo exposto, na busca pelo processo justo ante ao Estado Democrático de Direito imprescindível a observação dos princípios processuais inseridos na Carta Magna.

1.1.2 Princípios Recursais Fundamentais

Tão importantes quanto os princípios constitucionais, são os princípios inerentes aos recursos. Existem princípios recursais fundamentais que permeiam a regular aplicação dos recursos cíveis, dentre esses o princípio do duplo grau de jurisdição, que também se encontra regulamentado no âmbito do processo civil. Ressalte-se que o princípio do duplo grau, demasiadamente importante aos sistemas recursais, já foi devidamente explanado. De outra banda, o princípio da taxatividade também demanda notável relevância ao sistema recursal.

1.1.2.1 Princípio da Taxatividade

Conforme dispõe o art. 22, inciso I, da CRFB, a competência para legislar sobre processo civil é privativa da União.

A razão de sua existência é o simples fato da necessidade de que os litígios sejam extintos. Se assim não fosse, os mesmos se prolongariam indefinidamente. Araken de Assis o conceitua como o “princípio segundo o qual a existência dos recursos se subordina a expressa previsão legal, ainda que não seja a do estatuto de processo”56. Consequentemente, apenas os recursos previstos em lei federal poderão ser interpostos. A enumeração legal é taxativa, ou seja, o rol é numerus clausus. Aliás, Nelson Luiz Pinto alerta, “a taxatividade é do sistema legal federal, e não do Código de Processo Civil”57. Por conseguinte, impõe considerar não apenas os recursos presentes no art. 496, do CPC, ou mesmo os demais recursos presentes no referido código, mas todos aqueles recursos existentes em lei federal, como, v.g., o recurso inominado58.

1.1.2.2 Princípio da Unirrecorribilidade

Outro princípio recursal é o princípio da unirrecorribilidade, também denominado princípio da singularidade. Encontra-se expressamente disciplinado no art. 809, do CPC de 1939, o que não se repetiu no código atual. Cumpre ressaltar, entretanto, que a unirrecorribilidade está implicitamente disciplinado nos artigos 496, 162, 504, 513 e 522, todos do CPC59. Diante dos dispositivos comentados, verifica-se que para cada ato judicial recorrível haverá um recurso específico. Perante a singularidade recursal “inadmissível o uso concomitante ou cumulativo de dois ou mais recursos”60.

Evidentemente que há exceções à singularidade recursal, como se observa da possibilidade de se interpor conjuntamente os recursos especial e extraordinário, na ofensa a questões federais e constitucionais. Todavia, a regra é a singularidade.

Noutro entendimento Theotonio Negrão61, para quem é admissível a interposição de dois recursos contra a mesma decisão. Data venia, entendimento destoante aos princípios da economia e celeridade processual, e, ainda, à segurança jurídica.

Outro argumento favorável à interposição conjunta de dois recursos poderia ser o da interpretação da decisão em capítulos. Apesar de a decisão manifestar-se em capítulos, ou dispositivos, a mesma deve ser entendida e interpretada como um todo unitário. Não há a figura dos capítulos autônomos. Portanto, inexiste a possibilidade, motivo pelo qual a regra é a unirrecorribilidade, e as exceções, quando existirem, serão expressamente legais.

1.1.2.3 Princípio da Fungibilidade

O princípio da fungibilidade, assim como o da singularidade, não foi adotado expressamente pelo atual diploma processual. Porém, apesar da ausência expressa, é admitido nos casos em que houver dúvida objetiva quanto ao recurso cabível.

O Supremo Tribunal Federal e a doutrina já pacificaram. “O princípio da fungibilidade dos recursos, ainda que não constante do Código de Processo Civil, é ínsito à natureza instrumental das leis processuais; entretanto, somente pode ser aplicado em casos de fundada dúvida”62.

Araken de Assis traz a colação os requisitos à aplicação da fungibilidade recursal. Segundo o autor, a 1ª Turma do STJ as listou no julgamento do Recurso em Mandado de Segurança 888-DF.

A adoção do princípio da fungibilidade exige sejam presentes: a) dúvida objetiva sobre qual o recurso a ser interposto; b) inexistência de erro grosseiro, que se dá quando se interpõe recurso errado quando o correto encontra-se expressamente indicado na lei e sobre o qual não se opõe nenhuma dúvida; c) que o recurso erroneamente interposto tenha sido agitado no prazo do que se pretende transformá-lo.63

Dizer que a dúvida deverá ser objetiva, quer dizer que deve constar de discussões doutrinárias e/ou jurisprudenciais, desde que atuais. Já o erro grosseiro diz respeito à inobservação de recurso expressamente previsto em norma jurídica.

Quanto à tempestividade, apesar de a doutrina e a jurisprudência tender para a imprescindibilidade do respeito ao prazo do recurso próprio, na interposição do impróprio, há corrente pela irrelevância do prazo do recurso próprio. Nada obstante, Orione Neto64 aborda o tema indicando que é a orientação da doutrina dominante, para a qual o prazo é irrelevante para a incidência da fungibilidade recursal. Assiste razão Orione Neto, diante da dúvida objetiva e da crença, mesmo que errônea, e da prioridade do recurso ao caso concreto, o prazo é o que menos releva. Em sentido contrário vários julgados do STJ65.

1.1.2.4 Princípio da Voluntariedade

O princípio da voluntariedade, como dispõe o próprio termo, interliga-se à própria vontade, elemento volitivo, e aos motivos da insatisfação. O ato de recorrer deve ser algo realizável pela parte ante a sua vontade. Não pode ocorrer pela mera vontade do juiz, ou de ofício.

Conforme Orione Neto66 um exemplo da manifestação da voluntariedade é o “não-conhecimento do recurso quando houver fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, tal como renúncia ou desistência do recurso [...]”.

1.1.2.5 Princípio da Irrecorribilidade em Separado das Interlocutórias

Ao abordar o princípio da irrecorribilidade em separado das interlocutórias interessa notar o real significado do termo “em separado”. Conforme Nelson Nery Júnior67, significa impugnação com suspensão do processo. Logo, diferentemente do que se poderia entender, ao recorrer da decisão interlocutória não haverá a suspensão do processo, mas apenas a rediscussão daquela decisão, sem, contudo, obstar o prosseguimento do processo.

Por conseguinte, no que concerne ao princípio da irrecorribilidade é que diferentemente do que ocorre com a maioria dos recursos, nos recursos de agravo interpostos em desfavor das decisões interlocutórias, não há, em regra, o efeito suspensivo ao processo. No muito, o que se verifica, naqueles casos em que a decisão possa causar lesão grave e de difícil reparação à parte, é o efeito suspensivo apenas quanto à decisão interlocutória, ou seja, o processo continuará com a sua marcha normal.

1.1.2.6 Princípio da Vedação Legal da “reformatio in pejus

Para Cândido Rangel Dinamarco68 a reformatio in pejus consiste no agravamento da situação daquele que recorreu, sem ter a parte adversa recorrido também. O que se busca é evitar a piora da situação do recorrente no julgamento de seu próprio recurso. O princípio não esta consagrado expressamente no ordenamento pátrio. Alerta-se, entretanto, para a exceção ao princípio, quando o objeto do recurso tratar de matéria de ordem pública.

1.1.2.7 Princípios da Dialeticidade e da Complementaridade

Existem outros dois princípios que não são mencionados por alguns doutrinadores, os quais serão feitos breve menção.

O princípio da dialeticidade está diretamente ligado à necessidade de o recurso ser interposto conjuntamente as suas razões. Dirige-se à fundamentação, seja quanto aos fatos, ou ao direito ofendido. O que se busca proporcionar às partes é a garantia do efeito devolutivo ao recorrente, e ao recorrido o direito de resposta.

O outro é o princípio da complementaridade que “consiste na possibilidade de o recorrente complementar suas razões recursais, caso a decisão recorrida seja modificada ou completada, em decorrência do julgamento de embargos declaratórios”69.

1.2 Recursos Cíveis

O sistema recursal pátrio elenca várias espécies recursais, seja abordando o juízo a que se interporá, ou o resultado pretendido. Há recursos interpostos e decididos no próprio órgão prolator da decisão, como os embargos de declaração, e outros que têm o julgamento endereçado a outro órgão, que não aquele que prolatou a decisão.

Existe, ainda, um terceiro tipo que detêm as duas espécies anteriores. São os recursos mistos. Eles possibilitam ao órgão prolator o chamado juízo de retratação, assim como possibilita tal modificação ao órgão superior, como o recurso de agravo.

Quanto ao resultado, cabe informar que o recurso poderá visar à reforma, à invalidação, ou mesmo ao esclarecimento sobre a decisão impugnada. O diferencial consistirá no grau de inserção pretendida pelo prejudicado na decisão.

O CPC aborda os recursos cíveis em seu artigo 496.

Art. 496. São cabíveis os seguintes recursos:

I - apelação;

II - agravo;

III - embargos infringentes;

IV - embargos de declaração;

V - recurso ordinário;

Vl - recurso especial;

Vll - recurso extraordinário;

VIII - embargos de divergência em recurso especial e em recurso extraordinário.

Todavia, o rol do citado artigo não é taxativo, já que apesar das inúmeras tentativas de aperfeiçoá-lo, apresenta-se incompleto70.

No que tange a adequação recursal ao caso concreto, dependerá não apenas da unicidade recursal, mas também da natureza da matéria a ser apreciada. Diante disso, há uma divisão natural entre os recursos, podendo ser comum ou especial. Elpídio Donizetti ensina que será comum aquele que exige a sucumbência, além dos demais pressupostos gerais de admissibilidade. Já o especial (latu sensu) será aquele que visa à proteção de um direito objetivo, a uniformidade da aplicação desse direito, e não o direito subjetivo da parte.

O recurso especial tem em mira, pelo menos num plano imediato, não o direito subjetivo da parte, mas sim a proteção do direito objetivo, a uniformidade da aplicação desse direito. Como modalidades de recurso especial, temos o recurso especial propriamente dito, que se destina à uniformização do direito infraconstitucional, e o recurso extraordinário, cujo objetivo é a uniformização do direito constitucional. 71

Questiona-se, diante do novo sistema de filtros recursais alguns recursos, considerados comuns, assumiram aspectos de recurso especial. A apelação, cujo requisito adicional de conhecimento é a ausência de conformidade às súmulas dos Tribunais Superiores, adotou cerne especial. Ao Recurso Especial, considerado extraordinário, o que se exige, além da sucumbência, é um plus, o algo a mais imposto pela norma processual.

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Willemam72 aborda de forma criativa a passagem histórica do sistema recursal adotado no Brasil. Informa que o Código de Processo Civil de 1973, apesar de não se manter fiel ao anteprojeto de Alfredo Buzaid, adotou amplamente o princípio do duplo grau de jurisdição. Desta forma, abriu um leque de possibilidades à recorribilidade nas decisões de primeiro grau, e, ainda, da proibição da reformatio in pejus.

O Código de Processo Civil brasileiro proporciona em seu bojo alguns meios recursais. Luiz Orione Neto em sua obra “Recursos cíveis”73 elenca pelo menos dezesseis tipos recursais dispostos tanto no CPC e em outras leis. Como já observado, o artigo 496, do CPC apresenta nove recursos. No entanto, o CPC oferece outros recursos, v.g., cinco diferentes tipos de agravo, que não se aproximam do agravo retido, ou do agravo de instrumento. Outros diplomas legais proporcionam mais três recursos distintos, os embargos infringentes, o recurso inominado, e o agravo inominado.

Luiz Guilherme Marinoni afirma que “um recurso só é cabível quando a lei processual indicar-lhe – diante de determinada finalidade específica e certo ato judicial – como o adequado para extravasar a insurgência”74.

De modo geral, serão abordados os recursos cíveis perfunctoriamente, buscando aprofundar o estudo apenas daqueles recursos diretamente ligados aos novos sistemas de filtros recursais, objeto do presente trabalho.

1.2.1 Apelação

A apelação cível é o recurso interposto contra sentença de primeiro grau, sendo o primeiro recurso tratado no artigo 513, do CPC. Elpídio Donizetti Nunes conceitua apelação como “o recurso comum cabível contra sentença, com vistas a obter, através do reexame pelo órgão de segundo grau, sua reforma ou invalidação”75.

A apelação, conforme dispõe o diploma processual no artigo 515 e seus parágrafos, é o recurso com função de devolver toda a matéria da demanda para ser revista pelo tribunal. É recurso ordinário por excelência. É recurso padrão, cabível contra sentença definitiva ou terminativa76.

O termo apelação deriva do latim appellatio77. Orione Neto afirma que o princípio do duplo grau de jurisdição efetiva-se na apelação.

O princípio do duplo grau de jurisdição encontra a marca decisiva de atuação através do recurso de apelação, pois é por meio deste que se exercita uma atividade cognitiva ampla. Toda matéria impugnada, quer seja de fato, quer de direito, ou mesmo de fato e de direito, recebe no apelamento a possibilidade de ser revista, sem qualquer restrição. 78

Orione Neto conceitua apelação.

[...] é o meio processual que a lei coloca à disposição das partes, do Ministério Público e de um terceiro, a viabilizar; dentro da mesma relação jurídica processual, a anulação ou a reforma da sentença que extingue o procedimento de primeiro grau, que tenha ou não resolvido o mérito da causa [...]. 79

É recurso cabível apenas contra sentença, não o sendo, portanto, contra acórdão. Deve ser interposta no prazo de quinze dias em petição escrita80, acompanhada das razões, dirigida ao juiz prolator da sentença. Aliás, a doutrina é no sentido do não conhecimento da apelação sem as razões do inconformismo81.

A regra quanto aos efeitos do recurso é o recebimento em duplo efeito, suspensivo e devolutivo. A exceção é apenas o recebimento com efeito devolutivo, cujo rol é taxativo82, quando não caberá o efeito suspensivo, ou ainda poderá ser estendido àqueles casos em que a sentença possa causar lesão grave e de difícil reparação à parte.

Por outro lado, há que se informar que a apelação somente será recebida quando presentes os requisitos de admissibilidade recursais, ou juízo de admissibilidade, que, no caso, será analisado, inicialmente, pelo juízo “a quo”.

Em regra, a matéria impugnada fica adstrita àquelas já suscitadas, proibindo-se, assim, a ius novarum. Sublinhe-se, porém, a exceção conforme dispõe o art. 517, do CPC83.

No tocante ao sistema de filtros recursais, a apelação, além do imperativo dos requisitos de admissibilidade recursais comuns aos demais recursos cíveis, também apresenta um novo requisito, o que impede o recebimento da apelação quando a decisão impugnada estiver em conformidade com Súmula do STF ou STJ.

1.2.2 Agravo

Elpídio Donizetti Nunes conceitua agravo como o “recurso cabível contra as decisões interlocutórias proferidas no curso do processo”84.

A origem histórica advém do Direito Português, que por volta de 1325 a 1357, sob o reinado de D. Afonso IV proibiu-se “a apelação em separado contra as resoluções interlocutórias, salvo quando dotadas de caráter terminativo do feito ou quando provocassem mal irreparável”85. A restrição quanto à interposição do recurso de apelação causou vários dissabores às partes, que buscaram reparação através das querimas. Com as “cartas de justiça” dirigidas ao magistrado de grau superior ou ao soberano, buscavam a resolução de seus conflitos86. Afirme-se, assim, o surgimento do recurso de agravo, que é o recurso cabível contra decisões interlocutórias. Está disciplinado, inicialmente, no art. 496. É o gênero, e as espécies, o agravo retido nos autos, o agravo de instrumento e o agravo interno.

O agravo retido encontra disposição legal nos arts. 522 e 523 do CPC. É interposto e fica retido diretamente nos autos, sendo julgado preliminarmente no recurso de apelação. Independe de preparo, cabendo, ainda, juízo de retratação. O juízo de admissibilidade ocorre no órgão ad quem. A doutrina é pacífica quanto à necessidade de o agravante, na interposição de recurso de apelação, reiterar o inconformismo com a decisão interlocutória.

Orione Neto87 elenca as hipóteses de cabimento contra decisões interlocutórias: a) proferidas em audiência de instrução e julgamento; b) posteriores à sentença; c) que não causam dano de difícil e de incerta reparação; d) que cominam a multa do artigo 14 do CPC, se o responsável for parte.

O §3º do art. 52388 do CPC traz a forma do agravo retido oral.

Outro agravo específico é o de instrumento. Há nessa modalidade uma nova subdivisão, o agravo de instrumento (art. 522), cabível contra decisão proferida por magistrado de 1º grau que causa dano irreparável e/ou de difícil reparação. É interposto diretamente no órgão ad quem, por instrumento e em petição escrita89. Por outro lado, há o agravo de instrumento do art. 544, cabível contra decisão monocrática proferida por Vice-Presidente ou Presidente do Tribunal inadmitindo o RE ou REsp. É interposto no órgão a quo, diretamente para o próprio prolator da decisão, presidente ou vice-presidente do tribunal de origem. É isento de preparo, porte de remessa e retorno. Essa modalidade de agravo, após alteração processual, deve obedecer ao disposto nas Súmulas n. 288, do STF, e n. 223, do STJ. Doravante, no sentido de atestar a tempestividade do RE e do REsp, necessária juntada da certidão de intimação do acórdão e a petição do recurso recorrido.

Impõe ressaltar que, o agravo de instrumento90 apresenta prazo para interposição de 10 dias.

Orione Neto afirma que a regra é o agravo retido, e a exceção o de instrumento.

Derradeiramente há o agravo interno91. É interposto em desfavor da decisão singular proferida por relator, no âmbito dos tribunais. É imperativa a aplicação apenas nas decisões singulares do relator de tribunal de 2º grau ou superior. Interpõe-se nos próprios autos, por petição escrita acompanhada das razões do recurso e pedidos, sob pena de ser julgado inadmissível.

Quanto ao preparo do agravo do recurso de agravo, cabe atentar que, com exceção do agravo de instrumento do art. 522, todas as outras espécies são isentas.

No que concerne ao prazo para interposição, apenas o agravo interno apresenta o prazo de cinco dias, já que os demais apresentam prazo de dez dias. Observa-se, contudo, os casos especiais de prazo em dobro92.

1.2.3 Embargos Infringentes

O recurso de embargos infringentes encontra-se disposto nos art. 490, e arts. 530 a 534, do CPC. Diante das reformas no CPC, os embargos infringentes tornaram-se cabíveis apenas contra determinados acórdãos. Cabem contra acórdão não unânime que tenha reformado sentença de mérito julgada em apelação, ou, ainda, contra acórdão que houver julgado procedente ação rescisória.

Busca-se com os embargos infringentes o prevalecimento do voto vencido no julgado colegiado.

Impõe ressaltar que os embargos aqui dispostos divergem daqueles elencados no art. 34, caput, da Lei n. 6.830/80, cabíveis, especificamente, contra sentenças proferidas em execuções fiscais.

Um dos requisitos dos embargos infringentes é a existência de dois juízos de mérito, ou seja, mérito da ação e mérito do recurso.

Note-se que nem todo acórdão não unânime renderá embargos infringentes93. Não cabem mais quando a divergência for somente quanto à matéria preliminar; contra acórdão de apelação interposta contra sentença terminativa; quando houver dupla conformidade (acórdão/sentença); ou nos casos de decisão monocrática do relator, por absoluta ausência do requisito “voto vencido”.

No que diz respeito à possibilidade de interposição de embargos infringentes contra outros acórdãos, o STJ entende ser cabível recurso ordinário e embargos de declaração.

Art. 260. Cabem embargos infringentes, no prazo de quinze dias quando não for unânime o julgado proferido em apelação e em ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência. 94

Naturalmente a apelação ali disposta deve ser entendida apelação lato sensu, verdadeiro recurso ordinário95 do art. 539 e 540, do CPC. Já Araken de Assis96 tem outra opinião. Afirma que incabíveis embargos infringentes ao julgamento proferido em recurso ordinário por maioria de votos.

Quanto aos embargos de declaração, constituem natural desdobramento do resultado da apelação97. Por conseguinte, existente omissão, divergência ou contradição no acórdão, deverá a parte prejudicada interpor o recurso de embargos de declaração, e, assim, diante da nova decisão, interpor embargos infringentes.

Importante lição traz a doutrina98 no que concerne à extensão do desacordo, solucionado pelo voto médio. Caso o desacordo seja quantitativo, p.ex., nos votos quanto ao valor condenatório, caberão embargos para ambas as partes. No entanto, se a divergência for qualitativa, inexistirá solução pelo voto médio. Nesse caso, o art. 456, do RITJSP traz a solução, devendo ser cindido o julgamento, e submetendo-a a nova apreciação.

Os embargos infringentes apresentam o prazo para interposição de quinze dias, que deverá ocorrer por petição e razões escritas, assinadas por advogado constituído nos autos.

A verificação da admissibilidade somente ocorrerá após a apresentação da impugnação pela parte adversa. O processamento será nos próprios autos, sendo julgado por colegiado.

Por fim, da decisão de indeferimento liminar caberá agravo interno. Já o deferimento é irrecorrível.

1.2.4 Embargos de Declaração

O recurso de Embargos de Declaração consiste meio adequado para a busca da impugnação de qualquer decisão, seja sentença, decisão interlocutória ou acórdão, diante de obscuridade, contradição ou omissão. É recurso de motivação vinculada. Encontra fundamento legal não apenas no art. 496, inciso IV, do CPC, mas, também, nos arts. 535 a 538, do código processualista.

Entende-se por obscuridade “a falta de clareza na redação do decisum, tornando difícil a sua verdadeira inteligência ou exata interpretação”99.

A contradição, conforme Orione Neto100, ocorre naquelas decisões que demonstram proposições inconciliáveis entre si.

Consiste a decisão omissa àquela ausente algo que deveria ser dito.

Grosso modo, os embargos declaratórios têm prazo de cinco dias, devendo ser interpostos por petição escrita dirigida ao prolator da decisão recorrida, e, independe de preparo. Sua interposição interrompe o prazo dos outros recursos. Orione Neto101 alega que o pedido deve se de que se reexprima, e não que se redecida, pois, em regra, não há nova decisão.

Entendimento diverso traz Araken de Assis, para quem o “embargante deve formular pedido de nova decisão, integrando, aclarando ou modificando o provimento embargado”102.

Por sua vez, importante notar a possibilidade de os embargos declaratórios adquirirem caráter infringente, apresentando poder modificativo do julgado. Depara-se nos casos contraditórios e omissos. Do mesmo modo, quando houver matéria de ordem pública, ou versar sobre fato novo, erro evidente103, e, ainda, prequestionamento104.

Na medida em que se tornou mais freqüente, houve por bem, ante aos embargos protelatórios, impor ao embargante penalidade processual. Conforme se observa do disposto no parágrafo único do art. 538 do CPC, o depósito do valor da multa imposta ao litigante no acórdão dos embargos protelatórios, constitui novo pressuposto de admissibilidade recursal objetivo à interposição de outros recursos.

1.2.5 Recurso Ordinário

Recurso ordinário consiste uma espécie de apelação, pois mantém ampla fundamentação e corrobora o princípio do duplo grau de jurisdição. Nesse sentido, impende observar o conceito expresso por Araken de Assis.

[...] o recurso ordinário é o meio impugnativo de motivação livre que serve para atacar resoluções judiciais heterogêneas, acórdãos denegatórios de writs constitucionais e sentenças proferidas nas causas constitucionais, bem como decisões interlocutórias originárias dessas causas, cujo julgamento compete ao STF ou ao STJ.105

É instrumento hábil ao reexame de questões de fato e de direito. Insere-se no ordenamento jurídico pela Constituição Federal, e pelo artigo 539, do CPC.

Será interposto no STF nas decisões originárias do colegiado dos Tribunais Superiores –STJ, TST, TSE e STM-, conforme dispõe o art. 102, inciso II, alínea “a”, da Carta Magna, e inciso I do art. 539 do CPC, desde que resultem os acórdãos de habeas corpus, mandado de segurança, habeas data ou mandado de injunção decididos em única instância, e mais, que a decisão seja denegatória. Todavia, há exceção à regra de interposição somente contra decisão colegiada, ou mesmo quanto à improcedência. A sentença proferida por juiz federal, procedente ou improcedente, ensejará recurso ordinário, quando tratar de crime político.

Por outro lado, a interposição ao STJ obedece ao disposto no art. 105, inciso II, alíneas “b” e “c”, da CRFB, e ao art. 539, inciso II, alíneas “b” e “c”, do CPC. Assim, serão julgados em recurso ordinário os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal e Territórios, desde que denegatória a decisão. Ressalve-se, contudo, o cabimento nas causas em que forem partes, de um lado Estado estrangeiro ou organismo internacional, e, do outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no país106.

Por força dessa norma não caberá recurso ordinário da decisão singular em mandado de segurança, da decisão denegatória das Turmas dos Juizados Especiais, e da decisão que indefere liminarmente mandado de segurança de competência originaria do tribunal. 107

Quanto ao prazo para interposição será de quinze dias.

Há entendimento de que o juízo de admissibilidade é bipartido, efetivando-se no juízo a quo, segundo o art. 540, do CPC, cabendo, ainda, a retratação do juiz, e, pelo juízo ad quem, observando-se as regras dos regimentos internos do STF e STJ, conforme a competência recursal.

1.2.6 Recurso Extraordinário e Recurso Especial

No que compete aos recursos extraordinário e especial adverte-se que buscam preservar não apenas a unicidade, mas a autoridade do direito constitucional e infraconstitucional no ordenamento jurídico nacional. O ponto nodal dos recursos extraordinários (lato sensu) é a concretização da primazia do interesse público em detrimento do interesse das partes. 108

Alega a doutrina pátria que o recurso especial é, em verdade, uma variante do recurso extraordinário109. Nesse sentido, o RE e o REsp apresentam características comuns, motivo pelo qual terão abordagem conjugada.

Orione Neto demonstra as características comuns dos recursos extraordinário e especial.

a) prévio exaurimento das instâncias ordinárias; b) não visam à correção da injustiça da decisão recorrida; c) não servem para a mera revisão da matéria de fato; d) apresentam juízo de admissibilidade desdobrado; e) possuem fundamentos de natureza constitucional; f) a execução que se faça na sua pendência é provisória. 110

Encontram-se dispostos na CRFB. O recurso extraordinário jaz no art. 102, inciso III, e o recurso especial no inciso III do art. 105, ambos da CRFB. De vasto conhecimento, o RE ventila matérias ou questões constitucionais e o REsp questões federais.

Os recursos aqui dispostos somente poderão ser interpostos ante às causas decididas em única ou última instância. Por conseguinte, pressupõe-se que a decisão guerreada deverá ser decisão final, tendo sido exercido amplamente o direito de defesa através da interposição dos recursos ordinários cabíveis. Importante ponto a se relembrar é o imperativo legal de os recursos extraordinários serem interpostos somente nas causas decididas em única ou última instância. Não podem ser exercitados per saltum. Nesse ínterim, cabe a exposição do entendimento pacífico do STJ quanto ao significado do termo “causa decidida”. A orientação é no sentido de que “causa decidida não é apenas de mérito, mas qualquer uma, incidental ou não, apreciada em última instância”111.

Evidentemente que os recursos extraordinários –RE e REsp-, não têm em sua essência a busca do reexame da causa, da verdade fática desta, ou mesmo, reexame da prova. São, essencialmente, remédios de cunho político-constitucional. Logo, o mérito da decisão contraditada não se encontra no cerne do recurso.

O que diferencia os recursos extraordinários dos recursos ordinários, entre outras questões pontuais, não é apenas a ausência da devolutividade quanto à matéria fática, mas a inserção de um plus quanto ao juízo de admissibilidade recursal.

O juízo de admissibilidade é bipartido, nos moldes do já disposto no recurso ordinário. A interposição do RE e do REsp ocorrerá no juízo a quo, onde será exercido o primeiro juízo de admissibilidade, devendo a decisão ser fundamentada112. Clarifica-se que essa decisão não tem o condão de vincular posterior decisão do juízo ad quem quanto à admissibilidade, e, por conseguinte, o conhecimento do recurso. Aliás, o juízo de admissibilidade dos recursos extraordinários afere, além dos requisitos formais, sejam, cabimento, legitimação, interesse, tempestividade, preparo, entre outros, também, os pressupostos constitucionais de cabimento. Dessa forma, há que se verificar a invasão do juízo a quo no exame de mérito recursal, já que há, salvo engano, certa incursão da matéria de mérito no juízo de admissibilidade. Nesse sentido a doutrina, para quem “os recursos extraordinários teriam uma peculiaridade que os diferenciaria dos demais (para os quais há separação nítida entre juízo de admissibilidade e de mérito)”113.

Outro não é o juízo de Doreste Baptista114, cujo entendimento consiste na praticidade encontrada pela alta Corte na faina do escalão de inferior jurisdição na utilização de “redes de filtragem cujas malhas fossem menores do que aquelas propostas pelos defensores da exegese estrita”. Percebe-se que a utilização do sistema de filtros, apesar levar o presidente ou o vice-presidente do Tribunal a quo à análise do próprio mérito, segundo Doreste Baptista, não ensejou inconveniência ou prejuízo aos jurisdicionados.

Em resumo, os recursos extraordinários devem obedecer aos pressupostos de admissibilidade formais e a alguns pressupostos específicos. Esses pressupostos específicos estão arranjados na CRFB nos artigos 102 e 105. Contudo, existem outros requisitos especiais a serem observados, inseridos tanto na Carta Magna como em leis infraconstitucionais.

À interposição do RE ou do REsp devem estar presentes, respectivamente, conforme ensinamentos de Orione Neto, alguns pressupostos especiais, sendo comum o prequestionamento.

[...] b) a indicação expressa do preceito da Lei Maior tido por violado; c) a impugnação de todos os fundamentos legais autônomos da decisão recorrida; d) a interposição do recurso especial, quando a decisão recorrida tiver fundamento infraconstitucional autônomo; e) a fundamentação recursal apenas em matéria de direito constitucional – excluída a discussão fática e de direito federal; f) a repercussão geral da questão constitucional no recurso extraordinário.115

[...] b) a indicação precisa do dispositivo tido por violado; c) a impugnação de todos os fundamentos legais autônomos da decisão recorrida; d) a interposição do recurso extraordinário, quando a decisão recorrida tiver fundamento constitucional autônomo; e) a fundamentação recursal apenas em matéria de direito federal – excluída a discussão fática e constitucional.116

Impõe destacar que os recursos extraordinários apresentam dispositivos inseridos dentre os requisitos de admissibilidade recursais, que constituem verdadeiros elementos do novo sistema de filtros recursais. O RE oferece a repercussão geral, e o REsp o sobrestamento dos recursos com fundamento em idêntica questão de direito, também conhecidos recursos repetitivos. As minúcias desses filtros serão posteriormente demonstradas.

No mais, os recursos extraordinários – RE e REsp-, têm prazo de quinze dias para a interposição, que deverá ocorrer perante o juízo a quo. Quanto ao termo a quo para a interposição do REsp impõe observar a recente inovação, a Súmula aprovada por unanimidade pela Corte especial do STJ de n. 418, resultado do projeto do ministro Luiz Fux, informa que “é inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação”117.

A elaboração da peça recursal deverá observar os requisitos constitucionais, o CPC, nos artigos 406 a 512, e, em especial os artigos inerentes aos recursos extraordinários, artigos 541 a 545, e o art. 557. Há ainda que se verificar os regimentos internos dos Tribunais Superiores, além de suas Súmulas e jurisprudências. 118

1.2.7 Embargos de Divergência em REsp e em RE

O último meio recursal disposto no art. 496, do CPC, é o denominado Embargos de Divergência em recurso especial e em recurso extraordinário. Encontra-se regulamentado no art. 546, do CPC.

Orione Neto estima que os embargos de divergência têm a finalidade de uniformizar a jurisprudência interna do STF ou do STJ. Surge a necessidade, e, por conseguinte, o cabimento, quando ocorrer discrepância de posições entre turmas, turma e seção, ou mesmo órgão especial, no caso de o tribunal superior ser o STJ. No âmbito do STF será cabível da divergência entre turmas, ou turma e plenário.

Na utilização do recurso deverá o acórdão embargado ser divergente ao acórdão paradigma. Embarga-se apenas acórdãos de julgamento de RE e REsp, já o acórdão paradigma poderá referir-se a qualquer processo. Quanto aos requisitos inerentes ao acórdão embargado, além daqueles comuns à maioria dos recursos, a decisão recorrida deverá ser resultado de colegiado do Tribunal Superior. Há, ainda, entendimento de que a decisão deva ser de mérito, e não apenas denegatória. Entretanto, não está pacificado na doutrina. Araken de Assis119 admite os embargos referentes ao juízo de admissibilidade, e Orione Neto120 alerta somente para que tanto o acórdão embargado, quanto o paradigma contenham o mesmo grau de cognição.

Em regra não cabem quando os acórdãos são da mesma turma. Mas, excepcionalmente caberão quando o acórdão embargado houver resultado de Turma que possua composição majoritária diversa daquela que produziu o paradigma.

Outros dois requisitos especiais a serem observados são: identidade fática e a tese jurídica diversa. Logo, as situações fáticas dos acórdãos devem ser similares, e quanto à tese deve haver dissidência jurídica.

Fator importante é a demonstração da divergência. Afirma-se que não basta a mera transcrição de ementas121. Necessária a comprovação, que poderá ocorrer através da certidão ou cópia autenticada122, ou, ainda, citação de repositório de jurisprudência oficial ou autorizado. Também é necessária fundamentação adequada à matéria divergente.

De outra banda, o procedimento, conforme se obtém do art. 546, parágrafo único, do CPC, deverá obedecer aos regimentos internos dos Tribunais Superiores. Estão disciplinados nos arts. 330 a 336, do RISTF; e nos arts. 266 e 267, do RISTJ.

O prazo de interposição é de quinze dias. Deverá ser interposto por petição escrita e devidamente instruída com a prova da divergência. Correrá nos próprios autos do acórdão embargado.

O juízo de admissibilidade é exercido pelo relator que poderá negar-lhe seguimento, cabendo agravo interno no prazo de cinco dias. Da decisão que o acolhe não cabe recurso.

Verifica-se que o preparo é matéria divergente. Enquanto Orione Neto123 entende ser cabível perante o STF, conforme se observa do art. 335, § 2º, do RISTF, já no STJ considera incabível, diante da omissão do regimento interno deste tribunal. Não obstante, Araken de Assis os considera devidos, em conseqüência da Lei n. 11.636/2007 em seu art. 1º que instituiu o pagamento de custas nos processos cuja competência originaria e recursal seja do STJ. Por conseguinte, “doravante há preparo nos embargos de divergência interpostos perante o STJ”124.

Finalmente, outro fator divergente diz respeito à presença do efeito suspensivo. Segundo Orione Neto125 os embargos de divergência apresentam, em regra, apenas efeito devolutivo. Há exceção quanto à eficácia do acórdão embargado se neste houve provimento de RE. Araken de Assis diverge, já que considera cabível efeito suspensivo na omissão da lei. Ensina, “o que se suspende é a eficácia do julgamento do último recurso, e não do acórdão regional ou local originalmente impugnado, que continua produzindo, ou não, os efeitos que lhe são próprios ou naturais”126.

1.2.8 Recurso Inominado

Apesar de o recurso inominado não constar do rol disposto no art. 496, do CPC, não deve ser desconsiderado diante de sua importância perante o crescimento da procura pelos Juizados Especiais Cíveis. No âmbito dos Estados existe a Lei n. 9.099/95, e no âmbito Federal a Lei n. 10.259/2001.

Recurso inominado é o recurso cabível contra sentenças proferidas no Juizado Especial Cível. Encontra previsão legal no art. 41, da Lei n. 9.099/95. Assemelha-se ao recurso de apelação. Assim, a interposição independe de a sentença ser de mérito ou não. Contudo, apesar da aparente semelhança, há entre eles divergências pontuais. O prazo para interposição, diferentemente do prazo para a apelação que é de quinze dias, será de dez dias. Nesse sentido, cabe informar a Conclusão n.13 do 11º Encontro do Fórum Nacional dos Juizados Especiais: “O prazo para recurso, no Juizado Especial Cível, conta-se da ciência da sentença, e não da juntada do AR ou mandado aos autos”127.

Interposto o recurso inominado ao juízo da causa por petição escrita, o mesmo não sobe ao Tribunal, já que a causa é revisada no âmbito da Turma do Juizado Especial Cível, composto por três juizes togados em exercício no 1º grau de jurisdição. Muito se discutiu sobre a inconstitucionalidade das decisões recursais diante da deficiência na aplicação do princípio do duplo grau de jurisdição. Todavia, há que se considerar argumentos opostos128, para os quais o fato de o recurso inominado ser encaminhado a outro órgão, que não o prolator da decisão recorrida, garante o duplo grau de jurisdição.

Impõe ressaltar que o preparo do recurso inominado diverge do preparo da apelação. Aqui o preparo poderá ocorrer no prazo de quarenta e oito horas após a interposição do recurso, sem o risco de ser considerado deserto.

No que compete aos efeitos, o recurso inominado tem, em regra, o efeito devolutivo. Já o suspensivo poderá ser atribuído pelo magistrado para evitar dano irreparável às partes129.

Em resumo, no âmbito dos Juizados Especiais cabe apenas o recurso inominado, os embargos de declaração e o RE. A restrição aos outros recursos se deve à busca da essência dos Juizados, que se traduz na justiça célere e justa.

Por todo exposto, afirma-se que as reformas inseridas no sistema recursal cível buscaram conferir ao processo verdadeiro status de instrumento justo, adequando-se de modo ágil à efetiva solução de conflitos. Logo, no intuito de demonstrar a essência das reformas, após inúmeras reflexões sobre princípios e recursos inerentes ao processo civil, cabe agora abordar o juízo de admissibilidade e de mérito recursal, e mais, o novo sistema de filtros recursais.


  1. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

No intuito de distinguir juízo de admissibilidade do juízo de mérito, Araken de Assis130 aborda seus conceitos. Juízo de admissibilidade consiste no exame prévio, por parte do órgão judiciário, de um conjunto de condições denominadas pressupostos de admissibilidade. O juízo de admissibilidade positivo enseja conhecimento do recurso, enquanto o negativo, por obvio, o não conhecimento.

Noutro giro, o juízo de mérito, em tese, somente incidirá após o exame positivo da admissibilidade recursal. Esclarece Araken de Assis131 que nele se faz o “acolhimento ou não das alegações do recorrente”, e assim, tem “a tarefa de apurar a existência de fundamento para o ato postulatório, constitui etapa ulterior no itinerário mental do órgão judiciário [...]”.

Hodiornamente cabe indagar se em conseqüência das reformas recursais tornou verdadeira a antecipação de exame do mérito no prévio juízo de admissibilidade.

  1. Pressupostos de Admissibilidade

Os pressupostos são requisitos mínimos sem os quais os recursos não serão conhecidos. Ao abordar os sistemas recursais, há que se verificar os requisitos mínimos necessários para que os recursos possam ser conhecidos pelos órgãos julgadores.

Os pressupostos de admissibilidade dos recursos subdividem-se em genéricos e específicos. Os genéricos são aqueles intrínsecos a todos os recursos, e os específicos aqueles que dizem respeito apenas ao recurso determinado.

Alexandre Freitas Câmara132 discorre sobre outros meios de classificação e análise dos requisitos de admissibilidade recursais. Segundo Alexandre, alguns autores133 preferem distingui-los em objetivos e subjetivos. Aqueles diretamente relacionados ao próprio recurso e estes à pessoa do recorrente.

[...] se um recurso é uma manifestação do poder de ação, e se através do recurso provoca-se uma renovação do processo, o exame do mérito do recurso deve estar sujeito aos mesmos requisitos exigidos para que, tendo sido proposta uma ação, e instaurada em processo, possa ser examinado o mérito da causa. E tais requisitos, como sabido, são as “condições da ação” e os pressupostos processuais. 134

Uma vez que tais requisitos advêm da teoria geral do direito processual, e são didaticamente aceitáveis, não há porque desconsiderá-los. Em tese, as condições da ação transformam-se em condições do recurso, e os pressupostos processuais em pressupostos recursais. Assim, enquanto consideram condições da ação, legitimidade em ser parte, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido, em contrapartida são condições do recurso a legitimidade, o interesse e a possibilidade, mas, relacionados ao recurso. Entretanto, apesar de ser pouco explorada pela doutrina, conforme bem lembra Alexandre, a tese de que interposição de recurso consiste em um ato de exercício do poder de ação, apresenta-se perfeitamente aceitável.

Esclarece Alexandre135 que os pressupostos recursais constituem: juízo investido de jurisdição, partes capazes, e recurso regularmente interposto. Faz-se um paralelo com os pressupostos processuais.

O juízo investido de jurisdição pode ser entendido como a obrigatoriedade de o processo, no caso o recurso, ser interposto perante órgão investido, ou melhor, órgão capaz de rever a decisão prolatada. Assim, exemplifica Alexandre Freitas Câmara, o juízo ad quem investido de jurisdição contra decisões proferidas pelo juízo federal de primeira instância será o Tribunal Regional Federal.

Da mesma forma, compreender o que são partes capazes não é matéria difícil. A capacidade aqui apenas sofrerá uma subdivisão natural, por conta principalmente da ausência de obrigatoriedade de se encontrar, o autor ou o réu, apresentado por advogado. É o caso das ações propostas perante os Juizados Especiais Cíveis cujo valor seja inferior a vinte salários mínimos. Nestes casos, a parte detém capacidade postulatória, o que significa que poderá praticar pessoalmente todos os atos processuais. Entretanto, na interposição de recurso será obrigatória a representação por profissional habilitado. É bem verdade que, nas ações cujo valor exceda vinte salários mínimos a assistência por advogado será imprescindível.

Após breves apontamentos, faz-se mister confirmar que ao recorrer serão consideradas as seguintes situações: a capacidade de ser parte, inerente a todas as pessoas; a capacidade de estar em juízo, adstrita aos capazes, pois ao incapaz haverá a necessidade de estar assistido ou representado; e, ainda, a capacidade postulatória, que como já discorrido, dar-se-á com a “representação” em juízo por profissional habilitado.

Por fim, a demanda regularmente formulada diz respeito à necessidade de preexistência de processo em curso. A interposição regular do recurso, conforme Alexandre136, tem como essência quatro pontos a serem observados: tempestividade, preparo, forma e motivação. Em que pese à configuração apresentada por Alexandre, far-se-á apenas sucinta análise da forma, já que os outros pontos serão apresentados no exame dos pressupostos recursais segundo a doutrina majoritária.

Importante frisar que à mesma idéia de classificação filia-se Luiz Orione Neto137. Afirma ser o recurso um prolongamento do direito de ação. A possibilidade jurídica do pedido corresponde ao cabimento, a legitimidade ad causam à legitimação para recorrer, e, por fim, o interesse processual ao interesse em recorrer. Todavia, apesar do disposto, Orione Neto apresenta análise dos pressupostos de admissibilidade conforme o entendimento majoritário, subdividindo os pressupostos em intrínsecos e extrínsecos. Apresentam a mesma divisão Araken de Assis138 e Nelson Nery Junior139.

Coube até aqui, no que concerne à apresentação dos pressupostos de admissibilidade recursal, oferecer um novel estilo de análise dos mesmos, obedecendo a um critério inter-comparativo entre o sistema recursal e o de propositura da ação. Assim, em que pese o brilhantismo didático de Alexandre Freitas Câmara140, importante também a análise segundo a doutrina majoritária. Aliás, sem embargo de a didática empregada na novel análise, Araken de Assis141 assegura que a analogia é imperfeita. O principal argumento é a inserção dos pressupostos processuais como objeto da pretensão recursal, e, ainda, a possibilidade de renovação da demanda caso ausente algum requisito da ação, o que não ocorre quanto às condições de admissibilidade que, ausentes, trancam, definitivamente, a via recursal.

  1. Pressupostos Intrínsecos

Existem várias formas de conceituá-los, a que melhor se adequa é a que informa estarem os pressupostos intrínsecos intimamente ligados à própria decisão impugnada.

Barbosa Moreira142 aborda-os como à própria existência do poder de recorrer. Também Orione Neto afirma que se interligam à decisão recorrida.

A doutrina indica os seguintes pressupostos intrínsecos: cabimento, legitimidade para recorrer e o interesse em recorrer.

2.1.1.1 Cabimento

Para que um recurso seja cabível deve encontrar-se legalmente previsto, e mais, deve ser adequado ao caso concreto. À verificação da legalidade recursal ocorrerá pela análise de alguns artigos do CPC, além de outros diplomas legais143.

Como se pode lembrar da anterior análise dos recursos cíveis, o art. 496, do CPC, elenca a maioria dos recursos cabíveis no sistema processual. É bem verdade que, conforme explanado, apesar das várias reformas no referido artigo do CPC, restaram insuficientes para inserir todos os recursos existentes.

Sandro Marcelo Kozikoski assevera que “[...] a enumeração dos recursos se dá em numerus clausus, de modo a não permitir a ampliação do rol constante do artigo, somados ainda aqueles recursos contemplados em legislação especial”144.

Por outro lado, ensina Luiz Guilherme Marinone que “um processo só é cabível quando a lei processual indicar-lhe – diante de determinada finalidade específica e certo ato judicial – como o adequado para extravasar a insurgência”145. Impende observar o recurso adequado a cada decisão. Assim, na busca do recurso adequado, cabe à parte ponderar o caráter finalístico da decisão, advertindo a consagração pelo direito pátrio do princípio da singularidade.

Orione Neto146 declara que no intuito de saber qual o recurso correto ao ataque de determinada decisão judicial, caberá á parte “levar em conta a natureza jurídica do ato que se pretende”. Nesse intento, os arts. 162 e 163 elencam os atos decisórios, enquanto os arts. 504, 505, 513 e 522, todos do CPC, a possibilidade recursal.

A possibilidade jurídica do recurso, também denominada cabimento do recurso. Conforme dispõe Alexandre Freitas Câmara147, em sua particular classificação, essa condição é, em tese, a aplicação da possibilidade jurídica do pedido. Para que o recurso seja considerado possível há a necessidade de previsão legal expressa. Logo, possui conexão com a recorribilidade do provimento judicial impugnável, ou seja, somente será possível contra provimentos que admitam recurso. Cumpre registrar, portanto, que haverá a possibilidade jurídica do pedido quando não for vedado pelo ordenamento jurídico o exame da matéria por parte do judiciário. É o denominado cabimento do recurso ou taxatividade. A análise do recurso a ser interposto deverá obedecer ao disposto no Código de Processo Civil, ou em normas esparsas.

2.1.1.2 Legitimidade para recorrer

O art. 499, do CPC, traz rol exemplificativo daqueles legitimados para recorrer: quem for parte na causa; o órgão do Ministério Público; e o terceiro prejudicado.

Art. 499. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público.

§ 1o Cumpre ao terceiro demonstrar o nexo de interdependência entre o seu interesse de intervir e a relação jurídica submetida à apreciação judicial.

§ 2o O Ministério Público tem legitimidade para recorrer assim no processo em que é parte, como naqueles em que oficiou como fiscal da lei. 148

Afirma Donaldo Armelin que a legitimidade é o resultado principal da titularidade de “uma relação ou de uma posição em uma situação de fato, à qual o direito reconhece efeitos jurídicos”149.

Há que se recordar, conforme dispõe o CPC, que existem situações em que figuram partes o denunciado da lide, o opoente, o assistente litisconsorcial, o chamado ao processo e o substituto processual. O advogado também apresenta legitimidade quando recorre em nome próprio quanto à verba honorária.

A obediência aos requisitos da legitimidade deverá ser inerente ao conhecimento de todos os recursos no sentido de se efetivar o juízo de mérito.

2.1.1.3 Interesse em recorrer

O interesse em recorrer encontra relação com a sucumbência, sem, contudo, confundir-se a ela. Alerta-se para os casos em que o Ministério Público atua como custos legis, e, apesar de não ser sucumbente, tem interesse em recorrer. Nesse sentido, impende breve exame em que consiste o interesse em recorrer.

A noção de interesse, no processo, repousa sempre, ao nosso ver, no binômio utilidade + necessidade: [...] utilidade da providência judicial pleiteada, necessidade da via que se escolhe para obter essa providência. O interesse em recorrer, assim, resulta da conjugação de dois fatores: de um lado, é preciso que o recorrente possa esperar, da interposição do recurso, a consecução de um resultado a que corresponda situação mais vantajosa, do ponto de vista prático, do que a emergente da decisão recorrida; de outro lado, que lhe seja necessário usar o recurso para alcançar tal vantagem.150 (Grifo nosso)

Importante frisar que nestes casos o interesse em recorrer consistirá na possibilidade do o recurso colocar o recorrente em situação mais favorável que aquela em questão, seja a traduzida pelo provimento judicial impugnado.

Orione Neto151 ensina que a utilidade esta relacionada à sucumbência, ao gravame e ao prejuízo alcançado pela parte. Alerta que a análise do interesse no âmbito da sucumbência deverá ser aquilatada com base em critérios objetivos de verificação do prejuízo. Todavia, ressalta-se que o prejuízo poderá afetar não apenas às partes, mas, como supramencionado, aos demais legitimados para recorrer.

No caso especial do Ministério Público atuando como custos legis152, há o sopesar do interesse público em detrimento do privado. Aí, o interesse recursal não deve constituir requisito de admissibilidade recursal. 153

  1. Pressupostos Extrínsecos

Os pressupostos extrínsecos resultam da análise de fatores externos à decisão judicial. São considerados extrínsecos a tempestividade, a regularidade formal e o preparo.

2.1.2.1 Tempestividade

Como diz Orione Neto a tempestividade “a necessidade de interposição do recurso no prazo legal, sob pena de operar-se a preclusão temporal, e, caso a decisão impugnada tenha julgado o mérito da pretensão, incidir o fenômeno da coisa julgada material154.

No mesmo sentido Sandro Marcelo Kozikoski, para o qual “não sendo exercitado o poder de recorrer dentro do prazo assinalado na lei, operar-se-ia a preclusão temporal e, de conseqüência, após esgotadas as demais nuances legais, a coisa julgada”155.

A regulamentação dos prazos recursais cabe ao legislador, e cada espécie recursal esta sujeita a prazo estipulado em lei, conforme já observado no estudo dos recursos em espécie. Compete ao procurador da parte manter-se atento à adequada escolha da espécie recursal, assim como ao prazo singular da mesma.

Cabe alertar que os prazos processuais, em regra, não admitem dilação. Contudo, há exceção156.

A contagem do prazo obedece às regras do art. 184 combinadas com o art. 506, ambos do CPC. Ressalta-se, ainda, o prazo para intimação, atentando-se para àqueles relacionados à Fazenda Pública, ao Ministério Público157, e às partes com procuradores distintos nos autos158.

Por fim, as inovações vinculadas pela Lei n. 11.419, de 2006, reguladoras do processo eletrônico inseriram, p.ex., a citação, intimação e notificação por meio eletrônico159, apesar de resultar da busca pela celeridade e desburocratização processual, podem acarretar prejuízo às partes caso o advogado atue com desídia. Assim, deve-se guardar cuidado absoluto quanto aos prazos recursais.

A interposição prematura de recurso, cuja denominação é recurso prematuro ou extemporâneo enseja avaliação. O STF ajuíza ser intempestivo o recurso extemporâneo. A exemplo, “segundo reiterada jurisprudência, é extemporâneo o RE protocolado antes da publicação do acórdão que julgou os embargos de declaração, sem posterior ratificação”160. Noutro entendimento o STJ, cujo entendimento anterior convergia ao do STF. Atualmente compreende, diante da sistemática de publicidade das decisões, tempestivo o recurso interposto antes da publicação da decisão no veículo oficial. No mesmo sentido alguns Tribunais estaduais161, como o TJRS, o TJMG e o TJDFT. Destarte, ao recorrer cabe ao prejudicado identificar cuidadosamente o entendimento do Tribunal a que se pretende recorrer.

2.1.2.2 Regularidade formal

A regularidade formal, na lição de Araken de Assis162, tem como elementos essenciais alguns requisitos genéricos, como identificação das partes, petição escrita, motivação e pedido pertinente, seja de reforma ou invalidação do pronunciamento recorrido. Afirma o autor que existem, em casos específicos, demais requisitos suplementares como a formação de instrumento para translado; autenticação de peças, que atualmente poderá ser realizado pelo advogado da parte; e a assinatura do advogado.

A forma tem relação com o disposto em lei. Em regra será por petição escrita, em regra composto por termo e razões do recurso. Entretanto, existem exceções, v.g., o caso do agravo retido em audiência que deverá ser interposto oralmente, segundo dispõe o art. 523, § 3º, do CPC, ou dos embargos de declaração interpostos perante os Juizados Especiais Cíveis, segundo dispõe o art. 49, da Lei n. 9.099/95.

Orione Neto assevera que o conteúdo do recurso compõe-se de duas partes distintas: “a) declaração expressa sobre a insatisfação com a decisão (elemento volitivo); b) os motivos dessa insatisfação (elemento de razão ou descritivo)”163.

No âmbito da fundamentação do recurso ou da causa de pedir, são nas razões do recurso que se demonstrarão os fatos, quando pertinentes ao recurso cabível, os argumentos jurídicos indicativos do direito pleiteado, e o pedido.

Com o advento da Lei n. 9.800, de 1999 e da Lei n. 11.419, de 2006, que regulamentou a prática de atos processuais pelo sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar, e o processo eletrônico, respectivamente, estão mantidas as regras da petição escrita, pois o envio será de peça escrita pelos meios de transmissão de dados.

2.1.2.3 Preparo

Reconhece Sandro Marcelo Kozikoski que o “preparo consiste no recolhimento, em momento adequado, das despesas pertinentes ao processamento do recurso interposto”164. Quando exigido pela espécie recursal, e não recolhido, impede que o recurso seja conhecido, por deserto.

Cumpre gizar a alteração promovida pela Lei n. 9.756/98 no art. 511, do CPC165, que passou a exigir a comprovação do preparo – recolhimento de custas e emolumentos, incluindo o porte de retorno-, sob pena de deserção. À mesma ideia filia-se Orione Neto, para quem o “preparo, de acordo com a atual dicção do art.511 do CPC, deve ser comprovado no ato da interposição do recurso. Sua efetivação após a protocolização, mesmo que no prazo recursal, é extemporânea, gerando deserção”166.

A Corte Especial do STJ já uniformizou o entendimento de que, caso a parte entregue o recurso no protocolo dentro do prazo, contudo após o fechamento do estabelecimento bancário, não haverá deserção se o recorrente satisfizer requisito do preparo no primeiro dia útil após a data do protocolo167.

Por outro lado, o preparo insuficiente somente poderá gerar a deserção quando o recorrente devidamente intimado para supri-lo no prazo de cinco dias, quedar-se inerte168.

Vale assinalar, por último, a questão do preparo diante da regra contida no art. 3º, da Lei n. 11.419/06169. Nesses casos fica ratificada a necessidade do recorrente realizar o preparo no estabelecimento bancário.

Dessarte, após a averiguação dos pressupostos de admissibilidade recursais, estando todos devidamente cumpridos pela parte recorrente, sendo conhecido o recurso, caberá ao juízo ad quem passar à análise do mérito recursal.

  1. O NOVO SISTEMA DE FILTROS RECURSAIS E SUAS ESPECIFICIDADES

3.1 Filtros Recursais

O Código de Processo Civil passou por reformas na busca de tornar o processo mais célere e econômico, mantendo, contudo, em tese, o ideal de segurança jurídica e a justa prestação jurisdicional. Aliás, Araken de Assis alerta para o fato de que “nem sempre, celeridade e justiça se conjugam em medidas iguais”170.

Everton José Helfer de Borba171 confirma três movimentos de reforma do CPC: a) início da década de 90; b) início da virada do milênio (2000/2002); c) após o ano de 2005. Foi a terceira onda de reformas que trouxe efetivamente uma espécie de controle aos inúmeros recursos interpostos.

A exemplo do sistema jurídico norte-americano, common law, o sistema pátrio tem procurado implantar na esfera nacional precedentes vinculativos. Historicamente, em regra, os precedentes no âmbito do direito pátrio têm autoridade estritamente persuasiva, pois o direito brasileiro advém do sistema romano-germânico, também denominado civil law. Apresenta como fonte primária o direito positivado. “No Brasil, a regra é que cada decisão judicial só tenha eficácia entre as partes, e os precedentes caráter meramente persuasivo, servindo tão-somente de orientação para a livre convicção do juiz (CPC, art. 131), que pode ou não se filiar ao entendimento manifestado pelo Tribunal.”172 A matriz é a lei, por força do princípio constitucional da legalidade.

Osmar Mendes Paixão Côrtes173 aborda, brilhantemente, os dois sistemas jurídicos. Common law é “o sistema jurídico que foi elaborado em Inglaterra a partir do século XII pelas decisões das jurisdições reais”174. Esse sistema de precedentes constitui instrumento de “segurança jurídica para uma organização que não tem uma base legislativa escrita forte”175.

Há quem afirme que a common law americana é mista, e a inglesa, pura. As duas formas resultam do direito criado a partir do julgamento das causas (judge-made law). Entretanto, o sistema jurídico norte-americano constitui-se, também, de normas outras fundamentais à complementação das possíveis lacunas deixadas pelos precedentes (case law). A estas normas denominam statute law176. “O sistema inglês é aberto, pois comporta uma técnica que permite resolver toda a espécie de questões, não é uma técnica interpretativa, mas de criação de regras.”177 Quanto ao civil law impõe ressaltar que trata de um direito codificado, onde “o juiz declara o direito, mas não o cria”178.

O Civil Law é um direito de influência romana, que, ao contrário do Common Law, é constituído de leis escritas em códigos, as quais englobam de forma geral os casos particulares, ou seja, os aplicadores do Direito, ao se depararem com um caso concreto, devem identificar a lei que mais a ele se adequar. Pode-se dizer, dessa forma, que o Civil Law tem por escopo princípios objetivos derivados da lei. 179

Hodiernamente há tendente aproximação dos dois sistemas, romano-germânico e common law. Osmar Mendes Paixão Côrtes nas palavras de Mônica Sifuentes180 assegura a aproximação. Em análise, a “atuação dos magistrados dos países de direito escrito, que, diante de situações novas e não reguladas pela lei, passam a valorizar a casuística dos problemas em julgamento, em prejuízo do enfoque puramente conceitual”. Aborda ainda, no que concerne aos juízes anglo-americanos, o movimento é oposto. Atualmente “fazem uso crescente dos conceitos legais, como base da construção jurisprudencial”.

Cumpre ressaltar, portanto, que há verdadeira globalização do direito contemporâneo. O sistema de precedentes poderá oferecer, dentro dos limites legais, maior segurança jurídica à sociedade. A supressão de lacunas através das jurisprudências, ou mesmo, das súmulas, vai de encontro ao sistema romano-germânico. Logo, os precedentes devem resultar de interpretação legal para que tenham validade jurídica. No mesmo entendimento Osmar Mendes Paixão Côrtes.

Em determinados momentos, se houver lacuna da lei, a jurisprudência consolidada pelas súmulas pode vir até a complementá-la, mas, na verdade, o que ocorre é que essa súmula não partiu do nada, mas da interpretação de princípios que, ainda que não positivados, fazem parte do sistema jurídico. Assim, a jurisprudência sumulada não ocupa o papel de fonte formal. 181

A partir da ideia do nascimento de uma imensa aldeia global, onde não apenas os precedentes vêm se tornando essenciais à presteza da tutela jurisdicional, mas à necessária uniformidade jurisprudencial, é que será apresentado o novo sistema recursal pátrio. A atual base recursal visa à tutela jurisdicional célere, econômica e efetiva, assegurando às partes segurança jurídica dentro dos limites instituídos pelos princípios constitucionais, dentre eles o princípio da separação dos poderes.

A partir de 2004, com a Emenda Constitucional n. 45, e, por conseguinte, da Reforma do Judiciário, buscou-se instituir um Poder Judiciário mais célere e eficiente. A despeito da alteração inserida pelo instituto da súmula vinculante, para muitos, essas reformas iniciais evidenciaram-se tímidas, já que não “instituíram meios efetivos para a melhoria da celeridade e da segurança na prestação jurisdicional primária”182. Todavia, após a reforma surgiram movimentos crescentes e normas que legitimaram o sentido do movimento. Dentre essas normas citem-se as Leis n. 11.276, n. 11.418, ambas de 2006, e a Lei n. 11.672, de 2008. As primeiras tratam, respectivamente, da “Súmula Impeditiva de Recurso” e da “Repercussão Geral”, e a derradeira, dos “Recursos Repetitivos”. Conforme seus defensores, as normas buscam corroborar a celeridade criando obstáculos aos recursos meramente protelatórios.

  1. Súmulas Vinculantes

Foi a Emenda Constitucional n. 45, de 2004, que constitucionalizou a súmula vinculante através da inserção do art. 103-A, na Carta Magna. Já a Lei n. 11.417, de 19 de dezembro de 2006, regulamentou o referido artigo.

Diz-se súmula o “sumário ou exposição abreviada do conteúdo integral de alguma coisa. Na jurisprudência, indica a condensação de série de acórdãos do mesmo tribunal, revelando sua orientação para casos análogos.”183 O melhor conceito para o termo é a descrição do verbete disponibilizada pelo STF: “Palavra originária do latim SUMMULA, que significa sumário, restrito, resumo. É uma síntese de todos os casos, parecidos, decididos da mesma maneira, colocada por meio de uma proposição direta e clara.”184 Logo, será súmula vinculante àquela a qual se proporciona o efeito vinculante, ou seja, com aplicação obrigatória.

A súmula de que trata o art. 103-A é uma proposição, um resumo. No Supremo Tribunal Federal, denomina-se súmula o conjunto de proposições numeradas que resumem a jurisprudência da Corte sobre diferentes matérias. Cada um desses enunciados é considerado súmula. É óbvio que a vinculante seguirá o mesmo padrão das súmulas anteriormente editadas, se diferenciando das ‘normais’ pela obrigatoriedade de votação de 2/03 dos membros do STF e outros requisitos elencados no art. 103-A da Constituição Federal. 185

Diante do exposto, evidencia-se que a edição de súmula vinculante pelo STF pressupõe interpretação de dispositivo legal em decisões recorrentes sobre o assunto.

O caráter vinculativo é por muitos considerado ofensa aos princípios da legalidade e da separação dos poderes. Argumenta-se que o sistema jurídico romano-germânico adotado no Brasil, com o advento da súmula vinculante, tornar-se-ia misto, já que iria resultar do entrelaçamento das famílias civil law e common law.

A herança do sistema jurídico romano-germânico perderá parcialmente a sua eficácia, porquanto o país não será regrado apenas por leis e princípios, mas também, por preceitos jurisprudenciais. O Brasil então passará a ter um sistema misto, de inspiração romano-germânica e anglo-saxônica. 186

Neste contexto, julga-se existir verdadeira transformação de paradigma no direito pátrio. A exclusividade das normas, princípios e leis, como fontes primárias deixaria de existir, passando a sê-las, também, as súmulas vinculantes. Todavia, interessante registrar, apesar de a súmula vinculante resultar da função jurisdicional do STF, apresentando efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e da administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, não se trata de norma. A função criadora do juiz no sistema jurídico common law pressupõe relativa ausência de base legislativa na formação do case law (precedente). Por outro lado, no sistema romano-germânico o magistrado exerce apenas a função interpretativa e a aplicativa da norma. A súmula resulta de jurisprudência consolidada no âmbito do Supremo Tribunal. Assim, nada mais é que o resultado da interpretação das normas. Caso não fosse, haveria aí ofensa aos princípios da legalidade e da separação dos poderes. Nesse sentido, reafirma-se, súmula vinculante não é norma.

No seguro magistério de Osmar Mendes Paixão Côrtes “a súmula vinculante, por não ser norma, não afronta o princípio da separação dos Poderes e, tampouco, restringe a recorribilidade ou o exercício do direito de ação, pois apenas vincula a interpretação sobre determinada tese constitucional. [...]”187. Outro não é o entendimento do prof. José Joaquim Calmon de Passos, para quem a única soberania reconhecível num sistema democrático é aquela advinda do poder soberano, estabelecido pela vontade popular e formalizada conforme um verdadeiro processo político constitucionalmente instituído. J. J. Calmon informa ainda que a força vinculante das decisões dos tribunais superiores não resulta apenas das súmulas vinculantes, mas daquelas decisões desses tribunais sobre as instâncias inferiores.

[...] O tribunal, ao fixar diretrizes para seus julgamentos, necessariamente os coloca, também, para os julgadores de instâncias inferiores. Aqui, a força vinculante dessa decisão é essencial e indescartável, sob pena de retirar-se dos tribunais superiores precisamente a função que os justifica. Pouco importa o nome de que ela se revista – súmula, súmula vinculante, jurisprudência predominante, uniformização de jurisprudência ou o que for, – obriga. Um pouco à semelhança da função legislativa, põe-se, com ela, uma norma de caráter geral, abstrata, só que de natureza interpretativa. Nem se sobrepõe à lei, nem restringe o poder de interpretar e de definir os fatos atribuídos aos magistrados inferiores, em cada caso concreto, apenas firma um entendimento da norma, enquanto regra abstrata, que obriga a todos, em favor da segurança jurídica que o ordenamento deve e precisa proporcionar aos que convivem no grupo social, como o fazem as normas de caráter geral positivadas pela função legislativa. 188

A despeito do disposto, cabe alertar para a o poder discricionário do julgador, e mais, para a incompatibilidade do arbítrio frente ao Estado Democrático de Direito.

Em análise à possibilidade de se interpor ação rescisória para desconstituir decisão formada em contrariedade à súmula vinculante, Osmar M. P. Côrtes189 afirma ser incabível, diante da inexistência de ofensa direta à CRFB e à lei, mas, somente ao conteúdo de súmula190, o que não dá razão à rescisória. Alerta para o fato de que, apesar do disposto no art. 103-A, da Carta Maior, e dos dispositivos infraconstitucionais, não há nenhuma sanção diante da inobservância da súmula vinculante. A norma apenas afirma o cabimento de reclamação para o STF. Diante disso, a afirmação de que a decisão do tribunal vincula os magistrados inferiores deve ser ponderada diante do poder discricionário.

Por outro lado, quanto ao poder arbitrário na elaboração de precedentes vinculativos, como a súmula vinculante, afirma-se que mesmo as decisões dos Tribunais Superiores devem acatar princípios processuais constitucionais básicos, como o princípio da motivação, o qual impõe às decisões a fundamentação legal, sob pena de nulidade. Logo, a súmula vinculante que resulta da reiteração de decisões do STF, como já disposto, não é norma, mas sua mera interpretação.

De outro ângulo, Osmar M.P. Côrtes191 explana sobre a função da súmula vinculante: a) tornar conhecida a jurisprudência consolidada no âmbito do STF; b) evitar a tomada de decisões discrepantes da sumulada, visando economia, celeridade processual e obediência à política judiciária; c) oferecer segurança jurídica ao sistema e às relações sociais.

Por fim, cumpre cientificar a regulamentação da Lei 11.417 quanto à possibilidade, não apenas de edição da súmula vinculante, mas da revisão ou cancelamento da mesma192, e os legitimados para propositura.

São legitimados para a propositura, revisão ou cancelamento de súmula vinculante, conforme o disposto no art. 3º, da Lei 11.417: a) Presidente da República; b) a Mesa do Senado Federal; c) a Mesa da Câmara dos Deputados; d) o Procurador-Geral da República; e) o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; f) o Defensor Público-Geral da União; g) partido político com representação no Congresso Nacional; h) confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; i) a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; j) Governador de Estado ou do Distrito Federal; k) os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.

Em resumo, foi a súmula vinculante a precursora do novo sistema de filtros recursais.

  1. Súmulas Impeditivas de Recursos

A Lei n. 11.276, de 7 de fevereiro de 2006, deu nova redação ao § 1º do art. 518 do CPC, autorizando o juiz prolator da sentença recorrida a não receber o recurso de apelação quando a decisão estiver em conformidade com súmula do STF e STJ. É afeto apenas à apelação. Araken de Assis aborda o instituto como “fato impeditivo à admissibilidade da apelação na consideração dos fundamentos do ato decisório”193.

Ressalta-se não se tratar de simples exame de requisitos de admissibilidade, mas, de análise prévia do mérito recursal sob pretexto de conhecê-lo ou não. Assim, não há que se negar o cotejamento da fundamentação da decisão recorrida, e das alegações no ato de recorrer. Aliás, Araken de Assis194 afirma que se encontra superada a ideia de separação mais nítida entre os juízos de admissibilidade e de mérito. Ao observar a apelação, havendo a possibilidade de retratação do juiz prolator da decisão, pode-se afiançar que há julgamento de mérito no juízo a quo.

Araken de Assis195 trata o disposto no art. 518, § 1º, do CPC, como um dos requisitos intrínsecos dos recursos. No mesmo sentido Orione Neto196, que elenca a “súmula impeditiva de recursos” dentre os requisitos de admissibilidade, em particular a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer197.

Em sentido contrário Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina, para os quais “verificar se a sentença está ou não de acordo com súmula dos Tribunais Superiores é questão atinente ao juízo de mérito do recurso”198. Bem verdade que a suposta análise de mérito atribuída ao juízo a quo, versa apenas de análise superficial, pois se assim não fosse haveria invasão de competência absoluta do juízo ad quem.

Impõe ressaltar, a exemplo do que ocorre no art. 518, do CPC, o art. 557, caput, do mesmo diploma legal autoriza ao relator que negue seguimento ao recurso. Enquanto o primeiro possibilita ao juiz o não recebimento quando a sentença encontrar-se em conformidade com súmulas do STJ e do STF, o segundo negará seguimento quando o recurso seja manifestadamente inadmissível, improcedente, prejudicado. E mais, a exemplo do primeiro, que esteja em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do STF ou do STJ.

Apesar de guardarem aparente similitude, já que funcionam como freios recursais, têm divergências pontuais, a exemplo da competência, que na apelação será do juízo a quo, e nos outros recursos será do juízo ad quem, na pessoa do relator. Na apelação (art. 518, CPC) será analisada a decisão recorrida, ou seja, a sentença impugnada. Já aos demais recursos (art. 557, caput, CPC) é o próprio recurso que deve ser sopesado. Ao primeiro caso os instrumentos impeditivos são apenas as súmulas dos Tribunais Superiores, enquanto no segundo, além da análise sobre a inadmissibilidade, a improcedência, ou mesmo prejudicialidade do recurso, o impedimento será além das súmulas, a jurisprudência dominante. E mais, não apenas dos Tribunais Superiores, mas do próprio tribunal julgador.

Todavia, pela verificação do disposto no § 1º-A do art. 557 do CPC, do mesmo modo do disposto no art. 518, haverá análise da decisão impugnada. Logo, “se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso”199. E ainda, a decisão poderá encontrar-se em conformidade com jurisprudência do Tribunal de origem, mas, confrontando-se à jurisprudência dos Tribunais Superiores, que ainda assim caberá recurso, o que diverge da apelação (art. 518). Desse entendimento o STJ.

A Corte Especial proveu os embargos ao entendimento de que o relator pode negar seguimento a recurso contrário à jurisprudência dominante do próprio Tribunal de origem quando em consonância com a jurisprudência do STJ. Não se aplica o art. 557 do CPC se a súmula do Tribunal local é contrária à jurisprudência desta Corte. 200 (Grifamos).

Considera-se jurisprudência dominante “a existência de um número variável de precedentes uniformes e reiterados no mesmo sentido. Não é necessário que a tese seja pacifica; obviamente, há de ser atual [...]”201.

Por outro lado, a súmula impeditiva de recurso tem natureza própria distinta da súmula vinculante. A súmula vinculante, conforme ensinamentos de Everton José Helfer de Borba202, engessa o poder de decisão do juízo, já que, em tese, não é dada a opção de decidir em contrariedade a ela. Já na súmula impeditiva de recurso o juiz tem a faculdade de decidir de modo diverso, mesmo que tal decisão possibilite o conhecimento de recurso. Conquanto a literalidade do texto da norma indique obrigatoriedade, em verdade trata-se de faculdade do magistrado o recebimento ou não da apelação nas hipóteses elencadas203.

Noutra ponta, Daniel Amorim Assunção Neves sustenta que é um dever do juiz, “e não mera faculdade, negar seguimento ao recurso de apelação quando interposto contra sentença que se funda em súmula [...]”204. Já Denis Danoso205 ressalva que estando diante de súmula vinculante, nos seus precisos termos, conclui-se a pela aplicação obrigatória. Data venia, ao tratar do disposto no art. 518, do CPC, não se está a falar de súmula vinculante, que tem, evidentemente, força vinculativa, mas das súmulas dos Tribunais Superiores.

Por outro lado, sopesando a força vinculante dos dois institutos, cabe registrar os ensinamentos de Cássio Scarpinella Bueno.

Súmulas vinculantes e as súmulas impeditivas de recurso são, na verdade, duas faces de uma mesma moeda, quando menos, que são institutos com finalidades irremediavelmente complementares. Se, para todos os fins, os efeitos vinculantes de uma decisão de um dado tribunal querem impedir que sobre uma mesma questão jurídica o juízo inferior decida diferentemente, qual seria o sentido de admitir recursos interpostos de decisões que se fundamentam naquelas mesmas súmulas? 206

No limiar da decisão injusta, divergente do atual entendimento, não admitida apelação, restará à parte o recurso de agravo de instrumento. Orione Neto aborda os fundamentos à interposição: “i) por se tratar de decisão suscetível de causar ao apelante lesão grave e de difícil reparação; ii) e por se tratar de interlocutória que não admitiu a apelação (cf. art. 522, 2ª parte, na redação da Lei n. 11.187, de 19-10-2005)”207.

Há, por óbvio, outras situações onde a apelação deve ser admitida. Rodrigo da Cunha Lima Freire208 aborda algumas situações, como, p.ex., o mérito da pretensão recursal versar, especificamente, da aplicação ou não da súmula.

Interessante notar a batalha perpetrada pelos legisladores na busca de se reduzir o alto índice de recursos, em tese, protelatórios. O que se busca é a efetiva tutela jurisdicional célere. Corrobora essa ideia o art. 515, § 4º, do CPC, que traz mecanismos de saneamento de determinadas nulidades processuais. Quando sanável a nulidade “o tribunal poderá determinar a realização ou renovação do ato processual, intimadas as partes; cumprida a diligência, sempre que possível prosseguirá o julgamento da apelação”209. Nesse caso não haverá necessidade de o processo retornar ao juízo a quo, o que torna o processo célere.

  1. Repercussão Geral

A repercussão geral é tema demasiadamente interessante. Assim como a súmula vinculante, foi inserida na Carta Magna, especificamente no § 3º do art. 102, pela EC n. 45, de 2004. O próprio Supremo Tribunal Federal estabelece os fundamentos legais da repercussão geral. Elenca, além do referido parágrafo, a Lei n. 11.418, de 19 de dezembro de 2006, que regulamentou o instituto nos arts. 543-A e 543-B, ambos do CPC, alguns artigos do RISTF210 e a Portaria 138/2009 da Presidência do STF.

A doutrina aventura-se em oferecer conceito apropriado ao instituto. Orione Neto apresenta o entendimento de Arruda Alvim, para o qual é verdadeiro filtro recursal, e de Bruno Dantas, que deduz ser pressuposto especial de cabimento.

[...] a relevância de um sistema de filtro que permite afastar do âmbito dos trabalhos do tribunal as causas que não têm efetivamente maior importância e cujo pronunciamento do tribunal é justificável. Mas, como se sublinhou, se dentre essas, algumas se marcarem pela sua relevância, dessas haverá de tomar conhecimento o tribunal. 211

Repercussão geral é o pressuposto especial de cabimento do recurso extraordinário, estabelecido por comando constitucional, que impõe que o juízo de admissibilidade do recurso leve em consideração o impacto indireto que eventual solução das questões constitucionais em discussão terá na coletividade, de modo que se lho terá por presente apenas no curso de a decisão de mérito emergente de recurso ostentar a qualidade de fazer com que parcela representativa de um determinado grupo de pessoas experimente, indiretamente, sua influência, considerados os legítimos interesses sociais extraídos do sistema normativo e da conjuntura política, econômica e social reinante num dado momento histórico. 212 (Grifamos).

Interessante notar que o próprio STF traz o verbete repercussão geral213. No entanto, a simples observação do disposto pelo E. Tribunal revela a ruína do intento de conceituá-lo. O descreve como instrumento processual inserido na CRFB pela Emenda Constitucional n. 45, com o objetivo de obstar aqueles recursos extraordinários cuja matéria não apresente relevância jurídica, política, social ou econômica, afirmando, mais, que funciona como filtro recursal. A bem da verdade, o que se verifica é a dificuldade de se conceituar o instituto. Logo, acredita-se que somente através da análise das matérias apresentadas ao STF em preliminar do RE, é que se verificará, com mais propriedade seu conceito.

Nesse sentido, Araken de Assis214 apresenta questão polêmica sobre quais matérias podem ser consideradas com repercussão. Segundo o autor “toda questão constitucional controvertida é relevante e exibe transcendência; do contrário, tal controvérsia não fincaria raízes no texto constitucional”. Atenta para o fato de que não se deve considerar absoluta tal premissa, e analisa a assertiva sob o enfoque de R. Ives Braghittoni: “se é verdade que todo dispositivo constitucional é ‘relevante’ e tem ‘repercussão geral’, não significa que toda causa em que se discuta algum dispositivo constitucional também o seja”215.

A doutrina confronta repercussão geral e arguição de relevância. Há quem julgue a repercussão ser o ressurgimento da arguição de relevância prevista no art. 119, § 1º, da Constituição de 1967216, inserido pela EC n.1, de 17 de outubro de 1969, e modificado posteriormente pela EC n. 7, de 1977.

Cabe destacar, entretanto, pontos divergentes entre os dois institutos. Araken de Assis217 aborda o tema com grande propriedade: a) a repercussão geral possibilita o julgamento do RE somente quando trata de questões constitucionais relevantes; enquanto a antecedente arguição de relevância julgava questões federais; b) a arguição de relevância era mecanismo de inclusão; já a repercussão geral é de exclusão; c) a arguição dependia de instauração de incidente próprio no procedimento do RE; enquanto a repercussão geral prescinde de incidente específico, configurando preliminar do RE; d) a arguição relevância era apreciada, e distribuída de forma autônoma ao sorteio do relator, em sessão secreta, reunindo-se o tribunal em conselho, sendo o resultado irrecorrível publicado em ata, ausente de motivação; ao passo que a repercussão geral, após análise dos requisitos de admissibilidade, e distribuição a um relator que verifica a presença da repercussão, resulta, finalmente, em análise motivada, em sessão pública, cujo resultado publicar-se-á através de súmula que valerá como acórdão; e) a arguição de relevância assentava-se no voto da minoria, ou seja, voto de quatro ministros; já a repercussão geral tem base na posição majoritária de quatro ministros no que concerne ao reconhecimento, e em dois terços dos integrantes do STF. Observa-se que a despeito das diferenças, o ônus da demonstração dos dois institutos cabe ao recorrente, como exposto, numa em incidente próprio e noutra em preliminar.

De outra banda, curioso constatar que há quem observe semelhança entre o procedimento da Lei n. 11.672, de 2008, que trata dos recursos repetitivos com a repercussão geral do RE. Os dois institutos buscam tornar a prestação jurisdicional eficaz e célere, além da reduzir os recursos extraordinários (RE e REsp) interpostos ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça. Outra importante semelhança é o fato de haver o julgamento representativo de um, sobrestando-se outros recursos com idêntica demanda de direito. Consta ainda que uma das finalidades da repercussão geral, assim como ocorre no STJ quanto aos recursos repetitivos, é uniformizar a interpretação constitucional sem exigir que o Supremo decida múltiplos casos idênticos sobre a mesma questão constitucional.

A competência para análise da repercussão geral é exclusiva do Plenário do Excelso Pretório, mas, diante da inexistência da repercussão geral em preliminar do RE, poderá o Tribunal a quo inadmití-lo por ausência de requisito de admissibilidade de cabimento.

As matérias ou questões apreciadas sob o manto da repercussão geral são aquelas constitucionais que apresentem relevância social, econômica, política ou jurídica, e que transcendam os interesses subjetivos da causa.

O procedimento utilizado na análise da repercussão geral é deveras interessante. O próprio STF buscou adequar o instrumento tornando-o célere e eficaz. Interessante notar o disposto pelo STF sobre a análise.

[...] A preliminar de Repercussão Geral é analisada pelo plenário do STF, através de um sistema informatizado, com votação eletrônica, ou seja, sem necessidade de reunião física dos membros do Tribunal. Para recusar a análise de um RE são necessários pelo menos 8 votos, caso contrário, o tema deverá ser julgado pela Corte. Após o relator do recurso lançar no sistema a manifestação sobre a relevância do tema, os demais ministros têm 20 dias para votar. As abstenções nessa votação são consideradas como favoráveis à ocorrência de repercussão geral na matéria. 218 (Grifamos).

Ao sistema adotado denominou-se Plenário Virtual. Constatada a presença da repercussão geral, e após o término do julgamento de mérito, a decisão deverá servir como precedente com força vinculante, aplicando-se nas instâncias inferiores, em casos análogos. Assim, “a súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão”219. Atente-se, entretanto, para informação de que caso a turma decida pela existência da repercussão geral, com no mínimo quatro votos, será dispensada a remessa do recurso ao plenário.

Araken de Assis220 elenca como condição específica à repercussão geral a exposição vinculada na petição de interposição do RE das questões de direito, já que o recurso repele a revisão das questões de fato ou probatórias. Alexsandro da Silva Linck aborda aspectos processuais ao julgamento do RE sob a égide da repercussão geral.

a) compete ao recorrente elaborar tópico específico em sua peça recursal demonstrando a relevância à transcendência que caracterizam a repercussão geral; b) para a declaração de existência da repercussão geral faz-se necessário, no mínimo, 04 votos, sendo dispensado, neste caso, a remessa dos autos ao plenário do STF (nada impede, no entanto, que o Relator, negue seguimento sumariamente ao recurso quando não for observado outro pressuposto de admissibilidade como, por exemplo, o preparo); c) o julgamento é em sessão pública e deverá ser fundamentado (artigo 93, IX, da CF); d) não reconhecida a repercussão geral, os recursos que contemplam matéria idêntica serão liminarmente indeferidos, salvo no caso de revisão da tese; e) a súmula do julgamento constará de ata, que será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão; f) a decisão do STF quanto à inexistência de repercussão geral é irrecorrível.221

Derradeiramente, leciona Orione Neto que ausente a “repercussão geral pelo quorum qualificado de oito ministros, os recursos que ficaram represados junto ao tribunal de origem considerar-se-ão automaticamente não admitidos (cf. § 2º do art. 543-B)”. 222

  1. Recursos Repetitivos

Os recursos repetitivos são tratados na lei n. 11.672, de 8 de maio de 2008, que adicionou o art. 543-C, ao CPC223. A inserção desse artigo ao código trouxe ao ordenamento jurídico pátrio a possibilidade de tornar mais célere o julgamento. A partir dessa norma, seleciona-se um ou mais recursos representativos que apresentem causas com análoga questão de direito, dentre àqueles inúmeros interpostos, sobrestando-se os demais, até decisão do STJ quanto àqueles selecionados e enviados ao Tribunal Superior.

A despeito da semelhança com o procedimento do RE, aonde cabe ao STF, após escolha do recurso piloto, a análise da presença do requisito da repercussão geral, para somente então julgar o mérito, o REsp não apresenta tal requisito. Não há o instituto da repercussão geral no REsp, e, por conseguinte, nos recursos repetitivos. Difere também quanto à força vinculante da decisão do recurso piloto. Enquanto a decisão do STF quanto à presença da repercussão geral vincula o julgamento dos recursos sobrestados e daqueles com idêntica matéria de direito nos Tribunais de 2º grau, a decisão do STJ não apresenta força vinculante. Não vincula os REsp suspensos. Contudo, a despeito de a decisão do STJ não apresentar força vinculante, servirá de norte para a deliberação nos processos suspensos. 224 Nesse sentido Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina.

Assim, por exemplo, em relação ao sobrestamento de recursos extraordinários, o § 2º do art. 543-C estabelece que, decidindo o STF no sentido da inexistência de repercussão geral, os recursos cuja tramitação ficou suspensa, “considerar-se-ão automaticamente não admitidos”. Vê-se que a decisão do STF tem caráter absolutamente vinculante, quanto à inadmissibilidade do recurso em razão da ausência de repercussão geral. Deverá o órgão a quo, portanto, ater-se ao que tiver deliberado o STF a respeito. O mesmo, porém, não ocorre em relação aos recursos especiais: o não conhecimento dos recursos especiais selecionados não importará, necessariamente, na inadmissibilidade dos recursos especiais sobrestados. 225

Cumpre gizar, a aparente intenção do legislador foi tornar mais célere o julgamento dos recursos interpostos no STJ à semelhança do anterior mecanismo criado para o RE no STF. Nesse sentido, hodiernamente há o intuito do legislador, a exemplo do que ocorre com o RE, de tornar vinculante as decisões dos recursos repetitivos aos olhos do novo CPC226.

As decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento de processos sob o rito da Lei dos Recursos Repetitivos deverão ser seguidas por todos os magistrados de primeiro e segundo graus. Essa é uma das mudanças previstas para o Novo Código de Processo Civil (CPC), que está sendo discutido pela Comissão de Revisão do CPC, criada pelo Senado Federal.227 (Grifamos).

Noutro giro, a seleção dos recursos representativos cabe ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal a quo. Todavia, segundo estabelece o § 2º do art. 543-C, não adotada essa providência, incumbirá ao relator no STJ, “ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, [...] determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida”. Assim, nota-se que existem duas possibilidade para o sobrestamento do REsp repetitivo. A primeira quando a idêntica questão de direito for verificada no próprio Tribunal a quo, e a segunda quando a identificação ocorrer no STJ, onde o Relator determinará a suspensão nos Tribunais locais. Nesse caso, caberá a observação dos requisitos da suspensão pelo Relator: a) existência de jurisprudência; ou b) encontrando-se a matéria aberta ao Colegiado, seja Seção ou Corte.

Araken de Assis demonstra a necessidade da presença de dois pontos aos recursos repetitivos: “(a) multiplicidade de recursos e, em cada qual, a presença da (b) identificação de questão de direito aventada nas impugnações”228.

Há que ressaltar que a inclusão do artigo 543-C ao ordenamento jurídico ensejou à concepção de norma reguladora pelo STJ. Regula o referido artigo a Resolução n.8/08 do STJ. Conforme o Ministro do STJ, Luis Felipe Salomão, a Resolução 8/08 “permitirá a objetivação no julgamento dos recursos especiais, com análise, em abstrato, de questões reiteradamente conduzidas à apreciação desta Corte, assentando seu entendimento e orientando a atuação das instâncias ordinárias”229.

A escolha do REsp representativo ocorrerá sobre aquele que apresentar melhor fundamentação. Todavia, há que se identificar certo grau de subjetivismo à escolha, pois inexiste critério rígido à seleção. Nesse diapasão, Araken de Assis230 afirma que a “errônea seleção não tem remédio direto”, restando ao prejudicado intervir no processo apenas como amicus curiae231.

Não obstante a intervenção como amicus curiae, adverte-se para as peculiaridades de alguns processos. O presidente do STJ, ministro César Asfor Rocha, cientifica que nesses casos haverá amplo debate à solução da lide.

[...] quando se questiona um determinado dispositivo de uma lei, ele pode ser visto de várias formas. É por isso que em um mesmo colegiado, um mesmo dispositivo legal pode ter diferentes interpretações. É como se fosse um caleidoscópio: de cada ângulo que você vê, há algo diferente. O dispositivo é o mesmo, mas o argumento usado é diferente. Mas a lei dos recursos repetitivos permite o amplo debate. O tribunal, quando vai decidir um recurso repetitivo, auscuta todas as instituições necessárias. Em tese, esgota todos os argumentos que se pode ter, contra e a favor. Por isso o recurso repetitivo tem um rito processual específico. Nem todos os seguimentos têm interesse em uma solução como essa. Pode o poder público querer postergar a solução de determinado tema, enquanto podem não querer o mesmo alguns segmentos da advocacia. 232

Caso a tese do acórdão recorrido seja coincidente à do STJ, e tendo os recursos especiais sobrestados seguimento denegado, poderá a parte recorrente, que considere a questão de direito diferente daquela argüida no recurso piloto, interpor pedido de reconsideração à Presidência do tribunal a quo, para que este retire o sobrestamento. Diante do pedido poderá o tribunal de 2º grau retratar-se, retirando o sobrestamento e dando seguimento ao REsp ao STJ. Por outro lado, mantendo-se o julgado, deverá esperar a decisão do STJ, “ressalvada evidentemente a faculdade de, se for o caso, pleitear medidas cautelares a fim de prevenir eventual dano decorrente da demora”233. Ainda, considerado prejudicado o recurso especial poderá interpor agravo de instrumento ao STJ.

Possíveis dúvidas sobre a forma de sobrestamento dos recursos especiais preteridos, são elucidadas pela leitura do art. 1º, § 3º, da Resolução n. 8, que permite o sobrestamento por simples petição nos autos.

Interessante constatar o indicativo legal234 de que, após a publicação do acórdão do STJ, os recursos especiais sobrestados na origem serão novamente examinados pelo tribunal a quo na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça. Inicialmente o imperativo soa no mínimo curioso à presença do princípio da independência dos juízes. No entanto, apesar de a independência encontrar-se “indissoluvelmente ligada à própria noção de Estado constitucional”235, deverá ser avaliado de modo associado a outros valores como o caráter social das decisões, que busca assegurar não apenas as garantias individuais, mas, sobretudo, a segurança jurídica. Desse entendimento Cândido Dinamarco comentado por Osmar Côrtes: “[...] Nos últimos tempos, vem ganhando força a convicção do poder que o juiz tem de adaptar seus julgamentos às realidades sociais, políticas e econômicas que circundam os litígios postos em juízo [...]”236.

Há, ainda, a previsão de que, caso seja mantida decisão oposta a do Superior Tribunal, far-se-á juízo de admissibilidade do REsp. Ora, parece evidente que a decisão do STJ à análise desse recurso especial é absolutamente previsível, pois tendo o Tribunal Superior decidido matéria análoga, aplicará a jurisprudência alcançada no recurso piloto. No mesmo sentido João Moreno Pomar, para quem a decisão do recurso paradigma terá efeito vinculante.

[...] efeito que está previsto no § 8º do novo artigo, instala-se o comando de que a decisão proferida nos recursos pilotos - os que sobem ao STJ - terá efeito vinculante aos recursos sobrestados - os que permanecem no tribunal de origem; pois o juízo de admissibilidade a que se refere aquele parágrafo, com a vênia devida, visa verificar se a matéria recursal é conexa àquela da controvérsia julgada no acórdão paradigmal, caso em que estará tolhido o seguimento do recurso especial que foi qualificado pelo acórdão divergente. A constitucionalidade, neste aspecto, está comprometida pela limitação de competência estabelecida pelo art. 103-A ao Supremo Tribunal Federal. 237 (Grifamos).

À mesma ideia filia-se J. J. Calmon de Passos, ponderando a função das decisões dos tribunais superiores em relação aos demais tribunais de outras instâncias, em razão da vinculação das decisões daqueles sobre esses.

O tribunal, ao fixar diretrizes para seus julgamentos, necessariamente os coloca, também, para os julgadores de instâncias inferiores. Aqui, a força vinculante dessa decisão é essencial e indescartável, sob pena de retirar-se dos tribunais superiores precisamente a função que os justifica. Pouco importa o nome de que ela se revista – súmula vinculante, jurisprudência predominante, uniformização de jurisprudência ou o que for – obriga. Um pouco à semelhança da função legislativa, põe-se, com ela, uma norma de caráter geral, absoluta, só que de natureza interpretativa [...]. 238

Não obstante, há que se recordar que apesar da previsão de tornar vinculante as decisões dos recursos paradigmas no novo CPC, em verdade, atualmente inexiste tal força.

  1. Filtros Recursais frente aos Princípios Processuais Constitucionais

A inserção dos filtros recursais, movimento crescente e formador de um novo paradigma processual, trouxe ao ordenamento pátrio questionamentos quanto à ofensa aos princípios processuais constitucionais. Frente ao obstáculo dos filtros recursais à livre deliberação do juiz nos julgamentos de casos concretos poder-se-ia afirmar ofensa a princípios como duplo grau de jurisdição, devido processo legal, contraditório, ampla defesa.

No que concerne ao duplo grau, interessante notar os argumentos de Oreste Nestor Laspro239 quanto à inadequação do termo “duplo grau de jurisdição”. Segundo o autor a discordância se deve a ausência de pluralidade de jurisdição, mas a possibilidade de reexame das decisões. Acrescenta que jurisdição consiste em uma das projeções do poder soberano, sendo, portanto, um contra-senso o termo, que denota a existência de mais de uma jurisdição.

Ora, se fosse a intenção do legislador constitucional - ao prever os recursos aos tribunais superiores – garantir o direito ao recurso de apelação, não teria ele aberto a possibilidade da interposição de recurso extraordinário contra decisão de primeiro grau de jurisdição. Na realidade, quando a Constituição garantiu o recurso extraordinário contra decisão de primeiro grau, afirmou que o direito ao duplo grau não é imprescindível ao devido processo legal. 240

Em tese, poder-se-ia afirmar que o duplo grau de jurisdição é garantia absoluta. Entretanto, tal afirmação carece de fundamento. Contenda sobre a constitucionalidade ou não do disposto no § 3º do art. 515 do CPC241 pode contribuir para a solução do problema. Ivo Dantas242 elenca duas maneiras de se analisar o duplo grau sobre a égide do referido parágrafo. Caso conclua ser o duplo grau uma garantia constitucional haverá, portanto, absoluta inconstitucionalidade no parágrafo mencionado frente ao disposto no art. 60, § 4º, inciso IV, da Carta Magna243, cabendo sempre a interposição de recursos que somente deveram ser julgados por juízo de grau superior. Todavia, caso a adequação do duplo grau seja como princípio processual, entender-se-á pela possibilidade de supressão do julgamento por juízo superior, e, por conseguinte, pela constitucionalidade do § 3º do art. 515 do CPC. Orione Neto244 apóia o entendimento de que a mitigação ao duplo grau não enseja inconstitucionalidade do disposto no § 3º do art. 515 do CPC. De igual modo assevera que o propósito foi o de “enaltecer o valor celeridade processual”. No mais, duplo grau não figura dogma absoluto ante ao propósito do provimento jurisdicional em tempo hábil. Dessa análise resulta ser o duplo grau de jurisdição um princípio processual, aliás, como já disposto anteriormente, não figura garantia absoluta.

Apesar de o duplo grau de jurisdição encontrar-se previsto na Carta Política, o mesmo não é requisito ao devido processo legal. Desse entendimento Araken de Assis, para quem a ausência de reexame da decisão não macula o processo. Afirma que o “duplo grau concilia, em termos práticos, as necessidades simultâneas de restaurar a paz social perturbada pelo litígio e, malgrado a utopia, de fazer justiça”.

Os meios e recursos inerentes à ampla defesa, e explicitamente mencionados no art. 5º, LV, da CF/1988, limitam-se àqueles instituídos pelo legislador ordinário. Os princípios do devido processo legal e do duplo grau não se mostram interdependentes, nem há relação de continência entre o último e o primeiro, cabendo-se um processo com as garantias básicas do primeiro sem o reexame obrigatório de todos os atos decisórios. [...]245

Araken246 aparentemente defende a tese da efetividade e da duração razoável do processo sobre o duplo grau de jurisdição. Contudo, não obstante o imperativo daqueles princípios ante ao atual movimento processual, faz menção à inocência do duplo grau frente à sentença de mérito e à apelação. Entende que nesses casos não há que se cogitar a supressão do apelo ante a razoável duração do processo.

Por outro lado, a exemplo do disposto no § 3º do art. 515, quanto à incidência do duplo grau ao referido parágrafo verifica-se que se não há o imperativo de regresso dos autos ao juízo a quo, possibilitando ao tribunal ad quem julgar desde logo a lide. Logo, não há também quanto à aplicação dos filtros recursais. A impossibilidade recursal frente à súmula vinculante, à repercussão geral, às súmulas impeditivas de recursos, ou aos recursos repetitivos não fere garantias constitucionais.

De outra banda, ao observar a autoridade do devido processo legal ante aos filtros recursais, atenta-se para a visão de que esse princípio consiste, em verdade, em sobreprincípio que se subdivide em outros, como o princípio do contraditório e o da ampla defesa. Conforme disposto, a ampla defesa ocorre de forma subjetiva e o contraditório objetivamente, ou seja, a ampla defesa é a ideia e o contraditório o fato. Ângelo Pariz afirma que “o princípio do devido processo legal é o gênero do qual todos os demais princípios constitucionais processuais são espécies”247. O autor faz relação entre o princípio e a justiça, como garantia aos cidadãos a um processo com decisão justa, equilibrada e razoável.

Verifica-se daí, que o devido processo legal deve ser sopesado frente os princípios da supremacia do interesse público sobre o interesse privado (princípio da proporcionalidade) e o da efetividade social do processo. Aliás, nesse sentido a doutrina de Ângelo Pariz, para quem o devido processo legal e a ampla defesa não devem servir de refúgio à demora na prestação jurisdicional.

Por ser uma garantia processual do cidadão, de natureza essencial e fundamental, o princípio da ampla defesa merece ser cultivado com todas as suas características, mas deve-se evitar que a plenitude de sua extensão provoque a demora na prestação jurisdicional e acarrete o abuso de direito de defesa. Ora, as garantias processuais fundamentais do cidadão atuam como forma de proteção das liberdades jurídicas. Assim, a grande questão que se coloca em relação ao contraditório é pertinente à demora irrazoável na duração do processo para se obter uma prestação jurisdicional eficiente, o que exige a superação das causas materiais geradores da intrigante atraso processual. 248

Infere-se, dessa feita, que se pode ter “um processo obediente ao princípio do devido processo legal sem que haja, necessariamente, previsão do duplo grau de jurisdição. Permite-se, portanto, o estabelecimento de um sistema de reexame restrito sem qualquer ofensa às garantias constitucionais processuais”249. É nesse diapasão o disposto no REsp 495.808-ES250, nas palavras do relator, ministro José Delgado, para quem “a inexistência da garantia constitucional ao Duplo Grau de Jurisdição permite que sejam estabelecidas regras de admissibilidade dos recursos judiciais, limitando ou mesmo impedindo a possibilidade de recorrer, sem que isto represente violação à Carta Magna”.

Cabe esboçar que a Reforma do Judiciário, instituída principalmente pela EC n. 45, de 2004, procurou fomentar a celeridade e a efetividade processual consagrando o princípio da eficiência processual. Em tese, o que se deve buscar é a solução judicial num prazo razoável.

Resta provado, portanto, que “não existem princípios absolutos, pois uma pluralidade de valores deve e merece uma compatibilização e ponderação. A existência de conflitos de princípios apenas sugere o privilegio do acatamento de um, sem que isso signifique o desrespeito do outro”251.

  1. Filtros Recursais: engessamento do Poder Judiciário ou efetiva celeridade processual, um projeto para o novo CPC

O sistema de filtros recursais foi gerado no sentido de se instituir barreiras aos inúmeros recursos interpostos com o mero intuito protelatório. Em tese não haveria quaisquer ofensas a direitos ou garantias processuais. No entanto, esse é tema deveras complicado à análise instantânea. Somente o tempo poderá responder tal questionamento.

Em 2004, prestes a aprovação da Emenda Constitucional nº 45, o então Presidente Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Busato252, indicou ser a súmula vinculante verdadeiro retrocesso e fator de engessamento do Poder Judiciário. Argumentava Busato que esse mecanismo criado pelo Direito anglo-saxão não serviria para o Direito brasileiro, primeiro pela ampla diversidade social e regional do Estado nacional, e segundo, pela situação de prejudicialidade à independência dos juízes. Mesmo argumento e análise fez quanto à repercussão geral, instrumento do STF para bloquear processos que não apresentem interesse nacional ou matéria relevante.

Em sentido contrário o ministro Gilmar Mendes253, para quem tanto a súmula vinculante, quanto a repercussão geral buscam melhorar o Poder Judiciário como um todo, já que aquela procura solucionar o excesso de casos repetitivos, e esta obstar aqueles que não demonstrem relevância. Ao ministro releva notar a impossibilidade de engessamento a exemplo da súmula vinculante, frente à adoção de mecanismos contínuos e eficientes de revisão.

Apesar de a OAB inicialmente manter-se contrária à súmula vinculante, foi a instituição que inaugurou a classe processual vigente. A primeira Proposta de Súmula Vinculante (PSV) foi, justamente, ajuizada em 20 de novembro de 2008 na Corte pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, e entregue pessoalmente pelo então presidente da Ordem, Cezar Britto, ao ministro Gilmar Mendes. Interessante notar a adoção dos procedimentos da Lei nº 11.417, que resultaram na 14ª Súmula Vinculante. Para a elaboração, ou mesmo a aprovação de súmula vinculante há a manifestação da Procuradoria Geral da República, e ainda, a abertura do prazo de dez dias, conforme disposto no § 2º do art. 3º da Lei nº 11.417/06, para que quaisquer terceiros interessados possam se manifestar. No presente caso houve manifestação contrária por parte do Procurador-geral da República, e manifestação de terceiros, resultando na aprovação e edição da 14ª Súmula Vinculante, em 2 de fevereiro de 2009: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.” Aparentemente a adoção de procedimentos legais à edição de súmula vinculante garante segurança jurídica aos interessados.

Cumpre ressaltar a doutrina da ministra Ellen Gracie no que concerne à presença da conveniência e oportunidade indispensáveis nos procedimentos da Corte para a edição de súmula vinculante. Segundo a Ministra, há que se percorrer todo iter processual, pois a finalidade da súmula vinculante é o estabelecimento da segurança jurídica, para “que a interpretação dada pelos Tribunais e pela Suprema Corte seja uma só a respeito de determinada matéria de direito”254. Atualmente existem 31 súmulas vinculantes255 que tratam de diversos temas de interesse público e resultam da grande massa de processos.

A repercussão geral consiste noutro importante filtro recursal, verdadeiro pressuposto de admissibilidade dos recursos extraordinários interpostos no STF. Como anteriormente disposto, a inexistência da repercussão geral apresentada formalmente em preliminar dos recursos extraordinários interpostos de acórdãos publicados após 3 de maio de 2007 – data da publicação da Emenda Regimental n. 21, de 30 de abril de 2007-, resultarão na inadmissão dos mesmos. Outro será o resultado quando forem interpostos de acórdãos anteriores a essa data. Nesses casos os recursos serão admitidos e remetidos ao STF para distribuição e julgamento. Logo, o filtro atingirá apenas os recursos extraordinários interpostos após 30 de maio de 2007.

Afirma-se que a principal finalidade da repercussão geral é uniformizar a interpretação constitucional através de processos representativos encaminhados ao STF, que detém competência exclusiva à análise de sua existência. Nesse sentido, na busca de tornar mais célere tais análises, em regra, a apreciação ocorre via plenário virtual, ou seja, a “apreciação da presença ou não da repercussão geral das questões constitucionais ainda não decididas ou sem jurisprudência dominante no STF [...]”256 dar-se-á em meio virtual. Todavia, há exceção, p. ex., quando presentes “matérias com jurisprudência dominante no STF deverão ter análise [...] em decisão plenária, via Questão de Ordem, onde se poderá propor a reafirmação da jurisprudência”257.

Recentes relatórios do STF reafirmaram o empenho em assegurar celeridade ao andamento processual da Corte, ressaltando, sobretudo, a importância dos institutos súmula vinculante e repercussão geral ao intento.

Para se ter uma ideia do empenho do Tribunal para assegurar celeridade ao andamento processual na Corte, em 2009, no total, foram julgados cerca de 115 mil processos, muitos deles sobre assuntos que despertaram o interesse de boa parte da população [...].

Esse trabalho contou com uma ferramenta importantíssima, o e-STF, sistema eletrônico que possibilita o protocolo de petições no Supremo por meio virtual, conferindo maior agilidade na entrada e distribuições de processos. E contou ainda com a rapidez proporcionada pelos institutos da repercussão geral e da súmula vinculante. O resultado foi a redução no número de processos em trâmite na Corte, a edição de 13 novas súmulas vinculantes e a diminuição no número de processos distribuídos. 258

Parece evidente o alcance da celeridade almejada na criação dos institutos. No mais, há a possibilidade de um mesmo RE tratar de duas matérias com previsão de repercussão geral259. Há, ainda, a inexistência de repercussão em matérias infraconstitucionais e o sistema totalmente informatizado do Plenário Virtual260, que garante celeridade e publicidade ao processamento dos recursos extraordinários. Daí a redução de processos à Corte. Em 2010 reconheceu-se a repercussão em cento e noventa e duas matérias, e recusou-se em outras setenta e três261.

No que tange às súmulas impeditivas de recursos, afirme-se que são formas de se impedir a interposição de recursos de apelação quando os acórdãos por eles atacados encontrarem conforme o entendimento das súmulas do STJ e do STF.

Há que se registrar que somente o STJ conta, atualmente, com quatrocentos e quarenta e oito súmulas, e o STF com setecentos e sessenta e sete súmulas, dentre essas trinta e uma vinculantes262. Esse é um número bastante razoável para instrumentos que se apresentam obstáculos aos recursos de apelação. Verifica-se ainda a cobertura praticada sobre os demais recursos, considerando o disposto no art. 557, caput, do CPC, que obsta não apenas quanto às súmulas, mas também quanto à jurisprudência dominante do respectivo tribunal. É evidente a ausência de imposição ao juízo pelo não recebimento da apelação. Mas parece óbvio que o seguimento do recurso, e interposição ulteriores, apenas postergará o resultado presumido. Bruno Dantas alerta, “um juiz que decide contra uma decisão do Supremo é um marcador de ilusões, pois está vendendo ao jurisdicionado a esperança de gozar de um direito que ele não tem, pois o Supremo ou o STJ já disseram que ele não tem. [...]”263. No mais não há diagnóstico ou dados relacionados à pretensa redução dos recursos de apelação.

Já os Recursos Repetitivos, inseridos pela Lei n. 11.672, de 2008, também veem se demonstrando impedimento eficaz. Em breve cotejo analítico constata-se que houve redução de trinta e quatro por cento nos recursos especiais. Desde agosto de 2008 foram mais de duzentos e sessenta processos destacados para julgamento, já em 2009 foi algo em torno de vinte e quatro por cento disso. Ademais, esse filtro tem o condão de eliminar a grande quantidade de recursos idênticos ao STJ.

Após um ano de vigência da Lei 11.672/08, o Guardião da Lei Federal julgou 34% a menos de recursos. Nesse período a Corte julgou 66 recursos especiais pelo novo sistema e outros 115 aguardam análise pelos colegiados da Corte superior, decisões essas que espraiarão seus efeitos nos tribunais do País, trazendo economia processual, agilidade e segurança jurídica. 264

A partir dessa lei há seleção de recursos paradigmas, com idêntica questão de direito, que serão enviados ao STJ para que a demanda seja dirimida e reaplicada nos recursos sobrestados, presentes os princípios da conveniência e oportunidade. O mesmo ocorre com a repercussão geral do RE ao STF.

Nítida é a plena celeridade alcançada pelo sistema de filtros recursais. Curioso constatar que o sistema vem corroborando a mudança no perfil do Judiciário, o que se efetivará com o novo CPC.

Segundo o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante265, as reformas do CPC “procuram compatibilizar o binômio celeridade processual e segurança e devem reduzir as demandas judiciais, diminuir a sensação de impunidade e dar efetividade ao princípio da razoável duração do processo”. O presidente da OAB afirma que o grande beneficiado das reformas será “o cidadão brasileiro, que terá uma justiça mais rápida e sempre com a presença do advogado”. Neste esteio, cabe aferir as reais intenções da inovação processual, que, como observado, aos moldes dos filtros recursais, busca “reduzir as demandas judiciais, diminuir a sensação de impunidade e dar efetividade ao princípio da razoável duração do processo previsto na Constituição Federal”266.

Sob o mesmo fundamento o anteprojeto do CPC traz à tona a possibilidade de se instituir o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. O incidente pretende inibir não apenas recursos repetitivos, mas ações repetitivas, solucionando conflitos de massa. Bruno Dantas explica seu funcionamento.

Imagine que um juiz de Sergipe verifique que determinado assunto tem potencial de se multiplicar. Ele suscita o incidente para o Tribunal de Sergipe, onde o relator vai examinar se esse incidente é ou não admissível. Se o TJ admitir e concluir que é conveniente ter uma decisão única sobre o tema, o presidente da corte determina a suspensão de todos os processos que tramitam no estado, na jurisdição do TJ-SE, comunica ao CNJ, ao STJ ou STF, conforme a matéria seja constitucional ou infraconstitucional. Com a decisão do Tribunal de Justiça, a tese fica localizada no estado, mas cabe RE e REsp. Nestes recursos, a decisão vale para o país inteiro. 267

Por outro lado, deve-se manter com a devida cautela o entusiasmo inicial. O fato de o sistema de filtros recursais encontrar-se em plena aplicação, chegando, inclusive a corroborar a concepção do novo Código de Processo Civil, não deve subverter a plenitude da tutela jurisdicional. Cabe destacar que algumas correntes entendem ser o novel sistema fator de engessamento do Poder Judiciário. Questiona-se se ao molde do que ocorre com a aprovação súmula vinculante, a revisão ou mesmo o cancelamento detêm os mesmos requisitos, quais sejam, o quórum mínimo de dois terços dos membros do tribunal e, mais, a existência de reiteradas decisões, que na revisão ou cancelamento restariam em recursos recorrentes. Nesse caso, tanto a revisão, quanto o cancelamento, ao menos pelos tribunais, seriam obstados pela impossibilidade de interposição de recursos tanto ao juízo de segundo grau, frente ao disposto na Lei n. 11.276/2006, que trata das súmulas impeditivas, quanto os de grau superior, caso da Lei n. 11.672/2008, que dispõe sobre os recursos repetitivos. Há quem argumente que a “aplicação da Súmula Impeditiva de Recursos estaria levando a uma ausência de renovação da jurisprudência de acordo com valores sociais que estão em constante modificação e por conseqüência também às Súmulas dos Tribunais Superiores [...]”268. Todavia, acredita-se que sempre existirão meios legais de revisão e readaptação das normas às atuais circunstâncias da sociedade. O que cabe, portanto, é aguardar o resultado que somente o tempo demonstrará.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

À proporção que ocorreu o desenvolvimento humano e a inserção de um ordenamento jurídico comprometido com o Estado Democrático de Direito surgiram também um conjunto de princípios processuais constitucionais que visavam efetivar, formalmente, o princípio da dignidade da pessoa humana. Na busca de soluções às demandas judiciais, ao processo foram disponibilizados meios legais para que aquele que visse sua pretensão denegada pudesse ter a chance de obter resultado final positivo. Esses meios consistiam em recursos.

Notório enfatizar que os recursos buscam proporcionar ao prejudicado uma segunda chance. Indelevelmente, os recursos cíveis são assaz importantes ao primado do Estado Democrático, e devem ser sopesados como decorrência dos princípios processuais constitucionais e dos princípios recursais fundamentais.

Conforme já assinalado alhures, existe rol taxativo a ser observado quando da escolha do recurso pretendido, e, apesar do disposto no princípio da fungibilidade, a seleção deve ser cautelosa. A análise dos recursos cíveis introduzida no presente trabalho corrobora a afirmação da importância dos recursos visando o respeito aos direitos fundamentais.

De outra banda, as reformas ao processo civil trouxeram ao ordenamento jurídico pátrio meios, que em tese, deveriam tornar o sistema recursal mais célere e justo. Surgiram propostas de reformas que visavam solucionar a denominada “crise do judiciário”. Entre elas a súmula vinculante, as súmulas impeditivas de recursos, a repercussão geral e os recursos repetitivos.

Conforme observado, aparentemente, há o surgimento de uma aldeia global, em que todos os envolvidos estão, de alguma forma, imbuídos na aproximação dos sistemas common law e civil law. Há uma revolucionária introdução de precedentes vinculativos ao ordenamento jurídico nacional. Em movimento contrário, o Estado norte-americano vem transformando o próprio ordenamento, tornando-o misto, instituído pelos precedentes (case law) e normas (statute law). Nesse diapasão, justifica-se a miscelânea, na afirmação de que o sistema de precedentes trará maior segurança jurídica à sociedade. Aliás, o STF já se pronunciou no sentido de que o dissenso jurisprudencial é algo a ser evitado.

Provável questionamento quanto a integral mutação do sistema adotado pelo Brasil, de civil law para common law, frete às súmulas vinculantes, foram devidamente respondidas anteriormente. Súmula vinculante nada mais é que o resultado da interpretação de dispositivo legal. Não é norma, já que ao juiz não cabe instituir normas.

Já as súmulas impeditivas de recursos, apesar de seu efeito precedente, não devem em regra vincular decisões. Contudo, parece manifesto seu efeito vinculativo, ou, pelo menos, a intenção de torná-las vinculativas. A ideia é que se a decisão recorrida embasou-se em súmula do STJ ou do STF, qualquer pretensão recursal terá resultado negativo previsto. Daí seu efeito vinculante.

Noutro giro, tanto a repercussão geral, como os recursos repetitivos funcionam como requisitos de admissibilidade. De fato a repercussão geral possibilita o julgamento dos recursos extraordinários, basta estarem presentes matérias de relevância social, econômica, política ou jurídica. Ao afirmar que aos recursos repetitivos vigora requisito de admissibilidade, de fato quis asseverar que as decisões tomadas nos recursos representativos devem ser aplicadas aos demais recursos sobrestados. Apura-se, portanto, a intenção do legislador em tornar vinculante as decisões, tanto dos recursos extraordinários, quando da repercussão geral, quanto dos recursos repetitivos.

Nesse sentido, o sistema de filtros recursais está em crescente aproveitamento. Já há demonstração de redução de demandas no STF e no STJ. Aparentemente tais barreiras recursais surgiram em benefício da sociedade, que exigia a prestação jurisdicional célere e justa.

Todavia, tais avaliações podem ser precipitadas. O fato de haver, supostamente, redução significativa de recursos interpostos ao STF e ao STJ não significa também que os poucos resultados alcançados sejam justos. Ao obstar o segmento a um recurso sobre o pretexto de que decisão análoga já fora decidida, e deve ser aplicada ao presente caso, se esta afirmando que as causas são exatamente idênticas. Surgem, daí, as dúvidas: Quando uma causa pode ser considerada idêntica, se cada causa é única? E no caso do recurso de apelação, há redução de recursos interpostos?

Ao questionar o porquê de tais alterações no ordenamento pátrio, brotam algumas teses. Há quem afirme que o movimento em busca de solucionar a lentidão e o abarrotamento do judiciário advém do duelo entre o interesse público e o privado. A exemplo, em 2003 um relatório do STF demonstrava que mais de sessenta e cinco por cento de todos os processos autuados possuíam como parte a União ou outro órgão público federal. Logo, o movimento surgiu no sentido de salvaguardar, em tese, esse interesse público. Mas que interesse público? Ressalte-se que muitas vezes a parte adversa constituía-se de pensionistas e aposentados do INSS. Diante de tais considerações releva trazer a tona a doutrina de Alexandre Bahia, “podemos falar também dos Planos Econômicos (Bresser, Verão, Collor I e II, Cruzado e Real), que aqui nos interessam particularmente pela reiterada invocação da supremacia do interesse público como fundamentação à denegação do ressarcimento aos danos causados. [...]”269.

Noutro giro, o fato de bloquear recursos ao juízo de segundo grau, e até aos Tribunais Superiores, não se estaria obstando a renovação de jurisprudências? Será que apesar de os filtros recursais se mostrarem, aparentemente, positivos ante ao rápido resultado pretendido, chegado, inclusive a embasar algumas reformas do próximo CPC, estariam em verdade criando fortes obstáculos recheados de ranço político? Fala-se em segurança jurídica com o pretexto de que o Estado precisa estar preparado para um mundo globalizado e cada vez mais capitalista e competitivo. Julgam-se necessárias diante de investidores. Mas e a sociedade? E o real interesse público?

Eis, a propósito, o anteprojeto do CPC, em franca discussão e elaboração, já demonstrou a possibilidade de criação de mais um filtro, que dessa vez buscará bloquear não apenas recursos, mas ações. Trata do “Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas”. Outra modificação é a eliminação do efeito suspensivo automático do recurso de apelação. Todas essas alterações visam manter e aprofundar a celeridade pretendida. Cumpre gizar, contudo, recente aprovação do Congresso Nacional, Projeto Ficha Limpa do Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral (MCCE), onde realizaram o adverso, conceberam efeito suspensivo aos próprios recursos, dando inclusive prioridade de julgamento, justamente no sentido de postergarem a inelegibilidade. Questiona-se: Esse é o interesse público? É a primazia do interesse público?

Ante a todo o exposto, reafirme-se que a análise dos resultados obtidos da aplicação dos filtros recursais, e, por conseguinte, do sistema de precedentes vinculativos, somente serão concretos com o advento do tempo. Não há, ainda, como afirmar serem tais institutos benéficos à sociedade ou engessadores do Poder Judiciário. O Estado busca uma solução, o que, em tese, poderá estar presente nos referidos institutos. Podem representar o início da evolução social tão almejada por todos, o que somente se verificará posteriormente. Uma boa análise para esse milênio.


REFERÊNCIAS

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Sobre a autora
Silvanusa Rodrigues da Rocha Cruz

Advogada | Founder Ageless (@by.ageless) Graduada em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Pós-Graduada em Direito Penal pelo Centro de Estudos Jurídicos Fortium/Faculdade Projeção. Pós-Graduada em Direito Processual Civil pela Universidade de Santa Cruz do Sul. Pós-Graduada em Direito Imobiliário, Urbanístico, Notarial e Registral pela Universidade de Santa Cruz do Sul. Curso de Extensão Universitária em Formação de Tutores pela Universidade Católica de Brasília Virtual. Curso de Formação para o Exercício da Advocacia pela Escola Superior de Advocacia . Curso de Extensão em Fashion Law (direito da moda) pela PUC-Rio.

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