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Da restrição de acesso às armas aos acusados de violência doméstica.

Agenda 19/03/2024 às 17:51

Pessoas que estão respondendo inquéritos ou processos sobre violência doméstica não podem ter acesso às armas.

RESUMO: O presente artigo aborda a restrição ao porte e à posse de armas de fogo para as pessoas que estão respondendo a processos criminais por atos de violência doméstica.

 

ABSTRACT: This article addresses the restriction on carrying and possession of firearms for people who are facing criminal proceedings for acts of domestic violence.

 

PALAVRAS-CHAVE: Violência Doméstica – Controle de Armas – Restrição de Armas.

 

KEYWORDS: Domestic Violence – Gun Control – Arms Restrictions.

  1. DA IMPOSSIBILIDADE DE ACESSO ÀS ARMAS AOS ACUSADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA.

O Estatuto do Desarmamento dispõe em seu artigo 6º caput que é proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, exceto para os casos previstos na legislação.

O supracitado Estatuto nos diz que para adquirir uma arma de fogo de uso permitido a pessoa interessada deverá, além de especificar a efetiva necessidade, fazer a comprovação de sua idoneidade, apresentando as respectivas certidões negativas de antecedentes criminais (art. 4º, I).

O art. 4º, I é bastante relevante e pode ser um dos fundamentos para vetar o acesso às armas para o cidadão que responde a um processo criminal de violência doméstica, o interessado não atenderá ao mencionado requisito e deverá ter o porte e a posse negados.

Outro importante argumento é encontrado no Atlas da Violência do ano de 2023 confeccionado pelo IPEA, ele é bastante transparente em citar o acesso às armas no âmbito doméstico como potencial risco ao lar destacando um relatório do Instituto Sou da Paz apontando que a arma de fogo é o instrumento mais utilizado nos assassinatos de mulheres no Brasil, vejamos:

Com efeito, conforme já apontamos em outras edições do Atlas da Violência, há consenso na literatura científica de que a difusão de armas aumenta os homicídios. Isso ocorre por meio de três canais causais principais. Em primeiro lugar, uma arma de fogo dentro do lar conspira contra a segurança da própria família, pois faz aumentar as chances de feminicídios e vitimização fatal, em meio a brigas domésticas. Centenas de casos que ilustram esse fenômeno têm aparecido de forma maciça na imprensa. O Instituto Sou da Paz produziu um relatório em que mostrou que a arma de fogo é o instrumento mais utilizado nos assassinatos de mulheres no Brasil (Instituto Sou da Paz, 2022). De acordo com o documento, metade dos feminicídios ocorridos entre 2012 e 2020 envolveram armas de fogo. (ATLAS DA VIOLÊNCIA, 2023, p. 103).

Considerando que o acesso às armas aumenta o risco do lar e que é o instrumento mais utilizado para vitimar as mulheres, não faz sentido autorizar o porte e a posse para quem já responde ou respondeu um processo de violência doméstica, esse cidadão não pode ter arma, pois o seu histórico é desfavorável e o armamento no seu lar será um problema e não uma solução.

E que não se argumente que há necessidade de aguardar o trânsito em julgado da ação penal, o art. 4º, I do Estatuto do Desarmamento é bastante transparente em exigir uma certidão negativa, sendo positiva, não há o cumprimento do requisito lá exposto, devendo ser negado o acesso ao armamento.

E para os casos nos quais o armamento já foi entregue ao agressor no passado, nada impede que seja concedida uma medida protetiva consubstanciada na suspensão da posse ou restrição do porte nos termos do art. 22, I da Lei Maria da Penha.

Desde já rechaçamos qualquer argumentação de que a medida protetiva é uma sanção penal antecipada, a doutrina é clara em afirmar que “As medidas protetivas não têm natureza de sanção penal” (SILVA, 2022, p. 510).

Deve ser destacado que o art. 22, I da Lei Maria da Penha se aplica aos policiais, militares e outros servidores ligados à segurança pública. Cito um caso real apreciado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios:

PENAL E PROCESSO PENAL. LEI MARIA DA PENHA. MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA. SUSPENSÃO DA POSSE DE ARMA DE POLICIAL MILITAR. REQUERIMENTO EXPRESSO DA VÍTIMA PELA SUSPENSÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. RECLAMAÇÃO DESPROVIDA.

1. Havendo indícios mínimos da prática de fato típico em contexto de violência doméstica e de requerimento expresso da vítima pela suspensão da posse/porte de arma do agressor, que é policial militar, mantém-se a decisão do Juízo Reclamado que, nos autos da Medida Protetiva de Urgência, determinou motivadamente a suspensão da posse de arma do Reclamante.

2. A Lei Maria da Penha estabelece, entre as medidas protetivas de urgência, a suspensão da posse ou restrição do porte de armas, bem como autoriza a apreensão imediata da arma de fogo sob posse do agressor, consoante disposição dos artigos 18, inciso IV, e 22, inciso I.

3. Reclamação Criminal desprovida. (TJDFT, Rcl 07516160620208070000, DJe: 22/3/2021).

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Igualmente favorável temos a Recomendação nº 115/2021 do CNJ assinada pelo Ministro Luiz Fux, sendo o seu artigo 1º expresso em dispor sobre a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor (inciso I) e a aplicação também imediata da medida protetiva de urgência de suspensão da posse ou restrição do porte de armas (inciso II).

No mais, como destacado pelo IPEA, a arma é um fator de risco nos lares e é o meio mais utilizado para ceifar a vida das mulheres com fulcro em um relatório do Instituto Sou da Paz.

  1. CONCLUSÃO.

Diante do exposto, não há dúvidas que a manutenção do armamento ou a sua concessão aos que respondem ou já responderam a um processo de violência doméstica é uma decisão equivocada.

No mais, defendemos a não necessidade do trânsito em julgado para a proibição de acesso ao armamento, visto que o art. 4º, I do Estatuto é bastante cristalino e claro em exigir a certidão negativa, uma vez positiva, não há direito à arma.

E para aqueles que já possuem armas, a suspensão da posse ou restrição do porte é a medida de rigor nos termos do art. 22, I da Lei Maria da Penha, tal disposição se aplica também aos policiais, militares e outros servidores públicos.

REFERÊNCIAS.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Reclamação Criminal n. 07516160620208070000, Relator: JOÃO TIMÓTEO DE OLIVEIRA, Data do Julgamento: 11/03/2021, T2 – SEGUNDA TURMA CRIMINAL, Data de Publicação: 22/03/2021.

CERQUEIRA, Daniel; BUENO, Samira (coord.). Atlas da violência 2023. Brasília: Ipea; FBSP, 2023. DOI: https://dx.doi.org/10.38116/riatlasdaviolencia2023.

SILVA, Márcio Alberto Gomes. Leis Penais e Processuais Comentadas: 21 Leis Mais Cobradas em Concursos Públicos para Carreiras Policiais, São Paulo: Editora JusPODIVM, 2022.

Sobre o autor
João Vitor Rossi

Advogado especializado em Direito Tributário e Imobiliário, com registro na OAB-SP nº 425.279. Possui MBA Executivo em Direito, Negócios e Operações Imobiliárias, especialização em Direito Imobiliário e Direito Processual Civil, que lhe proporciona uma visão ampla e estratégica para a resolução de problemas complexos e a liderança de equipes jurídicas de alta performance. Com experiência reconhecida no setor . Autor de diversas publicações em revistas jurídicas renomadas e responsável por casos de destaque na mídia, João Vitor Rossi está à frente de seu escritório, comprometido com a entrega de soluções inovadoras e eficazes para os seus clientes.

Informações sobre o texto

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