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ADO no Sistema de Freios e Contrapesos? ADO 20

Agenda 20/03/2024 às 18:24

É notório o conhecimento de que as funções do nosso Estado brasileiro são exercidas pelos três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário. Tal conceito nasceu da “Teoria da Separação dos Três Poderes” criada por Montesquieu descrita em sua obra “O Espírito das Leis”. Nesta, o Estado fica sob a regência das atividades dos três poderes segundo suas peculiaridades, quais sejam, o Legislativo cria as leis, o Executivo administra segundo as diretrizes das leis e o Judiciário garante a aplicação das leis.

 

Perceba que nesse sistema, o Estado não é regido por um único ente, ele é dividido entre os poderes, onde através de suas atribuições acaba ocorrendo uma fiscalização mútua entre eles, por exemplo, o Legislativo fiscaliza os atos do Executivo através dos Inquéritos Parlamentares que, quando concluído, observando o descumprimento da lei, encaminha ao Judiciário para garantir sua aplicação. No mesmo sentido, o Executivo pode criar regras através do Decreto Executivo com vigência provisória, podendo após o período ser convalidado pelo Legislativo, se tonando ao final uma lei. Em outro momento, o Legislativo pode criar determinada norma para suprir uma necessidade da sociedade recorrente nos julgamentos das ações no Judiciário, observado através de muitas demandas com temas comuns e não supridos pela legislação vigente.

 

A Constituição Federal (CF) é a referência para o exercício das atividades dos três poderes, ou seja, nenhum ato praticado pelos poderes pode ser inconstitucional, sejam as leis criadas pelo Legislativo, ou os Decretos Executivos e até mesmo as decisões do Judiciário. Apesar de a Constituição ser uma criação do Poder Legislativo, é o Poder Judiciário que exerce sua defesa através do chamado “controle de constitucionalidade” por duas vias: a difusa, onde qualquer órgão do judiciário nos diferentes âmbitos inibe a inobservância da constituição nas demandas; e a concentrada, onde o controle é exercido diretamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), conforme artigos 101 e seguintes da CF.

 

Sobre o controle concentrado, existem quatro ações, das quais podem ser propostas por entes da sociedade e do Estado e decididas por maioria de votos pelo Plenário ou Órgão Especial do STF, são elas: a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), ambas previstas na Lei nº 9.698/1999; a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) prevista na Lei nº  9.882/1999; e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) cujo procedimento foi inserido pela Lei nº 12.063/2009 no texto da Lei nº 9.698/1999. Nas três primeiras ações (ADI, ADC e ADPF) procura-se inibir a inconstitucionalidade causada pela ação do infrator constitucional, já em relação ao último (ADO), ele trabalha na omissão, algo que não existe no plano legislativo, mas que deveria haver em nosso ordenamento jurídico.

 

A harmonia entre os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário existe pelo Sistema de Freios e Contrapesos que “consiste no controle do poder pelo próprio poder, sendo que cada Poder teria autonomia para exercer sua função, mas seria controlado pelos outros poderes” (PISKE, ORIANA e SARACHO, ANTÔNIO. Considerações sobre a Teoria dos freios e contrapesos, 2018. Disponível em https://www.tjdft.jus.br. Acesso em 14 fev. 2024). Existe pelo simples fato de impedir abusos de poder, sendo que observando esta conceituação, difícil imaginar a aplicação da ADO, porque ela trabalha na omissão, ou seja, não impede a ação do infrator constitucional no exercício de suas funções, mas sim estimula a criação de uma norma jurídica em virtude dos preceitos constitucionais existentes.

 

A dinâmica da ADO consiste no impedimento do Poder Judiciário criar a norma diante do caso concreto, vez que esta não é sua função, tal ocorre em razão da ineficiência do Poder Legislativo, onde através de seus representantes não são capazes de identificar toda a necessidade social para a criação e existência de determinada norma.  

 

Em recente decisão publicada no mês de dezembro de 2023, houve a procedência pelo Plenário do STF na ADO 20, que determinou que o Congresso Nacional sanasse em 18 (dezoito) meses, contados da publicação da Ata de julgamento, a omissão apontada no art. 7º, XIX, da CF, sob pena do próprio Tribunal fazê-lo. Nesta ação, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) argumenta que não houve lei regulamentando a licença-paternidade, apesar desta estar prevista no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), no art. 10, § 1º, onde define 5 (cinco) dias. Com isso, o período da licença pode aumentar, já que a licença-maternidade atual é de 120 (cento e vinte) dias.    

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No caso descrito acima, a CNTS apontou a omissão no art. 7º, XIX da CF que prevê “licença-paternidade, nos termos fixados em lei” como direito do trabalhador. Até então, não houve regulamentação por lei, mas sim a menção do período da licença no ADCT em seu art. 10, §1º. Ocorre que a ADCT existe para disciplinar a transição legal entre a CF 1969 e 1988 e não ditar regras dos direitos trabalhistas, ou seja, é parte complementar da CF.

 

Veja que o Legislador não seguiu a exigência constitucional para a regulamentação da licença-paternidade, utilizou-se de ferramenta legislativa inadequada para fazer valer tal direito previsto na CF. Impressionante como por mais de 30 (trinta) anos de vigência da CF de 1988, nenhum membro do Legislativo viu a necessidade de regulamentar um direito constitucional.

 

Por estas razões se justifica a existência de ferramenta de controle constitucional, justamente para suprir a ausência dos atos a serem exercidos por determinado poder diante de uma necessidade social. Isso demonstra que o sistema de freios e contrapesos pode trabalhar tanto na ação, como na omissão inconstitucional. O único problema é que o acesso aos procedimentos não é para todos, vez que a ADI, ADC, ADPF e ADO só podem ser ajuizados pelas pessoas e entidades descritas no art.2º da Lei nº 9.868/1999 e não por qualquer cidadão brasileiro.

Fontes:

https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/artigos-discursos-e-entrevistas/artigos/2018/consideracoes-sobre-a-teoria-dos-freios-e-contrapesos-checks-and-balances-system-juiza-oriana-piske

https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-temporarias/parlamentar-de-inquerito

https://www.al.sp.gov.br/repositorio/bibliotecaDigital/358_arquivo.pdf

https://www.cnj.jus.br/cnj-servico-como-funciona-o-controle-de-constitucionalidade/

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm#:~:text=Art.%20101.%20O%20Supremo%20Tribunal%20Federal%20comp%C3%B5e%2Dse%20de%20onze%20Ministros%2C%20escolhidos%20dentre%20cidad%C3%A3os%20com%20mais%20de%20trinta%20e%20cinco%20e%20menos%20de%20setenta%20anos%20de%20idade%2C%20de%20not%C3%A1vel%20saber%20jur%C3%ADdico%20e%20reputa%C3%A7%C3%A3o%20ilibada.

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9868.htm

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9882.htm#:~:text=LEI%20No%209.882%2C%20DE%203%20DE%20DEZEMBRO%20DE%201999.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20o%20processo%20e,102%20da%20Constitui%C3%A7%C3%A3o%20Federal.

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12063.htm

https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4288299

Sobre o autor
Rogério Alves

Advogado Graduado no Centro Universitário Nove de Julho - 2004. Especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito - 2007. Advogado parceiro da Buratto Sociedade de Advogados e Shilinkert Sociedade de Advogados. Palestrante do Departamento de Cultura e Eventos da OAB Seção São Paulo – Instagram: @rogerioalvesadv – E-mail: rogerio.alves.adv@gmail.com – Site: www.rogerioalvesadvblog.wordpress.com - Tel/WhatsApp: (11) 2367-1890.

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