A USUCAPIÃO é um instituto jurídico que visa a aquisição da propriedade (móvel ou imóvel) mediante o preenchimento de requisitos específicos exigidos por Lei de acordo com a modalidade pretendida. Como sempre explicamos aqui, dentre os requisitos (e o mais falado deles é o tempo, que tem grande variação, indo de 02 a 15 anos atualmente) está a "COISA HÁBIL". É importante ter em mente que nem todas as coisas podem ser usucapidas; o clássico exemplo tem base na Constituição Federal que fala no par.3º do artigo 183 e no par. único do artigo 191 da expressa vedação da Usucapião para os IMÓVEIS PÚBLICOS.
A conceituação dos bens públicos que acolhemos aqui é do clássico professor HELY LOPES MEIRELLES (Direito Administrativo. 1998) para quem,
"Bens públicos, em sentido amplo, são todas as coisas, corpóreas ou incorpóreas, imóveis, móveis e semoventes, créditos, direitos e ações, que pertençam, a qualquer título, às entidades estatais, autárquicas, fundacionais e paraestatais".
Nos casos de Usucapião não será diferente dos demais casos de regularização imobiliária: devemos analisar a MATRÍCULA IMOBILIÁRIA atualizada, expedida pelo Cartório do RGI; não será raro nos depararmos então nesse momento com casos envolvendo imóveis ainda titularizados por Sociedades de Economia Mista como a "CEHAB" aqui no Rio de Janeiro (havendo muitos outros casos em outros Estados como COHAB em São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso, por exemplo). A grande questão é identificar, sem prejuízo dos demais requisitos para a usucapião que devem estar preenchidos e comprovados, se nos bens ainda titularizados por exemplo pela CEHAB/RJ será possível a Usucapião (tanto judicial quanto extrajudicial).
A bem da verdade, os bens dessas Pessoas Jurídicas, em que pese serem instituídas pelo Poder Público, podem estar suscetíveis aos efeitos da USUCAPIÃO, como inclusive há muito confirmado pelo STJ ( REsp 37.906/ES. J. em 29/10/1997, por exemplo). A compreensão deve ser iniciada pelo conceito das "Sociedades de Economia Mista" e aqui nos socorremos da lição dos ilustres professores MARCELO ALEXANDRINO e VICENTE PAULO (Direito Administrativo Descomplicado. 2015):
"É possível definir sociedades de economia mista como pessoas jurídicas de direito privado, integrantes da administração indireta, instituídas pelo Poder Público, mediante autorização de lei específica, sob a forma de sociedade anônima, com participação obrigatória de capital privado e público, sendo da pessoa política instituidora ou de entidade da respectiva administração indireta o controle acionário, para a exploração de atividades econômicas ou para a prestação de serviços públicos".
A natureza jurídica de direito privado das Sociedades de Economia Mista (como a CEHAB e as COHAB) além da possibilidade de utilização, oneração e alienação dos seus bens autoriza a concepção de que seus bens são suscetíveis de Usucapião, não sendo outra a opinião do Professor BENEDITO SILVÉRIO RIBEIRO (Tratado de Usucapião. 2012), grande especialista no assunto:
"(...) Portanto, os bens formadores do patrimônio de empresas paraestatais desse jaez podem, em tese, ser objeto de usucapião, uma vez que ALIENÁVEIS, submetidos, enfim, a toda forma legítima de aquisição. As empresa públicas, dentre elas as SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA, segundo vêm firmando nossos pretórios, têm inequívoca natureza jurídica de DIREITO PRIVADO, aplicando-se-lhes não a prescrição quinquenária, mas a de maior prazo do Código Civil (art. 205)".
Fica, portanto, evidenciado que, preenchidos os demais requisitos legais não deverá ser óbice o fato de imóvel pertencer ainda na origem registral a uma Sociedade de Economia Mista como a CEHAB/RJ, por exemplo, de modo que tanto na via judicial quanto na via extrajudicial (sem processo judicial, diretamente no Cartório de Notas e no Cartório do RGI, através de Advogado) poderá ser exitosa a pretensão de aquisição da propriedade imobiliária via USUCAPIÃO, como confirma a jurisprudência do TJRJ:
"TJRJ. 00238309320008190000. J. em: 05/12/2000. PROCESSUAL CIVIL - USUCAPIAO - CEHAB/RJ - POSSIBILIDADE. CARÊNCIA DE DIREITO INEXISTENTE. 1. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA É PESSOA JURIDICA DE DIREITO PRIVADO E POR ISSO O SEU PATRIMÔNIO, AINDA QUE TRANSFERIDO DE ENTE PÚBLICO QUE A CRIOU, É PRIVADO PORTANTO SUJEITO A SER USUCAPIDO, NÃO EXISTINDO A ALEGADA CARÊNCIA DE DIREITO. 2. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO".