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Ineficácia do Sistema Carcerário no Brasil

RESUMO

O artigo proposto visa analisar três temáticas interligadas: Carandiru, o Sistema Carcerário Brasileiro e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Este apresentará um breve resumo do incidente ocorrido no Complexo Penitenciário do Carandiru, destacando sua relevância histórica. Em seguida será explorado sobre Sistema Carcerário Brasileiro, enfocando as condições de vida dos detentos, a desigualdade social dentro das prisões e as consequências resultantes do atual modelo carcerário. Posteriormente, será analisada a crise no sistema carcerário, destacando a corrupção institucional e a necessidade urgente de reformas estruturais para lidar com os problemas sistêmicos. E por fim será discutido o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, ressaltando a importância da ressocialização como ferramenta de transformação e a criação de oportunidades para os indivíduos que cumprem pena, visando uma sociedade mais justa e inclusiva. O intuito desse trabalho é oferecer uma análise crítica e abrangente dessas temáticas, com o objetivo de destacar a necessidade de mudanças significativas no sistema carcerário brasileiro em consonância com os princípios fundamentais de dignidade e justiça social.

Palavras-chaves: Carandiru; Sistema Carcerário Brasileiro; Dignidade da Pessoa Humana;

ABSTRACT

The proposed article aims to analyze three interconnected themes: Carandiru, the Brazilian prison system and the principle of human dignity. This will present a brief summary of the incident that occurred at the Carandiru Penitentiary Complex, highlighting its historical relevance. Next, the Brazilian Prison System will be explored, focusing on the living conditions of inmates, social inequality within prisons and the consequences resulting from the current prison model. Subsequently, the crisis in the prison system will be analyzed, highlighting institutional corruption and the urgent need for structural reforms to deal with systemic problems. And finally, the principle of human dignity will be discussed, highlighting the importance of resocialization as a tool for transformation and the creation of opportunities for individuals serving sentences, aiming for a more just and inclusive society. The purpose of this work is to offer a critical and comprehensive analysis of these themes, with the aim of highlighting the need for significant changes in the Brazilian prison system in line with the fundamental principles of dignity and social justice.

Keywords: Carandiru; Brazilian Prison System; Dignity of the Human Person;

INTRODUÇÃO

O tema é altamente relevante, considerando a crise carcerária no país. Torna-se evidente a crescente necessidade de incentivar a ressocialização e o emprego dos detentos dentro das prisões, além de proporcionar uma infraestrutura física adequada para o cumprimento da lei. Isso inclui acesso a serviços médicos, educacionais, jurídicos e psicológicos, sem negligência os direitos humanos dos indivíduos encarcerados, frequentemente esquecidos como cidadãos.

É sabido que são tratados constantemente na sociedade brasileira, o tema violência e todas as suas ramificações. Embora haja amplas discussões sobre o assunto, estas geralmente não resultam em mudanças substanciais no panorama social e uma das problemáticas mais significativas relacionadas a esse tema tem sido negligenciada, que é o sistema carcerário e suas consequências.

É crucial examinar como a aplicação da lei está sendo ignorada e suas consequências para a sociedade como um todo. A Constituição e as leis brasileiras são reconhecidas por sua abordagem avançada em questões humanitárias. No entanto, sofrem de uma lacuna entre teoria e prática, resultando em repetidas aparições do Brasil nos tribunais internacionais.

Apesar de garantirem a dignidade humana desde o primeiro artigo da Constituição, a realidade mostra uma frequente ignorância desses princípios. A Legislação, que deveria ser um farol de direitos humanos, muitas vezes não consegue ser plenamente eficaz em sua execução, especialmente no que diz respeito ao sistema carcerário e às medidas posteriores à condenação.

A Sociedade já está habituada a ver imagens de cadeias e penitenciárias superlotadas, onde os detentos são submetidos a um tratamento degradante, onde os direitos constitucionais são violados e a Lei de Execução Penal (Lei N.7210, de 11 de julho de 1964) é frequentemente ignorada. Essa negligência atingiu um ponto crítico, levando ao fechamento de várias instituições carcerárias e a transferências de detentos.

As consequências para a sociedade são grandes e significativas tanto moral quanto socialmente. A maioria da população parece não se importar com esses eventos e muitos, de fato, o apoiam. Esse desinteresse contribui para um ambiente hostil para os antes detentos, que, após enfrentar todo sistema prisional, encontram imensas dificuldades ao tentar se reintegrar à sociedade, muitas vezes retornando aos mesmos comportamentos criminosos que os levaram à prisão inicialmente.

Essa introdução tem como propósito apresentar uma visão geral do conteúdo, muitos aspectos dos quais são amplamente reconhecidos e negligenciados. Pretende-se demonstrar que as instituições carcerárias brasileiras, em sua maioria, não cumprem adequadamente seu papel de reintegração e garantia dos direitos fundamentais dos detentos.

As prisões, tal como estão atualmente estruturadas, tem se mostrado ineficazes, servindo apenas para perpetuar o ciclo do crime, conforme cotidianamente observado. Ao longo deste trabalho, será explorado mais detalhadamente os temas apresentados, fornecendo uma análise mais aprofundada das questões discutidas.

METODOLOGIA

A presente pesquisa adotou método dedutivo, considerado um dos principais métodos de pesquisa existentes para o desenvolvimento de um trabalho científico. Para embasar teoricamente o trabalho, foram consultadas fontes acadêmicas, literárias e pesquisas pertinentes ao tema, incluindo livros, artigos científicos e monografias disponíveis no Google Acadêmico, Jus brasil e Scielo.

Contudo, parte-se inicialmente de um breve resumo do livro Estação Carandiru de Drauzio Varella, explanando um pouco do que o médico passou na penitenciária. Após uma sucinta explanação sobre a história, a presente pesquisa cuida de analisar o sistema carcerário brasileiro e as principais causas da sua ineficácia.

No desenvolvimento da pesquisa, no que tange à técnica utilizada para a realização do trabalho, esta, se fundamentou na análise da doutrina digitalizada, assim como na análise da jurisprudência estabelecida pelos tribunais tanto em âmbito nacional quanto internacional, buscando identificar as causas da falência do sistema carcerário brasileiro.

Como também, analisar quais os motivos da revolta dos presidiários, bem como o reflexo desta crise na sociedade, e por fim, a aplicação do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, uma que vez que a dignidade é atributo essencial ao ser humano, com direito dos presos, uma vez que estes vivem em condições desumanas e com o mínimo necessário à sua sobrevivência dentro das prisões.

Por fim cuidará em abordar sobre a ressocialização como função principal da pena, destacando-se a sua importância, tanto para os condenados como também para a sociedade, que fica à mercê destes criminosos. Busca-se compreender e explicar o sistema carcerário brasileiro de forma rigorosa e sistemática, contribuindo para o avanço do conhecimento nesta área.

REFERENCIAL TEÓRICO

História e Impacto do Massacre do Carandiru

O evento ocorrido no Complexo Penitenciário do Carandiru em 1992, resulta em um massacre realizado após uma ação policial no Carandiru, uma antiga penitenciária que existia em São Paulo, em 2 de outubro de 1992. Tal ação policial, foi realizada com o objetivo de conter uma rebelião de detentos em curso, que ocorria no Pavilhão 9, na qual, a intervenção da polícia resultou em 111 detentos mortos.

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De acordo com a Constituição Federal de 1988, que tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana, também está assegurado o respeito à integridade física e moral dos presos. Mas, a realidade é outra. Com a superlotação dos presídios e o descaso de autoridades, essa população subumana e a violação de direitos básicos. as consequências são visíveis: além da repercussão mundial, o Estado brasileiro perdeu o controle nas cadeias para o crime organizado.

A consequências do fato ocorrido, foi primeiramente a divulgação em massa pela imprensa, em todos os jornais da Europa, dos Estados Unidos, e no mundo inteiro. E essa divulgação, prejudicou muito a imagem do país. Em decorrência disso, houve a propagação de facções em todas as cadeias do Brasil.

Assim como sempre houve no Carandiru, como as “sementes negras”, “ceita satânica”, e demais quadrilhas que eram formadas de acordo com a localização geográfica na cidade de São Paulo, como zona leste, zona norte, zona sul, e quando se tem várias facções juntas, nenhuma delas tem condição de dominar as outras e impor a suas vontades.

Outra consequência, foi o surgimento do PCC, na qual, a justificativa para ter surgido está nos seus artigos, que são, “livrar os presos da repressão do estado” e o segundo “vingar os 111 que morreram no Carandiru”. E hoje é a maior facção que domina o crime organizado em São Paulo em vários outros estados. Logo, presume-se que, o estado perdeu o controle das cadeias, no qual hoje é um controle muito mais restrito e muito menos abrangente e do que o que era no passado, e o crime organizado tomou conta das ruas do país inteiro.

Talvez o aspecto mais perigoso dessa prática de encarceramento em massa, condições alarmantes de detenção e falta de regimes significativos de reabilitação é que ela torna mais fácil a grupos como o PCC recrutar seus membros. A oferta de milhares de novatos no sistema prisional garante ao PCC uma audiência cativa. As autoridades equivocaram-se ao dispersar os líderes do PCC em prisões de estados vizinhos, pois isso simplesmente facilitou a disseminação da organização criminosa.

Condições de Vida no Sistema Carcerário Brasileiro

É nítido que as vagas no sistema carcerário brasileiro são poucas em comparação com a quantidade de detentos, e o Brasil convive com esse déficit de vagas no sistema prisional há mais de 20 anos. No ano 2000, o primeiro da série histórica do novo levantamento do Depen, havia 232.755 presos em todo o país, embora o número de vagas existentes no sistema carcerário brasileiro fosse de apenas 135.710.

Os dados recentes mostram que essa realidade está longe de mudar. A superlotação dos presídios brasileiros é algo real e é noticiado constantemente. Segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) de 2019, no Brasil, o déficit de vagas no sistema carcerário brasileiro de janeiro a junho de 2019 cresceu notoriamente, apesar da criação de mais de 6.332 vagas no período.

O déficit prisional referido está ligado diretamente ao uso e abuso das prisões provisórias que, de modo geral, são desproporcionais e descabidas. Os dados do CNJ apontam para o aumento da população prisional brasileira que, de acordo com diagnóstico do Depen, cresce a um ritmo de 8,3% ao ano, essas informações levam em conta presos em diversos regimes de cumprimento de pena e incluem até acusados contra os quais foram impostas medidas de segurança. Tem-se como estimativa, que, o número de presos pode chegar a quase 1,5 milhão em 2025, o equiparado à população de cidades como Belém e Goiânia.

É nítida as condições degradantes nos presídios, como situações em que os detentos enfrentam condições subumanas, insalubres e desumanas durante o cumprimento de suas penas. Dentro dessas condições, estão as celas imundas e insalubres que os presídios apresentam, com falta de higiene básica, esgotos abertos, falta de ventilação e iluminação adequada, além disso, a proliferação de pragas e doenças é um risco constante.

A superpopulação carcerária é um problema crônico no sistema prisional brasileiro, levando a condições precárias, a alimentação fornecida aos detentos muitas vezes é de baixa qualidade, chegando a ser azeda ou estragada e em alguns casos, os presos comem com as mãos ou em sacos plásticos, sem contar a ausência de produtos de higiene pessoal, água potável, camas adequadas e itens básicos de limpeza, assim como falta de acesso à assistência judiciária, educação, saúde e trabalho também agravam a situação.

“a superlotação das prisões e as condições de detenção – que são cruéis, desumanas e degradantes –, cominadas com a falta de controle do estado, levaram os presos a se rebelarem, fazerem visitas e agentes penitenciários reféns e tentarem fugir, às vezes em massa. No final dos anos 1990, rebeliões e fugas ocorreram semanalmente nas prisões e delegacias de São Paulo. Em 1997, no Espírito Santo, um número impressionante de 63% dos detidos conseguiu escapar devido à combinação de falta de pessoal para uma estrutura prisional completamente destruída e a conivência de agentes penitenciários e policiais militares que guardavam as prisões”. (macaulay, 2002; anistia internacional, 1999).

No Brasil, o perfil socioeconômico dos detentos reflete desigualdades sociais e econômicas gritantes, como os níveis de escolaridade, que baseado em dados atuais, cerca de 75% dos detentos brasileiros não completaram o ensino fundamental, sendo que aproximadamente 40% são considerados analfabetos funcionais.

A ocupação prévia ao encarceramento também é fator determinante, no qual muitos detentos se encontravam em empregos informais ou até mesmo desempregados antes do encarceramento, e estudos recentes do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) mostram que 67% dos detentos têm histórico de desemprego e 45% possuem renda familiar de até um salário mínimo.

Essa falta de oportunidades e empregos estáveis, leva-se os indivíduos a recorrerem à criminalidade. Assim como a situação familiar e condições financeiras também são fatores primordiais, pois grande parte dos detentos vem de famílias desestruturadas e possui condições financeiras instáveis, logo, pobreza e a falta de suporte familiar podem contribuir para trajetórias criminais.

Princípio da Dignidade da Pessoa Humana no Contexto Carcerário

Devido ao problema de superlotação e condições insalubres das prisões, os detentos enfrentam ambientes precários mais propícios a proliferação de doenças, o que poderia rapidamente ocasionar uma epidemia. A constituição Federal de 1988, estabelece em seu artigo 196, que “A saúde é um direito de todos e um dever do Estado”.

Porém, a falta de condições básicas de sobrevivência, dificultam os meios de promover a saúde, logo, aumenta-se as chances de contaminação entre os presos. Diante disso, se tornam mais vulneráveis a diversas doenças, como a tuberculose, relacionada a fator respiratório, conforme relata Damasceno (2007, p. 75):

“Os presos adquirem as mais variadas doenças no interior das prisões. As mais comuns são as doenças do aparelho respiratório, como a tuberculose e a pneumonia. Também é alto o índice de hepatite e de doenças venéreas em geral, a AIDS por excelência. Conforme pesquisas realizadas nas prisões, estima-se que aproximadamente 20% dos presos brasileiros sejam portadores do HIV, principalmente em decorrência do homossexualismo, da violência sexual praticada por parte dos outros presos e do uso de drogas injetáveis.”

Devido à falta de condições de sobrevivência e de assistência médica, como também o aumento crescente da população carcerária, da precariedade da saúde e de condições higiênicas, as penitenciárias colocam a vida dos presidiários em perigo. Convém ressaltar que, os indivíduos privados de sua liberdade devem ter direito à saúde de maneira garantida e humana, visto que a saúde é de acesso universal e igualitário.

Porém, mesmo existindo garantia deste direito, a falta de infraestrutura e a presença de ambiente insalubre, faz com que os presos fiquem mais expostos, demonstrando a uma violação aos direitos fundamentais. Ainda ressalta Damasceno justamente sobre o princípio geral do Direito:

“Dessa forma, a manutenção do preso em estado deplorável de saúde estaria fazendo com que a pena não só perdesse o seu caráter ressocializador, mas também estaria sendo descumprido um princípio geral do Direito, consagrado no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, também aplicável subsidiariamente na esfera criminal, e, por consequência, na execução penal, que em seu texto dispõe: na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.”(2007, p. 75).

É certo que está previsto em lei, princípios que resguardam os direitos humanos e, consequentemente, os direitos e garantias fundamentais de modo a proteger a dignidade da pessoa humana. A Constituição Federal de 1988 e o Código Penal de 1940 limitam o direito de punir do Estado garantindo um tratamento punitivo que respeite a vida humana.

Ocorre que, a realidade é outra, ao invés de ressocializar, a prisão torna-se um lugar de tormentos físicos e morais, onde o encarcerado recebe castigos e onde não é respeitada à sua dignidade como ser humano. A prisão, que deveria reeducar, transforma-se em indústria do crime, tendo em vista que os presos se tornam ainda mais frios, calculistas e capazes de conviver sob qualquer adversidade, sem medo e sem escrúpulos, pois já viveram tudo que há de pior. Ferindo completamente o princípio do direito à integridade física e moral:

“Os detentos têm o direito de serem tratados com dignidade e respeito, sendo vedada qualquer forma de tortura, tratamento desumano ou degradante.”

Obviamente, essa situação possui impacto direto na saúde física e mental dos indivíduos em cárcere, além do impacto dessa situação na integridade moral dessas pessoas. O direito a integridade moral abarca o direito ao nome, à intimidade, à privacidade, à honra, à imagem e outras liberdades morais. O próprio Código Penal dispõe em seu Art. 38 que:

“O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral.”

Ressocialização e Reintegração Social dos Detentos

Ressocializar é tornar o preso apto a conviver em sociedade, fazer com que o indivíduo compreenda a importância dos bens jurídicos por ele violados, buscando entender o motivo de ter levado a cometer tal infração penal. Porém, para voltar a possuir um convívio social, é preciso um suporte necessário para reintegrá-lo a sociedade. Nesse sentido, salienta Bitencourt que:

“o objetivo da ressocialização é esperar do delinquente o respeito e a aceitação de tais normas com a finalidade de evitar a prática de novos delitos.” (BITENCOURT, 2011, p. 139).

O jus puniendi, usado pelo Estado diante de uma transgressão à ordem pública, tem o direito de punir, onde irá empregar e concretizar a pena. Contudo, a punição não deve dedicar-se apenas a uma condenação que restrinja a liberdade ou a direitos, visto que há sim a possibilidade de o transgressor não voltar a cometer os mesmos erros.

Para isso, é necessário o cumprimento efetivo do objetivo ressocializador do Estado, onde evitaria o alto índice de reincidência e proporcionaria a redução da massa carcerária, que, na situação atual, é observado claramente a não efetivação da função ressocializadora, pois o índice de reincidência aumenta a cada dia.

Reincidência na qual, só demonstra o resultado ineficaz da função ressocializadora, causada na maioria das vezes pela obrigação em que se encontram os novos detentos a cumprirem as regras feitas pelos próprios presos, fazerem parte de facções, e ainda são incentivados a praticarem crimes, ocorrendo constantemente violência entre eles, o que consequentemente possibilita que muitos deles ao saírem da penitenciária cometam crimes até mais graves.

Conforme Bitencourt:

“A influência do código do recluso é tão grande que propicia aos internos mais controle sobre a comunidade penitenciária que as próprias autoridades. Os reclusos aprendem, dentro da prisão, que a adaptação às expectativas de comportamento do preso é tão importante para seu bem estar quanto a obediência às regras de controle impostas pelas autoridades.” (2011, p. 186).

O Estado, tem como responsabilidade, expressamente prevista na Constituição Federal, os direitos e deveres nela inerentes também alcançam os presidiários. Os condenados precisam ter seus direitos e deveres resguardados para possibilitar a reintegração ou reeducação social.

Os considerados ex-presidiários, não obtendo a ressocialização devida, enfrentam dificuldades de sair da vida do crime, o que pode ocorrer por não ter possibilidades de sair da criminalidade, ou pelo fato do seu aspecto criminoso ter aumentado diante do horror vivido dentro da penitenciária.

O artigo 5º da Constituição Federal de 1988, prevê garantias fundamentais de sobrevivência aos brasileiros e estrangeiros, conforme podemos observar:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes (…) (BRASIL, 1988).

A Lei de Execução Penal em seu artigo 10, menciona que:

Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso.

O trabalho possibilitaria o reconhecimento do indivíduo como ser humano, visando restabelecer a sua dignidade dentro da sociedade. O Conselho Nacional de Justiça, por intermédio da Resolução de nº 96, de 27 de outubro de 2009, estabeleceu o Projeto

“Começar de Novo”, que tem como finalidade a reintegração social dos ex-detentos mediante ações de capacitação e de educação, bem como a reinserção no mercado de trabalho.

Lopes; Gregório e Accioly, enfatizam que:

“Um dos grandes desafios dos ex-detentos é conseguir se ingressar no mercado de trabalho. O preconceito e o baixo grau de escolaridade dificultam o retorno ao mercado, já que o mesmo está cada vez mais competitivo e exigindo mão de obra qualificada e diferenciada. Por muitas vezes a sociedade é resistente a contratações desses indivíduos, o que intimida as organizações a contratarem este tipo de mão de obra. Parecenos que a sociedade não concorda, infelizmente pelo menos à primeira vista, com a ressocialização do condenado. O estigma da condenação, carregado pelo egresso, impede de retornar ao normal convívio em sociedade.” (2016, p. 59).

O trabalho é um dos preferíveis meios para contribuir com a reinserção dos ex-presidiários na sociedade. Desse modo, concerne às empresas o desimpedimento de oportunidades de trabalho. Em contrapartida, para amenizar a resistência das empresas, é necessária a criação de programas governamentais que propiciem incentivos para contratar o ex-prisioneiro.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Massacre do Carandiru expôs de forma brutal a necessidade urgente de uma reforma abrangente no sistema penitenciário brasileiro. A superlotação das prisões é um dos problemas mais graves, o excesso de presos em espaços inadequados não só compromete a saúde e a segurança, mas também impede qualquer tentativa de reabilitação eficaz.

Nota-se que, as condições insalubres das prisões brasileiras são um reflexo da negligência estrutural do sistema. Faltam investimentos em infraestrutura, saneamento básico, e cuidados de saúde, o que transforma as prisões em focos de doenças e violência, que podem ser sanadas com abordagens multifacetadas que incluam a construções de novas unidades prisionais, assim como a reforma das já existentes.

Melhorias essas que se tornariam essenciais não apenas para a dignidade dos detentos, mas também para a segurança pública, pois condições degradantes fomentam a desumanização e a criminalidade. Para resolver esse problema, é necessário um esforço focado na redução da população carcerária, o que pode ser alcançado através de medidas alternativas à prisão para crimes não violentos, e pela revisão de políticas de encarceramento provisório.

É fundamental que o Estado invista em programas que visem a ressocialização, como o ensino de habilidades vocacionais e a oferta de oportunidades de trabalho dentro e fora das prisões. Pois, sem programas de educação, capacitação profissional e suporte psicológico, os presos têm poucas chances de reintegrar-se à sociedade de forma produtiva após cumprirem suas penas, para não acabarem perpetuando o ciclo de reincidência criminal.

A responsabilidade do Estado deve ir além da punição, focando também na reabilitação e na reintegração dos ex-presidiários como cidadãos produtivos. Utilizando a criação de incentivos para empresas contratarem ex-detentos que facilitaria a reintegração social de maneira produtiva após o cumprimento de suas penas, reduzindo assim a taxa de reincidência e, consequentemente, a criminalidade.

Em última investigação, o Estado precisa ir além da simples punição, mas sim, focar no devido cuidado com o detento, e além disso, um olhar voltado para reabilitação dos ex-condenados no meio social e sua reintegração como cidadãos produtivos, promovendo assim uma sociedade mais segura, equilibrada e acima de tudo, humanitária.

REFERÊNCIAS

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Sobre os autores
Herbeth Barreto de Souza

Advogado e Professor. Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS e Professor da disciplina de Direito Penal IV da FACSUR︎

Aline Vieira Soares

Discente do 3º período do Curso de Direito da Facsur︎

Adria Fernanda Costa Silva

Discente do 3º período do Curso de Direito da Facsur︎

Informações sobre o texto

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