A COMPRA DE UM IMÓVEL só pode ser considerada minimamente "SEGURA" se partir da análise do que efetivamente consta no Cartório do Registro de Imóveis competente; ainda que a resposta dada pelo Cartório seja um "NADA CONSTA", não devemos nunca deixar de consultar, antes de qualquer coisa (e principalmente antes de adiantar qualquer valor pela compra) qual situação jurídica o imóvel ostente perante o Cartório. E, como veremos a seguir, não só o Cartório de Imóveis mas diversas outras repartições para diminuir ao máximo a chance de problemas com a aquisição imobiliária e reduzir os riscos - sempre existentes - nesse tipo de operação.
Em que pese a Lei 13.097/2015 estatuir no seu art. 54 o conhecido "Princípio da Concentração dos Atos na Matrícula" não passa por nossas recomendações a DISPENSA das certidões de praxe sempre exigidas para maior segurança dos contratantes. A respeito do referido princípio esclarece a abalizada doutrina exarada por KÜMPEL e FERRARI (Tratado Notarial e Registral. 2020) para quem,
"Corolário do princípio da publicidade, o 'PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO' é assim intitulado para definir a regra abstrata de que TODOS OS ATOS, fatos e negócios jurídicos que envolvem o imóvel ou seus titulares tabulares devem estar (" concentrados ") na matrícula a fim de torná-los oponíveis em face de terceiros. Amolda-se exatamente à eficácia do Registro Imobiliário, que representa mecanismo confiável para noticiar questões que repercutem no imóvel com eficácia erga omnes, ante sua completude, agilidade, segurança e universalidade".
Tal princípio por tornar desnecessária a apresentação de diversas certidões (especialmente de feitos judiciais em face dos vendedores) autoriza a lavratura de Escrituras sem a apresentação destes importantes documentos, como permite o art. 356 do atual Código de Normas Extrajudiciais do Estado do Rio de Janeiro:
"Art. 356. Para a validade ou eficácia dos negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis ou para a caracterização da boa-fé do terceiro adquirente de imóvel ou beneficiário de direito real, NÃO SERÃO EXIGIDOS quaisquer documentos ou CERTIDÕES, exceto o documento comprobatório do pagamento do imposto de transmissão e do laudêmio, se devidos, as certidões fiscais e a certidão de propriedade e ônus reais do imóvel, ficando DISPENSADAS as suas transcrições ou a apresentação de certidões forenses ou de distribuidores judiciais cíveis e criminais (art. 1º, § 2º, da Lei nº 7.433/1988 e art. 54, caput e §§, da Lei nº 13.097/2015)" .
A Certidão da Matrícula (que no cenário atual engloba as informações sobre ônus reais, conforme § 11 do art. 19 da LRP incluído pela recente Lei 14.382/2022) é indispensável para transações imobiliárias e em alguns casos poderá não exibir, por exemplo, uma PROMESSA DE COMPRA E VENDA ou mesmo uma PROMESSA DE CESSÃO em favor de quem hoje pretende "vender" um imóvel. Nesse cenário, não constando da Certidão da Matrícula, pode ser seguro adquirir o imóvel?
Antes de tudo é importante não perder de vista que toda transação imobiliária pode envolver riscos. Com os riscos conhecidos e bem avaliados a segurança da transação emerge; essa segurança advém da CERTEZA que só as CERTIDÕES expedidas pelas respectivas repartições poderão entregam - dentre elas, como se viu, os Cartórios Extrajudiciais, Prefeituras, Cartórios dos Distribuidores, Receita Federal, dentre outros, de acordo com as peculiaridades de cada caso específico. O fato da titularidade do DIREITO E AÇÃO não constar da matrícula imobiliária, em que pese não ser o cenário que recomendamos, não desabona a possibilidade de negociação do imóvel, especialmente se considerarmos que a Súmula 239 do STJ não exige o REGISTRO para que a Ação de Adjudicação Compulsória (ou seja, o meio de regularização imobiliária) seja adotado. O verbete julgado em 28/06/2000 reza:
"O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao REGISTRO do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis".
O que efetivamente precisa ser feito nesses casos específicos é a análise de toda a documentação que embasa da titularidade do direito e ação, inobstante o fato da inexistência de quaisquer registros em nome do transmitente. A referida análise apontará os riscos e vantagens da negociação, cabendo ao interessado avançar ou desistir da aquisição, com base no parecer dado por seu Advogado. Por óbvio esse exame de documentação deve ser feito por Advogado Especialista que possua principalmente experiência e familiaridade com as questões notariais, registrais e imobiliárias já que, por exemplo, hoje em dia já não se mostra obrigatória a adoção do processo judicial para a regularização via adjudicação compulsória. Desde a Lei Federal 14.382/2022 já se mostra possível a Adjudicação Compulsória Extrajudicial direto nos Cartórios Extrajudiciais, com a assistência de ADVOGADO, sem a necessidade de Processo Judicial.
POR FIM, importante decisão do TJSP que, confirmando decisão da primeira instância, mantém a procedência do pedido pela regularização imobiliária via adjudicação compulsória uma vez que cabalmente comprovados os requisitos para o procedimento, mesmo sem registro na matrícula:
"TJSP. 1000712-02.2019.8.26.0650. J. em: 29/09/2021. AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA JULGADA PROCEDENTE. Insurgência fundada em ausência de contrato escrito, de demonstração da cadeia negocial e de individuação do lote. Descabimento. Provas documentais que corroboram a pretensão autoral. Documento assinado pelo cedente e cessionário, no qual constam o nome das partes, o objeto e o preço, o que denota a natureza contratual. Comprovação da quitação do preço. Individuação do imóvel bem demonstrada, sendo alterada a sua designação pela municipalidade, o que não é capaz de obstar o deferimento do pedido. Nos termos da Súmula nº 239, do C. STJ, o direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no Cartório de Registro de Imóveis. Presentes os requisitos para a adjudicação, é de rigor a manutenção da procedência do pedido. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO".