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Estado laico e o poder da religião como forma de controle nas comunidades periféricas

Agenda 19/07/2024 às 17:08

“Não basta que todos sejam iguais perante a lei.

É preciso que a lei seja igual perante todos.”

Salvador Allende, 2022.

RESUMO: Este trabalho visa compreender a relação entre a religião, o crime e a transgressão de leis no Estado de direito brasileiro, especialmente em comunidades periféricas. Essa relação existe há muitos anos e vem ganhando força nas últimas décadas com o advento das mídias sociais e com a pulverização dos templos (neo)pentecostais1. Objetivamente buscar-se-á desenvolver uma linha temporal desde o início da constituição das comunidades até os dias atuais, assimilando, especificamente, a influência religiosa nas atividades do crime organizado e o papel do Estado laico nesta relação. A metodologia utilizada foi um estudo exploratório qualitativo, por meio do método fenomenológico, partindo de estudos de campo realizados por autores de livros e entrevistas com referências nas áreas que dialogam entre si (religião, crime e Estado). Percebeu-se que o Estado possui pouca gerência sobre a vida criminosa nas periferias e o vínculo religioso está limitado pela Constituição Federal diante o Estado laico.

Palavras-chave: crime; comunidade; religião; (neo)pentecostalismo; Estado laico.


INTRODUÇÃO

O presente trabalho abordará um tema de grande relevância jurídica e social para a população, tratando sobre assuntos complexos, polêmicos e que estão em destaque constantemente. O primeiro deles é a religião, que acompanha o homem ao longo das suas evoluções, detém papel fundamental no âmbito sociocultural e na subjetividade do indivíduo, seja por meio de crenças, valores, emoções e comportamentos que dela advém. O segundo tema a ser abordado são os crimes praticados com auxílio ou por meio da manipulação da religião para alcançar as camadas mais baixas da sociedade. E, por fim, aprofundaremos como se comporta o Estado Brasileiro no que se refere ao conflito entre Estado laico e religião. Será desenvolvida uma linha temporal desde os princípios da Constituição das comunidades até os dias atuais, compreendendo a influência religiosa existente nas atividades do crime organizado e qual o papel do Estado laico nessa relação.

O estudo será desenvolvido utilizando o método dedutivo, abordando também conteúdo histórico. No que tange aos instrumentais técnicos, serão utilizadas fontes bibliográficas, através da análise de publicação de autores, livros, artigos científicos e demais documentos que abordam o tema, bem como, no âmbito do direito, a legislação pertinente. De forma inédita, serão realizadas entrevistas com profissionais com longa experiência no assunto, autores de livros e com domínio teológico e jurídico que conhecem a realidade cotidiana das periferias a fim de compilar e compreender de forma clara o vínculo (caso haja) entre religião, crime e Estado.

DA ORIGEM DA RELIGIÃO PENTECOSTAL

O surgimento do pentecostalismo no Brasil data de 1910, quando os missionários suecos Daniel Berg e Gunnar Vingren (que conheceram o pentecostalismo nos Estados Unidos no início do século XX), com viés de criar uma nova proposta de expandir a evangelização no Brasil, edificaram a primeira igreja chamada de Missão da Fé Apostólica, hoje reconhecida como a Assembleia de Deus, que, conforme o Senado Federal (2023, documento digital), é uma das maiores igrejas evangélicas do país com mais de 22 milhões de membros. Já na região Sul do país, no mesmo período, a Congregação Cristã foi edificada pelo italiano Louis Francescon, que foi um dos pioneiros na mobilização pentecostal italiana, rapidamente começou a ganhar espaço na região e aumentou seus adeptos, segundo o breve relato escrito pelo próprio Francescon em 1939, publicado pela Congregação Cristã no Brasil, intitulado Histórico da Obra de Deus, revelada pelo Espírito Santo, no século atual (FRANCESCON, 1939).

De acordo com a retrospectiva histórica do pentecostalismo no Brasil e no mundo, segundo Matos (2006), os primeiros registros do pentecostalismo remetem ao século XIX dentro da Igreja Metodista, a partir do chamado Holiness Movement (movimento de santidade), que ensina que a natureza carnal da humanidade pode ser purificada por meio da fé e pelo poder do Espírito Santo. Os pentecostais acreditavam que os sinais característicos de quem recebeu o Espírito Santo eram visíveis exteriormente, por meio do dom de falar em línguas e, posteriormente, o dom de cura das doenças. Nesta doutrina, por meio da fé e pelo poder do Espírito Santo é possível ser regenerado e purificado dos pecados humanos (MATOS, 2006).

Campos (2005), relata que o pentecostalismo ganhou ainda mais adeptos a partir de 1906, quando o pastor afro-americano William Joseph Seymour, por meio do reavivamento da Rua Azusa, em Los Angeles, estado da Califórnia, nos Estados Unidos, começou a realizar batismos com o Espírito Santo por curas milagrosas, profecias, por experiências com interpretação de línguas e pelo discernimento de espíritos.

William Joseph Seymour, filho de ex-escravizados, foi criado na tradição religiosa da Igreja Batista e, ainda jovem, mudou-se para Houston, momento em que iniciou seus estudos na escola bíblica criada por Charles Fox Parham, em 1905. Entretanto, em virtude de ser um jovem negro, foi proibido de acompanhar os ensinamentos na sala de aula junto com os colegas brancos, motivo pelo qual assistia a tudo do corredor, do lado de fora da sala de aula (SILVA, 2021).

Ainda, segundo Silva (2021), foi justo na escola bíblica que William Joseph Seymour aprendeu as doutrinas do Movimento Holiness e fortaleceu a crença na glossolalia (o dom de falar em línguas), como prova do batismo com o Espírito Santo. Assim, em 1906, na cidade de Los Angeles, na Rua Azusa, Seymour deu início à sua “obra” de evangelização, edificando a primeira igreja pentecostal dos Estados Unidos, que se diferenciava das igrejas pentecostais tradicionais, pois unia ritmos, sons e uma forma de comunicação com o Espírito Santo que não engessava na rigidez do corpo.

Tudo isso se fortalece com o estudo realizado por Robbins (1986, documento digital), referindo que:

ao final do século XIX, muitos dentre o movimento de santidade começaram a falar e a buscar o “batismo de fogo”. Um ramo do movimento de santidade foi chamado de “Igreja Holiness do Batismo com Fogo” (originada em Iowa em 1895 e dirigida por Benjamin Irwin). Quem recebia “o fogo” frequentemente poderia gritar, berrar, cair em transes, ou falar enrolado. Este “batismo de fogo” foi considerado como uma visitação milagrosa do Espírito que seguia à inteira santificação. Os mestres mais conservadores do movimento de santidade rejeitaram essa “terceira” benção de fogo, por considerarem a mesma coisa que a segunda benção e o batismo especial do Espírito.

Dessa forma, dentro de poucos meses muitos grupos semelhantes ao Avivamento da Rua Azusa foram surgindo nos mais diversos lugares dos Estados Unidos e, consequentemente, o grupo Missão da Fé Apostólica da Rua Azusa foi reconhecido por sua singular importância no que diz respeito ao nível de organização e inter-relação com os demais múltiplos grupos do movimento, dando, assim, início à expansão para outros países.

Já no Brasil, o pentecostalismo é divido em três grandes “ondas” pelos historiadores. A primeira, chamada de pentecostalismo clássico, ocorreu entre 1909 e 1950 com a vinda do missionário italiano Louis Francescon para a colônia chamada de Pequena Itália, em São Paulo, e com a chegada dos suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg ao Pará (em 1910). Estes foram os responsáveis por fundarem as igrejas da Congregação Cristã no Brasil e da Assembleia de Deus, igrejas estas caracterizadas, em especial, pelo anticatolicismo, ênfase na crença do Espírito Santo, por um sectarismo radical e pelo ascetismo, rejeitando os valores do mundo e defendendo a plenitude da vida moral (FRANCESCON, 1939).

Já a segunda onda, conforme Mariano (2014), teve início em 1950, a partir da chegada dos missionários norte-americanos Harold Williams e Raymond Boatright a São Paulo. Tão logo chegaram constituíram a Cruzada Nacional de Evangelização, tendo por objetivo promover a evangelização das massas populares utilizando a comunicação por meio de rádios, contribuindo de grande forma para a expansão do pentecostalismo no Brasil, alcançando milhares de pessoas que lotaram os cultos em teatros, centros esportivos e estádios. Neste mesmo período surgiram diversas outras denominações, como, por exemplo, a Igreja Casa da Bênção, a Igreja Unida, a Igreja Pentecostal Deus é Amor, dentre outras.

Por fim, a terceira onda, conhecida como neopentecostal, teve início em meados dos anos 70, através da criação, por brasileiros, da Igreja Universal do Reino de Deus no Rio de Janeiro em 1977; Igreja Renascer em Cristo em São Paulo em 1986, e; Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra, em Brasília, no ano de 1992. Essas igrejas utilizavam-se da mídia eletrônica, aplicação de técnicas de administração empresarial e uso do marketing, alcançando ainda mais fiéis e trazendo-os para mais perto da Teologia da Prosperidade, cuja base é crer que a fé está fortemente ligada à doação financeira (por meio do pagamento do dízimo), conforme Carmo (2016, p. 137):

a Teologia da Prosperidade pregada por Macedo e seus pastores relacionam-se de maneira específica com o sistema socioeconômico de consumismo existente nos dias de hoje. A pregação é voltada para o consumo, para ter bens materiais e riquezas.

Conforme muito bem recorda Lopes Júnior (2012, texto digital),

o termo neopentecostal, apesar de consagrado, dá margem a certas confusões. Nem todas as centenas de novas denominações pentecostais que surgem são neopentecostais. O “neo” se refere à forma de ser pentecostal, e não ao tempo em que surgiu a Igreja. Devido ao sucesso, ao profissionalismo de sua aplicação e, especialmente, à crise da modernidade, práticas neopentecostais, como “declaração” de vitória e prosperidade, cânticos triunfalistas, segmentação de “mercado”, especialização litúrgica em torno de determinados temas como casamento, trabalho e doenças, estão presentes em qualquer tipo de igreja evangélica, e até mesmo em algumas católicas.

Por possuir esse diálogo aberto, contemporâneo, alcançando e aprofundando assuntos do dia a dia das pessoas, em especial trabalho, vida, sentimentos e finanças, e por fazer uso de sons, músicas e ritmos, que esse formato de evangelização vem ganhando espaço. Consequentemente, esta referência se torna um dos pilares para a transformação no campo religioso brasileiro, culminando com o início das perseguições e violências físicas, patrimoniais e morais sobre outras religiões que disputavam o território e os fiéis das comunidades cariocas.

Segundo Lemos (2017), a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), estabelecida a partir do pastor Edir Macedo no ano de 1970, no subúrbio do Rio de Janeiro, usou fortemente a Teologia da Prosperidade, registrando-a como mais uma das características marcantes do neopentecostalismo, para promover uma guerra espiritual contra o Diabo, crendo na apropriação religiosa no “mercado dos bens da salvação”. Essa teologia recebeu repercussão internacional quando a Igreja Universal adquiriu, em 1989, a Rede Record de televisão, passando a difundir suas teorias e pregações em massa.

Conforme discurso do próprio Macedo (1987, p. 36, 54, 79, 84) a respeito da Teologia da Prosperidade:

Comece hoje, agora mesmo, a cobrar dele tudo aquilo que Ele tem prometido (...) O ditado popular de que ‘promessa é dívida’ se aplica também para Deus. Tudo aquilo que Ele promete na Sua Palavra é dívida que tem para você (...) Dar dízimos é candidatar-se a receber as bênçãos sem medida, de acordo com o que diz a bíblia (... ) Quando pagamos o dízimo a Deus, Ele fica na obrigação (porque prometeu) de cumprir a Sua Palavra, repreendendo os espíritos devastadores (...) Quem é que tem o direito de provar a Deus, de cobrar d’Ele aquilo que prometeu? O dizimista! (...) Conhecemos muitos homens famosos que provaram a Deus no respeito ao dízimo e se transformaram em grandes milionários, como o Sr. Colgate, o Sr. Ford e o Sr. Caterpillar.

A partir deste momento e, em menos de um século, o neopentecostalismo alcançou números jamais vistos, quebrando o monopólio do catolicismo e pregando a religiosidade das soluções mágicas e imediatas. Essas dinâmicas são reproduzidas, especialmente, sobre as comunidades majoritariamente negras e pobres, periféricas, vulnerabilizadas de políticas públicas e expostas à violência estatal.

Notadamente a vida similar entre pastores neopentecostais e moradores das favelas geraram maior empatia com relação ao culto, diferente do que ocorre com os padres da Igreja Católica, que normalmente residem em áreas urbanas. Inclusive, o fácil acesso ao culto e a grande oferta de igrejas, que eram “construídas” de forma menos verticalizada e hierarquizada que o catolicismo oficial, também auxiliaram para a evangelização de um número cada vez maior de fiéis. As igrejas neopentecostais realizam um grande acolhimento de “irmãos”, gerando uma rede de solidariedade, circuitos de reciprocidade e de proteção com os novos membros que, de praxe, convivem com ambientes inseguros, instáveis e vulneráveis (CAROLINA, 2021).

Outro aspecto interessante é a contextualização do momento e local em que os evangélicos começaram a ganhar mais adeptos e tiveram expansões até então inéditas, como refere Camurça (2013, p. 72):

Uma das explicações mais de fundo para o decréscimo católico é a sua grande dificuldade para acompanhar migrações internas que revolvem o Brasil contemporâneo. Onde os católicos mais diminuíram e os pentecostais e sem religião mais cresceram são as regiões das periferias metropolitanas e as fronteiras de ocupação sem presença institucional católica. A estrutura eclesial católica é centralizada e burocrática, centrada nas paróquias, não consegue acompanhar a mobilidade dos deslocamentos populacionais como as ágeis redes evangélicas.

Isso fica evidente se considerarmos que, nos bairros periféricos, para cada igreja católica, há dezenas de outras evangélicas pentecostais, ainda mais considerando os processos que um sacerdote católico precisa cumprir para completar a formação ministerial, que, em média, leva sete anos, enquanto os pentecostais recém-convertidos se tornam ministros em poucos meses. Esses novos ordenados cumprem suas missões nas comunidades em que já estão inseridos, ou seja, entre familiares, amigos e redes de apoio, tornando-se prova da eficácia da mensagem transformadora dos evangélicos pentecostais.

Conforme Mariano (2014), a aceleração do crescimento evangélico pentecostal se dá, em maior força, nas classes sociais mais pobres e com menor índice de escolaridade, prevalecendo-se analfabetos, pessoas de baixa renda e com alta taxa de desempregados. Distante dos olhos do Estado, as pessoas se aglomeram em comunidades, periferias e favelas, constituindo uma nova forma de sociedade em transição e que, consequentemente, configura locais de vulnerabilidades sociopolíticas e de insegurança. E é justamente nestas comunidades que as redes de apoio evangélicas pentecostais ganham espaço, afirmando serem respostas aos desafios e sofrimentos, ressignificando os modos de ver(-se) e viver em territórios marginalizados.

Sanchis (1997, p. 115) afirma que:

A religião é também consequência de uma prática simbólico-espacial. Sair, voltar, permanecer, abandonar as instituições religiosas são mediadas pela assimilação do indivíduo a contextos e esferas mais amplos de sua inserção na sociedade não restritos apenas à visão purista da instituição ou a um sistema de crenças fechado e supostamente constituído com imutável pelo indivíduo. Desse modo, a associação entre as razões que os indivíduos encontram para suas mobilidades (espaciais, culturas e religiosas), o reconhecimento da atitude de experimentação religiosa como uma prática contemporânea, e o olhar atento sobre os contextos socioculturais dos tempos atuais podem ainda nos render boas interpretações para a análise sobre religião no Brasil.

Com todo este apanhado histórico, percebe-se que nas últimas décadas ocorreram as maiores transições religiosas já vividas por este país, bem como a ocupação e inserção da igreja na política e na manutenção do conservadorismo religioso, o que, considerando a máxima do Estado laico, assusta parte da sociedade. Inclusive, como já advertido por Diniz (2020, texto digital), “o receio é que surja no futuro um novo monopólio religioso com perfil teocrático.”

O COMPLEXO DE ISRAEL: O TRÁFICO DE DROGAS E A RELIGIÃO2

O traficante Álvaro Rosa, apelidado de Arão e Peixão, é o líder e fundador do Complexo de Israel. Desde julho de 2020 estão sob seu comando cinco comunidades que, juntas, integram mais de 130 mil habitantes; Vigário Geral, Cinco Bocas, Cidade Alta, Pica-Pau e Parada de Lucas. Mas, na realidade, o processo de integralizar as comunidades e criar um grupo forte e unificado, denominado de “Exército do Deus Vivo ou Tropa do Arão” (conforme ilustração abaixo), em referência ao seu líder (Álvaro Rosa) iniciou em meados de 2007, a partir da disputa de narcotraficantes pelo controle do tráfico local das maiores comunidades da região (Vigário Geral, Parada de Lucas e Cidade Alta) (FERNANDES, LEITÃO, RIANELLI, et al., 2020).

Figura 1 - Uso de armas pelos traficantes denominados “Exército do Deus Vivo ou Tropa do Arão”

Fonte: Reprodução/Redes Sociais UOL. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/03/13/tropa-de-arao-o-uso-da-religiao-como-escudo-para-a-pratica-de-crimes-no-rj.htm. Acesso em: 24 jun. 2024.

Ainda conforme os autores, a estabilização e domínio da facção nas comunidades não se deu de forma imediata, passando por processos árduos e complexos de dominância. Em meados de 2007, sob comando de Peixão, a facção iniciou a anexação forçada da comunidade Parada de Lucas e, ainda no mesmo ano, agregou também a comunidade de Vigário Geral. Já a partir de 2016 (decorridos mais de 9 anos de sua constituição), a facção conquistou os territórios do outro lado da Avenida Brasil (Rio de Janeiro), partindo pela Cidade Alta, culminando em um conflito que durou aproximadamente sete meses, contando, inclusive, com intervenção policial e queima de veículos nas vias paralelas. Nos anos seguintes, as comunidades de Pica-Pau e Cinco Bocas, em Brás de Pina, também foram incorporadas ao domínio faccional (conforme ilustração abaixo).

Figura 2 - Mapa da ocupação das comunidades do Complexo de Israel

Fonte: reprodução Rede Globo, acesso em: 24 jun. 2024. Disponível em: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2021/10/25/pm-ocupacao-comunidades-complexo-de-israel-por-tempo-indeterminado.ghtml

Milicianos do Morro do Quitungo, bairro Brás de Pina, uniram-se em 2020 ao Terceiro Comando Puro (TCP), grupo criminoso criado por Peixão, e iniciaram a disputa contra o Comando Vermelho pelo controle da Região Norte da comunidade. A união se deu a partir do início da pandemia de covid-19, meados de maio de 2020, quando foram firmadas negociações e acordos entre traficantes que tiveram a permissão dos paramilitares para visitar parentes que moram em morros dominados pela milícia (OLIVEIRA, C. 2021).
Aproveitando-se das fragilidades e vulnerabilidades criadas pela pandemia, a facção ampliou a dominação territorial para áreas que, até então, não tinham no seu dia a dia a presença do tráfico de drogas e crime organizado, o que, consequentemente, alterou drasticamente a dinâmica social dessas comunidades.

Baseado nos princípios do Estado de Israel para pautar sua interferência e domínio sobre as comunidades do Rio de Janeiro, o Peixão assume o papel de próprio salvador da cristandade, vinculando o teocentrismo evangélico ao tráfico de produtos ilícitos, sendo reconhecido tanto como liderança na hierarquia do crime quanto como líder religioso instituído de autoridade divina (CUNHA, 2009).

Para reforçar o status de comunidades dominadas pelo “Exército do Deus Vivo ou Tropa do Arão”, passou-se a utilizar símbolos religiosos, podendo ser contemplada, a partir de 2020, sobre o ponto mais alto da Cidade Alta uma figura em led azul, formada por dois triângulos sobrepostos: a famosa Estrela de Davi. A estrela possui quatro metros de altura e pode ser avistada por diversos trechos da Avenida Brasil, uma das principais vias de acesso ao Rio de Janeiro.

Figura 3 - Foto da estrela de Davi no ponto mais alto da Cidade Alta, Rio de Janeiro

Fonte: reprodução Rede Globo, acesso em: 29 mar. 2024, às 12h20. Disponível em: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/07/24/traficantes-usam-pandemia-para-criar-novo-complexo-de-favelas-no-rio-deixam-rastro-de-desaparecidos-e-tentam-impor-religiao.ghtml

Ainda durante o regime de Peixão foram utilizados apelos de imagens que constam nos muros dos bairros por meio de artes em grafite com dizeres bíblicos. Em uma delas, um pergaminho é desenrolado para revelar a mensagem “Deus/Jesus é o Dono do Lugar” (figuras 4 e 5), desenhando, ao lado, o mapa do Brasil com as cores da bandeira de Israel. Já em outra aparece a imagem do personagem infantil Peixonauta (ilustração abaixo), referindo-se ao apelido utilizado por Álvaro Rosa, o qual já é reconhecido e aprovado por outros criminosos também convertidos ao evangelismo e igrejas neopentecostais, criando-se, assim, um grupo de traficantes evangélicos3 que atuam no Rio de Janeiro sob liderança de Peixão.

Figuras 4 e 5 - Grafites nos muros das comunidades

Fonte: reprodução O Tempo/Google Street View + reprodução/instragram/@bailesdocabana. Disponível em: https://www.otempo.com.br/cidades/2024/5/27/estabelecimento-de-faccao-evangelica-no-cabana-liga-alerta-para-. Acesso em: 25 jun. 2024.

Figura 5 - Personagem Peixonauta – referência humorada ao Peixão.

Fonte: Foto de Christina Vital da Cunha, 2022, disponível em: file:///D:/Dados/Downloads/aa-11890.pdf. Acesso em: 24 jun. 2024.

Percebe-se que a partir da segregação e da subjugação das classes trabalhadoras pelas dominantes se criam espaços abertos a outros tipos de subordinação, não mais exclusividade do Estado, nas quais se vinculam fortes laços comunitários, interesses do capital articulando o tráfico de drogas, as milícias, as igrejas evangélicas e o próprio Poder Público por meio da violência. É exatamente nesse contexto que o tráfico de drogas e outros ilícitos surge trazendo condições um pouco mais compensatórias em meio às diversas exclusões e escassez de oportunidades de mobilidade social. Em moldes muito semelhantes, o neopentecostalismo vem crescendo com celeridade nas periferias urbanas sob o manto da prosperidade, concebida dentro da ideia da fé em Deus contra todo o mal, expulsando o “diabo” da vida das pessoas e operando vitórias individuais no mundo material (sucesso profissional, riquezas, reconhecimento e ascensão social).

No entanto, conforme explica Costa (2023, entrevista digital), que é pastora e pesquisadora da área, tratando do Complexo de Israel:

Ainda que estejamos falando de uma nova configuração quando olhamos para o Complexo de Israel e os traficantes evangélicos, onde a religião tem papel fundamental na estrutura, estratégia, identidade e ética local impostas pelo tráfico, é equivocado dizer que somente nesses territórios e na relação com evangélicos pentecostais, a religião e as experiências com o sagrado estão presentes dando sentido à vida e segurança em contextos de violências.

Assim, precisamos estar atentos à utilização dos termos narcopentecostalismo e narcorreligião, visto que ambos surgiram na mídia de forma bastante irresponsável. O que poderíamos afirmar que há, comprovadamente, seria apenas a existência de alguns líderes do tráfico de drogas que se identificam como evangélicos e de algumas igrejas que transformam seu jeito de existir nas favelas por conta da dinâmica dessa criminalidade.

O CRESCIMENTO PENTECOSTAL NAS PERIFERIAS

Conforme Rodrigues (2004), o tráfico de drogas é, sem dúvidas, um verdadeiro mercado de trabalho ilícito, com alto grau de lucratividade, justamente por se tratar de uma atividade com diversos níveis, mantido por redes internacionais ou por quadrilhas inseridas em favelas. Normalmente é composto por pessoas excluídas da sociedade, pobres, desempregados e subempregados, que encontram dificuldade de acesso à infraestrutura Estatal, mas facilidade de acesso às instituições corruptas e ao próprio sistema financeiro “ilegal”, conforme explicam Cruz Neto, Moreira e Sucena (2002). O tráfico de drogas nas favelas está tão bem estruturado que chegamos a um ponto onde é possível encontrar planos de carreira, com possibilidades de ascensão profissional e social e diferentes remunerações dependendo da atividade e função desempenhada. O lucro do tráfico retorna à economia formal, assegura lucros para os empresários das comunidades e mantém postos de trabalho, o que torna viável a sua manutenção nas comunidades.

Em virtude da exploração massiva pela mídia ao longo das últimas décadas, o modelo de tráfico de drogas e suas consequências vêm contribuindo para um novo conceito de favela que vincula de forma taxativa a pobreza e a violência, destacando-se como uma vizinhança instável, perigosa e incômoda (PICANÇO e LOPES, 2016,).

Tinha-se, até poucos anos atrás, que o catolicismo era um elemento central estabelecido no Brasil, entendendo-se por cultura popular tradicional. Entretanto, o crescimento do número de evangélicos pentecostais, em específico nos espaços públicos e políticos, têm provocado abalos nessa prevalência católica, gerando, inclusive, abalo nas esferas da vida social nas periferias (CUNHA, 2018, p. 03).

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os números obtidos no Censo 2010 (cabe esclarecer que o Censo de 2022 não abordou especificamente o número de membros de cada religião) confirmam essa alteração emblemática, com o número de evangélicos crescendo mais de 16 milhões em dez anos:

A proporção de católicos seguiu a tendência de redução observada nas duas décadas anteriores, embora tenha permanecido majoritária. Em paralelo, consolidou-se o crescimento da população evangélica, que passou de 15,4% em 2000 para 22,2% em 2010. Dos que se declararam evangélicos, 60,0% eram de origem pentecostal, 18,5%, evangélicos de missão e 21,8 %, evangélicos não determinados.

Outrossim, mesmo não indicando o número de adeptos de cada religião, é imprescindível afirmar que o Censo de 2022 trouxe novidades quanto ao cadastramento e georreferenciamento de todos os 111 milhões de endereços do Brasil cadastrados durante a pesquisa, o que evidenciou números alarmantes entre estabelecimentos religiosos, educacionais e de saúde. Segundo os dados coletados, o Brasil possui 579,7 mil estabelecimentos religiosos (igrejas, templos e outros), sendo 286 para cada 100 mil habitantes; 264,4 mil estabelecimentos de ensino (escolas, creches e universidades), sendo 130 para cada 100 mil habitantes, e 247,5 mil estabelecimentos de saúde (hospitais, clínicas e pronto socorro), sendo 122 para cada 100 mil habitantes.

A partir da análise dos dados inseridos no mapa do Brasil divulgado pelo Censo 2022, percebe-se que o número de estabelecimentos religiosos em comparação à população é muito maior na Região Norte (estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins), onde há 79.650 igrejas (459 para cada 100 mil habitantes). Com 554 igrejas para cada 100 mil habitantes, o Acre está liderando a média nacional, seguido de Roraima e Amazonas, cada um com 485 para cada 100 mil habitantes. Já na região Sul (Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina) a relação entre o número de estabelecimentos religiosos e a população é reduzida, eis que há apenas 226 estabelecimentos para cada 100 mil habitantes.

Segundo análise de Christina Vital da Cunha (2009), a fé dos traficantes, entre 1980 e 1990, estava intrinsecamente ligada às religiões de matriz africana (umbanda e candomblé), existindo múltiplos locais de culto nas favelas. Inclusive, eram realizados registros da religiosidade em tatuagens, rituais, construção de altares e pinturas nos muros das favelas. Todavia, a partir da década de 90 alguns policiais que foram se introduzindo nas favelas destruíram diversos emblemas religiosos da presença e dominância dos traficantes, marcando, assim, a tomada dos territórios e proclamando a nova ordem local com emblemas e imagens cristãs. Inclusive, esse é o motivo pelo qual até hoje existem traficantes que perseguem os praticantes das religiosidades afro.

O crescimento exponencial das igrejas neopentecostais também pode ser atribuído à capacidade de atualizar seus instrumentos de evangelização, ainda que enfatize a questão do sobrenatural. Especialmente na questão dos templos que, de forma totalmente diferente do sagrado católico, que traz à tona o elemento divino, edificando catedrais majestosas, as religiões neopentecostais fixam-se em lugares comuns e até mesmo periféricos, onde anteriormente existiam estabelecimentos comerciais/industriais ou residenciais, concebendo-se a igreja enquanto local não sagrado, mas comum, de reunião de todos os fiéis, proporcionando acolhimento sem distinções ou constrangimentos (MELLO NETO E SILVA JÚNIOR, 2010).

Esse crescimento ocorre, sobretudo, em países em desenvolvimento, em contextos periféricos, conectado diretamente com o perfil socioeconômico local, a experiência de vulnerabilidade social e a vivência de abandono do poder público, apresentando-se como resposta, ou fuga, aos desafios e sofrimentos, por meio das redes de apoio evangélicas pentecostais, ressignificando o dia a dia de quem vive em territórios marcados pela violência e abandono. Interessante observar, também, os números trazidos pelo Censo Institucional Evangélico, realizado pelo Instituto Superior de Estudos da Religião (ISER) entre 1990 e 1992, que apresentaram riquíssimos detalhes do avanço pentecostal nas periferias de 13 municípios da região metropolitana do Rio de Janeiro.

Durante o período foi registrada a abertura de 3.477 templos, sendo que destes, 61% eram de igrejas pentecostais. Os outros (39%) eram igrejas protestantes históricas. Ainda, neste mesmo intervalo, 710 novos templos foram registrados no cartório do estado, uma média de 5 novas igrejas evangélicas por semana. O que se mostra ainda mais surpreendente, na percepção de Mariano (2014), é a constatação de que “em cada dez templos evangélicos criados no período, nove eram pentecostais”.

A respeito do crescimento pentecostal em áreas de fragilidade político-social, Cunha (2014, p. 67), da Universidade Federal Fluminense, afirma que:

Embora muitas análises tratem de salientar que a onda pentecostal, para usar uma expressão de Freston (2014), ganhou nos últimos anos a adesão de segmentos abastados, não se pode negar o fato de que, ainda hoje, os mais pobres e mais vulneráveis econômica e socialmente são os que compõem a maioria pentecostal mundo afora. Nos países em desenvolvimento, são os habitantes dos “territórios da pobreza” aqueles que mais se convertem. Assim também ocorre em países desenvolvidos [...] O pipocar de denominações e templos evangélicos pentecostais nesse país é alvo da atenção da academia e dos governos locais, preocupados com o crescimento das (possíveis/supostas) seitas e com a forma pela qual tal crescimento pode impactar essas sociedades e culturas.

Essa fala reforça as preocupações quanto ao futuro da religião no país e a sua influência nos campos políticos e sociais, motivo pelo qual estudos mais aprofundados devem ser realizados e o acompanhamento dessas mudanças religiosas deve ser acentuado.

Importante ressaltar que o neopentecostalismo atual é diferente do movimento pentecostal inicial (surgido em 1910), cuja ênfase recaía sobre o batismo no Espírito Santo, a cura e a salvação mediante a rejeição do mundo. Surgindo durante o inchamento urbano no Brasil, desenvolvimento da industrialização, modernização e comunicação em massa, no final da década de 70, com a crise católica, o movimento neopentecostal se caracterizou, sobretudo, pela realização de milagres e na crença da salvação e extinção da pobreza, da miséria e da opressão demoníaca, iniciando a guerra espiritual viabilizada pelos três pilares: cura, exorcismo e prosperidade (PICOLOTTO, 2016, p. 81).

De acordo com Cao e Zhao (2010), processos intensos e acelerados de modernização, quando acompanhados por uma fragilidade estatal e redes de infraestrutura incapazes de responder às novas demandas urbanas, resultam em períodos de anomia social, que encorajam a emergência de novas experiências de coletividade e coesão, que são alavancadas com a falta de investimento Estatal nas favelas, surgindo, assim, os chamados poderes paralelos. Essa negligência estatal com investimentos em infraestrutura urbana, serviços básicos de saúde, educação, lazer e segurança, em conjunto do sentido de insegurança e ameaça proveniente dos conflitos com a polícia e comunidade, conduz favoravelmente ao surgimento destes poderes paralelos ao Estado (OLIVEIRA & ALENCAR, 2017).

Em algumas comunidades dominadas pelo tráfico de drogas o poder político e religioso está na mesma pessoa (traficante), o que favorece a criação de um estado paralelo teocrático, pois “existe um povo, uma unidade cultural, espaço geográfico e existe quem governa (que não é o governador ou o prefeito), faltando apenas uma constituição” (Veira, 2024, entrevista digital).

No entendimento de Amorim e Júnior (1993), a concepção de “estado paralelo” depende de:

1) disposição das organizações criminais de uma força armada, composta por milícias próprias; 2) sustentação de um poderio bélico pelo qual passa o controle da vida social de todo um território, impondo regras de conduta à população; 3) realização de ações assistencialistas normalmente realizadas pelo Estado; 4) influência direta ou indireta na escolha de lideranças locais que ocupam cargos representativos em entidades locais ou até mesmo apoio à candidatura de parlamentares; 5) existência de burocracia organizacional; 6) afirmação do poder à organização criminal independente do reconhecimento formal do Estado, com quem se confronta frequentemente.

Conforme Leal e Almeida (2012), esses poderes paralelos são comumente exercidos por organizações criminosas que dominam as comunidades periféricas dos grandes centros urbanos e atuam por meio da brutalidade e discursos morais, estabelecem relações íntimas entre seus integrantes e a comunidade em geral que, juntos, operam contra as forças militares oficiais que tentam adentrar nos territórios dominados.

Ainda segundo os autores acima referidos:

As organizações criminais utilizam-se também do discurso moral – assim como a organização estatal – para convencer os indivíduos do valor do crime organizado, fazendo-os perceber sua face assistencialista, ou seja, o seu “lado bom”. Desta forma, torna o controle que exercem sob a população mais estável do que se o fizessem simplesmente através do domínio pela força. Independente dos “bons” sentimentos que o “dono do morro” possa ter para com os seus conterrâneos, o seu comportamento compre a função de estabilizar o seu poder. Por mais sutil que seja a diferença entre um domínio (instável e/ou estável), não se trata de um mero detalhe. (LEAL e ALMEIDA, 2012, p. 12)

Nas comunidades periféricas dos grandes centros urbanos Brasileiros funcionam dois grandes grupos que diferem entre si: as milícias e as facções. A primeira é constituída, majoritariamente, por policiais, ex-policiais, bombeiros e agentes penitenciários com formação militar, que se juntam para prestar segurança às regiões não alcançadas pelo poder estatal, exigindo da comunidade em que atuam o pagamento de serviços básicos através da imposição do medo e da violência.

Já as facções surgem no Brasil durante o período da Ditadura Militar, em que ocorreram diversas situações de violência nas unidades prisionais, e foi necessário a união dos detentos em grandes grupos como, por exemplo, o Primeiro Comando da Capital (PCC), em São Paulo, ou o Comando Vermelho (CV), no Rio de Janeiro, para unir forças em prol da segurança e autogestão carcerária. Mas, a partir de bem estruturadas e unificadas, as facções começam a obter lucro por meio dos crimes de roubo, sequestros e, principalmente, o narcotráfico, impulsionado pela entrada de vários países-latino americanos nas redes de tráfico no final do século XX (HIRATA, CARDOSO, GRILLO et al., 2019).
Com o tráfico de drogas, eleva-se, também, o risco constante aos jovens pobres pelo fato de atuarem na ilegalidade, deixando-os vulneráveis e desamparados diante das regras do sistema institucional, suscetíveis às repressões policiais e problemas como a ausência de assistência médica e psicológica. Uma das alternativas é se destacar e ser conhecido na favela em que atua, gerando dinheiro, poder e fama, ingredientes que acrescentam sedução à vida do crime, principalmente nestes ambientes em que a vida pública e privada se entrelaçam.

Conforme Teixeira (2009), um novo tipo de mercado ilegal de drogas foi surgindo a partir da introdução da cocaína no dia a dia das favelas, passando as quadrilhas a fazerem uso de força por meio das armas de fogo, garantindo maior imposição desse poder paralelo à comunidade. É o próprio tráfico que, diante da necessidade de controle e gestão, cria leis, julga os infratores aos códigos estabelecidos e os pune, organizando a favela em nome da funcionalidade do negócio.

Um dos aspectos bem interessantes a ser avaliado, segundo Grillo (2013), é a forma com que se (inter)relacionam os donos do morro e seus subalternos, uma vez que os mesmos mantêm contato próximo, respeitam a honra do “sujeito homem” e “moral de cria”, causando fascínio e admiração para com o outro, diferente da grande maioria das relações entre “patrão” e funcionário nas relações de trabalho formal, em que geralmente o primeiro se torna ausente, impositivo e até fugaz.

Alba Zaluar (1994-1995) traz uma perspectiva interessante entre os jovens que residem em áreas periféricas e de classes mais pobres e o crime organizado, afirmando que estes são as principais vítimas e também os principais agentes da criminalidade, pois prestam os serviços na linha de frente, onde existem mais riscos do que lucros. São eles, jovens, que fazem a distribuição das drogas, carregam as armas e enfrentam a polícia e as quadrilhas/facções rivais, o que, consequentemente, torna-os estatísticas daqueles que, com menos de 25 anos, já estão presos ou já foram mortos em “serviço”.

O vínculo entre traficantes e a igreja nas favelas surge a partir do momento em que as lideranças evangélicas ganham poder político e estabelecem acordos com o crime organizado para proteção e paz no espaço. Sem contar, também, que, por exemplo, segundo consta no site da Assembleia de Deus dos Últimos Dias (ADUD), fundada por Marcos Pereira da Silva, a atuação dentro dos presídios levando a palavra de Deus gera empatia entre os traficantes, alcançando lugares dentro da periferia que são isentos do poder público.

DIREITO, RELIGIÃO E O ESTADO BRASILEIRO LAICO

A Igreja Católica utilizou todos os seus recursos para que, durante a Assembleia Constituinte de 1890, incumbida de promulgar a Constituição da República, os valores do catolicismo fossem utilizados ao máximo para compor o novo documento que daria base à sociedade brasileira. Entretanto, a Constituição de 1891 rejeitou qualquer tipo de união entre o poder civil e o poder religioso, exterminando, dessa forma, o Regime do Padroado, dando início ao regime de separação entre Igreja e Estado (CÂMARA NETO, 2006).

O Estado assumiu o compromisso de garantir a liberdade e a igualdade de todos os cidadãos, independente dos valores morais e religiosos, adotando uma postura, do ponto de vista jurídico-constitucional, de Estado moderno (na acepção da teoria da secularização cunhada nos países centrais) teoria esta que prevê a separação entre Igreja e Estado premissa básica para os Estados modernos (Huaco, 2008, p. 34). Importante também referir a compreensão de Huaco (2008, p. 43) que:

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o Estado (diga-se o Estado moderno) não busca a salvação das almas, mas sim a máxima expansão das liberdades humanas em um âmbito de ordem pública protegida, ainda que às vezes o exercício de tais liberdades seja contrário aos padrões éticos das religiões.

Percebe-se que no próprio preâmbulo da Constituição Federal (CF) de 1891 não consta qualquer referência eclesiástica: “Nós, os representantes do povo brasileiro, reunidos em Congresso Constituinte, para organizar um regime livre e democrático, estabelecemos, decretamos e promulgamos a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL”. O artigo 72, parágrafos 4º, 5º, 6º e 7º da Constituição são uma evidência desta separação, pois abordou de forma autônoma e distante das concepções católicas assuntos como casamento, registro civil, cemitérios, educação pública confessional, dentre outros.

Artigo 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

[...].

§ 4º - A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita.

§ 5º - Os cemitérios terão caráter secular e serão administrados pela autoridade municipal, ficando livre a todos os cultos religiosos a prática dos respectivos ritos em relação aos seus crentes, desde que não ofendam a moral pública e as leis. § 6º - Será leigo, [isto é, laico], o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos.

§ 7º - Nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial, nem terá relações de dependência ou aliança com o Governo da União ou dos Estados.

É evidente que a promulgação da Constituição não necessariamente alterou o cotidiano das pessoas, que continuavam a agir e pensar de acordo com o Regime do Padroado, que vigorou no Brasil por aproximadamente 400 anos, durante o Brasil Colônia e Império. Esse regime de separação entre Estado e Igreja não trouxe somente mudanças negativas à Igreja, pois esta passou a exercer suas atividades sem interferência estatal, com maior autonomia no trabalho pastoral e trabalhos internos, publicando livros e documentos livremente e cobrando o dízimo sem interferências (ESQUÍVEL, 2008, p. 169).

Ocorre que, com a chegada de Getúlio Vargas ao poder, o que parecia irrevogável foi rapidamente modificado, a começar pelo preâmbulo da Constituição de 1934, que passou assim a vigorar:

Nós, os representantes do povo brasileiro, pondo a nossa confiança em Deus, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para organizar um regime democrático, que assegure à Nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bem-estar social e econômico, decretamos e promulgamos a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL DE 16 DE JULHO DE 1934. (grifo próprio)

Essa referência no preâmbulo da CF retrata o posicionamento dos legisladores membros da Assembleia Constituinte, revelando o sentimento religioso da maioria da população à época, visto como um ato tradicional na história do constitucionalismo brasileiro.

Alterações também foram realizadas no art. 17 da Constituição, evidenciando a colaboração recíproca entre a Igreja e o Estado, vejamos:

Artigo 17 - É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

II - estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos religiosos; III - ter relação de aliança ou dependência com qualquer culto, ou igreja sem prejuízo da colaboração recíproca em prol do interesse coletivo.

Outrossim, como aponta Emmerick (2010), a CF de 1934 alterou grande parte dos princípios liberais estabelecidos pela Constituição de 1981, possibilitando a interferência do religioso na política e nos assuntos públicos do Estado, bem como restabeleceu-se as aulas de ensino religioso nas escolas públicas em todos os seus níveis (primário, secundário), bem como o casamento religioso passou novamente a ter efeitos civis, ocasionando grandes retrocessos aos avanços da Constituição anterior e ao Estado laico. E, com a nova Constituição em voga, a Igreja Católica reconquistou seu espaço nas relações públicas, privadas e políticas, passando a exercer ingerências que formavam margens de manobra para defender seus interesses, o que agora estava calcado no inciso III do art. 17 da CF, “colaboração em prol de interesse coletivo”.

Mesmo com a Constituição de 1946, que previa o regime democrático no Brasil, as relações entre Igreja e Estado permaneceram inalteradas, o preâmbulo continuava mencionando Deus, o casamento religioso manteve efeitos civis, garantia-se à família monogâmica e heteressexual proteção especial por parte do Estado. Uma das únicas alterações da Constituição foi ao avanço dos direitos fundamentais de liberdade de consciência e liberdade religiosa, garantias estas que foram incrementadas ao texto original (EMMERICK, 2010).

A partir do golpe civil militar, em 1964, este cenário foi brutalmente alterado , rompendo-se o estado democrático de direito. Entretanto, as Constituições de 1967 e 1969, promulgadas durante o governo militar, em nada alteraram o texto constitucional de 1946 no que se refere à relação Igreja/Estado. Conforme Emmerick (2010), nos anos seguintes novas denominações religiosas começam a disputar espaço econômico, social, cultural e intelectual com a Igreja Católica que, ao perceber a perda da sua hegemonia e com a necessidade de mudança de estratégia, deixou de lado a caridade cristã e focou nos compromissos sociais, surgindo a Teologia da Libertação.

Já com a redemocratização do Brasil e a promulgação da Constituição de 1988, os discursos da Igreja Católica e de outras denominações religiosas de matriz cristã se viram contraditórios nas discussões da Assembleia Constituinte, em especial nos temas que contrariam seus ensinamentos e dogmas basilares. Em razão disso, a Igreja influenciou de forma constante e massiva no processo da Constituinte objetivando garantir seus interesses nas questões relacionadas à família, à moral, à educação e, de maneira bem marcante, à reprodução, à sexualidade e ao planejamento familiar.

Estes aspectos são comprovados quando da leitura do art. 5º da Constituição Federal de 1988, que prevê a colaboração entre as religiões e o Estado em ações de interesse público; concede imunidade tributária a templos de qualquer culto; prevê o ensino confessional nas escolas públicas; mantém o casamento religioso com efeitos civis; concede à família proteção especial, dentre outros.

A Constituição de 1891, mesmo tendo sido uma das primeiras a ser promulgada, foi a mais laica da história da sociedade brasileira, visto que a separação entre Igreja e Estado é muito mais nítida e clara do que as posteriores. Mas, não obstante esta separação ser constitucionalmente regulada, percebe-se que a linha que distingue o religioso e o político é muito tênue, o que facilmente incorre em dificuldade de se estabelecer os limites de atuação entre o Estado e as Igrejas.

Neste sentido, tratando-se do vínculo entre influência religiosa no campo político, o professor e historiador Leandro Karnal (2022, entrevista digital), diz:

Os evangélicos neopentecostais são uma novidade crescente na cena política e possuem projetos e interesses específicos e se aproximam de políticos que podem favorecer tais projetos. Isso inclui convicções sinceras contra o aborto ou oportunismos variados. Existe uma reação quase global de desconfiança com a modernidade dissolução de fronteiras de gênero, etc.) que encontra eco em projetos políticos conservadores e instituições religiosas.

Hervieu-Léger (2008, p. 41) contribui de forma importante para que se possa entender as mudanças que estão ocorrendo na relação entre os indivíduos e as instituições religiosas na contemporaneidade (da religião em movimento), salientando que:

Falou-se, muito equivocadamente, de “retorno do religioso” ou de “revanche divina”, para designar, desordenadamente, o atual desenvolvimento dos novos movimentos espirituais, o aumento das correntes carismáticas, o retorno das peregrinações [...]. Longe de se ligarem ao universo religioso das sociedades do passado, esses fenômenos, pelo contrário, trazem à luz o caráter paradoxal da Modernidade do ponto de vista da crença. [...] As instituições religiosas continuam a perder sua capacidade cultural de impor e regular as crenças e as práticas. O número de seus fiéis diminui e os fiéis “vêm e vão”, não apenas em matéria de prescrições morais, mais igualmente em matéria de crenças oficiais. De outro lado, esta mesma modernidade secularizada oferece, geradora que é, a um tempo, de utopia e de opacidade, as condições mais favoráveis à expansão da crença. Mas a incerteza do porvir é grande, mais pressão de mudança se intensifica e mais crenças se proliferam, diversificando-se e disseminando-se ao infinito. O principal problema, para uma sociologia da modernidade religiosa, é, portanto, tentar compreender conjuntamente o movimento pelo qual a Modernidade continua a minar a credibilidade de todos os sistemas religiosos e o movimento pelo qual, ao mesmo tempo, ela faz surgir novas formas de crença. Para responder a esse problema, é necessário ter entendido que a secularização não é, acima de tudo, a perda da religião no mundo moderno.

A autora Chantal Mouffe (2006, p. 25-26) ensina que as religiões não podem ser ignoradas enquanto atores políticos nos debates e nos embates na arena pública, mas a participação na política deve respeitar estritamente os limites constitucionais:

Falar de separação Igreja e Estado, portanto, é uma coisa; outra é falar de separação entre religião e política; e outra ainda é falar de separação entre o público e o privado. O problema está no fato de que esses três tipos de separação são às vezes apresentados como de algum modo equivalentes e requisitando-se mutuamente. A consequência disto é que a separação entre Igreja e Estado é vista como implicando a exclusão de todas as formas religiosas da esfera pública. [...] Não acho que esta concepção possa ser defendida. Na medida em que atuem nos limites constitucionais, não há qualquer razão pela qual os grupos religiosos não devam intervir na arena política para pronunciar-se em favor de ou contra certas causas. Certamente, muitas lutas democráticas têm sido informadas por motivos religiosos. E a luta pela justiça social tem com frequência sido fortalecida pela participação de grupos religiosos [...]. As tradições possuem poder de aglutinação especial no trato de intuições morais principalmente no que tange a formas sensíveis de uma convivência humana, Tal potencial faz do discurso religioso que vem à tona em questões políticas referentes à religião um candidato sério a possíveis conteúdos de verdade, os quais podem ser, então, toma-dos do vocabulário de uma determinada comunidade religiosa e traduzidos para uma linguagem acessível em geral.

Então, afinal, qual é o conceito de religião? Devemos considerar ser o mais aberto possível, evitando-se, assim, restrições desnecessárias, permitindo toda e qualquer manifestação religiosa, caso contrário estaremos incorrendo em erros frente ao Estado de Direito Democrático, infringindo o próprio princípio da neutralidade estatal.

Conforme ensinamentos de Laurence Tribe (1988), até o século XIX o conceito de religião era compreendido de forma restrita, teísta, em termos ocidentais, vinculando divindade, moralidade e adoração. Entretanto, a partir do século XX, mais de 250 grandes organizações religiosas foram reconhecidas, o que gerou um novo conceito de religião, agora sob perspectiva do crente e não de uma teologia sistematizada. No Brasil a religião é percebida como uma crença e a manifestação dessa no poder divino ou sobrenatural. Não é necessária sistematização teológica, nem uma unidade organizacional ou vinculação a um determinado líder.

Assim, basta a ligação a um aspecto sobrenatural, ainda que não seja ligado a um deus pessoal para ser considerada religião e estar sob a proteção constitucional, como é o caso do candomblé, o cristianismo, o islamismo, o budismo, o espiritismo, a prática de cartomancia, entre outros. Mas é importante fazermos uma ressalva, o conceito de religião não pode ser confundido com ideologia, crenças políticas ou outro tipo de manifestação intelectual do ser humano, pois deve estar, obrigatoriamente, vinculada ao sobrenatural (Teraoka, 2010).

Percebe-se que no inciso VI, art. 5º, da Constituição Federal de 1988, não se busca tutelar alguns aspectos da liberdade religiosa, mas sim a liberdade de consciência. Esta liberdade é a faculdade do indivíduo formular ideias a respeito de si mesmo e do mundo que o cerca, não se confundindo com liberdade religiosa. A primeira é mais ampla e compreende tanto a liberdade de ter ou não ter religião, bem como de ter qualquer religião, tratando-se do foro individual, enquanto a segunda possui uma dimensão social e institucional.

Arremata Teraoka (2010, p. 50):

[...] a crença, como consciência interna, deve ser sempre livre, não podendo regras jurídicas determinar ou impedir que seres humanos pensem ou acreditem de determinada forma ou em determinada divindade, pois a liberdade de crença protege tanto os aspectos ligados à fé como também a exteriorização da crença religiosa pelo indivíduo por meio de práticas externas.

Para Silva (1989) a liberdade religiosa é compreendida como 3 liberdades: I. liberdade de crença com conotação interior ou espiritual que, no máximo, protege o homem na sua profissão de fé no interior de sua residência, nos chamados cultos domésticos; II. liberdade de culto, que protege a exteriorização da fé, permitindo ao homem a prática pública da religião; III. liberdade de organização religiosa, permitindo a constituição de igrejas ou denominações jurídicas com fins religiosos.

Já para Pinheiro (2007) é visível três dimensões da liberdade religiosa, a primeira é a chamada “subjetiva ou pessoal”, a qual abrange o direito do indivíduo; a segunda é a “dimensão coletiva”, referindo-se ao direito ao culto público, ao proselitismo religioso e à possibilidade de divulgação das ideias religiosas e, por último; a “dimensão institucional”, abrangendo a liberdade de organização religiosa, cultos e liturgias, bem como a possibilidade de arrecadação de recursos para consecução de seus fins.

Como muito bem conceitua Sarlet (2020, documento digital), o direito à liberdade religiosa, “[...] trata-se de um direito complexo que, nem por isso, deixa de ser eficaz e operacional, inserindo-se nas relações entre as pessoas, físicas e jurídicas, e o Estado — e das pessoas entre si.”, de forma que todos possuem direitos, assim como todos possuem limites para exercê-lo.

DA RELIGIÃO E O EMBASAMENTO JURÍDICO

O ordenamento jurídico brasileiro estabelece de forma muito abrangente o direito à liberdade, mas ressalta que ele não é absoluto, eis que sua prática é restrita por outros princípios constitucionais e por regras impostas pela própria Constituição.

A liberdade de expressão, por exemplo, encontra amparo no art. 5º, IV da CF, que define “livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.” Assim sendo, a CF garante a liberdade de opinião, convicção, comentário, avaliação e/ou julgamento, independentemente do assunto ou pessoa que se trata. Importante ressaltar que o direito à liberdade de expressão, de consciência e da liberdade em geral não se confundem, eis que cada um deles trata de direitos garantidos separadamente na Constituição, possuindo características próprias que os especificam. Mas evidentemente, importantes que são, se conectam entre si a partir de muitos pontos, podendo, todos, serem fundamentos legítimos para um mesmo fato.

Nesse sentido, a liberdade religiosa encontra amparo em três garantias constitucionais: liberdade em geral; liberdade de consciência, e liberdade de expressão. Entretanto, mesmo tendo tanto fundamento constitucional, ainda assim a liberdade religiosa não é absoluta, como podemos mensurar a partir do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do caso Siegfried Ellwanger (concluído em 17 de setembro de 2003).

Proprietário da editora “Revisão Editora LTDA”, Ellwanger publicou obras de relevância que tratavam sobre os crimes de guerra ocorridos durante o Holocausto, assim intitulados “Os conquistadores do mundo - os verdadeiros criminosos de guerra” (de autoria de Louis Marschalko), “o Judeu Internacional”, e “Holocausto Judeu ou Alemão - nos bastidores da mentira do século”, de Henry Ford, nos quais, segundo a denúncia realizada, abordaram mensagens anti-semitas e discriminatórias, motivo pelo qual Ellwanger foi condenado pelo crime de preconceito, forte no art. 20, caput da Lei 7.716/89, que prevê pena de reclusão de um a três anos e multa a quem “Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.”

Impetrado o Habeas Corpus ao Supremo Tribunal Federal, manifestou-se o Relator Ministro Moreira Alves esclarecendo que o recurso não se insurgiria contra a decisão no crime de preconceito, mas sustentou que o preconceito contra judeus não caracterizaria racismo, para fins de se considerar o delito imprescritível. Assim sendo, na sua percepção, o conceito de racismo não abrange toda forma de preconceito e discriminação, “Não sendo, pois, os judeus uma raça, não se pode qualificar o crime por discriminação pelo qual foi condenado o ora paciente [Ellwanger] como delito de racismo e, assim, imprescritível a pretensão punitiva do Estado.”.

Entretanto, conforme julgamento, não foi este o entendimento que prevaleceu, devido ao Ministro Maurício Correa afirmar que, cientificamente, não há raças, de modo que a interpretação do Ministro Moreira Alves não permite a aplicação do que prevê o art. 5º, XLII da CF. No mesmo viés, manifestou-se o Ministro Gilmar Mendes, que “do ponto de vista estritamente histórico, não há como se negar o caráter racista do anti-semitismo.” Ou seja, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a vedação do racismo é limite objetivo à liberdade de expressão.

Atentando-se aos votos divergentes, percebemos a interpretação do Ministro Carlos Ayres Britto, que reconheceu estar frente a uma “contraposição de princípios jurídicos”. Constatou a atipicidade do fato, visto que as condutas descritas na denúncia eram anteriores à Lei 7.716/89, mas, no mérito do habeas corpus, reconheceu que há três excludentes de abusividade da liberdade de manifestação do pensamento: crença religiosa, convicção filosófica ou convicção política. Assim, entendeu que pelo fato das obras escritas e divulgadas por Siegfried Ellwanger serem de caráter científico, de revisionamento histórico, estavam acobertadas pela liberdade de manifestação de pensamento.

Outro caso de grande repercussão que também trata sobre o direito religioso e seus desmembramentos ocorreu na Espanha, quando o Tribunal Constitucional do país, em 1996, reconheceu a restrição indevida de liberdade de expressão, amparada pelo art. 20.1, a, da Constituição da Espanha, à Pedro Varella Geiss, titular e diretor de uma livraria europeia que publicou materiais supostamente vexatórios “para o grupo social integrado pela comunidade judaica”. Foi condenado, em instâncias originárias, como responsável pelo crime continuado de genocídio, art. 607.2 do Código Penal Espanhol, visto que negava a perseguição e o genocídio sofridos pelo povo judeu durante a Segunda Guerra Mundial.

Dessa forma, no Tribunal Constitucional da Espanha foi reconhecido que a liberdade de expressão compreende, também, a liberdade de crítica, “ainda quando a mesma seja ríspida e possa molestar, inquietar ou desgostar a quem se dirige, pois assim o impõe o pluralismo, a tolerância e o espírito de abertura, sem os quais não existe sociedade democrática.” E continuam, afirmando que “a liberdade de expressão é válida não somente para as informações ou ideias acolhidas com favor ou consideradas inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas que contrariam, chocam ou inquietam o Estado ou uma parte qualquer da população.”

Na legislação brasileira, por exemplo, as organizações religiosas são asseguradas pelo artigo 44, I, do Código Civil de 2002, o qual foi incluído na legislação pela Lei nº 10.825 no dia 22 de dezembro de 2003, garantindo maior autonomia em relação ao Poder Público, eis que expresso na legislação infraconstitucional.

Já o parágrafo primeiro do referido Código assim dispõem:

São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento. (Incluído pela Lei nº 10.825, de 22.12.2003)

Assim, é natural que as organizações religiosas possam instituir um poder de auto-ordenação, formando suas normas de admissão e exclusão dos seus filiados, regras de distribuição interna do poder, bem como adotar modelos de governança próprios. Importante ressaltar que esse poder de auto-ordenação das igrejas não se confunde com o disposto nos arts. 59 e 60 do CC, que impõem uma gestão democrática das associações mediante a manifestação da vontade por meio de assembleias gerais. Diferem as igrejas justamente porque, na sua grande maioria, não são reguladas pela democracia, mas sim pela ordem hierárquica, de forma que o convencimento das lideranças é suficiente e superior à opinião dos membros e fiéis.

Concluindo-se, assim, que a autonomia da organização religiosa possui seus fundamentos no direito à liberdade religiosa, ganhando reforço e garantia pelo modelo de laicidade do Estado Brasileiro, identificado especialmente no art. 5º, VI a VIII e art. 19, I da Constituição Federal (CEDIRE, 2022).

Conforme prevê o artigo 5º, VI da Constituição Federal de 1988, “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.” E, neste sentido, destacamos a concepção sobre religião a partir de Mendes e Branco (1996, p. 595 e 2015, p. 317) “na liberdade religiosa inclui-se a liberdade de crença, de adquirir alguma religião e a liberdade do exercício do culto respectivo. As liturgias e os locais de culto são protegidos pelos termos da lei”.

Assim, evidenciamos a importância do direito de liberdade de crença estar esculpido na Constituição Federal, protegendo as instituições e suas práticas religiosas. Entretanto, essas proteções têm limites e, a partir do momento em que as práticas religiosas o ultrapassam, não devem mais ser interpretadas à luz do direito previsto na Constituição.

De forma mais objetiva, a liberdade de manifestar sua fé, seja qual for a sua religião, a liberdade de realizar cultos e encontros para tratar de assuntos religiosos, liberdade para alterar entre as diversas religiões existentes, liberdade, inclusive, para não acreditar em nenhuma dessas religiões (ateísmo) ou até mesmo não ter religião, é a autonomia que representa a liberdade religiosa.

É importante distinguir as diferenças existentes entre a liberdade de crença e a liberdade de consciência, que não podem ser confundidas, conforme ressalta Dirley da Cunha Jr. (2011, p. 694):

Poder-se-ia dizer que isso não tem importância, na medida em que as liberdades de consciência e de crença se confundem, são a mesma coisa. Não é verdade! Primeiro porque a liberdade de consciência pode orientar-se no sentido de não admitir crença alguma. Os ateus e agnósticos, por exemplo, têm liberdade de consciência, mas não têm crença alguma. Segundo porque a liberdade de consciência pode resultar na adesão de determinados valores morais e espirituais que não se confundem com nenhuma religião, como ocorre com os movimentos pacifistas que, apesar de defenderem a paz, não implicam qualquer fé religiosa. (grifo próprio)

O Brasil, por exemplo, é um país que não tem religião definida, não segue nenhuma crença específica e, desta forma, deve manter as opiniões imparciais e longe de qualquer discriminação de crença, motivo pelo qual se define como Estado laico. Entretanto, há países com religião definida, a exemplo do Vaticano, um Estado Teocrático, onde a religião comanda a política do país, sendo utilizada como base para o desenvolvimento da sociedade e das estruturas governamentais.

Justamente por ser um país laico é que o Brasil deve ser imparcial nas questões religiosas, proporcionando formas para que as pessoas possam exercer a fé livremente, conforme explicita o Ministro Marco Aurélio, em julgamento no Supremo Tribunal Federal quanto ao ensino religioso em escolas públicas:

O quadro impõe ao Supremo, última trincheira da cidadania, atuar em defesa da liberdade religiosa e do estado laico. Cumpre-nos retirar o caráter confessional do ensino religioso. É tempo de atentar para o lugar da religião na sociedade brasileira, embora aspecto relevante, digno da tutela, desenvolve-se no seio privado, nas escolas, no lar. O convívio democrático deve prevalecer, a ampla liberdade de pensamento sem direcionamento estatal a qualquer credo. (grifo próprio)

É assegurada também, pela Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso VII, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares do país, de forma a não permitir a privatização de direitos em prol de crenças específicas. Outros artigos importantes previstos na Carta Magna são aqueles que limitam as ações dos entes federativos quando se trata da religião, a exemplo do artigo 19, I:

É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

[...]

Tendo em vista alguns doutrinadores que criticam a garantia de assistência religiosa nas entidades civis e militares do país, sob alegação de incompatibilidade com o Estado laico, Moraes (2012, p. 49-50) declara que:

Não nos parece procedente a crítica que alguns doutrinadores fazem a esse inciso da Constituição Federal, afirmando que não há compatibilidade entre um Estado laico e a previsão, como direito individual, de prestação de assistência religiosa, uma vez que o Estado brasileiro, embora laico, não é ateu, como comprova o preâmbulo constitucional, e, além disso, trata-se de um direito subjetivo e não de uma obrigação, preservando-se, assim, a plena liberdade religiosa daqueles que não professam nenhuma crença.

E, ainda, é vedado aos entes federativos, conforme dispõe o artigo 150, VI, alínea “b”, da Constituição Federal, “sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte [...] VI - instituir impostos sobre: b) templos de qualquer culto”.

Portanto, compreende-se que o direito de religião é universal e pode ser usado e gozado por todos, desde que respeitada a lei, a moral e os bons costumes, pois a liberdade de crença/religião deve ter limites, não podendo ser absoluta, sendo obrigatório que todos respeitem a crença alheia. Dessa forma, nessas proteções e limitações reconhecidas na Lei é imposto ao Estado o princípio da não intervenção na organização religiosa com o objetivo de proporcionar harmonia na sociedade, excluindo a possibilidade de preconceitos e extremismos religiosos.

Nesta mesma linha trabalha Sarlet (2020), compreendendo que há dois princípios entre Estado e Religião, sendo um deles o da separação, o qual aparta as igrejas e confissões religiosas da organização político-administrativa do Estado, permitindo livre organização e exercício de culto. A segunda é o princípio da não confessionalidade, no qual o Estado se afasta dos sujeitos religiosos, atuando de forma imparcial em todos os âmbitos.
Assim, percebe-se que a liberdade de religião é composta por três modelos de liberdades distintas, mas que estão intrinsecamente relacionadas, sendo elas: a liberdade de crença, a liberdade de organização religiosa e a liberdade de culto.

Consoante o magistério de Silva (1989, p. 223), englobam na liberdade de crença:

a liberdade de escolha da religião, a liberdade de aderir a qualquer seita religiosa, a liberdade (ou o direito) de mudar de religião, mas também compreende a liberdade de não aderir a religião alguma, assim como a liberdade de descrença, a liberdade de ser ateu e de exprimir o agnosticismo. Mas não compreende a liberdade de embaraçar o livre exercício de qualquer religião, de qualquer crença.

Já a liberdade de culto se evidencia na liberdade de orar e de praticar os atos próprios das manifestações exteriores na sua casa ou lugares públicos, e ainda a de receber contribuições para tanto. A possibilidade de estabelecimento e organização de igrejas e suas relações com o Estado demonstram a liberdade de organização religiosa, mas enfatizando que, perante a Constituição Federal, deve haver uma divisão bem nítida entre Estado e religiões em geral, não sendo possível existir religião oficial ou, então, proteção e garantias exclusivas à essa ou àquela.

Ressalta-se que a liberdade de religião e crença protege tanto as profecias vinculadas a religiões majoritárias e institucionalizadas, quanto aquelas crenças e convicções ateístas, teístas ou não teístas de grupos religiosos minoritários, de novos movimentos religiosos e, inclusive, de grupos não religiosos. Nesse sentido é interessante abordar a liberdade de crença como conceito mais amplo, alcançando as liberdades de crenças e convicções. Assim também compreende o Comentário Geral nº 22 do Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas (CCPR/C/21/Rev.1/Add.4, de 30 de julho de 1993), recomendando interpretação ampla dos termos “religião” e “crença”, favorecendo que o art. 18 da Declaração Universal de Direitos Humanos e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos alcance o maior número possível de crenças e religiões.

Por este motivo, há, também, qualificadoras no direito penal que abordam especificamente a religião, como, por exemplo, a de injúria por motivo religioso, prevista no art. 140, assim escrito:

Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

[...]

§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a religião ou à condição de pessoa idosa ou com deficiência: (Redação dada pela Lei nº 14.532, de 2023)

Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 14.532, de 2023)

Da mesma forma, o Código Civil Brasileiro garante às vítimas reparação civil, nos termos do artigo 927, ao decretar que “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Igualmente, o Estatuto da Igualdade Racial, Lei nº 12.288/10, prevê políticas de igualdade nos âmbitos da educação, trabalho, saúde, lazer e cultura, além da tutela de direitos das comunidades quilombolas e dos seguidores de religiões de matrizes africanas, em especial pelos artigos 24 e 26 do Estatuto, quais sejam:

Art. 24. O direito à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercício dos cultos religiosos de matriz africana compreende:

I – a prática de cultos, a celebração de reuniões relacionadas à religiosidade e a fundação e manutenção, por iniciativa privada, de lugares reservados para tais fins;

II – a celebração de festividades e cerimônias de acordo com preceitos das respectivas religiões;

III – a fundação e a manutenção, por iniciativa privada, de instituições beneficentes ligadas às respectivas convicções religiosas;

IV – a produção, a comercialização, a aquisição e o uso de artigos e materiais religiosos adequados aos costumes e às práticas fundadas na respectiva religiosidade, ressalvadas as condutas vedadas por legislação específica;

V – a produção e a divulgação de publicações relacionadas ao exercício e à difusão das religiões de matriz africana;

VI – a coleta de contribuições financeiras de pessoas naturais e jurídicas de natureza privada para a manutenção das atividades religiosas e sociais das respectivas religiões;

VII – o acesso aos órgãos e aos meios de comunicação para divulgação das respectivas religiões;

VIII – a comunicação ao Ministério Público para abertura de ação penal em face de atitudes e práticas de intolerância religiosa nos meios de comunicação e em quaisquer outros locais.

Art. 26. O poder público adotará as medidas necessárias para o combate à

intolerância com as religiões de matrizes africanas e à discriminação de

seus seguidores, especialmente com o objetivo de:

I - coibir a utilização dos meios de comunicação social para a difusão de proposições, imagens ou abordagens que exponham pessoa ou grupo ao

ódio ou ao desprezo por motivos fundados na religiosidade de matrizes africanas;

II - inventariar, restaurar e proteger os documentos, obras e outros bens de

valor artístico e cultural, os monumentos, mananciais, flora e sítios

arqueológicos vinculados às religiões de matrizes africanas;

III - assegurar a participação proporcional de representantes das religiões

de matrizes africanas, ao lado da representação das demais religiões, em

comissões, conselhos, órgãos e outras instâncias de deliberação vinculadas ao poder público.

O referido Estatuto prevê a reivindicação de medidas concretas para o atendimento de interesses individuais e/ou coletivos, bem como permite que um ente político solicite do outro a sua cooperação dentro dos projetos e programas de combate a discriminações e desigualdades que acometem os afro-brasileiros.

Evidente que não basta apenas a criação de medidas sociais que visem a população negra e a propagação de seus valores culturais individuais, pois o Estatuto, por si só, não tem o condão de alterar as desigualdades do país, em especial a desigualdade social. Tanto é que na esfera penal sequer há sanções em caso de descumprimento das premissas impostas pelo Estado.

Já no crime de “redução à condição análoga de escravo”, há majorante se o agente o cometer por motivo religioso, veja:

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: (Redação dada pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência. (Redação dada pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

[...]

§ 2o A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

O art. 208 do Código Penal prevê o crime de “ultraje a culto e impedimento ou perturbação a ato a ele relativo”:

Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.

Parágrafo único - Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.

Sem contar as penas previstas na legislação penal especial como, por exemplo, a Lei nº 7.716, de 05/01/1989, que criminaliza condutas que manifestem preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (art. 1º) ou a prática, indução ou a incitação de discriminação ou preconceito, com pena de reclusão de um a três anos e multa (art. 20).

Também previsto na Lei nº 2.889, de 01/10/1956, o crime de genocídio: “Art. 1º Quem, com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso, como tal: [...]”.

Para os grupos indígenas também há o crime daqueles que escarnecem de ritos religiosas indígenas, como é o caso do art. 58 da Lei nº 6.001, de 19/12/1973: “Constituem crimes contra os índios e a cultura indígena: I - escarnecer de cerimônia, rito, uso, costume ou tradição culturais indígenas, vilipendiá-los ou perturbar, de qualquer modo, a sua prática. Pena - detenção de um a três meses; [...]”

Inclusive, a própria Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 prevê, em seu art. II, 1., o princípio da isonomia, sob o qual não haverá distinção entre as pessoas em razão de opções religiosas:

Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.

No aspecto da isonomia religiosa, temos que a sua aplicação é bastante complexa, considerando que o seu cerne é dispensar tratamentos desiguais, de forma a desigualar o típico do atípico, o legal do ilegal, o legítimo do ilegítimo. Este princípio não impede que ocorram distinções entre indivíduos, mas impede que essas distinções sejam incoerentes. Assim, as distinções não permitidas nas leis e na CF devem ser rechaçadas de tal forma que diferenças baseadas na religião entre indivíduos não podem ser admitidas, exceto se previsto constitucionalmente, como é o caso da objeção de consciência. Mas, ainda assim, para que não se crie tratamento mais favorável ao objetor de consciência, deverá ele cumprir prestações alternativas previstas em lei.

Também há menção na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, de 1948, que veda a distinção por motivos religiosos e prevê a liberdade de manifestação pública de opiniões religiosas: “Artigo III. Toda a pessoa tem o direito de professar livremente uma crença religiosa e de manifestá-la e praticá-la pública e particularmente.”

Referência à liberdade religiosa está na Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969, o famoso Pacto de San José da Costa Rica, inclusive permitindo a divulgação da religião, garantindo a liberdade da manifestação pública de ritos religiosos:

Artigo 12. Liberdade de consciência e de religião

1. Toda pessoa tem direito à liberdade de consciência e de religião. Esse direito implica a liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças, bem como a liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças, individual ou coletivamente, tanto em público como em privado.

2. Ninguém pode ser objeto de medidas restritivas que possam limitar sua liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças.

3. A liberdade de manifestar a própria religião e as próprias crenças está sujeita unicamente às limitações prescritas pela lei e que sejam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral públicas ou os direitos ou liberdades das demais pessoas.

4. Os pais, e quando for o caso os tutores, têm direito a que seus filhos ou pupilos recebam a educação religiosa e moral que esteja acorde com suas próprias convicções.

Importante também ressaltar a “Declaração sobre a eliminação de todas as formas de intolerância e discriminação fundadas na religião ou em convicções”, que data de 1981, documento internacional muito bem detalhado que trata exclusivamente do tema e, já no seu artigo 1º, estabelece que

§1. Toda pessoa tem o direito de liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Este direito inclui a liberdade de ter uma religião ou qualquer convicção a sua escolha, assim como a liberdade de manifestar sua religião ou suas convicções individuais ou coletivamente, tanto em público como em privado, mediante o culto, a observância, a prática e o ensino. [...]

No artigo 3º, reconhece que “A discriminação entre os seres humanos por motivos de religião ou de convicções constitui uma ofensa à dignidade humana e uma negação dos princípios da Carta das Nações Unidas [...]”

Mas tanto como garante a liberdade religiosa, faz ressalvas quanto às suas limitações, conforme perceptível no art. 1º:

A liberdade de manifestar a própria religião ou as próprias convicções estará sujeita unicamente às limitações prescritas na lei e que sejam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral pública ou os direitos e liberdades fundamentais dos demais.

Esclarece e especifica, também, no art. 6º da Declaração, as liberdades que acompanharão o direito fundamental à liberdade religiosa, veja:

[...]

a) A de praticar o culto e o de celebrar reuniões sobre a religião ou as convicções, e de fundar e manter lugares para esses fins.

b) A de fundar e manter instituições de beneficência ou humanitárias adequadas.

c) A de confeccionar, adquirir e utilizar em quantidade suficiente os artigos e materiais necessários para os ritos e costumes de uma religião ou convicção.

d) A de escrever, publicar e difundir publicações pertinentes a essas esferas.

e) A de ensinar a religião ou as convicções em lugares aptos para esses fins.

f) A de solicitar e receber contribuições voluntárias financeiras e de outro tipo de particulares e instituições;

g) A de capacitar, nomear, eleger e designar por sucessão os dirigentes que correspondam segundo as necessidades e normas de qualquer religião ou convicção.

h) A de observar dias de descanso e de comemorar festividades e cerimônias de acordo com os preceitos de uma religião ou convicção.

i) A de estabelecer e manter comunicações com indivíduos e comunidades sobre questões de religião ou convicções no âmbito nacional ou internacional.

A religião e o direito possuem muitas similaridades, pois ambos são sistemas normativos com viés de conduzir, regrar, regulamentar a vida das pessoas, não necessariamente conflitando uma com a outra. Inclusive, um dos dez mandamentos, “não matarás”, possui a mesma finalidade e valor ético-jurídico que o artigo 121 do Código Penal. Mas há, também, direitos religiosos que não são tutelados pela norma jurídica como, a exemplo, o sacrifício dos rituais de animais, a poligamia, consumo de drogas em contexto religioso. Outras situações conflitantes ocorrem quando da necessidade de submissão a tratamento de saúde contrário à sua crença, os dias santos não reconhecidos por lei, concursos, provas e vestibulares que ocorrem aos sábados (candidatos adventistas), entre outras.

Interessante avaliar que, embora a Constituição Federal reconheça um valor positivo na prática da religião (seja ela qual for), assegurando de forma ampla o seu exercício, não informa, expressamente, que o Brasil é um Estado laico. Assim, a partir da leitura do art. 19, I da CF, entende-se que o modelo adotado é de separação entre Estado e religião, apresentando-se um Estado indiferente quanto a estes fenômenos e discussões religiosas.

Muito bem sinaliza Ramos (1987, p. 203), indicando que:

[..] há a separação atenuada, em que o Estado emite um julgamento positivo sobre a religião em geral, embora predominem os objetivos laicos, legalmente estabelecidos, sobre os objetivos religiosos e não haja opção de determinada seita. Essa valoração positiva da crença é sentida em disposição, conquanto reduzidas, que estimulam e favorecem a disseminação de práticas religiosas, mesmo que não envolvam subvenção.

Interessante aferir a decisão tomada pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do Recurso Extraordinário nº 494601/RS (28/3/2019) em que, por maioria, fixou-se a tese de que “É constitucional a lei de proteção animal que, a fim de resguardar a liberdade religiosa, permite o sacrifício ritual de animais em cultos de religiões de matriz africana”, vencido o ministro Marco Aurélio, que compreende a constitucionalidade do sacrifício de animais em ritos religiosos de qualquer natureza, vedada a prática de maus-tratos no ritual e condicionado o abate ao consumo da carne.

Lembrando, há regra constitucional que proíbe a crueldade e a tipifica como maus-tratos, art. 32 da Lei nº 9.605/98: “Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: [...] Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.” Assim, o desafio que se estabelece é aliar o âmbito ecológico com a dignidade humana na perspectiva intercultural inclusiva e progressiva, promovendo a liberdade religiosa e o combate à intolerância, nos termos da Resolução nº 440 do Conselho Nacional de Justiça.

Já no Supremo Tribunal Federal, recentemente, em 17 de abril de 2024, foi julgado o caso de Repercussão Geral (RE 859.376 - Tema 953) envolvendo o uso de trajes religiosos em fotos oficiais, que se iniciou a partir de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face da União e o Departamento de Trânsito do Estado Paraná (Detran-PR), dado o momento em que uma freira foi impedida de utilizar o hábito religioso na foto para renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH).

Por unanimidade, o Plenário seguiu com o entendimento do presidente do Supremo Tribunal Federal, e relator do caso, Ministro Luís Roberto Barroso que assim se manifestou:

Como nós todos sabemos, a liberdade religiosa é direito fundamental, e a restrição a um direito fundamental precisa respeitar o princípio da proporcionalidade. Aqui, ainda que se considerasse que a exigência de não poder utilizar o hábito fosse adequada para o fim de segurança pública, inequívoco que ela é uma medida exagerada e desnecessária por ser claramente excessiva.

Assim sendo, no julgamento ficou estabelecido que “É constitucional a utilização de vestimentas ou acessórios relacionados à crença ou religião nas fotos e documentos oficiais, desde que não impeçam a adequada identificação individual, com o rosto visível.”

Outro caso que requer atenção é a Lei Municipal 7.205/04, de Sorocaba, que instituiu a obrigatoriedade de exemplares da Bíblia nas bibliotecas municipais, que foi reconhecida como inconstitucional a partir do julgamento pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Na ação direta de inconstitucionalidade, processo nº 2287771-95.2023.8.26.0000, proposta pelo Ministério Público alegou-se que a Lei viola a laicidade do Estado e o princípio da isonomia (previsto na Constituição Federal), visto que prestigia um determinado grupo de pessoas em detrimento de outros em ambiente em que a religião ou o credo não podem receber especial consideração. O relator designado, desembargador Campos Mello, em 20 de abril de 2024, salientou que:

Não há notícia de que outros textos religiosos devam fazer parte obrigatória das bibliotecas municipais. Nem o Alcorão, nem o Talmude ou a Torá terão sido objeto dessa obrigatoriedade. Ao contrário, o art. 19 da Lei Maior veda que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estabeleçam cultos religiosos, embaracem os respectivos funcionamentos ou com eles mantenham relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público. No caso em tela, porém, a nítida opção do legislador municipal pela difusão apenas das religiões cristãs implica relação de aliança vedada pela Carta Magna. (grifo próprio)

Assim, embora a Bíblia seja um livro mundialmente conhecido, não há obrigatoriedade legal para que esteja em bibliotecas municipais, sob pena de ferir os princípios do Estado laico.

O artigo intitulado “Religião e Política: mistura sempre perigosa” de autoria do promotor de Justiça (MP-SE), mestre em Direitos Humanos, professor de Direito Eleitoral e membro da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), Peterson Almeida Barbosa, refere a decisão (ainda não transitada em julgado, ou seja, passível de recurso) do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro que cassou o diploma do deputado estadual Fábio Francisco da Silva (União), basicamente por ter promovido, por meio de programa em rádio na qual atua como apresentador, festivais gospel em templos religiosos “assemelhados a showmícios”.

E, em sua redação, o promotor afirma que “Nenhuma liberdade está à margem da lei, nem mesmo os direitos fundamentais são absolutos; o argumento do freedom speach não ampara nem acolhe a transformação do culto ou da missa em local de pedido de votos.” Portanto, é necessário que a liberdade religiosa esteja amparada em ações políticas que garantem, de fato, a ampla liberdade do povo.

Nas palavras de Gabriel (2018), autor do livro Liberdade religiosa e Estado laico Brasileiro, compreendendo que o Estado, por não ser ateu ou a-religioso, “é um Estado, ao menos técnica e teoricamente, tolerante com toda e qualquer manifestação religiosa e garantidor do exercício da liberdade individual de escolher qual religião praticar.”

LAICIDADE E RELIGIÃO

A laicidade é um tema atual e de muita repercussão que permite diversas discussões e opiniões divergentes desde a Constituição da República, mas que por um longo período era entendido como uma questão já resolvida, principalmente a partir da separação formal entre Igreja e Estado e a secularização da sociedade. Importante, assim, compreender o que é a laicidade segundo Mariano (2011, p. 244):

[...] regulação política, jurídica e institucional das relações entre religião e política, igreja e Estado em contextos pluralistas. Refere-se, histórica e normativamente, à emancipação do Estado e do ensino público dos poderes eclesiásticos e de toda referência e legitimação religiosa, à neutralidade confessional das instituições políticas e estatais, à autonomia dos poderes político e religioso, à neutralidade do Estado em matéria religiosa (ou a concessão de tratamento estatal isonômico às diferentes agremiações religiosas), à tolerância religiosa e às liberdades de consciência, de religião (incluindo a de escolher não ter religião) e de culto.

Já para Oro (2008, p. 81), a laicidade é:

um neologismo francês que aparece na segunda metade do século XIX, mais precisamente em 1871, no contexto do ideal republicano da liberdade de opinião - na qual está inserida a noção de liberdade religiosa = do reconhecimento e aceitação de diferentes confissões religiosas e da fundação estritamente política do Estado contra a monarquia e a vontade divina.

Há muito os cientistas sociais estão se preocupando com a laicidade, de modo que estão revendo frequentemente o conceito, por mais que na literatura sociológica permaneça a ideia de que a exclusão da religião da esfera pública constitui condição necessária para a democracia, seguindo o princípio secularista (MARIANO, 2011).

Diverge de Mariano (2011) o professor Vieira (2024, entrevista digital), compreendendo que essa teoria de exclusão da religião para efetivar-se a democracia possui origem francesa, “a qual tem como objetivo a retirada da crença religiosa de todo e qualquer espaço público, inclusive escolas, relegando-a apenas ao espaço privado e particular de cada um.” No caso do Brasil, não há o que se fazer quando o estado constitucional é o que está posto, inclusive com o nome de Deus expresso no preâmbulo da CF e a cruz exposta na bandeira do Brasil. Afirma que “a laicidade fomenta a religiosidade, gerando pluralismo político, o que, consequentemente, gera uma comunidade melhor e faz com que o Brasil cresça”.

Assim também pensa Montero (2013, p. 20), reconhecendo que no Brasil as religiões estão em toda parte:

[...] (e, aliás, sempre estiveram), é difícil sustentar que elas estão “fora de seu lugar”. Desse modo, as ciências sociais são chamadas a enfrentar de uma nova maneira o problema das relações entre religião e política, em particular, repensando o próprio secularismo que, de ponto de partida impensado do estudo das religiões, se torna ele próprio objeto privilegiado da reflexão.

Destaca-se que a laicidade estatal não significa, necessariamente, oposição ou hostilidade quanto às manifestações religiosas, pois é dever do Estado garantir às pessoas o livre exercício de suas crenças e religiões, sejam elas individuais ou coletivas, públicas ou privadas, bem como as celebrações e cultos religiosos, os ministros e outros (NETO, 2007). Mas o Estado Laico Brasileiro, constituído como Estado Democrático de Direito, previsto no art. 1º da CF, assegura a liberdade religiosa e reconhece o transcendental, assegurando sua efervescência espiritual no seio da sociedade, legitimando o fenômeno religioso na esfera pública e privada.

No viés histórico, laico ou leigo tem origem no termo grego laikós, o qual designa o que se refere ao povo (laós). O termo era utilizado para distinguir as pessoas que eram designadas a missões especiais, como no caso dos presbíteros, diáconos e bispos, daquelas que passaram apenas pelo batismo. Nesse sentido, Estado laico não se refere a um estado sem fé, ateu ou que proíbe símbolos ou convicções religiosas, mas se refere a um Estado não confessional, sem religião oficial ou obrigatória.

Conforme Blancarte (2008, p. 23) “o Estado laico é a primeira organização política que garantiu as liberdades religiosas. Há que se lembrar que a liberdade de crenças, a liberdade de culto e a tolerância religiosa foram aceitas graças ao Estado laico, e não como oposição a ele”.

Assim, é possível sintetizar a laicidade em três princípios fundamentais: I. respeito à liberdade de consciência e a sua prática individual e coletiva; II. autonomia da política e da sociedade civil com relação às normas religiosas e filosóficas particulares, e; III. nenhuma discriminação direta ou indireta contra os seres humanos. Este conceito está expresso na Declaração Universal da Laicidade do Século XXI4, na qual podemos enfatizar, também, o art. 6º, que entende a laicidade como “[...] elemento chave da vida democrática. Impregna, inevitavelmente, o político e o jurídico, acompanhando assim os avanços da democracia, o reconhecimento dos direitos fundamentais e a aceitação social e política do pluralismo.”

Esta Declaração é marco importante para a civilização, pois compreende que, enquanto nos Estados religiosos o “poder do monarca” está vinculado ao poder de Deus, nos Estados laicos o poder parte do povo. Assim, é dever do Estado adotar uma postura neutra em relação às concepções religiosas presentes na sociedade, garantindo, de forma universal, a liberdade religiosa.

Vieira (2024, entrevista digital) compreende que o Estado Brasileiro possui uma laicidade colaborativa, os poderes colaboram entre si em busca do bem comum, previsto no art. 19, I da CF. Outro princípio do nosso Estado laico é a benevolência, “a religião é importante para a sociedade, pois gera pluralismo e cidadania”. Ressalta que, na sua percepção, “quanto mais o fenômeno religioso acontece, mais há efetividade da liberdade religiosa e o congraçamento do sistema laico colaborativo”.

Objetivando maior transparência entre as relações existentes entre Estado e Igreja, foi apresentado um Projeto de Lei (PLC 160/2009) que trata das garantias e dos direitos fundamentais ao livre exercício da crença e dos cultos religiosos – a chamada Lei Geral das Religiões, cuja aprovação na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) foi realizada em 12 de junho de 2013 e agora o projeto segue para o plenário do Congresso Nacional. Caso o Projeto seja aprovado no Congresso Nacional, o princípio da cooperação religiosa será ampliado a outras confissões, visando legitimar a relação do Estado com a religião.

E nestas discussões político-religiosas não é incomum o uso de alguns termos de forma equivocada, em especial as palavras “ateísmo”, “secularismo”, “laicismo” e “neutralidade”, as quais passaremos a compreender e distinguir brevemente a partir de agora.

Começando pelo primeiro, o ateísmo não admite qualquer religiosidade e não aceita a sua existência. Segundo o OLE - Observatório da Laicidade do Estado (aba Dicionário, documento virtual):

O Estado ateu é aquele que proclama que toda e qualquer religião é alienada e alienante, em termos sociais e/ou individuais. Para combater a alienação, o Estado ateu tenta suprimir toda e qualquer religião. Se não consegue proibi-la completamente, dificulta ao máximo suas práticas, inibe sua difusão e desenvolve contínua e sistemática anti-religiosa.

O secularismo, por sua vez, possui um significado mais amplo, envolve um contexto cultural de entendimento que faz a separação entre as esferas civis e religiosas, o que, nas palavras de Gauchet (2000), é a “saída da religião” do Estado.

Já o laicismo está relacionado à exclusão da religião da esfera pública de forma mais enérgica e generalizada, não permitindo que a religião tenha qualquer contato em ambientes estatais. Dessa forma, o laicismo não considera os aspectos democráticos da presença social da religiosidade. Na percepção de Blancarte (2008), essa expressão expõe o anti-clericalismo pela hostilidade ou indiferença à religiosidade coletiva.

Nas palavras do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello (2012, p. 41), “Laicismo [significa] uma atitude de intolerância e hostilidade estatal em relação às religiões. Portanto, a laicidade é marca da República Federativa do Brasil, e não o laicismo”.

Participante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Emmanoel Campelo, analisando o Pedido de Providência - PP Nº 0001058-48.2012.2.00.0000, referiu que "há aqueles que confundem Estado Laico com Estado Laicista, deturpação do primeiro, no qual se procura isolar o fator religioso à esfera puramente pessoal, proibindo ou cerceando as manifestações externas da religiosidade”.

E, por fim, a neutralidade remete a não oficialização da religião no Estado, não podendo este favorecer ou desfavorecer nenhuma religião ou convicção moral, mas deve garantir que os valores da República, da democracia e a liberdade religiosa sejam respeitados.

Júnior (2014, p. 72), compreende que essa confusão entre expressões é repercutida pela mídia de forma muito superficial, quase inexistente:

As declarações noticiadas pela mídia que afirmam a laicidade do Estado brasileiro transmitem a impressão de que se está perante um conceito perfeitamente compreendido por todos. Nada mais enganoso. O que se observa frequentemente é o emprego irrefletido da expressão por indivíduos que, para sustentar sua opinião favorável ou antagônica ao fato religioso, esgrimem-na como mero argumento retórico jejuno de qualquer compromisso com o significado jurídico da laicidade e, o que é pior, divorciado de uma compreensão adequada do tratamento outorgado pela ordem constitucional brasileira ao fenômeno religioso.

Desse modo, o Estado laico tem como bases os ideais democráticos, em especial a liberdade e igualdade, de forma que, caso se alie a uma confissão específica, os cidadãos de confissões distintas não terão a sua liberdade religiosa garantida. Assim, a laicidade permite a coexistência pacífica de diferentes modos de concepção de mundo, sem que haja necessidade de sacrificar identidades distintas em prol do igualitarismo uniformizador que ignora as peculiaridades próprias (HUACO, 2008).

Segundo os dados coletados pelo Instituto Datafolha, ano base 2016, “três em cada dez (29%) brasileiros com 16 anos ou mais atualmente são evangélicos”. Entre eles, há divisões: evangélicos pentecostais (22%), frequentadores das igrejas como Assembleia de Deus, Congregação Cristã, Universal do Reino de Deus, e evangélicos não pentecostais (7%), pertencentes a igrejas como Batista, Metodista e Presbiteriana. Esse movimento de crescimento do pentecostalismo no Brasil iniciou-se em meados dos anos 50, acelerando gradativamente a partir da década de 1980, data na qual o movimento religioso conquistou maior visibilidade pública, espaço na TV e, inclusive, inseriu-se no poder político partidário. Como já citado no capítulo anterior, o número de evangélicos cresceu mais de 16 milhões em dez anos, segundo o Censo.

Destaca-se, outrossim, que quando se refere à religião pentecostal, englobam-se todas as diferentes denominações pentecostais existentes no país, visto que esse movimento religioso possui uma diversidade institucional e pluralidades internas bem acentuadas. Veja-se pelo elevado número de igrejas existentes e concorrentes entre si, diversas variações doutrinárias, rituais, eclesiásticas e comportamentais, o que permite diversas estratégias proselitistas distintas, público alvo e relação com os poderes públicos. Segundo Mariano (2008, documento digital), “trata-se de um fenômeno religioso dinâmico e internamente muito diversificado”.

A escritora Christina Vital da Cunha, autora do livro Oração de Traficante, realizou pesquisas de campo nas comunidades periféricas do Rio de Janeiro e trouxe, em entrevista digital (2024, arquivo digital), concepções interessantes que contribuem para entendermos o motivo pelo qual as religiões pentecostais vêm crescendo em ritmo acelerado. Segundo a autora, essas religiões (não católicas) facilitam o acesso aos cultos por meio de transporte gratuito das favelas até os grandes templos; aproximam o estilo de vida da liderança religiosa e da assembleia reunida, visto que os pastores dão testemunhos do dia a dia, das superações que se aproximam das vivências dos seguidores. E, pela necessidade de atuação in loco para coleta de informações na Comunidade do Acari, percebeu que “as Igrejas Católicas estavam abertas em horários restritos, diferente das demais denominações atuantes que diariamente estavam abertas, facilitando o acesso e cultivando a religião de forma constante e diária”.

Contribui também neste aspecto Lins e Silva (1989, P. 172), que na elaboração do livro “Bandidos evangélicos: extremos que se tocam”, já indicavam que, ao contrário do “mito de que o caminho da bandidagem não oferece volta aos seus componentes”, muitos, à época, já “encontravam uma segura exceção na conversão destes ao evangelho”. Complementam que durante a pesquisa realizada em 1980 na favela Cidade de Deus, o acesso às igrejas evangélicas era permitido por qualquer pessoa, não era “comum frequentadores [...] não evangélicos” ou que não estivessem “em vias de se converter” (1989, p.173).

Já na pesquisa realizada por Corrêa (2022, p. 157) na comunidade da Cidade de Deus alguns anos depois, “as igrejas evangélicas poderiam ser encontradas, em seus mais variados tamanhos, a cada esquina da favela.” Inclusive, complementa que “havia um grande número de visitantes esporádicos, podendo bandidos e jovens da boca de fumo serem vistos com frequência nos cultos e nas orações - mesmo aqueles que não apresentavam nenhum intuito de se converter”.

Nas palavras de Vieira (2024, entrevista digital), a “igreja católica é altamente desenvolvida, organizada e hierarquizada, possui um código canônico bem estruturado, normas canônicas que protegem e, ao mesmo tempo, engessam a instituição”. Diferentemente das igrejas pentecostais, que possuem como característica a oralidade, percebido, especialmente, com o Movimento da Rua Azusa no final do século XIX.

Lins e Silva (1989, p. 173), na conclusão do texto de 1980, já permitiam a compreensão de que haveria, muito em breve, uma aproximação entre as igrejas evangélicas e o tráfico, porque:

Enquanto o evangélico significa o bem, o bandido significa o mal, ambos convivem diariamente com a presença do “inimigo”, seja ele o diabo, seja a quadrilha adversária, que é preciso combater a todo instante. Esse modelo de combinações simbólicas, ao mesmo tempo em que polariza o evangélico e o bandido, os aproxima paradoxalmente, posto que, para além da polarização, existe o reconhecimento mútuo por se saberem, de um lado, representantes do bem, os evangélicos, e, de outro, representantes do mal, os bandidos.

É justamente esta compreensão, também, do professor Bobsin (2024, entrevista digital) quando cita que as igrejas pentecostais e neopentecostais mais autônomas ganharam força nos últimos dez anos, período em que alteraram, inclusive, seus princípios, priorizando fortalecer relações com os traficantes das comunidades periféricas (do Rio de Janeiro, Brasil) para expandir seus templos e denominação, ao invés de, justamente, convertê-los a deixar o vício e os crimes.

Já a professora Cunha (2024, entrevista digital) referiu que, durante sua pesquisa de campo realizada nas comunidades periféricas do Rio de Janeiro, ao entrevistar os traficantes que exerciam atividades na região, percebeu que eles pagavam o dízimo regularmente, frequentavam os cultos dominicais e pediam bênçãos, mas não se intitulam evangélicos, mas sim como “desviados”, pois não convertidos oficialmente à religião em virtude das atividades ilícitas do tráfico.

Essa também foi a percepção de Vieira (2024, entrevista digital), referindo que em agosto do ano passado (2023) realizou palestras em algumas comunidades do Rio de Janeiro e ouviu comentários de que são sim os traficantes que comandam os morros, mas ninguém referiu que esses mesmo líder do morro é pastor em alguma instituição religiosa da comunidade. Entretanto, não descarta a possibilidade desse vínculo de atividades entre pastor e líder criminoso de forma indireta.

Alguns pastores são investidos de poderes que podem, sim, mudar a trajetória de vida de um traficante que está sendo julgado pelo Tribunal do Crime, podendo, inclusive, interferir no processo de execução das práticas violentas, interrompendo-as. O traficante é reputado como aquele que tira vidas, enquanto o crente é capaz de salvá-las (CORRÊA, 2022).

Em contribuição, Mariz (1994) sinaliza que o pentecostalismo ajuda os pobres a enfrentarem a pobreza, a se libertarem do alcoolismo e das drogas, melhorando, assim, a autoestima enquanto conversos.

Mariano (1999, p. 107) elucida que:

O sucesso pentecostal fundamenta-se extensamente no milagre, na magia, na experiência extática, no transe, no pietismo ou na manipulação da emoção transbordante e desbragada, práticas desprezadas e reprimidas pelas igrejas Católica e Protestante. Oferece magia e catarse para as massas. E uma boa pitada do velho moralismo cristão.

Complementando esse mistério e magia existente na conversão evangélica, Corrêa (2022, p. 337) ressalta que os crentes, ao contrário dos traficantes, desejam que toda família participe ativamente da igreja por entenderem ser “uma ilha de proteção material e espiritual que permite - ou, ao menos, ajuda - a não sucumbir aos diversos riscos mundanos ali presentes”.

Compreende-se da leitura de Lins e Silva (1989), que entre os anos de 1990 e 2000 ocorreu uma forte e rápida aproximação entre o tráfico de drogas e a igreja, visto que cada vez mais o tráfico abandonou os terreiros de macumba, as guias e os santos e protetores, bem como a igreja pentecostal passou a ser mais aberta, acolhendo a todos independente do desejo de conversão, culminando, assim, na ascensão do número de bandidos convertidos à igreja.

A denominação Assembleia de Deus dos Últimos Dias (ADUD) é citada por Manso (2023, p. 59) quando refere que algumas mudanças bem impactantes realizadas na favela do Acari foram a mando de um traficante convertido à referida denominação:

A partir dos anos 1990, as imagens de são Jorge, os terreiros e os altares em homenagem aos guias e orixás, as festas de Cosme e Damião, os colares de conta coloridos no pescoço, as roupas brancas, entre outros símbolos ligados à umbanda, ao candomblé e ao catolicismo, vinham sendo substituídos por representações da fé pentecostal.O processo que ocorreu nas favelas da Acari foi liderado por um traficante do TCP convertido à Assembleia de Deus dos Últimos Dias.

Os símbolos citados pelo autor foram substituídos por salmos e páginas da Bíblia e, com maior frequência, a frase: “Jesus é o dono do lugar”. Buscou, assim, criar um espaço cordial entre o tráfico, a religião e os moradores da comunidade.

Em contrapartida, Cunha (2024, entrevista digital) refere que na comunidade de Acari havia irmandades que faziam trabalhos assistenciais poderosos que foram retraídos justamente a partir da intervenção e crescimento do tráfico de drogas e crimes relacionados.

Assim também complementa o professor Bobsin (2024, entrevista digital) citando a “conversão mágica” realizada pelas igrejas pentecostais, em que as pessoas vão à Igreja e são orientadas sem a necessidade de mudarem seus princípios, atitudes ou o passado, em que o indivíduo obtém recursos religiosos e ideológicos para reorganizar o espaço ameaçador sem que mude a realidade.

Cunha (2024, entrevista digital), complementa que a “instrumentalização da fé” e a chamada “conversão mágica” são extremamentes perigosas, pois:

há atores que estão esvaziando os sentidos da religião e produzindo outros sentidos que são relativos a interesses próprios, assim como também há atores políticos que se aproveitam da sensibilização das pessoas, mobilizando gramáticas específicas para atrair corações e mentes para os seus projetos próprios, evidenciando a instrumentalização da fé.

Vieira (2024, entrevista digital) chama atenção àquelas situações em que o líder religioso, utilizando da sua relevância dentro da instituição e no próprio espaço religioso, tenta impor sua agenda ao fiel, em evidente afronta ao Estado laico, usando do poder religioso para exercer domínio no espaço político. Cita, por exemplo, quando o líder exige que os fieis ou membros votem em determinado candidato político ou participem de movimentações políticas específicas.

O culto pentecostal, em partes, cumpre a função de produção de forças elaboradas nos termos da teoria durkheimiana, pois tomado de carga emocional. Com os cultos pentecostais as pessoas se sentem fortalecidas e consoladas em suas necessidades. A presença do Espírito Divino outorga “dons”, produzindo estados proféticos de entrega de bênçãos e vitórias sobre os problemas da vida, fazendo-se crer que se está em contato de forma muito especial com o sagrado. Assim reflete Durkheim (2012, pág. 31):

Quando o fiel está no estado religioso, ele se sente em contato com forças que apresentam as duas características seguintes: elas o dominam e elas o sustentam. Ele sente que elas são superiores àquelas das quais ele dispõe ordinariamente, mas, ao mesmo tempo, ele tem a impressão de que participa desta superioridade. Ele pode mais.

E estes discursos ganham maior relevância nos contextos periféricos, em que a vulnerabilidade socioeconômica e social produzem condições específicas para a disseminação dos discursos de superação e auto-afirmação frente à pobreza. Neste sentido é a linha de compreensão de Mariano (2011, p. 12), em que “[...] os marginalizados - distantes do catolicismo oficial, alheios a sindicatos, desconfiados de partidos e abandonados à própria sorte pelos poderes públicos - têm optado voluntária e preferencialmente pelas igrejas pentecostais.”

Sabe-se que um dos grandes problemas enfrentados nas periferias são as facções religiosas e o domínio do crime. E, neste sentido, nas palavras de Cunha (2024, entrevista digital) “a Assembleia de Deus dos Últimos Dias tem um papel fundamental na conversão dos traficantes, empregando políticas de redução de danos, diminuição da violência nas comunidades, prática de crimes hediondos e afins.” Lembra de lideranças da Assembleia que atuaram nos presídios do Rio de Janeiro realizando missões para conversão dos detentos, inclusive junto aos Tribunais do Crime, situações em que intervém para salvar o sujeito da morte e convertê-lo à igreja.

Corrêa (2022, p. 161), compreende que essas atividades de evangelismo nas prisões, em especial com as lideranças do tráfico de drogas das comunidades, contribuíram significativamente para a “pentecostalização do tráfico e do crime”, visto que muitos desses líderes se converteram ao evangelho ainda enquanto reclusos nos presídios, tanto é que as ordens para derrubada de santuários e outros itens religiosos ligados à umbanda e ao catolicismo sincretizado que estavam nas comunidades foram realizadas pelos líderes de dentro dos presídios com a aproximação do evangelho.

Essa expressão “pentecostalização do tráfico” também é citada por Vital (2008), ao compreender que, por mais que se mantivessem distantes e com barreiras bem estabelecidas, a igreja e o tráfico, por coabitarem o mesmo espaço e elaborarem, entre si, uma rede de interdependência por trocas, se transformam mutuamente.

Neste aspecto, Corrêa (2022, p. 180), em sua pesquisa de campo na comunidade Cidade de Deus, elencou alguns pontos de convergência entre o tráfico e a igreja pentecostal, sendo eles:

(1) aumento significativo de bandidos que frequentam igrejas pentecostais; (2) o aumento de traficantes ou bandidos convertidos à religião evangélica; (3) a proibição, em todas as regiões da Cidade de Deus, de se fazer despachos e coisas afins; (4) a presença de passagens bíblicas (normalmente salmos) nas paredes da favela - pinturas feitas a mando dos líderes do tráfico de drogas local; (5) a construção de monumentos relacionados ao universo pentecostal, como a Bíblia [...]; (6) relatos sobre a mudança nas atitudes e no comportamento de traficantes - incluindo os donos da boca - a partir de sua aproximação com o mundo pentecostal ou forma de vida pentecostal (traficantes que oravam, liam a Bíblia, frequentavam cultos etc); [...].

Ou seja, a partir da disseminação da igreja evangélica nas comunidades periféricas houve um aumento significativo de conversões dos traficantes/bandidos à religião e, simultaneamente, modificações importantes no dia a dia das comunidades, atribuindo-se regras de convivência que possuem respaldo em dogmas evangélicos.

Assim também depreende Bobsin (2024, entrevista digital), indicando que existem algumas igrejas pentecostais e neopentecostais muito localizadas que favorecem a influência do tráfico de inúmeras formas, visto que os pastores, por mais que não defendem a droga, não conseguem manter hígida a postura do não consumo e comércio de drogas, inclusive fazendo pregação para a conversão, mas sem muito sucesso. Refere que situação semelhante ocorre nas periferias do estado de São Paulo, local em que há acordos implícitos entre traficante e o pastor, porque se o jovem traficante “quer sair fora da organização, eles dizem ó ‘se tu sair fora tu tem dois caminhos: nós vamo [sic] te matar ou tu vira crente.’ E o pessoal que opta por isso eles controlam dentro da igreja para ver se não tá traindo eles, denunciando para a polícia.” É perceptível, nessa situação, que o medo predomina, fazendo com que os pastores e as pessoas se mantenham na organização por receio de perderem a vida, bem como os traficantes se convertam para conseguirem influenciar em ambos os setores (igreja e comunidade).

Um dos chefes do tráfico de drogas nas comunidades, pertencente ao Terceiro Comando Puro e sócio de um grupo de milicianos, reconhecendo-se como um grande apreciador da fé pentecostal, tatuou no braço direito o nome de Jesus, misturando suas atividades criminosas com a fé. Assim, percebeu-se que em diversos locais e comunidades que o pentecostalismo se misturou com o crime e as milícias, ações violentas e opressoras foram realizadas contra terreiros e seguidores das religiões de matriz africana (MANSO, 2023).

Seguindo as perspectivas indicadas no Censo 2010 e pelos números trazidos pelo Instituto Datafolha, o pentecostalismo irá crescer e angariar milhares de adeptos nos próximos anos, o que, consequentemente, poderá criar um fenômeno de pulverização dos templos nas comunidades, podendo, na perspectiva de Bobsin (2024, entrevista digital), favorecer a influência do tráfico das mais variadas formas, eis que os criminosos “se convertem à religião de forma que o pastor encontra dificuldade de se posicionar contra seus seguidores”.

Nesta perspectiva, Cunha (2024, entrevista digital) chama atenção para como as diversidades postas em campo refletem as dinâmicas em curso, tanto das pequenas igrejas de garagem que, pela proximidade do pastor com a família do traficante, do próprio familiar do pastor que está envolto no tráfico, fazem o acolhimento dessas pessoas que vivem em situações de vulnerabilidade. A autora ainda cita a Favela do Acari, onde percebeu que as “grandes denominações insistiam veementemente na conversão dos traficantes, pois entendiam que podiam atuar em todas as margens, sejam elas criminosas ou outras religiões” (CUNHA, 2024, entrevista digital).

Corrêa (2022, p. 215), que em seu trabalho de campo participou ativamente dos cultos evangélicos nas comunidades, percebeu que “a cada testemunho, a cada pregação, a boca de fumo e a igreja parecem se sintonizar ainda mais, parecem fluir em uma mesma frequência.” Por isso, nesses locais, com apoio das pregações e intenso apelo emocional e afetivo, elos e vínculos se estreitam.

Os traficantes, após convertidos ao evangelho, deparam-se com um dilema: o dinheiro advindo do tráfico e dos crimes (na percepção evangélica, atividades relacionadas ao Diabo), é legal ou ilegal na concepção da fé? Uma das teorias compreende que tudo que veio do Diabo é ilegal e deve ser recusado para que seja possível viver em Cristo, como na pergunta que Paulo faz em 2 Coríntios 6,14: “Que comunhão pode ter a luz com as trevas?”.

A segunda teoria, e que aqui mais nos interessa, refere que não é tão importante a origem do dinheiro, mas sim o seu destino, forte no versículo encontrado em Neemias 13:2 “O nosso Deus, porém, transformou a maldição em bênção”. Assim, os traficantes e bandidos convertidos utilizam o dinheiro obtido por meio das atividades ilícitas para estruturar e fornecer meios de subsistência para os templos evangélicos nas Comunidades.

E esse dinheiro obtido por meios ilegais é utilizado pelos grupos criminosos para realizarem o controle e influência nas pequenas igrejas existentes nas comunidades periféricas por meio do fornecimento de bens materiais e estruturação da instituição, a fim de manter o líder religioso como refém do crime (BOBSIN, entrevista digital, 2024).

Neste aspecto, Cunha (2024, entrevista digital) ressalta que há pastores que se submetem aos criminosos, os que se valem do poder dos traficantes e aqueles que se mantêm afastados dos criminosos, mas concorda que “há sim traficantes que se valem do aporte financeiro dentro das instituições religiosas para lá atuarem”.

Como percebeu Manso (2023, p. 65), na trajetória de Álvaro Malaquias Santa Rosa, mais conhecido como Peixão, chefe do Complexo de Israel que mistura assistencialismo com violência, ao assumir o controle das comunidades, distribuiu “uma carta-manual aos moradores para anunciar a troca de comando, contendo as diretrizes daqueles que chegavam para governar ‘em nome de Deus’”. E visando melhorar o dia a dia dos moradores da comunidade, obtendo, assim, apoio e respeito destes, Peixão organizou e investiu em recolhimento de lixo, pavimentação de ruas e na construção de obras reivindicadas há tempo pela comunidade, a exemplo da construção da ponte para ligar as comunidades Cinco Bocas e Pica-Pau, conforme retrata MANSO (2023).

Entretanto, em contraposição, Cunha (2024, entrevista digital) refere que a ponte construída e que foi engrandecida pela comunidade “pelo fato de que o Poder Público demoraria anos para construir e, quiçá, nunca construiria”, não foi construída tão somente com fins sociais, mas sim para ser utilizada pelos veículos com condições de passar pelos obstáculos de concreto lá introduzidos, visando evitar o acesso de veículos não autorizados (polícia, traficantes e facções rivais). A autora afirma, ainda, que os traficantes não fazem políticas públicas, políticas universais, mas sim com objetivos específicos e claramente pontuais (beneficiando as atividades ilícitas).

E, neste ínterim, há de se questionar: as facções criminosas ocuparam o espaço do Estado nas comunidades periféricas? Na percepção de Cunha (2024, entrevista digital), “o tráfico de drogas nessas localidades está muito além e muito aquém do Estado”. Refere que os traficantes participam ativamente da vida das comunidades, resolvendo os conflitos cotidianos e fornecendo benefícios individuais e pontuais a algumas pessoas, promovendo uma dimensão de lazer, importantes para a sociabilidade local, especialmente em datas comemorativas, como Páscoa e Natal. Essas atividades e ações não são, em essência, de responsabilidade do Estado, por isso o tráfico se mantém muito além do Estado.

Outrossim, nada que os traficantes possam oferecer nessas comunidades se aproxima do que o Poder Público pode e deveria fazer, visto que não atuam por uma política universal, mas sim por ações que os beneficiam (Cunha, 2024, entrevista digital).

Um dos assuntos mais repercutidos ao tratar sobre Estado laico x Religião é o questionamento sobre a permanência dos símbolos religiosos em prédios públicos, se colide ou não com a laicidade do Estado brasileiro. Este tema inclusive será abordado em breve pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a partir de uma Ação Civil Pública iniciada em 2009 na 3ª Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo, de iniciativa do Ministério Público Federal (MPF), em que se postula a retirada de todo e qualquer símbolo religioso dos órgãos e prédios públicos da União no Estado de São Paulo.

O referido julgamento é de repercussão geral, ou seja, influenciará diretamente futuras decisões que tratam de temas semelhantes. Por isso, é importante mencionar que o Estado laico é de todos, sem distinção entre crentes ou ateus, de tal forma que é de responsabilidade do Estado promover a pacificação e união entre todos os cidadãos, sem que a laicidade se torne antirreligiosa.

Campelo (2019) compreende que o ato/determinação de serem retirados os símbolos religiosos de repartições públicas que tradicionalmente estavam expostos é agressivo, discriminatório e favorece a intolerância religiosa, visto que privilegia uma minoria que professa outras crenças.

Ressaltam Mendes, Coelho e Branco (2015) que o Estado pode sim conviver com símbolos religiosos, mesmo que não professe o ateísmo, pois estes símbolos traduzem valores histórico-culturais, bem como são conhecidos e importantes para parcela significativa da população, motivo pelo qual não é viável proibir suas exibições em lugares públicos.

Nas palavras de Capez (2009, documento digital), “A Constituição Federal não conformou um Estado ateu, nem hostil ao cristianismo, apenas estabeleceu um regime não confessional. Não há religião oficial, mas também não há política oficial de repúdio à religião.” Neste mesmo viés pensa Vieira (2024, entrevista digital), compreendendo que “a presença de um crucifixo no espaço público é herança cultural daquele país (no caso, o Brasil)”. Assim, a retirada destes símbolos desses espaços somente deve ser realizada de forma consensual, de acordo com a vontade do povo, jamais por ações judiciais.

E complementa Tavares (documento digital) que a pretensão evangelizadora, no âmbito da religião cristã, “constitui elemento normativo-constitucionais essencial da liberdade religiosa, merecendo, por conta disto, um tratamento mais cauteloso do exegeta (no caso em concreto do Judiciário), quanto ao seu escopo.” O autor também ressalta que a liberdade religiosa atua como garantidora da inviolabilidade de consciência e de crença, de modo que os valores transcendentais do indivíduo não podem sofrer direcionamento estatal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O que buscamos compreender a partir deste trabalho é como a religião pode influenciar nas várias esferas estatais. Analisamos com bastante cautela a situação que ocorre nas periferias do Rio de Janeiro, em que o tráfico de drogas se utiliza da religião para dominar a tudo e a todos, realizando atividades que são, nas palavras de Cunha (2024, entrevista digital), aquém e além do Estado. Distinguimos algumas expressões que são comumente utilizadas e confundidas no estudo do Estado laico (laicismo, ateísmo, secularismo e neutralidade).

A partir do trabalho foi possível perceber que são diversas as formas e motivos de aproximação e identificação dos traficantes de drogas com as Igrejas Evangélicas, lideranças e membros. Alguns buscam na igreja uma proteção forte que, em outros momentos, encontravam nas religiões de matriz africana, enquanto outros congregam na igreja e, ao mesmo tempo, desempenham as atividades criminosas na favela, apresentando o quanto, em termos morais, a igreja o afetou.

Foi possível compreender, também, que a separação entre Estado e religião não é absoluta, visto que a neutralidade prevista na Constituição é reconhecida como um valor positivo para a religião. Mas, claro, é dever do Estado abster-se de assuntos religiosos e de favorecer uma igreja/religião ou fé em detrimento de outra. Assim como, também, não deve realizar juízo de valor quanto a veracidade ou não do que a religião ou fé proclamam. A partir da análise da Constituinte Originária, percebeu-se que a religião tem sim um valor positivo para a formação do indivíduo, e que, nas palavras de Vieira (2024, entrevista digital), “a religião é importante para a sociedade, pois gera pluralismo e cidadania”.

Além disso, constatou-se que há um entendimento comum entre os entrevistados (Bobsin, Cunha e Vieira) no que diz respeito a interpretação da religião, sendo de responsabilidade de cada ser humano utilizar, enquanto ocupantes do espaço público, a linguagem da teologia da religião de acordo com o local em que se encontram, de forma a dialogar com todos os presentes igualitariamente.

E essa compreensão está relacionada, também, com o entendimento de Habermas (2013, p.167) que estabelece:

Os cidadãos religiosos, como também os seculares, devem saber interpretar, cada um na sua respectiva visão, a relação entre fé e saber, porquanto tal interpretação prévia lhes abre a possibilidade de uma atitude auto-reflexiva e esclarecida na esfera pública política.

Cabe ao Estado, por fim, atuar de forma neutra no que diz respeito às visões de mundo, permanecendo aberto para aprender com ambas as partes do conflito, desde que com uso da razão pública e sem abrir mão da sua autonomia. Nas palavras de Vieira (2024, entrevista digital), “Todo direito fundamental de exercício precisa ter limitações, em especial quando colide com outro direito fundamental”.

O religioso é protegido pela Constituição Brasileira e suas leis infraconstitucionais, podendo crer e agir de acordo com determinada vontade, professar ao coletivo suas crenças e até converter outras pessoas, conforme garantido pela inviolabilidade de crença ou a liberdade de divulgação das crenças, vinculado à liberdade de expressão e no princípio da dignidade da pessoa humana, basilar da organização estatal e fundamento republicano. Esse também é o entendimento do Poder Judiciário, nas suas instâncias superiores, que adotam como regra um Estado laico, mas não laicista ou intolerante.

Dessa forma, o Estado neutro não pode se posicionar a respeito do correto ou incorreto de uma determinada crença ou fé religiosa, da mesma forma que não pode entrar em controvérsias teológicas. Por esse motivo, os conflitos entre Religião e Estado devem ser sanados com diálogo, conciliando-se de forma pacífica e harmoniosa. Como orientou Nelson Mandela, não há futuro para a humanidade sem perdão e reconciliação. A paz que o Estado deve prover é para curar o coração das pessoas e dos povos. Na percepção de Capez (2009, documento digital), “Como mecanismo eficaz de inibição da violência, da correção de rumos e da solução de desentendimentos, a religião deveria ser tratada com maior deferência e atenção.” Afinal, conforme vimos, o art. 19, I da Constituição Federal prevê a colaboração de interesse público entre Estado e religião, buscando e priorizando sempre o bem comum da sociedade brasileira.

No que diz respeito, especificamente, a situações que envolvam o Estado, a religião e o crime nas comunidades do Rio de Janeiro, precisamos cuidar com a generalização ao utilizar os termos “narcopentecostalismo” e “narcorreligião”, visto que ambos surgiram na mídia de forma irresponsável. Mas, conforme abordamos no trabalho, é possível afirmar que há, comprovadamente, a existência de alguns líderes do tráfico de drogas que se identificam como evangélicos e de algumas igrejas que transformam seu jeito de existir nas favelas por conta da dinâmica dessa criminalidade.

Percebe-se que não há um modelo restrito de laicidade, visto que a expressão acompanha o desenvolvimento e a transformação social que ocorre em cada Estado Soberano. Desse modo também leciona Abbate (2008, p. 82) que “uma definição clara e consensual de laicidade, no sentido jurídico, não é possível extrair de algum ordenamento positivo, tratando-se de uma noção, além de, por si só, mutável, condicionada pela evolução do contexto sociopolítico [...]”

Motivo este pelo qual se reforça a importância da investigação constitucional sobre este tema, que repercute diretamente na essência de toda a sociedade brasileira, alvo da laicidade estatal.

Por fim, nas palavras de Vieira “O modelo brasileiro de laicidade não significa ausência da religiosidade na esfera pública, mas a garantia e a salvaguarda de todas suas expressões.”

REFERÊNCIAS

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  1. Neste trabalho usa-se o termo “neopentecostalismo/neopentecostais”, considerando que não há clareza conceitual entre pentecostalismo e neopentecostalismo nos autores pesquisados.

  2. Alguns autores trazem o conceito de “Narcorreligião” ou “Narcopentecostalismo”, mas este termo é incorreto considerando que não há uma religião exclusiva para traficantes ou que possua uma liturgia ou teologia voltada à prática de crimes.

  3. Termo lançado em 2006 pela pesquisadora Christina Vital da Cunha, para descrever um fenômeno identificado nas favelas cariocas, usado entre aspas, explicando que não era uma autorreferência dos traficantes em relação a eles mesmos. Afirma que o termo incomodava muitos evangélicos e evangélicas que se sentiam estigmatizados pelo uso descuidado desta expressão que fazia parecer que sua religião era permissiva em relação ao crime e eles afirmam que não.

  4. Declaração apresentada por Jean Baubérot (França), Micheline Milot (Canadá) e Roberto Blancarte (México) no Senado Francês, em 9 de dezembro de 2005, por ocasião das comemorações do centenário da separação Estado-Igrejas na França.

Sobre o autor
Felipe Albino Schmitz

Acadêmico do curso de Direito, Universidade do Vale do Taquari - Univates.

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