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Deontologia de edital de concurso estatal

Agenda 13/08/2024 às 22:55

O edital não é apenas um documento formal, mas uma parte essencial da forma como o Estado se organiza e governa, refletindo a legalidade e a legitimidade das suas ações.

Resumo: O Estado torna-se ético a-si ao densificar a qualidade normada, governada e ordenada da Legalidade e Legitimidade Institucionais estatais.

Palavras-chave: Staatsrecht, Staatspolitik, lógica da Liberdade e Igualdade, Metaética Estatal, Ordnung e Grossraumordnung.


O Edital de concurso estatal é expressão disjuntiva-descensional da Legalidade1 e Legitimidade Institucionais do Staatsrecht e Staatspolitik, pois, partindo-se dos Blocos de Legalidade, Hermeneuticidade e Realidade, conformam a governabilidade da Norma e normação do Governo.

O Edital causa e porta a Norma governada e Governo normado de posturas a serem seguidas pelo Estado e candidatos, densificando-se o Rechtsstaat, em decisão normativa concreta do Estado.

O Edital não é simploriamente algo normado, governado e ordenado na pureza abstrata normada, mas estabelece-se e assenta-se na ordenação histórica-concreta; na Staatsordnung, em expressão puntualizada da Rechtordnung e Politikordnung.

Edital é ato estatal administrativo; é expressão da Soberania Institucional que define a qualidade de inteligibilidade estatal-institucional. Estado e candidato se realizam neste grau de complexidade, densidade e intensidade evoluenda estatal.

Para o candidato há uma expressão inflexora diferida na temporalidade estatal, para mutação de sua condição fática e jurídica.

Há uma governabilidade pelo candidato de sua situação normada, que se ordena na sucessão temporal nas etapas, em absorção pela História Universal2 de resultados, em ascensão consolidadora de sucesso; de inflexão determinada pela Norma.

Para o Estado, este apõe e compõe o Edital com a Eticidade normada, governada e ordenada, em expressão da Metaética estatal.

O Estado densifica sua retidão deontológica (Rechtprinzipien e Politikprinzipien; Justiça e Governo, Bem e Destino Comuns e Estabilidade Institucional).

O Edital torna-se parte integrante da normogênese estatal já portadora e causadora de específica complexidade deontológica.

Edital é densificação disjuntiva-distensiva do Rechtsstaat, puntualizado no Staatsrecht3 e Staatspolitik, sob apresentação estética-pragmática de ato estatal adminstrativo, sendo a Soberania Institucional que determina a ordenação deontológica editalícia, portanto, por inferência lógica e cronológica, a observância de seu cumprimento: o Estado torna-se ético a-si e os candidatos também.

A deontologia editalícia é a Metaética estatal, do Estado como Instituição das instituições (Carl Schmitt4), fundamentada aquela na Staatsphilosophie e Filosofia das instituições, que por-si e sua matricidade qualitativa deontológica, eugenizando a individual, social etc.

Fixa-se a institucionalidade do essente estatal, sendo este o exclusivo paradigma deontológico.

O candidato tem o livre arbítrio decisório de aderir àquela realidade normada, governada e ordenada, em expressão realizadora de sua espiritualidade, de autogoverno, autonormação e auto-ordenação de-si de seu Eu, na busca objetiva de redefinição de sua condição jurídica, governando a sucessiva temporalidade editalícia em fases, logo há uma relação contínua de todos com a história e seu Espírito.

Autogoverno de-si é expressão de liberdade ordenada e ordenante do candidato evoluendo e realizante de seu Eu no Universo, portando a convicção dos riscos existenciais no Universo e seu universo intelectível cultural, objeto de aferição e decisão por-si de seu Eu para-consigo.

Há imputabilidade e responsabilidade do candidato para-consigo, de fomento e impulso para auto-conservação de seu Eu para-consigo (valor axiológico-matriz/primário).

O Edital perfectibiliza a Eticidade dualógica dinâmica-implicacional entre Estado e candidato, num binômio realizador-temporário, perfectibilizando-se a ordenação orgânica da finalidade editalícia, logo há uma teleologia ontológica e objetivamente expressa e definida até ao exaurimento normado do Edital.

Esta é a perspectiva de ambos no autogoverno de-si, que é a Estabilidade Institucional (Politikprinzipien) entre-si – Estado e candidato.

Garantias Institucionais do Estado e do Homem são normadas, governadas e ordenadas no Edital em co-igualdade relacional-orgânica, afastando-se a simploriedade do formal-estrutural, do estético-pragmático do objetivado finendo de ambos no Universo.

Afasta do Edital a mera visualização estética e puntualizada pela densidade da Humanidade do Homem.

A identidade do Homem é o que ele é e se expressa no Universo, em co-eternidade e co-infinitude essente.

A liberdade decisória e, principalmente, a assunção de imputabilidade e responsabilidade são efeitos do cálculo político e do compromisso que o candidato há de ter para-consigo, como fator específico de possibilidade evoluenda. Esta é a possibilidade da co-igualdade do Edital para-com-todos os candidatos: a igualdade orgânica-ordenadora de evolutividade, de desafio agente-reagente de autossuperação espiritual para-consigo diante da realidade do viver no Universo, sendo oportunidade deontológica, de eticização/Metaética estatal fora do subjetivismo individual, social (etc).

O Edital tem mais possibilidade concreta de intensificação evoluenda do candidato que se supõe, pois porta, fomenta, a lógica evoluenda do Homem e sua Humanidade.

O essente humano é desafiado, o autogoverno, auto-ordenação e autonormação.

O Homem consciente e livremente liberta-se de-si, em desafio das fases editalícias perante-si. Evolui com ou sem sucesso. É o contínuo vital e vivente do candidato face à diplomacia, sabedoria e maturidade ética para-consigo. É a pedagogia deontológica editalícia, que só o Estado poderia viabilizar. Evolui-se com, pelo e no Estado (G.W.F. Hegel).

Quanto mais e melhor se realiza o Edital, mais ético a-si o Estado se permite ser. Evoluindo.

O Edital não é hibridação categorial deontológica, a estatal e a individual, mas a concentração e densificação da primeira, que o indivíduo adere, logo ascende sua forma de raciocínio, servindo o Edital com duas faces, bifrontal-estético, mas em contra-ponto aproximativo-perfectibilizante de um processo estatal administrativo, com etapas exaurientes no pretérito, sendo absorvidas pela História Universal.

O Edital é espaço comum dos candidatos, no qual se desenvolverá num fragmento de suas vidas, determinada condição jurídica comum e universalizante, de uns para com os outros e todos para com o Estado.

O Edital é especificação do Bloco de Legalidade, que é projetado desde à Constituição existencial até ele, consolidando-se a gradação qualitativa normada, governada e ordenada do Staatsrecht e Staatspolitik.

Sob trespasse do Bloco de Hermeneuticidade há a hermenêutica do existir humano e respectiva hermenêutica de vitalidade; da afirmação existencial do Agente Inteligente/Intelecto Agente5 em face do Estado e deste perante cada candidato.

Cada candidato causa e porta o livre arbítrio decidente-ordenador de seu Eu para ser, estar, pertencer, permanecer e persistir no Universo e aderir ao Edital, logo já nasce imediatamente a auto-imputabilidade que o candidato faz e desenvolve a-si perante o Estado.

O Edital causa e porta a decisão normativa concreta da Democraticidade estatal-institucional e Rechtsstaat6, que se desenvolve na descensão disjuntiva de governança e governabilidade do conteúdo normando do Edital.

Forma-se e conforma-se no núcleo editalício parcela do núcleo vital do Poder Executivo ou Tecnoburocracia Institucional.

O Edital contém a densidade, complexidade e evolutividade de normanda, organizacionais-ordenadoras e governativas, logo já houve a experimentação na realidade funcional-executiva para completude fática, consolidando-se na gradação qualitativa de inteligibilidade do edital, como realidade e vida comum o Lebensraum7, Lebenswelt8, Lebensrecht e Lebenspolitik.

Há a densificação do espaço, tempo e vida comuns formado no e pelo Edital, que é a teleologia ontologicamente vinculada no edital, proposto pelo Estado, perfectibilizando a escolha e decisão do condidato a ele aderir e cumprir.

Todavia, a vida e condição jurídica assim narrados não são tão singelos.

O Edital causa e porta as lógicas da Lei, lógica e Espiritualidade da Liberdade e Igualdade para realização de todos no, para e com o espaço tempo e modo comuns, perfectibilizando o Eu do candidato e a densidade matricial-organizacional orgânica do Edital, que é a norma governada e já estabilizada.

Bem e Destino Comuns e Estabilidade Institucional são expressões do Rechtprinzipien e Politikprinzipien (Justiça e Governo), no Staatsrecht e Staatspolitik, perfectibilizados pela Staatsphilosophie, que confere a fundamentação necessária à compreensão da perspectiva editalícia.

Sem a Staatsphilosophie não é possível a reflexão crítica e profunda via hermenêuticas existencial e vital do essente do candidato e nem ele perante uma realidade pedagógica, que a vida cotidiana lhe prepara e lhe exige.

Há uma irresistível realidade vivenciável que o candidato e Estado passam, que é o desenvolvimento contínuo existencial de cada qual, em superação paulatina de fasese e exigências, que o próprio Estado faz por-si e para-si: a Legalidade constitucional-estatal.

O Edital contendo o Rechprinzipien e Politikprinzipien densifica a Metaética pregada por G.W.F. Hegel, tornando o Estado ético a-si, e projeta a melhor possibilidade ao candidato para exercício das lógicas da Liberdade e Igualdade, estabilizando-se institucionalmente a qualidade condicional jurídica e política de todos.

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O contexto editalício é complexo em termos de ordenação, normação e governança estatais, pois não se está na transcendência/idealidade somente, mas o edital é publicado, sendo existente, válido e vigente na Staatsordnung concreta, na qual formam-se atos estatais na gradação qualitativa de decisão normativa estatal.

A síntese editalícia exige do Estado a Grossraumordnung histórica-concreta, a visão multíplice de além da hermenêutica estatal institucional, mas também da existencialidade e vitalidade do Estado perante o Logos relativo, em sua Humanidade, no Logos do Homem, Espírito do Homem e no reconhecimento que cada candidato busca: o ideal da excelência da vida humana para-si, na realização do segundo valor mais importante da preferibilidade hierárquica vertical axiológica.

Apresenta o Estado singular modo ético de existir e ser para o Universo.


Notas

1 “VOTO: O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Em primeiro lugar, atesto a presença dos requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário e ressalto que a questão nele discutida teve repercussão geral reconhecida por esta Corte (decisão de 27.4.2011). O parecer da Procuradoria-Geral da República sugere que o presente recurso extraordinário não seria cabível contra a decisão do Superior Tribunal de Justiça que, mantendo o entendimento fixado pelo Tribunal Regional, não debateu questão constitucional nova. Dessa forma, não havendo prequestionamento, a oportunidade para invocar matéria constitucional estaria preclusa, pois não teria sido interposto o recurso extraordinário contra a decisão da Corte regional. Para tanto, cita a consolidada jurisprudência desta Corte sobre o tema (AI-AgR 145.589, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 24.6.1994). De fato, a jurisprudência desta Corte é no sentido de ser inadmissível o recurso extraordinário interposto contra decisão do STJ que, em recurso especial, fundamenta-se em matéria constitucional já apreciada e decidida na instância inferior e não impugnada diretamente no STF mediante recurso extraordinário. Assim, não interposto o recurso extraordinário contra a decisão de segunda instância dotada de duplo fundamento (legal e constitucional), fica preclusa a oportunidade processual de questionar a matéria constitucional. Novo recurso extraordinário somente é admissível para suscitar a questão constitucional surgida originariamente no julgamento do recurso especial pelo STJ (AI-AgR 155.502, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 27.5.1994; RE-AgR 365.989, rel. Min. Celso de Mello, DJ 10.02.2006). Ocorre, porém, que o caso apresentado nos presentes autos é deveras peculiar. O tema referente à incorporação de quintos, por suscitar a interpretação da legislação aplicável a essa matéria (leis 8.112/90, 8.911/94, 9.624/98 e MP 2.225-45/2001), costuma ser tratado como de índole estritamente infraconstitucional. Assim, ele tem sido enfrentado pelos tribunais e também pelo Superior Tribunal de Justiça. No entanto, essa forma de abordar a matéria representa apenas um dos enfoques possíveis quanto à questão da legalidade. Nada impede que a questão debatida em todas as instâncias inferiores, inclusive no âmbito do STJ, seja abordada desde outra perspectiva no Supremo Tribunal Federal, mesmo porque a causa de pedir do recurso extraordinário é aberta (RE 298.695, rel. min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 6-8-2003, Plenário, DJ de 24-10-2003). A mesma questão debatida, devidamente prequestionada, pode ser apreciada desde outro enfoque pelo Supremo Tribunal Federal, o qual poderá enfrentar o tema desde o enfoque constitucional, inegavelmente presente nesta matéria. Nessa hipótese, é cabível o recurso extraordinário, tendo em vista que, apreciada a questão novamente pelo STJ, apenas resta a via do recurso extraordinário para que o STF possa analisá-la sob outra perspectiva, a constitucional. E, no caso, a matéria, apreciada de forma adequada, é visivelmente constitucional. Destarte, não há, aqui, mera questão de ilegalidade, por ofensa ao direito ordinário, mas típica questão constitucional consistente na afronta ao postulado fundamental da legalidade. Embora a doutrina ainda não tenha contemplado a questão com a necessária atenção, é certo que, se de um lado, a transferência para o Superior Tribunal de Justiça da atribuição para conhecer das questões relativas à observância do direito federal acabou por reduzir a competência do Supremo Tribunal Federal às controvérsias de índole constitucional, não subsiste dúvida de que, por outro, essa alteração deu ensejo à Excelsa Corte de redimensionar o conceito de questão constitucional. O próprio significado do princípio da legalidade, positivado no art. 5.º, II, da Constituição, deve ser efetivamente explicitado, para que dele se extraiam relevantes consequências jurídicas já admitidas pela dogmática constitucional. O princípio da legalidade, entendido aqui tanto como princípio da supremacia ou da preeminência da lei (Vorrang des Gesetzes), quanto como princípio da reserva legal (Vorbehalt des Gesetzes), contém limites não só para o Legislativo, mas também para o Poder Executivo e para o Poder Judiciário. A ideia de supremacia da Constituição, por outro lado, impõe que os órgãos aplicadores do direito não façam tabula rasa das normas constitucionais, ainda quando estiverem ocupados com a aplicação do direito ordinário. Daí porque se cogita, muitas vezes, sobre a necessidade de utilização da interpretação sistemática sob a modalidade da interpretação conforme à Constituição. É de se perguntar se, nesses casos, tem-se simples questão legal, insuscetível de ser apreciada na via excepcional do recurso extraordinário, ou se o tema pode ter contornos constitucionais e merece, por isso, ser examinado pelo Supremo Tribunal Federal. Ainda, nessa linha de reflexão, deve-se questionar se a decisão judicial que se ressente de falta de fundamento legal poderia ser considerada contrária à Constituição, suscitando uma legítima questão constitucional. Na mesma linha de raciocínio seria, igualmente, lícito perguntar se a aplicação errônea ou equivocada do direito ordinário poderia dar ensejo a uma questão constitucional. Tal como outras ordens constitucionais, a Constituição brasileira consagra como princípio básico o postulado da legalidade segundo o qual “ninguém está obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (CF, art. 5.º, II). O princípio da legalidade contempla, entre nós, tanto a ideia de supremacia da lei (Vorrang des Gesetzes), quanto a de reserva legal (Vorbehalt des Gesetzes). O princípio da reserva legal explicita as matérias que devem ser disciplinadas diretamente pela lei. Este princípio, em sua dimensão negativa, afirma a inadmissibilidade de utilização de qualquer outra fonte de direito diferente da lei. Na dimensão positiva, admite que apenas a lei pode estabelecer eventuais limitações ou restrições (CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional. 5. ed., Coimbra, 1992, p. 799). Por seu turno, o princípio da supremacia ou da preeminência da lei submete a Administração e os tribunais ao regime da lei, impondo tanto a exigência de aplicação da lei (dimensão positiva) quanto a proibição de desrespeito ou de violação da lei (dimensão negativa) (CANOTILHO. Direito Constitucional, op. cit., p. 796-795). A propósito, são elucidativas as lições de Canotilho: “Em termos práticos, a articulação de suas dimensões aponta: (I) para a exigência da aplicação da lei pela administração e pelos tribunais (cf. CRP arts. 206, 266/2), pois o cumprimento concretizador das normas legais não fica à disposição do juiz (a não ser que as ‘julgue’ inconstitucionais) ou dos órgãos e agentes da administração (mesmo na hipótese de serem inconstitucionais); (II) a proibição de a administração e os tribunais actuarem ou decidirem contra lei, dado que esta constitui um limite (‘função limite’, ‘princípio da legalidade negativa’) que impede não só as violações ostensivas das normas legais, mas também os ‘desvios’ ou ‘fraudes’ à lei através da via interpretativa; (III) nulidade ou anulabilidade dos actos da administração e das medidas judiciais ilegais; (VI) inadmissibilidade da ‘rejeição’ por parte dos órgãos e agentes da administração (mas já não por parte dos juízes), de leis por motivo de inconstitucionalidade. Neste sentido pôde um autor afirmar recentemente que o princípio da legalidade era um ‘verdadeiro polícia na ordem jurídica’ (J. Chevallier).” Problema igualmente relevante coloca-se em relação às decisões de única ou de última instância que, por falta de fundamento legal, acabam por lesar relevantes princípios da ordem constitucional. Uma decisão judicial que, sem fundamento legal, afete situação individual revela-se igualmente contrária à ordem constitucional, pelo menos ao direito subsidiário da liberdade de ação (Auffanggrundrecht) (SCHLAICH, Klaus. Das Bundesverfassungsgericht, Munique, 1985, p. 108). Se se admite, como expressamente estabelecido na Constituição, que os direitos fundamentais vinculam todos os poderes e que a decisão judicial deve observar a Constituição e a lei, não é difícil compreender que a decisão judicial que se revele desprovida de base legal afronta algum direito individual específico, pelo menos o princípio da legalidade. A propósito, assinalou a Corte Constitucional alemã: “Na interpretação do direito ordinário, especialmente dos conceitos gerais indeterminados (Generalklausel) devem os tribunais levar em conta os parâmetros fixados na Lei Fundamental. Se o tribunal não observa esses parâmetros, então ele acaba por ferir a norma fundamental que deixou de observar; nesse caso, o julgado deve ser cassado no processo de recurso constitucional” (Verfassungsbeschwerde) (BverfGE 7, 198 (207); 12, 113 (124); 13, 318 (325) ( BverfGE 18, 85 (92 s.); cf., também, ZUCK, Rüdiger. Das Recht der Verfassungsbeschwerde. 2ª ed., Munique, 1988, p. 220). Não há dúvida de que essa orientação prepara algumas dificuldades, podendo converter a Corte Constitucional em autêntico Tribunal de revisão. É que, se a lei deve ser aferida em face de toda a Constituição, as decisões hão de ter sua legitimidade verificada em face da Constituição e de toda a ordem jurídica. Se se admitisse que toda decisão contrária ao direito ordinário é uma decisão inconstitucional, ter-se-ia de acolher, igualmente, todo e qualquer recurso constitucional interposto contra decisão judicial ilegal (SCHLAICH. Das Bundesverfassungsgericht, op. cit., p. 109). Enquanto essa orientação prevalece em relação a leis inconstitucionais, não se adota o mesmo entendimento no que concerne às decisões judiciais. Por essas razões, procura o Tribunal formular um critério que limita a impugnação das decisões judiciais mediante recurso constitucional. Sua admissibilidade dependeria, fundamentalmente, da demonstração de que, na interpretação e aplicação do direito, o juiz desconsiderou por completo ou essencialmente a influência dos direitos fundamentais, que a decisão se revela grosseira e manifestamente arbitrária na interpretação e aplicação do direito ordinário ou, ainda, que se ultrapassaram os limites da construção jurisprudencial (Cf., sobre o assunto, SCHLAICH. Das Bundesverfassungsgericht, op. cit., p. 109). Não raras vezes, observa a Corte Constitucional que determinada decisão judicial afigura-se insustentável, porque assente numa interpretação objetivamente arbitrária da norma legal (Sie beruth vielmehr auf schlechthin unhaltbarer und damit objektivwillkürlicher Auslegung der angewenderen Norm) [BverfGE 64, 389 (394)]. Assim, uma decisão que, v.g., amplia o sentido de um texto normativo penal para abranger uma dada conduta é considerada inconstitucional, por afronta ao princípio do nullum crimen nulla poena sine lege (LF, art. 103, II). Essa concepção da Corte Constitucional levou à formulação de uma teoria sobre os graus ou sobre a intensidade da restrição imposta aos direitos fundamentais (Stufentheorie), que admite uma aferição de constitucionalidade tanto mais intensa quanto maior for o grau de intervenção no âmbito de proteção dos direitos fundamentais (ZUCK, Rüdiger. Das Recht der Verfassungsbeschwerd. 2.ª ed., Munique, 1968, p. 221). Embora o modelo de controle de constitucionalidade exercido pelo Bundesverfassungsgericht revele especificidades decorrentes sobretudo do sistema concentrado, é certo que a ideia de que a não observância do direito ordinário pode configurar uma afronta ao próprio direito constitucional tem aplicação também entre nós. Essa conclusão revela-se tanto mais plausível se se considera que, tal como a Administração, o Poder Judiciário está vinculado à Constituição e às leis (CF, art. 5.º, § 1.º). Enfim, é possível aferir uma questão constitucional na violação da lei pela decisão ou ato dos poderes Executivo, Legislativo ou Judiciário. A decisão ou ato sem fundamento legal ou contrário ao direito ordinário viola, dessa forma, o princípio da legalidade. No caso, a decisão judicial que determina a incorporação dos quintos carece de fundamento legal e, portanto, viola o princípio da legalidade. (...)” (negritos e itálicos no original e nossos). (RECURSO EXTRAORDINÁRIO 638.115 CEARÁ)

2 Cf.: KAUFMANN, Fritz, Filosofia da História in A Filosofia no século XX. KAUFMANN, Fritz (org). 4ª edição. Lisboa: Fundação Calouste Goubenkian, Tradução e Prefácio: Alexandre F. Morujão, p. 476-477 e ss: “Mesmo o domínio técnico crescente do homem sobre a natureza pode incluir uma tal sanção. Significa este domínio, neste caso, uma liberdad que foi oferecida e confiada aos “filhos de Deus”. De modo algum necessita, mesmo precisamente nas formas de vida e de trabalho, quase insuspeitadas em signo de automação, de cair na automatização que ameaça a actual indústria fabril. Pode ser compreendido como vocação, início da Bíblia e de facto assim foi ao princípio entendido. No captar dessa determinação não se gasta apenas a obstinação do homem. Porém, a relação do homem à natureza não se encontra, de modo algum, limitada a adquirir, pelo esforço, esse poder sobre ela. Tem a sua profundeza originária e sua historicidade interna em que tudo o que é terreno “estranhamente nos diz respeito”, se nos oferece à apercepção e conservação e ganha em nós uma presença nova, explícita e uma forma bem esboçada. A ciência do Homem não se realiza apenas na ação exterior, na intervenção de facto no mundo real que ele mesmo forma, mas já na captação espiritual, numa espécie de movimento ontológico, na realização de um encargo da natureza que dele necessita como ele dela. A natureza regressa ao homem como se sai dela; ela encontra-se estabelecida nele e é próprio dele ouvir-lhe as solicitações. Da concepção da sensibilidade até à visão artística e entendimento do conceito científico realiza-se um processo multiforme, cuja história não é um simples sucesso natural, mas uma acção formadora em nós, na qual a natureza, permanentemente, ganha a sua forma histórica. A consciência e a consciencialização humanas têm, assim entendidas, uma função produtiva e teleológica que – para o domínio da nossa experiência – dá razão “no fim”, não no princípio, ao idealismo: trazemos no espírito algo acabado que está confiado à nossa habilidade. A ordenação de que damos conta, nesta correlação entre homem e cultura, remete também para um princípio primário de ordem que apenas tacteamos como um a priori de toda a experiência. Revela-nos um ser em que – para além de nós próprios – podemos participar. Possibilita o encontro com as coisas, num contacto que nos pode arrancar à indiferença e captar e formar a nossa natureza inteira; reciprocamente, também as coisas, neste encontro, adquirem a forma da aparência, percebemos o que lhes diz respeito e o significado e abordamo-las a partir desse último. A unidade do perceber e do aparecer (o mais maravilhoso de todos os fenómenos, no dizer de Hobbes) remete para uma origem a que corresponde todo o ente – o ser comum, de cuja distribuição participamos, com todos os outros e dá base e ressonância a toda a participação. Respeitamos esta unidade originária do ser participado, também e sobretudo na dualidade da natureza e da história do próprio homem, se bem que ambas se tornem válidas em nós, segundo aspectos e relações contrárias – em constância regular, por um lado, em suplemento a si próprio [...], por outro. São diferentes como raiz e copa da árvore que se orientam em sentidos opostos embora pertençam a um só tronco e um só desenvolvimento; ou como os rios que, provenientes da mesma nascente, correm cada um para seu lado.” (...) “A vida histórica – pode-se afirmar – cresce em contradição com a vida natural, sem nunca de todo a superar. Necessita de um enraizamento primitivo natural assim com forma uma base, històricamente originária. Recìprocamente, depende da natureza, a quem deve a sua existência, na medida em que apresenta à natureza uma profunda presença de si mesma e a transforma na paisagem do mundo histórico.”

3 Cf.: STERN, Klaus. Derecho del Estado de la Republica Federal Alemana. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1987, Tradução parcial do Tomo I: Javier Royo y Perdro Cruz Villalón, Colección “Estudios Constitucionales”, p. 111-113 e 114 e ss: “a) En este sentido el Derecho del Estado podría ser caracterizado como el conjunto de normas jurídicas que hacen referencia al Estado así como a la organización y actividad de los órganos estatales hacia el interior. Esta caracterización servía ya de fundamento al Derecho del Estado del Reich alemán de 1871. (...)” (...) “b) Un concepto tan amplio de Derecho del Estado carece de todo valor de delimitación y desconoce el desarrollo jurídico diferenciado desde hace siglo y medio. Dicho desarrollo há independizado materias jurídicas como el Derecho Penal, el Derecho de Organización de los Tribunales de Justicia, el Derecho Procesal, el Derecho Administrativo, a pesar de que también en ellos se hace referencia a la organización y función del poder del Estado. Del concepto de Derecho del Estado hay que segregar las materias jurídicas que no hacen referencia a los principios supremos de constitución, función y organización, materias que en la actualidad se han constituido ampliamente como disciplinas jurídicas autónomas. (...)” (...) “2. En este sentido existe hoy un acuerdo general sobre el concepto del Derecho del Estado en la ciencia del Derecho del Estado. Se trata por lo general de aquellas normas que de forma idéntica o semejante aprehenden y ordenan el fucionamiento del Estado desarrollado en el interior en sus principios fundamentales, em su organización esencial y en su relación básica com el ciudadano.” (...) “1. De lo expuesto en el apartado II resulta que el Derecho Constitucional es una parte del Derecho del Estado, que el Derecho del Estado abarca más que el Derecho Constitucional, ya que, por ejemplo, no todas las normas jurídicas constitutivas para la organización de los órganos supremos del Estado están incluidas en la Constitución. (...) Por outra parte, el Derecho Constitucional es en todo caso Derecho del Estado, ya que en él se tratan materias que han sido puestas por el pouvoir constituant, por el poder constituyente, es decir, por el pueblo, en una proximidad de la relación entre el Estado y el ciudadano. En este sentido pertenecen en todo caso el Derecho del Estado normas fundamentales, (...)” (Negritos no original e itálicos nossos).

4 I Ter Tipi di Scienza Giuridica. Torino: Giappichelli Editore, 2002, Jus Publicum Europaeum, Collana diretta da Agostino Carrino, a cura di Giuliana Stella, ps. 49-50.

5 Cf.: SELLÉS, Juan Fernando. El Intelecto Agente y los Filósofos – Venturas e Desventuras del supremo hallazgo aristotélico sobrel el hombre. Pamplona: EUNSA, vol. 1. – Siglos IV a.C. – XV, Colección de Pensamiento Medieval y Renascentista, p. 20. e ss.

6 “El concepto de ley tiene un significado central para la conformación y concreción ulterior de este concepto de Estado de Derecho. Es el eje de la constitución del Estado de Derecho. Y el concepto de ley próprio del Estado de Derecho tampoco permite diferenciar entre un concepto material o formal de ley, sino que es una categoria unitária. En ella se vincula un aspecto material o de contenido con um aspecto formal o procedimental en uma unidad inseparable: la ley es una regla general (norma general) que surge con el asentimiento de la representación del pueblo en um procedimiento caracterizado por la discusión y la publicidad. Todos los principios esenciales para el Estado de Derecho están incluidos institucionalmente en este concepto de ley, y en él reciben su forma. El asentimiento de la representación del pueblo garantiza el principio de la liberdad y la posición de sujeto del ciudadano; la generalidad de la ley impide ingerencias en el ámbito de la liberdad civil y de la sociedad más allá de sus limitaciones o delimitaciones de caráter general, esto es, válidas para todos por igual; el procedimiento determinado por la discusión y la publicidad garantiza la medida de racionalidade que el contenido de la ley puede humanamente alcanzar.” (BÖCKENFÖRDE, Ernest Wolfgang. Estudios sobre el Estado de Derecho y democracia. Madrid: Trotta, 2000, Tradução: Rafael de Agapito Serrano, Colección: Estructuras y Procesos, Serie: Derecho, ps. 17-34)”.

7 Cf.: NOVAIS, Jorge Reis. Contributo para uma Teoria do Estado de Direito – do Estado Liberal ao Estado social e democrático de Direito. Coimbra: Almedina, 2006, ps. 184-185 e nota de rodapé nº 455 à p. 185: “Como vimos, tratava-se, agora, não de actuar sobre aspectos parcelares da sociedade civil, mas de desenvolver uma actuação global, da qual a política económica constituía um instrumento basilar, tendente à conformação ou estruturação da sociedade pelo Estado e não apenas à mera correcção das deficiências marginais de um sistema auto-regulado. Este projecto, orientado para a prossecução de uma justiça social generalizada, desenvolve-se, não apenas numa política económica com o sentido referido, mas também na providência estadual das condições de existência vital dos cidadãos, na prestação de bens, serviços e infra-estruturas materiais, sem os quais o exercício dos direitos fundamentais não passa de uma possibilidade teórica e a liberdade de uma ficção; o Estado social é, fundamentalmente, um Estado que garante a integração existencial, que se responsabiliza pelo que a publicística alemã – sob influência de Forsthoff – designa por Daseisvorsorge.” (...) “Caracterizando como espaço vital (“Lebensraum”) o conjunto de bens, serviços, relações e situações materiais ou culturais em cujo âmbito o homem desenvolve a sua existência, Forsthoff distingue, dentro dele, o espaço vital dominado (“der beherschte Lebensraum”) do espaço vital efectivo (“der effektive Lebensraum”). O primeiro é integrado por tudo que lhe é atribuído – independentemente da condição de proprietário – de forma tão íntima ou intensa que o homem concreto pode permanentemente dispor e utilizar numa relação de senhorio ou predomínio (é, assim, o caso de sua propriedade, do seu poço, da sua casa, da sua oficina ou do seu posto de trabalho na fábrica); o espaço vital efectivo é constituído, por sua vez, por todos os bens e serviços que o homem não domina, que lhe são alheios, mas em cujo âmbito decorre efectivamente a sua existência concreta (o sistema de transportes e telecomunicações, os serviços de água, electricidade, gás, o ordenamento urbanístico). Ora, analisando as alterações produzidas no espaço vital a partir do século passado, Forsthoff conclui pela constatação de duas tendências irreversíveis: por um lado, as grandes concentrações urbanas e as deslocações das populações dos seus locais de origem provacam uma redução decisiva do âmbito do espaço vital dominado; paralelamente, o progresso tecnológico compensa aquela redução através do alargamento constante do espaço vital efectivo. Esta transformação nas condições de desenvolvimento da existência – em que tendencialmente o homem perde o domínio e controle sobre um cada vez mais amplo conjunto de bens e serviços que utiliza para viver – repercute-se decisivamente no plano das funções do Estado, na medida em que a diminuição progressiva da auto-suficiência (relativamente à qual não se pode fazer uma valoração negativa, pois este processo pode ir a par e ser sentido como um instrumento da liberdade perante o Estado e da felicidade individual) deve necessariamente ser compensada por uma actividade do Estado dirigida a assegurar as condições vitais de existência de que o homem carece, ou seja, pelo Daseinsvororge.” (Itálicos no original e nossos).

8 Cf.: HEIMSOET, Heinz in op. cit. ps. 66-67: “A “espontaneidade” da vida é pois o princípio directivo e a característica essencial que, tanto a respeito do organismo individual como da evolução das espécies, se destaca hoje cada vez mais, de novo, na crítica do Darwinismo e do seus conceitos fundamentais. Às simples relações de “reacção e estímulo” e de “adaptação ao meio”, opõe, por exemplo, a doutrina de Uexküll sobre os “ambientes” (como um todo articulado) e quem constrói para si, em harmonia com as suas particulares características, o seu próprio pequeno mundo e o “espaço vital” em que há-de mover-se. Assim, a grande diversidade que de facto se nota entre os vários “ambientes” vem a ser explicada pela espontaneidade da vida e das suas direcções endogénicas e deixa de ser por quaisquer considerações físico-fisiológicas, como até aqui acontecia. A idéia kantiana da condicionalidade subjectiva da realidade empírica, particularmente do mundo externo, no meio do qual o homem se encontra, vem também deste modo a achar-se ampliada ao domínio da Biologia. – De resto, não deixam de alcançar também uma extraordinária importância para a determinação fundamental do novo conceito da vida as investigações biopsíquicas, recentemente retomadas, sobre o problema do instinto, sobre os actos instintivos e de inteligência dos animais, sobre a vida e a experiência, a vida e a memória, movimento, acção e jogo destes. É sobretudo aqui que se abrem para a concepção autonómica da vida e das específicas categorias da região biológica novos horizontes e se patenteia a absoluta insuficiência das explicações mecanicistas de outros tempos. E assim se vai, numa palavra, preparando de novo o terreno para a profunda convicção de que a vida tem de ser compreendida e interpretada de dentro para fora, e não de fora para dentro, segundo caracteres que nós, os homens, aliás podemos muito bem compreender sem sairmos de nós próprios, embora possamos correr assim o risco de cairmos numa falsa interpretação exclusivamente humana das coisas.” (Itálico no original e nossos).

Sobre o autor
Marcelo Elias Sanches

Especialista em Direito Tributário, Direito Processual Civil e Direito Público; Mestre em Direito Político e Econômico.Advogado da União Federal

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