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Descriminalização do porte de até 40 gramas de maconha pelo STF e seus reflexos na Justiça Militar

Agenda 27/10/2024 às 17:08

A decisão do Supremo Tribunal Federal que descriminalizou porte de até 40 gramas de maconha para uso pessoal se aplica à legislação penal militar?

Introdução – 2 Caso hipotético, baseado em fatos corriqueiros envolvendo sentinelas das Forças Armadas, presas em flagrante na posse de menos de 40 gramas de maconha para uso próprio – 3 Decisão do Supremo Tribunal Federal que descriminalizou o porte, de até 40 gramas de maconha, para uso pessoal / Hipótese em que o porte de maconha, na quantidade de até 40 gramas, pode configurar tráfico de drogas – 4 Bem jurídico tutelado pelo art. 28 da Lei 11.343/06 (porte de drogas para uso próprio) e o princípio de lesividade – 5 Bem jurídico tutelado pelo art. 290 do Código Penal Militar (porte de drogas para uso próprio) – 6 Conclusão.

Luciano Moreira Gorrilhas

Subprocurador-Geral de Justiça Militar

1 INTRODUÇÃO

A maconha é a droga mais antiga e a mais utilizada no mundo. Vários países descriminalizaram o uso do referido entorpecente, tendo alguns deles fixado a quantidade em que o porte deixou de ser crime. Por outro lado, algumas nações a legalizaram (regulamentaram a produção e a venda, incidindo tributo). Dentre os países situados no continente americano que descriminalizaram ou legalizaram a cannabis, vale citar: Canadá, Estados Unidos (alguns estados), Uruguai, Chile, Colômbia, Peru, Paraguai, Venezuela, Costa Rica e Brasil (descriminalização pelo STF). Não obstante, artigos acadêmicos, como o “Cannabis: how it affects our cognition and psychology – new research”, publicado no site ¨theconvesation.com/br¨, indicaram que o uso de cannabis aumenta moderadamente o risco de sintomas psicóticos em jovens, com efeitos muito mais fortes naqueles com predisposição para psicose (pontuação alta em uma lista de sintomas de ideias paranoicas). Segundo a avaliação do estudo, para os 2.437 usuários de maconha, jovens entre 14 a 24 anos, houve um aumento, em 6 pontos percentuais, do risco de sintomas psicóticos em relação a não usuários, mesmo sem terem predisposição para psicose (Sahakian; Langley; Skumlien; Jia, 2022).

Consta, na biblioteca virtual científica brasileira SciELO-Brasil, estudo que demonstraram os seguintes efeitos da maconha: euforia, alteração da percepção do tempo, aumento da interferência na atenção seletiva, prejuízo no controle motor e efeitos adversos como ataque de pânico e ansiedade (Crippa et al., 2005). Os mencionados efeitos da cannabis podem não trazer significativos riscos e consequências para o usuário de maconha civil, mas certamente trarão para militares de serviço, os quais precisam ter lucidez, coordenação motora e pronta resposta na utilização dos armamentos de alto poder lesivo que portam, notadamente em situações que envolvem possíveis ataques a um posto de serviço militar, como já ocorrido na cidade do Rio de Janeiro por organizações criminosas.

2 CASO HIPOTÉTICO BASEADO EM FATOS CORRIQUEIROS ENVOLVENDO SENTINELAS DAS FORÇAS ARMADAS, PRESAS EM FLAGRANTE NA POSSE DE MENOS DE 40 GRAMAS DE MACONHA PARA USO PRÓPRIO

Para fins de reflexão, traz-se à colação o seguinte relato hipotético (optou-se por não registrar neste artigo fatos que constam em processos na Justiça Militar, para evitar exposições desnecessárias), mas que retrata similitude com vários casos concretos ocorridos em unidades militares das Forças Armadas, localizadas no Rio de Janeiro e situadas próximas a comunidades dominadas pelo tráfico de drogas: Uma sentinela armada de fuzil levou para seu posto de serviço, sete cigarros de maconha que continham menos de quarenta gramas. Fumou um dos cigarros e odor característico da droga chamou a atenção de uma equipe de serviço que fazia ronda nas proximidades daquele local. A equipe, imediatamente, se dirigiu para aquela guarita de vigilância e encontrou, na posse da sentinela, seis cigarros de maconha. Além desse caso, que é o que se configura mais comum nessas circunstâncias, tome-se o exemplo de um piloto de aeronave militar ou um controlador de voo militar, surpreendido com cigarros de maconha durante suas missões. Indaga-se: diante dessas situações, a polícia judiciária militar ficará impedida de lavrar um auto de prisão em flagrante, levando em conta a decisão do STF que descriminalizou o porte de até quarenta gramas de maconha para uso pessoal?

3 DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL QUE DESCRIMINALIZOU O PORTE, DE ATÉ 40 GRAMAS DE MACONHA, PARA USO PESSOAL / HIPÓTESE EM QUE O PORTE DE MACONHA NA QUANTIDADE INFERIOR A 40 GRAMAS PODE CONFIGURAR TRÁFICO DE DROGAS

O Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, no dia 26/06/2024, deu provimento ao recurso extraordinário nº, 635.659, interposto pelo Defensor Público-Geral do Estado de São Paulo e decidiu descriminalizar o porte de até 40 gramas de maconha para uso pessoal e fixar os parâmetros que diferenciam o usuário do traficante de drogas. Desse modo, nos termos do art. 28, §2º, da Lei 11.343/2006, será presumido usuário aquele que adquiri, guarda, tem em depósito, transporta ou traz consigo quantidade de até 40 gramas de maconha para uso próprio (quantidade estipulada até que o Congresso Nacional legisle a respeito). Vale observar, contudo, que o referido suposto usuário, mesmo portando quantidade inferior a 40 gramas de maconha, pode vir a ser considerado traficante, caso, no momento de sua abordagem pela polícia, sejam encontrados elementos que caracterizem mercancia da droga, tais como: posse de outras espécies de drogas, balança, anotações que configurem operações de compra e venda e outras circunstâncias indiciárias do comércio de drogas. Nessas situações, a polícia deverá fundamentar, de forma minudente, sem levar em consideração critérios subjetivos, as razões para o afastamento da presunção do porte da maconha para uso pessoal.

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Assinale-se ainda que, segundo a decisão do STF, mesmo nas hipóteses em que haja apreensão de mais de 40 gramas de maconha com uma pessoa, o juiz não fica impedido de concluir pela atipicidade do fato, caso entenda se tratar de um usuário. Desse modo, a quantidade em gramas de maconha para diferenciar o usuário do traficante de drogas não é absoluta e depende das circunstâncias que envolvem os fatos.

Como a decisão do STF fez referência a quantidade da maconha natural em gramas e no cultivo de 6 plantas fêmeas, poderá haver possível imbróglio em relação à interpretação jurídica que se deva dar ao porte para uso pessoal da chamada maconha sintética (nomes comerciais K2 e K9) e de outras versões usadas para cigarros eletrônicos.

A interposição do Recurso Extraordinário em questão teve como objetivo alegar a inconstitucionalidade da incriminação do porte de drogas para uso pessoal tipificado no art. 28, caput e seu §1º, da Lei 11343/2006. O caso envolveu a condenação de um cidadão, por porte de maconha, à pena de dois meses de prestação de serviços à comunidade ou entidade pública, pela prática de conduta descrita no art. 28, caput, da Lei 11.343/2006.

Consoante argumentos apresentados pelo impetrante do aludido RE, o supracitado dispositivo penal está em desacordo com a ordem constitucional, uma vez que inexiste, em relação a conduta incriminada, a necessária lesividade a bem jurídico digno da tutela penal, notadamente em razão de a ação proibida pela norma incriminadora em menção ter atingido a saúde individual do usuário e jamais a saúde pública. Os fundamentos do recurso foram adotados na decisão do STF somente em relação ao porte de maconha, em quantidade inferior a 40 gramas, para uso pessoal.

4 BEM JURÍDICO PROTEGIDO NO CRIME PREVISTO NO ART. 28 DA LEI DE DROGAS

Ressalte-se que o legislador da lei em comento deixou uma lacuna no supramencionado dispositivo que perdura desde a sua publicação até a presente data (mais de 18 anos), ao não estabelecer, de forma objetiva, fatores que diferenciam o usuário do traficante de drogas, tais como, quantidade de tóxico apreendido e as circunstâncias de como se deu a apreensão. Tal omissão legislativa culminou com a judicialização dessa matéria perante o STF. Vejamos o art. 28 da Lei 11.343/2006:

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

§ 1º Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica.

Verifica-se que a Lei 11.343/2006 estabeleceu no supracitado dispositivo penal uma modalidade de crime de menor potencial ofensivo sem pena privativa de liberdade para o usuário de drogas. Houve uma despenalização com, inclusive, proibição de prisão em flagrante (art. 48, §2º). Dessa forma, nem mesmo antes da recente decisão do STF que descriminalizou a posse de até 40 gramas de maconha, a polícia, ao ser notificada de que uma pessoa estava fumando maconha em sua residência, não deveria, em tese, invadir o local para prender o infrator (usuário) em flagrante. No entanto, a mídia noticia, cotidianamente, além de invasões de agentes do Estado em residências da periferia para prender em flagrante usuário de drogas, abordagens em local público, seguidas de prisão em flagrante de cidadãos negros de baixa renda, o que, não raro, resulta, em condenações pela justiça, por tráfico, de usuários que portavam pequena quantidade de tóxico para uso próprio.

Em relação ao preceito secundário descrito no art. 28 da lei, assinale-se que a prestação de serviço à comunidade não poderá mais ser aplicada pelo judiciário ao presumido usuário de maconha, pois foi considera pela Suprema Corte uma pena corporal e, consequentemente, de natureza penal. Assim, somente as penas de advertência e de medida educativa poderão ser infringidas àqueles que portarem para uso até 40 gramas de maconha.

Vale observar que a decisão do Supremo se restringiu à descriminalização da posse para uso próprio de maconha na quantidade mencionada alhures. Destarte, a posse de outras drogas, independentemente da quantidade, continua sendo penalmente ilícita.

Relativamente à reportada decisão da descriminalização da maconha pela atual composição do STF, percebe-se uma substancial mudança de entendimento por parte de alguns ministros da corte se levarmos em conta julgados anteriores. Com efeito, outrora houve votos de ministros no sentido de que os crimes constantes da lei de drogas se caracterizavam como delitos de perigo abstrato, que visavam proteger a saúde pública e, assim, prescindiam da comprovação da existência de situação que tenha colocado em risco o bem jurídico tutelado; e que a posse ou guarda de substância entorpecente não afasta o perigo à coletividade e à saúde pública. Assim sendo, para a caracterização do delito descrito no art. 28 da Lei n. 11.343/2006, bastava a realização da conduta proibida para que se presumisse o perigo ao bem jurídico tutelado, uma vez que, ao adquirir droga para seu consumo, o usuário realimentava o comércio funesto, o que colocava em risco a saúde pública e era fator decisivo na difusão da droga (STF, Ag. Reg. Habeas Corpus 202.883 – São Paulo, 2021). Houve uma mudança radical de paradigma.

Hoje, prevalece o entendimento majoritário, na doutrina e na jurisprudência, de que a conduta de portar droga para uso próprio, descrita no art. 28 da Lei 11343/2006, não viola o bem jurídico tutelado, vale dizer, a saúde pública, mas tão somente a saúde individual do usuário.

O princípio da ofensividade preconiza que não há crime sem lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico alheio. Foi com fundamento nesse princípio que o STF descriminalizou o porte de até 40 gramas de macona para uso pessoal.

5 BEM JURÍDICO TUTELADO PELO ART. 290 DO CÓDIGO PENAL MILITAR E SUA PECULIARIDADE

Vejamos o art. 290 do CPM:

Art.290. Receber, preparar, produzir, vender, fornecer, ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, ainda que para uso próprio, guardar, ministrar ou entregar de qualquer forma a consumo substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, em lugar sujeito à administração militar, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão, até cinco anos.

Casos assimilados

§ 1º Na mesma pena incorre, ainda que o fato incriminado ocorra em lugar não sujeito à administração militar:

I - o militar que fornece, de qualquer forma, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica a outro militar;

II - o militar que, em serviço ou em missão de natureza militar, no país ou no estrangeiro, pratica qualquer dos fatos especificados no artigo;

III - quem fornece, ministra ou entrega, de qualquer forma, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica a militar em serviço, ou em manobras ou exercício.

Forma qualificada

§ 2º Se o agente é farmacêutico, médico, dentista ou veterinário:

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

§ 3º Na mesma pena incorre o militar que se apresentar para o serviço sob o efeito de substância entorpecente Incluído pela Lei nº 14.688, de 2023)

§ 4º A pena é aumentada de metade se as condutas descritas no caput deste artigo são cometidas por militar em serviço.(Incluído pela Lei nº 14.688, de 2023)

§ 5º Tratando-se de tráfico de drogas, a pena será de reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos.(Incluído pela Lei nº 14.688, de 2023)

Importa pontuar, precipuamente, que os bens jurídicos tutelados pela legislação penal militar divergem em muito dos bens jurídicos protegidos pela legislação penal comum. Dessa forma, a prática de qualquer crime por militar da ativa, em lugar sujeito à administração militar, afeta os princípios matrizes da hierarquia e disciplina, direta ou indiretamente. Nesse sentido, embora o art. 290 do CPM, que tipifica a posse de droga para uso próprio em lugar sujeito à administração militar (Lei 14.688/2023), esteja topograficamente inserido no capítulo dos crimes contra a saúde, o fato de um militar portar droga, em qualquer quantidade, no interior de uma organização militar, viola os princípios da hierarquia e disciplina, além de, em algumas situações, colocar em risco à segurança do aquartelamento, principalmente nos casos envolvendo militares armados responsáveis pela segurança.

É interessante lembrar que, antes da Lei 14.688/2023, o porte para uso próprio de drogas e o tráfico de drogas eram tratados no caput do mesmo tipo penal, com pena que variava de 1 a 5 anos de reclusão (art. 290, caput, do CPM). Com o advento da aludida lei, a pena para o tráfico de drogas passou a ser de 5 a 15 anos de reclusão (§5º).

Não se pode olvidar que a legislação penal militar tipifica condutas que são consideradas indiferentes penais pela legislação penal comum, tais como: os crimes de dormir em serviço, embriagar-se em serviço ou se apresentar embriagado para o serviço, desrespeitar superior hierárquico, não cumprir ordem de superior hierárquico sobre matéria de serviço, exercício de comércio pelo oficial e despojamento desprezível (ocorre quando o militar despoja-se de uniforme, condecoração militar, insígnia ou distintivo por menosprezo ou vilipêndio). Tais dispositivos penais podem parecer exagerados e violadores do princípio da ofensividade aos olhos daqueles que não compreendem, por exemplo, que o ato de uma sentinela armada de fuzil dormir, no seu quarto de hora, em seu posto de serviço, pode redundar no furto de seu fuzil (fato já ocorrido), comprometendo a segurança do aquartelamento. Pontue-se que toda guarnição de serviço deposita total confiança nas sentinelas designadas para realizar vigilância nas guaritas de um quartel.

Por essa razão, faz-se necessário que os crimes militares mereçam, por parte do operador de direito, exegeses diversas dos tipos penais previstos no código penal comum, principalmente em razão dos valores, princípios e bens jurídicos envolvidos.

Nesse sentido, o STF, no julgamento do Habeas Corpus 103684/2010, decidiu pela inaplicabilidade do postulado da insignificância penal em caso de posse ínfima de substância entorpecente em recinto sob administração militar. Seguem elucidativos trechos da decisão:

1- A questão da posse de entorpecente por militares em recinto castrense não é de quantidade, nem mesmo do tipo de droga que se conseguiu apreender. O problema é de qualidade da relação jurídica entre o particularizado portador da substância entorpecente e a instituição castrense de que ele fazia parte, no instante em que flagrado com a posse da droga em pleno recinto sob administração militar.

2- A tipologia de relação jurídica em ambiente castrense é incompatível com a figura da insignificância penal, pois, independentemente da quantidade ou mesmo espécie de entorpecente sob a posse do agente, o certo é que não cabe distinguir entre adequação apenas formal e adequação real da conduta ao tipo incriminador. Por discreto que seja o concreto efeito psicofísico da droga nessa ou naquela relação tipicamente militar, a disposição pessoal em si para manter o vício implica inafastável pecha de reprovação cívico-funcional, senão por afastar temerariamente a saúde do próprio usuário, mas pelo seu efeito danoso no moral das Forças Armadas, que são instituições voltadas, entre outros explícitos fins, para a garantia da lei e da ordem.

3- O modelo constitucional das Forças Armadas brasileiras abona a ideia-força de que entrar e permanecer nos misteres da caserna pressupõe uma clara consciência de que a disciplina mais rígida e os precisos escalões hierárquicos hão de ser observados como carta de princípios e atestado de vocação para melhor servir ao país pela via das Forças Armadas, donde a compatibilidade de maior rigor penal castrense como modo peculiar pelo qual a Constituição Federal dispõe sobre as Forças Armadas brasileira.

4- No caso, o art.290 do Código Penal Militar é o regramento específico do tema para os militares. Pelo que o princípio da especialidade normativo- penal impede a incidência do art.28 da Lei de Drogas ( artigo que, de logo comina ao delito de uso de entorpecentes penas restritivas de direito). Princípio segundo o qual somente a inexistência de um regramento específico em sentido contrário ao normatizado na Lei 11.343/2006 é que possibilitaria aplicação da legislação comum.

6 CONCLUSÃO

Provavelmente haverá uma enxurrada de Habeas Corpus no Superior Tribunal Militar e Supremo Tribunal Federal em face de processos que tramitam na Justiça Militar da União e na Justiça Militar dos estados envolvendo porte de maconha por militar, na quantidade de até 40 gramas.

É preciso, contudo, que os operadores do direito levem em consideração que a razão da existência no Brasil de um Código Penal Militar, diverso do Código Penal comum, reside na especificidade e peculiaridades da legislação penal militar que visa, precipuamente, à tutela de bens jurídicos e princípios inerentes às Forças Armadas.

Com efeito, conforme mencionado alhures, todo crime praticado por militar em ambiente castrense, além de violar o bem jurídico descrito no capítulo em que está inserido o tipo penal, atinge, mesmo que indiretamente, a hierarquia e disciplina, podendo, ademais, colocar em risco à segurança da organização militar, como é o caso de uma sentinela armada de fuzil surpreendida, no seu posto de serviço, sob o efeito de substância entorpecente.

Assim sendo, temos que a decisão do STF que descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal de ate 40 gramas, não terá efeito em relação ao militar usuário de maconha que for surpreendido dentro do quartel com a mesma quantidade de droga. O primeiro motivo é que o STF considerou inconstitucional o art. 28 da Lei de Drogas e não o art. 290 do CPM. O segundo, é que, como já decidido pelo próprio supremo em outras oportunidades, existem outros bens e valores dignos de proteção que envolvem as atribuições constitucionais da Forças Armadas.

Sobre o autor
Luciano Gorrilhas

Subprocurador-geral de Justiça Militar

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