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Lúcio correia, uma história de lutas.

Agenda 07/11/2024 às 12:12

INTRODUÇÃO:

 

 

Este que escreve este pequeno ensaio tem a honra de ter o mesmo nome e sobrenome do personagem deste pequeno trabalho, além de ser seu sobrinho.

A ideia de escrever sobre este que conta atualmente com 89 anos de idade nasceu dos muitos causos e histórias contadas pela minha mãe Lúcia Correia, e por todos os companheiros de lutas de Lúcio.

Não entendia como um político da envergadura de Lúcio Correia, o seu Lúcio, ou seu "Luiçu" , não tivesse sequer um ensaio escrito sobre sua trajetória de vida e política.

Então, depois de procrastinar muito e adiar bastante a confecção deste trabalho, decidi fazer a fim de resgatar a memoria de um dos grandes políticos de Pernambuco e um dos maiores de Camutanga.

A história de meu tio é uma daquelas história homéricas, improváveis, mas que nos ensina duas coisas: a importância da perseverança e da fé em Deus, e a importância de projetos construídos de forma popular.

 

1.    Capitulo; Lúcio, filho de Sapé-PB.

 

Lúcio Correia da Silva e o filho mais velho de Antônio Correia da Silva e Rosa Augusta, agricultores de Sapé na Paraíba, mas especificamente “antas do sono”.

Com ele são mais 9 irmãos do primeiro casamento de Antônio Correia, sendo 2 homes e 8 mulheres, com os do segundo casamento de Antônio Correia são mais 5 irmãos.

A vida dos Correia foi uma vida difícil, como da maioria do povo pobre dos rincões desse país.

Na década de 50 deixa Sapé e vai trabalhar em pedreiras “quebrando pedras”. No inicio da década de 60 perde a mãe Rosa Augusta, toma destino no mundo, chega a Jaboatão dos Guararapes e vem para Camutanga, então distrito de Itambé para pavimentar algumas Ruas. Sem maiores delongas, e nesse meio tempo que Lúcio conhece Maria da Glória (Glorinha) com quem veio a ter 8 filhos.

2.    Capitulo; LÚCIO, filho de Itambé.

Camutanga ainda não era emancipada quando Lucio Correia chegou em Camutanga, aqui formou família, fez amizades, passou a frequentar a IBC Igreja Batista de Camutanga, passou a ter uma boa relação, relação de amizade com os Porfírio de Queiroz, especialmente Pr. Antônio.

Dessa amizade nasceu uma relação de afinidades de ideia. Mas fora através de João Nunes, prefeito de Itambé, Getulista de carteirinha e contra UDN que Lúcio entrou na política.

Fora eleito vereador conversando com as camadas mais humildes, camponeses, trabalhadores, e também fora presidente da Câmara de Itambé por 5 mandatos, pois naquele ano cada mandato durava um ano. Esse já seria um feito enorme para um simples “quebrador de pedras”, mas mostrava a sua habilidade e sua forma de atuar junto aos mais humildes.

3.    Capitulo; Lúcio,  Filho de Camutanga.

 

Lucio Correia ou simplesmente seu “luiçu” como carinhosamente era chamado por seus correligionários em sua maioria mais humildes, persistiu , persistiu , fazendo comícios “relâmpagos”, conversando com a base, com o conjunto da população mais pobre e oprimida de Camutanga e depois de muito tentar se eleger para o cargo de prefeito da Cidade, o “forasteiro”, o “preto”, o “pobre”, o “quebrador de pedras”, o “comunista” palavras que eram usadas por seus adversários , conseguiu se eleger. É imperioso lembrar que vivíamos um período de Ditadura militar, de “bipartidarismo”, a Arena, partido do regime e o MDB, o único partido “legalizado” no país. Lúcio era do MDB, e depois de tanto tentar, venceu as eleições em meados da década de 70.

É possível ouvir os sons das ruas, a agitação, a vibração, e também o furor daqueles que diziam à época “somos a família tradicional”, somo “filhos daqui”, ou as interrogações; Como pode aquele homem ganhar? Mas ganhou, e a ARENA pôs luto na Rua Santa Cruz, foi “velar” o seu partido e chorar, resmungar, questionar os resultados, mas o povo pobre venceu junto à Lúcio Correia.

3.1  As perseguições:

 

Quem enfrenta a ordem constituída, os poderosos, não tem vida fácil, e com Lúcio não foi diferente.

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Cito um texto de um pesquisador ferreirense Ricardo Leite para ilustrar esse fato:

"LÚCIO CORREIA SOB ATAQUE - CAMUTANGA VIGIADA

Quando pesquisava no Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano, em arquivos oriundos do extinto Departamento de Ordem Política e Social - DOPS - me deparei com um envelope nominado CAMUTANGA. Por curiosidade abri e dentro encontrei uma espécie de folha corrida da cidade dos papagaios coloridos. Eram uns poucos documentos, que servem como uma amostra de como o arenismo local recorreu ao clima de perseguição do poder militar para fazer a disputa política em Camutanga no período ditatorial.

Um dos documentos, relacionados a Camutanga, encontrados na pasta do DOPS, talvez o mais significativo para demonstrar a tentativa de militarização da disputa política, é o que versa sobre denuncias de que o então prefeito Lúcio Correia da Silva estava fazendo uma política contra o governo golpista instalado em 31 de março de de 1964 no Brasil. A autoria da carta denúncia é assumida por um grupo que se autodenomina ARENISTAS DA CIDADE DE CAMUTANGA e traz o seguinte cabeçario:

"Informo-vos extra-judicialmente para fins de investigação que o atual prefeito desta cidade Sr. Prefeito Lúcio Correia da Silva, vem se portando de maneira contrária aos princípios constitucionais e aos (sic) da Revolução de de 31 de março de 1964".

O documento dos arenistas de Camutanga não é datado. Contudo, pelas informações que traz no seu bojo, pode-se deduzir que tenha sido produzido após as eleições de 1974. Eleição a qual o MDB "ganhou de lavagem", com Camutanga ajudando a eleger Marcos Freire senador, Thales Ramalho deputado federal e João Ferreira Lima deputado estadual. Duas derrotas seguidas deve ter sido demais para o ego e o interesse do arenismo local.

A eleição de 1972 em Camutanga pode ser considerada um marco na política da região. Lúcio Correia, que tinha sido perdedor em em 1965 e 1969, vence o pleito de 1972 com uma diferença de 52 votos. Nos anais do TRE aponta-se o seguinte resultado: Lúcio Correia do MDB 1.131 votos e José Maria Chaves (Zé Rogério) da ARENA 1.079 votos.

A vitória de Lúcio é gigante. Para se ter uma ideia, naquela eleição de 1972, somente em 10 cidades pernambucanas a ARENA não ganhou. Também gigante foi João Ferreira Lima. Das 10 vitórias obtidas pelo MDB no estado, ele comandou 3: Timbaúba, Camutanga e Aliança.

Eu ainda tenho uma memória curiosa desta verdadeira queda da bastilha na Camutanga de 1972. Em Ferreiros, Francisco Freire voltava ao poder para a alegria da "grande e unida família ferreirense". E em meio a grande comemoração que se dava em Ferreiros, aparece um carro de Camutanga, não lembro se Jeep ou caminhonete, como um grupo composto de músicos e coral, fazendo um lamento musical, uma espécie de réquiem para a ARENA de Camutanga:

"Camutanga está de luto, está de luto

Pois a ARENA hoje perdeu

Enquanto ela foi viva

Camutanga, camutanga já cresceu".

A melodia acompanhada por um exímio clarinetista de Camutanga, que também era figura cativa nos comícios da ARENA em Ferreiros, era muito triste. O curioso cortejo camutanguense nas ruas de Ferreiros naquele final de 1972, fez muito gente chorar e lamentar. Foi algo muito fúnebre. Não esqueço!

Mas... voltando. Na denúncia dos Arenistas de Camutanga tem de tudo: falso moralismo, costumes, política e choro de perdedor. Tem de tudo, mas o fio condutor é o de sempre: o perigo e o fantasma do comunismo. A trama contra 1964. Como vou anexar aqui o documento denúncia, me aterei no post em citar algumas passagens do documento, que me parece ser uma permanente tentativa de repetir o que a oligarquia ferreirense tinha feito com êxito alguns anos antes. Em 1965, apoiadores da ditadura em Ferreiros instalaram uma lucrativa fábrica de comunistas em Ferreiros, conseguindo alijar da disputa municipal a oposição mais popular da cidade.

Ser contra a "redentora" era um crime inafiançável nos anos 70s. O documento é anticomunismo na veia. Era como se dissesse, vem aqui Exército, varre esses comunistas para Quebec. Senão vejamos:

Lúcio é acusado de fazer reunião comandada pelo comunista Eráclio de Itambé; de se reunir dentro da mata com o sindicato em 1963; de forçar alistamento de trabalhador rural a Liga Camponesa; de ter um cabo eleitoral de nome Antônio Olimpio que, pasmem, vai nas usinas aliciar trabalhador para que deixe de ser empregado da usina e passe a trabalhar na prefeitura, além de incitar greves; de soltar ladrão e desmoralizar a polícia; de ir a maternidade, só de calção vermelho tipo zorba, para incitar parturientes arenistas; e de perseguir arenistas em massa, debochando e dizendo que "da ARENA não quer ver nem a semente". É pouco ou quer mais?

O documento pinta Quebec como um reduto comunista. Um soviet em pleno principado de Arnau. Vai pra Cuba, Lúcio. Diz que a vila é onde moram um caminhão de eleitores trazidos de fora para eleger Lúcio e seus aliados. E deduz que vem dai o nome Cuba, com o qual é pejorativamente denominada aquela comunidade. Além disso, o então prefeito tinha costume de alcoolizado botar seu Opala por cima dos transeuntes e mais... Lúcio cruelmente mandava eletrificar muros e postes em frente a casa de adversários políticos colocando em risco sua vida e das crianças ali residentes.

Por fim, diz a denúncia: quando da visita do então governador Moura Cavalcante na qual seria homenageado, após a sua saída da cidade, aliados de Lúcio tocaram fogo nos instrumentos da banda estadual. Ato que afirmam ter sido um ato de terrorismo e que só não teria sido provado pelo Tenente Ribeiro porque as pessoas ouvidas teriam sido coagidas pelo pessoal do prefeito.

Como se pode ler, o prefeito Lúcio estava sob ataque dos arenistas. Arenistas que usaram a proximidade que tinham com os militares e disposição destes em se meter no pequeno varejo da política local, para tentar mostrar força e voltar ao poder.

Em que pese toda tentativa feita. A Arena não voltaria ao poder. Em 1976, Camutanga elegeu o violeiro Severino Pereira para o cargo de prefeito, impingindo mais uma derrota aos remanescentes apoiadores da ditadura militar na cidade."

(Ricardo Leite - História Social e Sociologia.)

 

Foi nesse cenário que Lúcio teve seu primeiro mandato, com ataques, injurias, calunias, acusações a fim de ver o regime ditatorial intervir e retirara-lo na marra ou até mesmo prendê-lo.

Há um fato, que minha mãe irmã Lúcia conta, não sei se fora assim, ou se há uma contradição fruto da memória, de que teriam indo matar meu tio por algumas vezes, mas em uma destas o “executor” teria se arrependido quando do encontro com Lúcio Correia. O fato é que, se achamos difícil fazer política hoje, que dirá numa época marcada por um regime de exceção, de força bruta, de desaparecimentos forçados, exílios.   

Como dito a cima, Lúcio não fazia parte de família tradicional, mas era filho de agricultores simples, e talvez por intervenção divina, do destino ou não, Lúcio se tornou um dos maiores personagens da história de Camutanga.

4.    Outras Vitórias e derrotas:

 

Lúcio fizera o seu sucessor, um talentoso cantador de viola filho de Ferreiros -PE, Seu Pereira , homem simples e da confiança de Lúcio. Já em 1982 Lúcio vai para seu segundo mandato como prefeito, num período em que o país caminhava para a abertura democrática. Fica no poder até 1989, elege seu sucessor, Luiz Gonzaga, pai de sua nora, que era casada com seu Filho Lenildo Correia, que já estava na política como vereador.

Entre idas e vindas, Lúcio rompe com Luiz Gonzaga, perde as eleições em 1992 e 1996, e retorna nos braços do povo como vice-prefeito em 2000 numa chapa encabeçada por Armando Pimentel, este fora seu ultimo mandato. Lúcio Correia ainda teve o provilegio de ver suas raízes fincarem, Lenildo que fora vereador por mais alguns mandatos e vice-prefeito duas vezes e Lucia Correia, sua irmã que está indo para o sexto mandato eletivo.

Lúcio também teve perdas duras, perdeu o filho caçula num acidente de moto em 2009 (Lucio Filho), um outro vitima de um câncer devastador em 2011 (Leilton) e em 2021 seu sucessor e herdeiro político (Lenildo Correia) vitima de Covid-19.

 

Conclusão:

 

            Existem destes personagens que nasceram com um dom nato, Lúcio Nasceu para fazer politica junto às massas e esse oficio exerceu com perfeição. Lúcio está e ficará na historia de Camutanga.

 

Referências:

Ricardo Leite - História Social e Sociologia.

 

 

 

Sobre o autor
Lucio Wagner Barbosa Correia Vieira

Advogado, Especialista em Direito Penal e proc. Penal , pós-graduando em Ciências Políticas..

Informações sobre o texto

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