REFLEXÕES FINAIS
Uma verdadeira viagem metafórica nos institutos que conduzem o delinquente à liberdade; um sem número de benefícios processuais que dão concretude a regra da liberdade em casos de violações às normas penais. Percebe-se que existe uma quantidade enorme de delitos de pequeno potencial ofensivo, bastando o autor assumir o compromisso de comparecer ao Juizado Especial Criminal, e tudo resolvido; são exatamente 131 crimes possíveis de lavratura de Termo Circunstanciado de Ocorrência - TCO, previstos somente no Código Penal e de novo o criminoso voltando às ruas.
Se não for o caso de crime de menor potencial ofensivo, resta a possibilidade de depósito de fiança, sendo 77 casos de crimes afiançáveis somente no CP, podendo ser conhecido por decisão do delegado de polícia logo após a lavratura do APFD, e logo o delinquente está de volta às ruas.
Lembrando que de acordo com levantamentos realizados, reafirma-se, existem pelo menos 77 crimes possíveis de concessão de fiança pelo delegado de polícia, em sede de IP, somente no Código penal, em contar os corriqueiros casos de porte e posse de arma de fogo de uso permitido, embriaguez na condução de veículos automotores, racha na direção de veículo, homicídio culposo na direção de veículo e até uso de drogas por pilotos de aeronaves, previstos em leis esparsas, tudo isso cabe ao delegado de polícia arbitrar um valor de fiança.
Vencidas essas etapas na delegacia de polícia, vem a possiblidade da conversão da prisão por 10 por pelo menos medidas cautelares do artigo 319 do CPP, na audiência de custódia. Vencida a fase da audiência de custódia, restam ainda duas possiblidades do processo não caminhar. A possibilidade da suspensão condicional do processo, nos crimes de médio potencial ofensivo, artigo 89 da Lei nº 9.099, de 1995, aqui há pelos menos 102 hipóteses de cabimento deste benefício previstos no CP. E depois desse rol de benefícios ainda resta a possibilidade do acordo de não persecução penal, artigo 28-A do CPP.
Depois de tudo isso, vamos começar efetivamente o processo? Se houver condenação a pena não superior a 4 anos de prisão, se o crime não for praticado com violência ou grave ameaça a pessoa, vamos substituir a pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, prestação de serviços à comunidade, prestação pecuniária, limitação de fim de semana. Antes disso, ainda tem a possiblidade da suspensão condicional da pena, o famoso sursis.
Mas agora não tem jeito, o criminoso conseguiu vencer todas essas etapas. Agora é de lascar, não tem jeito mesmo; vai ter que recolher ao cárcere. Terá direito a progressão de regime, sob o conforto das Súmulas Vinculantes 56 e 59, fará jus ao trabalho interno e externo, terá direito a remição da pena pelo trabalho, pelos estudos, pela leitura de obras literárias, e agora querem remir a pena do preso que realiza atividades recreativas no interior do presídio. Mas ainda não acabou. Tem induto, graça e anistia; tem livramento condicional da pena; mas enfim, conseguiu sair do presídio, mas ainda durante 60 dias terá assistência ao egresso para retornar ao convívio social. Parou? Se for em Minas Gerais o preso terá ao sagrado direito ao período de férias, de acordo com o artigo 59 da Lei 11.404, de 1994, lei de execução penal no Estado berço da liberdade.
Com seus mais de 840 mil presos recolhidos nos estabelecimentos penais, no ranking de 3ª maior população carcerária do mundo, há quem sustente ainda que o Brasil prende muito e mal; o ideal talvez fosse o cumprimento das normas de convivência sem necessitar de normas jurídicas; o ideal fosse todo mundo do sistema penal perder seus cargos, suas funções porque não existe mais ninguém para punir; assim, cumprir as normas de conduta oriundas do pacto social passaria a ser um direito natural. Claramente, estamos diante de um sonho ou uma quimera. Deixamos a utopia de lado para afirmar com todas as letras que vivemos inexoravelmente numa sociedade altamente criminosa; egoísta; arrogante; por isso, sempre haverá alguém transgredindo as leis, inclusive, nesse instante é possível que estejam acontecendo crimes em algum lugar deste Torrão, gente matando, roubando, desviando dinheiro público nos suntuosos gabinetes em Brasília ou em qualquer outro lugar, e assim, o aparato estatal sempre será necessário para punir os recalcitrantes do contrato social.
Pelo menos em sede de direito penal, não obstante aos teóricos do sistema do garantismo monocular hiperbólico, aos amantes da intervenção mínima, aos apaixonados e acometidos pela síndrome de Estocolmo, aos adeptos ao princípio da felicidade plena, aos críticos do direito penal estigmatizante, aos lunáticos defensores das penas alternativas, um lado, e de outro, inobstante aos frenéticos defensores do direito penal máximo, aos compulsivos tatuadores de arminhas pelo corpo, aos seguidores do direito penal do inimigo, aos aloprados bélicos, e mais que isso, apesar dos narcisistas otimizados, dos midiáticos desenfreados, dos mercadores do sangue, dos cabotinos de gabinetes, dos paladinos da justiça, dos que se acham monopolizados da sabedoria jurídica, é certo que o delinquente tem o direito inalienável de ir para as profundezas do cativeiro dos ímpios, dos pecadores, do reservatório de almas condenadas, com as vestes rituais e exuberantes do corpo, num ataúde cheio de flores, vermelhas ou lilás, hermeticamente fechado, desde que no meio do trajeto não venha a transgredir direitos alheios.
BIBLIOGRAFIA
BOTELHO. Jeferson. A concessão de fiança pelo delegado de Polícia. Disponível em <https://jus.com.br/artigos/111598/a-concessao-de-fianca-pelo-delegado-de-policia>. Acesso em 08 de novembro de 2024.
BRASIL. Constituição da República de 1988. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em 29 de outubro de 2024.
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BRASIL. Código Penal Brasileiro. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em 29 de outubro de 2024.
BRASIL. Lei de Execução Penal. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7210.htm>. Acesso em 29 de outubro de 2024.
BRASIL. Lei do Juizado Especial Criminal. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm>. Acesso em 29 de outubro de 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em <https://portal.stf.jus.br/jurisprudencia/sumariosumulas.asp?base=26&sumula=1268>. Acesso em 29 de outubro de 2024.
Notas
1 BOTELHO. Jeferson. A concessão de fiança pelo delegado de Polícia. Disponível em <https://jus.com.br/artigos/111598/a-concessao-de-fianca-pelo-delegado-de-policia>. Acesso em 08 de novembro de 2024.
2 SANTOS. Carlos Eduardo Ferreira. Sistemas penitenciários e o princípio da proporcionalidade. Disponível em https://www.migalhas.com.br/depeso/326810/sistemas-penitenciarios-e-o-principio-da-proporcionalidade. Acesso em 29 de outubro de 2024.
3 MUÑOZ CONDE, Francisco; Arán, Mercedez García. Derecho Penal. Parte General. 8ª ed. Valência: Tirant Lo Blanch, 2010, p. 555.
4 VON LISZT, Franz. Tratado de Direito Penal alemão Vol. I. História do Direito Brasileiro. Obra fac-similar. Brasília: Senado Federal, 2006, p. 418.
5 MUÑOZ CONDE, Francisco; Arán, Mercedez García. Derecho Penal. Parte General. 8ª ed. Valência: Tirant Lo Blanch, 2010, p. 556.
6 BOTELHO. Jeferson. Breves anotações sobre a Remição Penal pela leitura. Disponível em <https://jus.com.br/artigos/56363/breves-anotacoes-sobre-remicao-penal-pela-leitura>. Acesso em 30 de outubro de 2024.