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Lei Marcial na Coreia do Sul: Entre Crises Internas e o Estado de Direito

Agenda 05/12/2024 às 16:10

A lei marcial na Coreia do Sul é uma medida extraordinária que transfere o controle civil para as forças militares, sendo historicamente utilizada em momentos de instabilidade. Apesar de ser um mecanismo constitucionalmente previsto, sua aplicação tem gerado debates intensos sobre os desafios e limites impostos aos direitos fundamentais em uma democracia moderna.

Durante a segunda metade do século XX, a Coreia do Sul enfrentou períodos de intensa instabilidade política e social, incluindo golpes de Estado e protestos massivos. Nesse contexto, a lei marcial foi empregada como resposta a crises internas, sendo marcada por episódios de repressão autoritária.

O caso mais emblemático ocorreu em 1980, durante o Massacre de Gwangju, quando a lei marcial foi usada para justificar a repressão brutal de manifestantes contrários ao governo militar de Chun Doo-hwan. Centenas de civis foram mortos, e o evento permanece como um trauma na memória coletiva do país, simbolizando os perigos de abusos por parte das forças armadas.

Sob a Constituição da Coreia do Sul, o presidente tem o poder de declarar a lei marcial, mas sua continuidade depende da aprovação da Assembleia Nacional. Este mecanismo reflete o princípio de “checks and balances”, essencial para impedir que medidas excepcionais sejam usadas de forma arbitrária ou como instrumento político.

No âmbito internacional, a possibilidade de suspender garantias constitucionais em situações de emergência é reconhecida, desde que obedeça aos parâmetros estabelecidos no artigo 4º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP). A Coreia do Sul, como signatária, é obrigada a garantir que tais medidas sejam proporcionais, temporárias e não discriminatórias, além de assegurar que direitos fundamentais, como a proibição de tortura, sejam preservados mesmo em cenários de exceção.

Comparativamente, a abordagem sul-coreana tem similaridades e contrastes com outras democracias. Nos Estados Unidos, por exemplo, a imposição da lei marcial é extremamente restrita, estando sujeita a supervisão judicial e legislativa rigorosa. Já nas Filipinas, o uso da lei marcial durante o regime de Ferdinand Marcos destacou os riscos de consolidação de regimes autoritários, demonstrando a importância de limitações institucionais robustas.

A experiência da Coreia do Sul durante o regime militar ilustra os desafios de equilibrar segurança nacional e direitos humanos. O Massacre de Gwangju não apenas expôs os perigos de abusos militares, mas também catalisou reformas institucionais que fortaleceram a supervisão parlamentar e judicial.

Contudo, embates entre o executivo e o legislativo persistem. Em contextos de polarização política, a declaração de lei marcial pode ser interpretada como um movimento político, exacerbando tensões institucionais. Por exemplo, decisões sobre segurança nacional foram judicializadas em ocasiões anteriores, revelando fragilidades no consenso político necessário para lidar com crises.

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Além disso, as tensões persistentes com a Coreia do Norte representam um desafio adicional, uma vez que a ameaça externa é frequentemente usada como justificativa para medidas de segurança mais rígidas. A memória de abusos passados, como em Gwangju, serve como um alerta para que as respostas às crises sejam compatíveis com os princípios democráticos.

Embora a Coreia do Sul tenha avançado significativamente em restringir o uso da lei marcial e em fortalecer suas instituições democráticas, desafios permanecem. O risco de abusos ainda é real, especialmente em contextos de instabilidade política ou tensões internacionais.

O fortalecimento contínuo da supervisão parlamentar e judicial, combinado com o compromisso com o estado de direito, é essencial para evitar retrocessos. A experiência sul-coreana oferece uma lição importante para democracias em todo o mundo: a preservação das liberdades civis em tempos de crise é o verdadeiro teste da resiliência democrática.

A Coreia do Sul demonstra que, embora a lei marcial seja constitucionalmente legítima, seu uso deve ser sempre a última alternativa, aplicada com transparência, controle e respeito aos direitos humanos. Assim, o país continua sua jornada para consolidar um modelo de democracia que equilibra segurança e liberdade, reforçando as barreiras institucionais contra o autoritarismo.

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