Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Posso regularizar por Usucapião o imóvel que nem meus pais, nem meus avós que tinham a posse regularizaram?

Agenda 12/12/2024 às 17:14

USUCAPIÃO é um dos procedimentos admitidos pelo ordenamento jurídico brasileiro que têm o condão de REGULARIZAR a propriedade de um imóvel. Através do preenchimento de certos requisitos - POSSE, COISA HÁBIL e TEMPO - que são comuns à todas as espécies de Usucapião - será possível reconhecer a aquisição do imóvel através da Usucapião. Esse reconhecimento hoje em dia pode ser feito tanto através de um processo JUDICIAL quanto através de um procedimento EXTRAJUDICIAL, que dispensa o tradicional processo judicial e é feito em Cartório Extrajudicial, com assistência obrigatória de Advogado.

Como sempre falamos aqui, analisar os detalhes do caso antes de iniciar uma regularização de imóvel através da USUCAPIÃO, por exemplo, é uma medida salutar que visará a economia de recursos importantíssimos como tempo e dinheiro. Ninguém tem tempo sobrando para perder com um processo que se eternize na justiça e muito menos dinheiro sobrando para gastar com diligências caríssimas em Cartório, onde o ambiente rejeita fortemente os pleitos de gratuidade por exemplo (embora não haja e nem possa mesmo haver qualquer restrição aos pedidos de gratuidade nas regularizações feitas pela via extrajudicial, já que todas as soluções que os Cartórios oferecem devem estar à disposição principalmente daqueles que não podem pagar pelas altas custas e emolumentos cartorários). A bem da verdade, são exatamente os altos custos que fazem com que as pessoas não regularizem seus imóveis, somada à burocracia que só dificulta as coisas.

Um aspecto importante da regularização via Usucapião (que tem aplicação tanto na aquisição de imóveis através da Usucapião Judicial quanto na Usucapião Extrajudicial) diz respeito à SUCESSIO POSSESSIONIS, que autoriza, no procedimento, a soma das posses de modo a cumprir um dos requisitos citados acima que é a exigência legal do TEMPO DA POSSE qualificada.

Como sabemos, todas as espécies de Usucapião exigirão algum tempo de posse, tempo esse que pode ser, atualmente, de 02 anos, 05 anos, 10 anos ou 15 anos. Temos a "sucessio possessionis" quando aquele que possui tempo de posse transfere, em razão da sua morte, o tempo de posse para seus herdeiros. A posse é uma situação fática que possui reflexos e importância econômica e jurídica, na medida em que autoriza seu titular (titular da posse, ou posseiro) a ingressar com as medidas jurídicas necessárias (usucapião) para ver convertida a posse qualificada em propriedade, na forma da Lei. Sob o prisma da sucessio possessionis a posse é direito que se transmite. Ora, essa carga jurídica e econômica da posse não se perde quando o posseiro falece. Ela pode ser transmitida como assegura o Código Civil em seu artigo 1.784 prestigiando o "direito de saisine":

"Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários".

A "sucessão da posse" outrora nos arts. 495 e 496 do Código Civil de 1916 hoje tem base legal nos artigos 1.206 e 1.207 do atual Código Civil de 2002, senão vejamos:

"Art. 1.206. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos caracteres".

"Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais".

A respeito desse importante aspecto dentro da USUCAPIÃO ensina o douto professor e Magistrado, Dr FABIO CALDAS DE ARAÚJO (Usucapião. 2015):

"Em nossa legislação precisamos combinar os arts. 1.206, 1.207 e 1.784 do CC para concluir pela transmissão imediata da posse. (...) Como a 'sucessio possessionis' gera transmissão automática de direitos, não acarreta prejuízo quanto ao prazo, ressalvando-se, entretanto, que a posse se mantém com os vícios e qualidades originais. (...) A posse do herdeiro e a do 'de cujus' são, na verdade, uma só: 'heres et defunctus una eademque persona esse intelligentur'. Assim, se o 'de cujus' vinha exercendo uma posse mansa e pacífica, com justo título e boa-fé, tendo direito à usucapião ordinária, seu sucessor também o terá, pois receberá a posse na mesma qualidade. (...) Aplica-se o mesmo raciocínio em relação aos vícios. Se o 'de cujus' vinha exercendo posse clandestina, seu sucessor não aproveitará a mesma, para efeito de prescrição aquisitiva, tendo que começar novo lapso com posse justa".

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Outro artigo do atual Código Civil importante no exame da soma das posses recebida por herança é o art. 1.243 que reza:

"Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus ANTECESSORES (art. 1.207), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e de boa-fé".

Observada, portanto, a regra legal, será plenamente possível aos sucessores do possuidor dar continuidade à posse exercida pelos seus antecessores, podendo pleitear inclusive a regularização via Usucapião em seu nome, como confirma recente decisão do TJMG:

"TJMG. 1506275-93.2011.8.13.0024. J. em: 06/03/2024. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA - IMÓVEL URBANO - POSSE ININTERRUPTA, MANSA, PACÍFICA E COM ANIMUS DOMINI POR MAIS DE QUINZE ANOS - SOMA DE POSSE ANTERIOR - SUCESSIO POSSESSIONIS E ACCESSIO POSSESSIONIS - PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS (ARTS. 1238 E 1243, CÓDIGO CIVIL)- USUCAPIÃO CONFIGURADA - REFORMA DA SENTENÇA. Tratando-se de ação de usucapião extraordinária é ônus do Autor provar a sua posse ininterrupta, sem oposição e com o ânimo de dono sobre o imóvel usucapiendo, independentemente de justo título e boa-fé, pelo lapso temporal exigido, conforme previsão legal do art. 1.238 do Código Civil. Conforme disposto no art. 1.243, do Código Civil, é permitida a contagem, pelo possuidor, do tempo das posses anteriores, exercidas pelos seus antecedentes, em relação ao imóvel usucapiendo. Tratando-se de sucessio possessionis, nos termos do art. 1.207, do Código Civil, a posse anteriormente existente é transmitida com as mesmas características, para o sucessor que segue em seu exercício, para fins de aquisição da propriedade. A soma da posse do atual possuidor com a de seus antecedentes é possível, devendo ser comprovada a identidade de características, ou seja, ambas devem ser mansas, pacificas, contínuas e com animus domini. Uma vez preenchidos os requisitos mínimos necessários para declaração da prescrição aquisitiva pleiteada sobre imóvel indicado na inicial, o deferimento da usucapião pretendida e consequente reforma da sentença é medida que se impõe".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!