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Tratados Internacionais de Direitos Humanos.

Um novo "locus" hermenêutico?

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4.Conclusão

De tudo o que foi visto, depreende-se que o fundamento da hermenêutica no neoconstitucionalismo é a própria Constituição, pela qual princípios e regras ganham novos sentidos e possibilidades de aplicação. A interpretação das normas infraconstitucionais deve ser adequada aos princípios e regras da Constituição, instituindo um padrão multifacetado que irradia valores e sentidos a todas as normas, que com ele devem se compatibilizar.

Quanto aos tratados internacionais de direitos humanos a que alude a cláusula constitucional de abertura do catálogo de direitos fundamentais, há algum tempo correntes minoritárias já os contemplavam como normas materialmente constitucionais. Aceitando, em parte, a importância hierárquica dessas normas internacionais, o Supremo Tribunal Federal brasileiro vem sinalizando para uma mudança na interpretação. Preferiu utilizar o vocábulo "supralegal", ao invés de confirmar o caráter constitucional.

A convenção internacional humanitarista, ao ser alçada à categoria de norma supralegal, inclui assim um novo paradigma de compatibilidade vertical e horizontal: as normas infralegais retiram seu fundamento de validade da Constituição e dessas convenções internacionais. Os tratados de direitos humanos – por estarem formalmente entre a Constituição e a legislação infraconstitucional e em razão da cláusula de abertura colocá-los em pé de igualdade com os direitos fundamentais do sistema jurídico interno – adquirem novo "status" hermenêutico: toda norma infraconstitucional deve agora não somente adequar-se ao texto da Constituição (direito constitucional interno), mas também às normas derivadas dos tratados internacionais de direitos humanos, incorporados ao ordenamento interno.

Como conseqüência da criação da cláusula de abertura, surge, portanto, o reconhecimento de uma fonte inovadora do sistema constitucional de direitos e garantias fundamentais: os tratados internacionais de direitos humanos. Combate-se assim o risco de que, no caso concreto, o operador do direito faça uma adequação da legislação infraconstitucional tomando como parâmetro apenas textos normativos constitucionais originários, eventualmente descurando normas de cunho humanitarista, contempladoras de direitos fundamentais mais intensos e/ou mais favoráveis.


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Notas

01 É a posição de HESSE, STERN e CANOTILHO, indicada por SARLET. Cf. A eficácia dos direitos fundamentais. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 84-87.

02 DANTAS trata da abertura da Constituição tendo como referência o conceito de "Constitución abierta" de VERDÚ. Cf. Interpretação constitucional no pós-positivismo: teoria e casos práticos. 2.ed. São Paulo: Madras, 2005, p. 184.

03 O dispositivo constitucional supracitado resultou de proposta do, à época, Consultor Jurídico do Itamaraty Cançado Trindade.

04 O Legislativo pode recusar o tratado e impedir a ratificação pelo Presidente da República. Não poderá alterar o texto do tratado. As emendas que podem ser apresentadas por cada uma das Casas do Legislativo se restringem ao projeto do decreto legislativo, jamais ao texto dos tratados por serem "insusceptíveis de qualquer mudança". Cf. MAZZUOLI. Op. cit., p. 315.

05 Na concepção de TRINDADE, PIOVESAN e MAZZUOLLI, os tratados internacionais de direitos humanos possuem validade no ordenamento jurídico interno a partir da ratificação, prescindindo do decreto presidencial.

06 O dualismo se desdobra em: a) dualismo radical – admite-se a incorporação do tratado ao direito interno, desde que seja por meio de uma lei, sem a qual o tratado não surte efeito; b) dualismo moderado – para a incorporação do tratado basta o rito procedimental complexo (ato do Executivo – confirmação do Legislativo – ratificação – decreto). Cf. MAZZUOLI. Op. cit., p. 212.

07 As duas ordens, internacional e nacional, se harmonizam porque apontam na mesma direção: possuem o "propósito comum de proteção da pessoa humana". Cf. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de direito internacional dos direitos humanos. 2. ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003. v. I, p. 506.

08 No entanto, como se verá adiante, surge uma nova concepção liderada pelo Min. Gilmar Mendes pondo fim à paridade dos tratados de direitos humanos com lei ordinária. Cf. RE 466.343-SP e HC 90.172-SP.

09 Pedro Dallari, ao analisar o princípio da prevalência dos direitos humanos e o § 2° do art. 5° da CF/88, expõe que o Brasil tem duas preocupações na efetivação desses direitos: uma no âmbito da comunidade internacional, outra no âmbito interno. Propõe, então, uma "plena integração das regras de tais sistemas à ordem jurídica de cada Estado". Cf. Constituição e relações exteriores. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 162.

10 Cabe esclarecer que, embora se refira apenas aos direitos sociais, a proibição do retrocesso tratada por CANOTILHO se amolda perfeitamente à matéria aqui estudada, como um reforço ao princípio "pro homini". Nas palavras do doutrinador português, "o núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e efectivado através de medidas legislativas [...] deve considerar-se constitucionalmente garantido, sendo inconstitucionais quaisquer medidas estaduais que [...] se traduzam na prática numa ‘anulação’, ‘revogação’ ou ‘aniquilação’ pura e simples desse núcleo essencial". Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 3. ed. Coimbra: Almedina, 1999, p. 336-337.

Sobre os autores
Paulo Antonio de Menezes Albuquerque

Magister Legum e Doutor em Direito pela Westfälische Wilhelms-Universität Münster (Alemanha). Professor Titular do Curso de Mestrado em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Professor da Universidade Federal do Ceará (UFC). Procurador Federal.

Rodrigo Ferraz de Castro Remígio

Mestrando em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Bolsista CAPES/PROSUP. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALBUQUERQUE, Paulo Antonio Menezes; REMÍGIO, Rodrigo Ferraz Castro. Tratados Internacionais de Direitos Humanos.: Um novo "locus" hermenêutico?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1817, 22 jun. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11401. Acesso em: 23 nov. 2024.

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