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Liberdade de informação e sigilo da fonte

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Agenda 23/05/2009 às 00:00

4 – ASPECTOS JURÍDICOS DO SIGILO DA FONTE NO BRASIL

A prerrogativa jornalística em utilizar o sigilo da fonte foi uma inovação trazida pela Lei de Imprensa, nos seus artigos 7º, caput e 71, ao disporem que será assegurado e respeitado o sigilo quanto às fontes ou origem de informações recebidas ou recolhidas por jornalistas, rádio repórteres ou comentaristas, os quais não poderão ser compelidos ou coagidos a indicar o nome de seu informante ou a fonte de suas informações, não podendo seu silêncio, a respeito, sofrer qualquer sanção, direta ou indireta, nem qualquer espécie de penalidade.

Essa proteção jornalística também foi recepcionada pela Constituição Federal de1988 ao estabelecer que é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional (artigo 5º, inciso XIV).

Segundo Celso Mello [93], o texto constitucional intensificou, ainda mais, a idéia de que o sigilo da fonte é um "dos valores essenciais à preservação do Estado Democrático de Direito, além, de ser uma garantia básica de acesso à informação".

Outro dispositivo que trata do sigilo da fonte é o Código de Ética dos Jornalistas Profissionais do Brasil, aprovado pela Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ). No artigo 8º, ficou estabelecido que, sempre que considerar correto e necessário, o jornalista resguardará a origem da identidade de suas fontes de informação. Até o projeto da nova Lei de Imprensa contempla o anonimato do fonte, no artigo 10, parágrafos 4º e 5º [94].

Benedito Luiz Franco [95] explica que, ao garantir o sigilo da fonte jornalística, o ordenamento jurídico está agindo em favor da própria coletividade e da ampla pesquisa dos fatos ou eventos. Assim, se o sigilo não existisse, o acesso à informação estaria seriamente comprometido e "fatos de grande relevância não seriam dados ao conhecimento do público em geral".

Para Freitas Nobre [96], o segredo jornalístico é uma "exigência social, porque ele possibilita a informação mesmo contra o interesse dos poderosos do dia, pois que o informante não pode ficar à mercê da pressão ou da coação dos que se julgam atingidos pela notícia".

Importa ainda destacar que não é toda e qualquer pessoa que está autorizada a fazer uso do sigilo. De acordo com a redação do inciso XIV, do artigo 5º da Constituição, é imprescindível para a outorga dessa expressiva garantia que o seu uso seja feito quando necessário ao exercício profissional. Sendo assim, somente o jornalista, com registro profissional obtido após a conclusão de curso superior de Comunicação Social – habilitação em Jornalismo -, ou por aqueles que foram provisionados, face o direito adquirido e garantido pela legislação específica (decreto – lei n. 91.902, de 11 de novembro de 1985), poderão utilizar o sigilo da fonte.

Em relação a esse aspecto, Celso Ribeiro Bastos e Samantha Meyer - Pflug [97] criticam a postura de alguns magistrados de veicularem suas opiniões sobre diversos assuntos (inconstitucionalidade ou não de uma medida provisória ou lei, a viabilidade da instauração de CPI’s) na imprensa, sem, no entanto, realizarem a divulgação expressa de seus nomes, alegando, para tanto, o resguardo do sigilo da fonte.

Para esses autores, é impossível tal argumentação tendo em vista que a concessão do benefício do artigo 5º, inciso XIV da Constituição Federal pertence, única e exclusivamente ao jornalista, em decorrência de sua atividade profissional. Assim, a ocultação da identidade do magistrado configura-se como anonimato, atitude esta proibida pela Lei Maior (artigo 5º, inciso IV [98]).

Cumpre enfatizar que não se deve cogitar a idéia de que se trata de um privilégio de caráter individual ou de natureza corporativa. Ao contrário, quando o jornalista resolve preservar a identidade de sua fonte, ele está, automaticamente, assumindo a responsabilidade pelo que está sendo divulgado. Portanto, fica afastada a idéia de privilégio ou de impunibilidade.

Além do que, acrescenta Celso Mello [99], a prerrogativa do sigilo da fonte configura:

"Meio essencial de concretização do direito constitucional de informar, revelando-se oponível, em conseqüência, a quaisquer órgãos ou autoridades do Poder Público, não importando a esfera em que se situe a atuação institucional dos agentes estatais interessados".

Como conseqüência do entendimento de que o sigilo da fonte constitui um limite à atividade do Poder Público, ficou estabelecido que nenhum jornalista pode ser compelido a indicar o nome de seu informante ou a fonte de suas informações, mesmo que ele seja intimado como testemunha num processo.

Após enfatizar o alto significado político-social que assume a "indevassabilidade" das fontes de informação, Darcy Arruda Miranda [100] observa o seguinte:

"O jornalista ou radialista que publicou ou transmitiu a informação sigilosa, ainda que interpelado, não fica obrigado a indicar o nome de seu informante ou a fonte de suas informações. Este silêncio é direito seu, não podendo ser interpretado neste ou naquele sentido e não fica sujeito a sanção de qualquer natureza, nem a qualquer espécie de penalidade. Esclareça-se, porém: o que não sofre sanção civil, administrativa ou penal, é o silêncio do divulgador, não a publicação ou transmissão incriminada." (grifo nosso).

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal [101] também é enfática nesse ponto. Além de conferir ao jornalista o direito de não relatar a sua fonte de informação ou a pessoa de seu informante em juízo, ela assegura e desautoriza qualquer medida tendente a pressionar ou a constranger o profissional da Imprensa a indicar a origem das informações a que teve acesso:

"O ordenamento positivo brasileiro, na disciplina específica desse tema (Lei nº 5.250/67, art. 71), prescreve que nenhum jornalista poderá ser compelido a indicar o nome de seu informante ou a fonte de suas informações. Mais do que isso, esse profissional, ao exercer a prerrogativa em questão, não poderá sofrer qualquer sanção, direta ou indireta, motivada por seu silêncio ou por sua legítima recusa em responder às indagações que lhe sejam eventualmente dirigidas com o objetivo de romper o sigilo da fonte (...).

Eis que - não custa insistir - os jornalistas, em tema de sigilo da fonte, não se expõem ao poder de indagação do Estado ou de seus agentes e não podem sofrer, por isso mesmo, em função do exercício dessa legítima prerrogativa constitucional, a imposição de qualquer sanção penal, civil ou administrativa."

Outra decisão encontrada sobre o assunto, refere-se ao caso do Senhor X [102], ocorrido no ano de 1997. Nesse período, o Ministério Público Federal requereu a busca e apreensão, na sede do jornal Folha de S. Paulo, das fitas que continham as gravações originais dos diálogos entre o Senhor X e os deputados Ronivon Santiago (PFL-AC) e o João Maia (PFL-AC).

Para o Ministério Público, as fitas seriam o único meio que possibilitaria a verificação da autenticidade dos diálogos, divulgados nos dias 13 e 14 de maio de 1997 pela Folha. Conforme o conteúdo dessas fitas, cinco deputados federais tinham votado a favor da emenda constitucional da reeleição presidencial mediante suborno.

No entanto, a Folha de S. Paulo negou o pedido por considerar que, ao entregar as fitas para o Ministério Público, o jornal estaria "quebrando" o acordo firmado com a fonte de proteger a sua identidade. "A menos que o Senhor X queira, nada será revelado sobre sua verdadeira identidade", declarou Fernando Rodrigues [103], repórter responsável pelas matérias.

Não satisfeito com a decisão da Folha de S. Paulo, o Ministério Público entrou com recurso, alegando que "o sigilo da fonte não pode sobrepor-se ao interesse público de investigar e punir ilícitos gravíssimos de grande repercussão social".

Em resposta ao recurso interposto pelo Ministério Público, o juiz [104] emitiu a seguinte decisão:

"Tenho, em princípio, como lícita a recusa do Jornal Folha de São Paulo em entregar à Polícia Federal as fitas contendo as gravações originais dos diálogos telefônicos ocorrido entre os parlamentares federais e o, assim denominado "Senhor X", informante daquele periódico. A preservação dos informantes da imprensa poderá estimular outras condutas idênticas, possibilitando que o público tenha acesso a informações valiosas e reveladoras do comportamento criminoso dos agentes públicos, imprescindível, tal ciência, para o aperfeiçoamento das instituições democráticas e da cidadania. Este sigilo, repiso, de envergadura constitucional, poderá ceder diante de sua colisão contra outra garantia constitucional, que em caso concreto deva prevalecer, como por exemplo, os direitos individuais fundamentais".

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Dessa forma, o entendimento pátrio é de que o sigilo da fonte configura-se como um direito absoluto, não existindo, no ordenamento jurídico, qualquer restrição ao uso desse direito.

Portanto, a revelação da identidade de uma fonte fica a cargo da consciência e da ética de cada jornalista, tendo em vista que a Constituição Federal concedeu ampla garantia ao sigilo da fonte jornalística, não estabelecendo quaisquer limitações ao seu conteúdo.

É importante ressaltar que o tratamento jurídico brasileiro está em consonância com o entendimento contido nos Códigos Deontológicos de diversos países. Contudo, a posição jurídica internacional difere da brasileira. Para os demais países, o sigilo da fonte não apresenta um caráter absoluto, sendo passível de exceções na forma da lei. Esse questão será analisada num capítulo a parte.

Porém, mesmo com toda essa delimitação precisa de que o sigilo da fonte é uma área excluída do âmbito da investigação penal, alguns jornalistas continuam sendo ameaçados, caso não revelem as suas fontes.

Em 28 de fevereiro de 2001, por exemplo, os jornalistas Nilson Mariano e Altair Nobre, do jornal Zero Hora [105], de Porto Alegre (RS), foram intimados pela Polícia para deporem e revelarem a sua fonte de informação sobre uma reportagem, que continha denúncia contra o corregedor-geral da Polícia Civil, Pedro Urdangarin.

O delegado José Antônio de Araújo chegou a ameaçar os jornalista de que eles seriam indiciados no "crime de falso testemunho", caso não revelassem a identidade da fonte que repassou as informações publicadas na reportagem.

A atitude do chefe de Polícia do Governo foi repudiada pelo Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), que encaminhou uma denúncia-crime ao Ministério Público e ao coordenador de Promotorias Criminais de Porto Alegre, Ricardo Fêlix Herbstrith.

O MJDH enviou, também, uma Carta Aberta ao Governador do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra, pedindo providências, uma vez que o abuso de autoridade foi cometido pelo delegado nomeado pelo governo do Estado. Seguem alguns trechos da referida carta [106]:

"O Movimento de Justiça e Direitos Humanos repudia com veemência a tentativa do chefe de Polícia do Governo do Rio Grande do Sul de pressionar, coagir e ameaçar os jornalistas Nilson Mariano e Altair Nobre. (...). A iniciativa caracteriza, portanto, flagrante abuso de autoridade, conscientemente levado a cabo pelo chefe de Polícia, uma vez que os jornalistas foram intimados a depor, interrogados e, sob ameaça de imputação de crime, impelidos a revelar suas fontes, violência a que não se submeteram, em nome da dignidade, das suas garantias constitucionais e da ética profissional jornalística. (...). Tamanha violência não merece tão somente ser denunciada e repreendida. Ela cobre seu governo de vergonha e exige imediata retratação perante a sociedade que confiou a Vossa Excelência um mandato democrático, que não pode ser manchado pela truculência fascistóide e pelo brutal desrespeito às leis. São urgentes, portanto, as providências administrativas e legais que o caso torna impositivas. (...)".

Sem dúvida alguma, o delegado José Antônio de Araújo desrespeitou o direito constitucional dos jornalistas de manterem o sigilo da fonte. Cabe reforçar que os artigos 7º e 71 da Lei de Imprensa, juntamente com o artigo 5º, inciso XIV da atual Constituição, asseguram ao jornalista o segredo profissional, podendo, inclusive, não indicar o nome do informante, ou até mesmo o local de onde obtém os elementos que lhe permitem escrever a notícia ou comentário.


5 – SEGREDO PROFISSIONAL [107]VERSUS SIGILO DA FONTE

O artigo 154 [108] do Código Penal tutela o segredo profissional [109], cuja ação típica consiste em revelar, total ou parcialmente, sem justa causa, segredo de que o agente teve conhecimento em razão de função, ministério, ofício ou profissão [110].

Assim, exige-se uma determinada qualidade do agente ativo e que o fato sigiloso lhe tenha sido revelado em razão de sua atividade, ou seja, é a profissão ou a condição pessoal que proporcionam ao sujeito ativo conhecer o fato. Luiz Regis Prado [111] explica que "o artigo 154 não se destina a todos os que exerçam uma função, ministério, ofício ou profissão, mas somente àqueles que, para fazê-lo, devam obrigatoriamente ingressar na esfera de segredos alheia". Em outras palavras, para tornar-se sujeito ativo deste delito basta o nexo causal entre o conhecimento do segredo e a atividade exercida pelo agente.

Cabe ressaltar que não é necessário que o agente pertença à profissão ou ofício, no momento em que revela o segredo. Basta que lhe tenha sido transmitido como um profissional.

É comum denominar o sujeito ativo de confidente necessário, que são pessoas que recebem o segredo em razão da sua atividade. Encaixam-se, nessa definição, o médico psicanalista, o advogado e até o padre.

Salienta-se que o dever de sigilo se estende aos auxiliares ou ajudantes dos confidentes necessários (estagiárias, enfermeiras, secretárias e outros), desde que venham a ter conhecimento do segredo em razão de sua atividade.

Já o sujeito passivo pode ser qualquer pessoa sujeita a sofrer um dano com a divulgação do fato sigiloso. É quem tem interesse na conservação do segredo.

A conduta típica desse delito consiste em transmitir, divulgar a qualquer pessoa (uma só basta) o segredo. Essa conduta tem que ser dolosa, pois a forma culposa não acarreta qualquer punibilidade. Portanto, somente a vontade livre de revelar o segredo é punida, como explana Heleno C. Fragoso [112]:

"Este crime só é punível a título de dolo, que é a vontade livre de revelar o segredo. Envolve a consciência de que o fato é sigiloso e da ilicitude de sua revelação. Basta para a configuração do crime o dolo eventual, que se dá quando o agente, sem querer diretamente a revelação do segredo, pratica a ação assumindo a revelação assumindo o risco de revelá-lo".

A legislação penal obriga, por sua vez, que sejam obedecidas duas condições estabelecidas no próprio artigo 154: que a revelação seja feita sem justa causa e capaz de provocar dano a outrem. Caso elas não estejam presentes, não se pode cogitar na configuração do delito.

Dessa forma, é preciso que a divulgação do segredo seja capaz de produzir qualquer dano (material ou moral) injusto e juridicamente considerável. Ou seja, tem que existir a possibilidade de prejudicar alguém ou a efetivação desta. Para tanto, adverte Luiz Regis Prado [113], "exige-se que o informe divulgado pelo sujeito ativo seja portador de alguma relevância, pois, se inofensivo ou frívolo, a conduta do agente será atípica".

Em relação à justa causa, esta decorre da lei. O artigo 269 do Código Penal, por exemplo, exige a comunicação obrigatória às autoridades competentes caso o médico saiba da existência de moléstias graves, constituindo, inclusive, crime o fato de omitir a notificação das mesmas.

Há justa causa também na hipótese de revelação de segredo em defesa de direito próprio, ou ainda, quando o segredo é revelado em situação de estado de necessidade ou de legítima defesa. Diante dessas hipóteses, Nelson Hungria [114] conclui que o segredo profissional não é absoluto, comportando uma série de exceções toda vez que ele se deparar com interesses mais relevantes ou de alta importância moral.

Por fim, o crime de violação de segredo profissional apura-se mediante ação penal pública condicionada à representação do ofendido.

Diante do exposto, cabe indagar se a atitude do jornalista de revelar a sua fonte estaria ou não incluída no artigo 154 do Código Penal?

Darcy Arruda Miranda [115] tem o seguinte posicionamento sobre o assunto:

"Como o artigo 154 do Código Penal pune o fato de "revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tenha ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem", e como o art. 7º da Lei de Imprensa estatui que "será, no entanto, assegurado e respeitado o sigilo quanto às fontes ou origem de informações recebidas ou recolhidas por jornalistas, rádio-repórteres ou comentaristas", não resta dúvida que a estes últimos é vedado indicar a origem ou fonte da notícia que possa causa dano ao informante, sob pena de incursão no artigo citado".

Magalhães Noronha [116] compartilha deste entendimento, manifestando-se da seguinte forma:

"Sem grande razão, ao nosso ver, se tem discutido acerca do jornalista, argumentando alguns que sua profissão é mesmo dar à publicidade fatos de que tem conhecimento. Não há dúvida de que ele goza, por essa razão, de maior amplitude, devendo a pessoa que lhe confia um segredo esperar a publicação. Todavia a missão do jornalista é bem outra de que a de devassar a vida privada das pessoas, descobrir e expor a nu fatos, ocorrências e acontecimentos que nenhum valor têm, senão satisfazer a curiosidade mórbida de alguns, com prejuízo insanável para aquelas. O jornalista que deseja enaltecer sua nobre profissão não se pode conduzir desse modo. Por que estaria a salvo da sanção do artigo em exame o jornalista que, valendo-se de sua profissão, penetrasse a casa alheia e ali, surpreendendo um segredo, viesse depois contá-lo ao público (...) ?".

Diferentemente da posição tomada pelos renomados doutrinadores, este trabalho defende que o sigilo profissional conferido ao jornalista distingue-se ao dos médicos, advogados e padres, entre outras profissões que envolvam a figura do confidente necessário. E para defender esta posição, serão elencados os seguintes itens:

a) O segredo profissional protegido pelo artigo 154 do Código Penal tem como objetivo proteger segredo alheio, obtido licitamente, durante o exercício de determinada atividade profissional. E caso o segredo seja divulgado, implicará em violação à intimidade, à vida privada, à honra ou à imagem das pessoas, sendo assegurada indenização pelo eventual dano moral e material, conforme a disposição do artigo 5º, inciso X da Constituição Federal;

b) O sigilo da fonte conferido à classe dos comunicadores sociais (repórteres, editores, comentaristas, redatores) tem como escopo permitir que as informações possam ser levadas livremente a todos. Aluízio Ferreira [117] sintetiza esta finalidade com a seguinte explicação sobre o conteúdo do artigo 5º, inciso XIV da Constituição Federal:

"Todavia, exame mais detido mostra que no dispositivo em referência consignam-se não um só, mas dois distintos direitos: o de acesso à informação (a todos assegurado) e o de resguardo do sigilo da fonte (assegurado apenas ao comunicador e somente quando necessário ao exercício profissional). A condição do resguardo é que sua necessidade se imponha para o pleno exercício profissional, o que pode evidenciar-se não só quando o profissional vai buscar, senão também quando ocorre alguém lhe trazer informação".

c) Enquanto que o segredo profissional impõe aos confidentes necessários o dever de resguardar o segredo que lhe foi confiado, o jornalista possui apenas o dever ético e moral de preservar a identidade da fonte que lhe passou as informações.

No ordenamento jurídico brasileiro, não existem normas constitucional ou ordinária que obriguem o comunicador a preservar a identidade da fonte de informação. De acordo com a Constituição Federal, o artigo 5º, inciso XIV, apenas confere ao jornalista a faculdade de exercer ou não o sigilo da fonte, ou seja, o jornalista não está obrigado a preservar a sua fonte de informação.

De forma contrária é o entendimento dos códigos deontológicos, que impõem ao jornalista o dever de resguardar a identidade da fonte de informação, principalmente, quando ele for intimado como testemunha num tribunal.

Logo, o compromisso que o jornalista assume com a sua fonte em omiti-la é meramente ético e moral. Benedito Luiz Franco [118], diante disso, afirma:

"Não há qualquer disposição legal que obrigue o comunicador a não revelar a fonte de uma informação. Esse dever é de caráter ético e está contido nos códigos deontológicos e nos princípios que norteiam as atividades dos meios de comunicação social. O cumprimento das normas de caráter ético, pela sua natureza, depende de uma adesão íntima do indivíduo (ordem moral) a determinado juízo de valor que ele faz quanto a sua profissão".

Ademais, Celso Ribeiro Bastos [119], assevera que "a revelação da fonte não constituirá crime previsto na legislação penal (artigo 154), pois o jornalista não estaria revelando um segredo e sim a identidade da pessoa que lhe passou uma informação".

Daniel Cornu [120] salienta que a única conseqüência que poderá advir para o comunicador que não respeita o sigilo da fonte será a perda da confiança e da credibilidade. Afinal, "quem aceitaria conversar com um jornalista arriscando envolver-se em um processo judiciário?".

Gilberto Dimenstein e Ricardo Kotscho [121] também concordam que o princípio da confiança é o elemento decisivo para que uma fonte aceite fornecer informações "resguardando-se no off". Portanto, se o jornalista não souber manter em sigilo a identidade da fonte, esta "vai preferir o silêncio ou outro repórter para liberar inconfidências".

Segundo o jornalista e professor Edenilson de Almeida, o trabalho jornalístico envolve muita seriedade, credibilidade, competência para investigar e levantar as informações e, sobretudo, uma relação de confiança entre o leitor, o jornalista e a fonte. Logo, "se o sigilo foi prometido, o profissional da imprensa é obrigado a honrar com a sua palavra até as últimas conseqüências, mesmo correndo o risco de ir para a cadeia. É uma questão de ética, de princípios e de lisura individual", declara.

Ricardo Noblat [122] também é bastante rigoroso quanto ao compromisso do jornalista em não declinar a sua fonte de informação, sintetizando-o assim: "Uma vez que tenham assumido o compromisso de manter em sigilo a identidade de uma fonte, vocês estarão obrigados a honrá-lo. Percam o emprego, vão para a cadeia, mas não desrespeitem o acordo com a fonte. É questão de ética".

Para Carla Nascimento, da editoria de Cidades do Jornal de Londrina, o dever de preservar a fonte é "o pressuposto para o estabelecimento de um trabalho mútuo, parceiro: a fonte fornece a informação e o jornalista garante que manterá sob sigilo a sua identidade".

Outro autor que escreveu sobre o assunto foi Francisco Viana [123], para quem o cumprimento do sigilo é uma evidência da importância da fonte, tendo em vista que o "jornalista geralmente prefere sofrer penalidades, mesmo se estas forem uma eventual condenação judicial ou mesmo a demissão, a revelar o nome de uma fonte que tenha fornecido informações sob promessa de sigilo". Francisco Viana considera também que, para existir e funcionar o sigilo, ele deve estar alicerçado "numa relação direta de confiança com os jornalistas. Não se fala em off para quem não se conhece".

Não é assim, entretanto, que pensam todos os jornalistas. No dia 28 de outubro de 1987, a Revista Veja publicou a seguinte matéria da repórter Cássia Maria: "Por bombas nos quartéis, um plano da ESAO".

Na reportagem, foi denunciado que um grupo da Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais planejava utilizar métodos terroristas contra seus próprios companheiros de farda, para obter um aumento de soldo e melhores condições de trabalho.

No entanto, não foi o conteúdo da matéria que chamou atenção. Durante o desenrolar do texto do noticioso, a repórter Cássia Maria revelou que a obtenção de tais informações estava condicionada ao compromisso do sigilo entre a repórter e suas duas fontes principais: o capitão Jair Messias Bolsonaro e outro capitão, identificado apenas como "Xerife". Até o momento, nada de errado sob o ponto de vista ético e profissional.

Segundo Cássia Maria, os contatos com as fontes começaram no anterior ao da publicação da matéria, ou seja, em 1986. Em todos as conversas que a repórter teve com as fontes, foi prometido que não seria revelada a identidade das mesmas. Porém, ao perceber que estava recebendo em primeira mão a notícia de um plano criminoso, a repórter rompeu com o compromisso assumido com as fontes, e revelou o nome dos dois capitães.

Na época, Cássia tentou justificar a sua atitude, alegando que, "a partir do momento em que não denunciasse a existência da articulação, eu estaria sendo cúmplice e, para não ser cúmplice, eu abri o off". Além dessas razões, Cássia acrescentou que não haveria matéria se a fonte fosse omitida. "Afinal, vivemos num país onde a credibilidade da Imprensa é sempre contestada", defende.

Até hoje, a postura da repórter é questionada. Será que era realmente necessário a revelação das fontes para que a matéria tivesse credibilidade? Não bastava apenas a publicação pura e simples do fato?

Apesar de reconhecer que o dever ético de guardar o segredo da fonte "é um valor tão respeitável como o direito da justiça de prosseguir a verdade", Óscar Mascarenhas [124], integrante do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas portugueses, admite que o jornalista não deve encobrir ou ser cúmplice de um crime futuro. Portanto, Óscar Mascarenhas leva a crer que não reprovaria a decisão tomada pela repórter Cássia Maria, de revelar a identidade das fontes.

De modo contrário, sustenta António Fidalgo [125] para quem o jornalista deve manter o sigilo da fonte, mesmo em questões referentes a assuntos de natureza grave ou mesmo criminosa:

"Temos aqui dois deveres em disputa: por um lado, o dever profissional de manter o sigilo, por outro lado, o dever de denunciar um crime. Trata-se sem dúvida de um dilema ético, mas a regra geral é a de manter o sigilo profissional. É que essa informação foi prestada sob condição de o jornalista guardar segredo".

Heródoto Barbeiro e Paulo Rodolfo de Lima [126] também não teriam concordado com a atitude da repórter, já que para eles, "a identificação de uma fonte, que em princípio deve ser protegida, só é feita se ela, por dolo ou má-fé, gerar uma notícia falsa".

Sem dúvida, esse assunto suscita várias indagações a respeito da conduta ética a ser tomada. No caso específico da revista Veja, acredita-se que a veracidade e a credibilidade da matéria não estariam comprometidas se a repórter tivesse mantido a promessa do sigilo.

Outro fator que merece ser mencionado é que a repórter somente conseguiu obter aquelas informações mediante o compromisso de não divulgar as suas fontes. Assim, foi em nome desse acordo verbal de confidencialidade, que se tornou possível o acesso às informações.

Fora esse caso específico, o jornalista, ao oferecer o sigilo da fonte, deve se perguntar se realmente é necessária a concessão de tal garantia; se a preservação da identidade de uma fonte é tão importante quanto a informação que ela tem para repassar. Trata-se de ponderar os deveres; refletir se vale a pena utilizar o sigilo profissional, lembrando-se das conseqüências que advêm dessa opção.

d) Outra diferenciação existente entre o segredo profissional e o sigilo da fonte refere-se ao bem jurídico a ser tutelado. Enquanto que naquele a preocupação consiste em resguardar fatos da intimidade do confitente, neste busca-se a preservação da identidade de quem forneceu as informações para o jornalista.

É sabido que a função dos jornalistas consiste, precisamente, em divulgar informações verdadeiras e imparciais de que tiveram conhecimento. E como forma de concretizar esta função social, o jornalista está autorizado a utilizar a liberdade constitucional do sigilo da fonte pois, com ela, muitas informações importantes e úteis são conseguidas em nome da sociedade.

Dessa forma, seria totalmente incoerente a Constituição Federal e a Lei de Imprensa conceberem a existência do sigilo da fonte, se, ao utilizá-lo, o jornalista fosse enquadrado na figura típica do artigo 154 do Código Penal. Sobre este tópico, o autor Daniel Cornu [127] manifesta-se da seguinte forma:

"A expressão "segredo profissional" é ambígua, na medida em que ela também é aplicável a outras profissões (médicos, advogados, membros do clero, etc.), igualmente sob a obrigação legal de respeito a esse segredo. Diferentemente dos jornalistas, os outros profissionais devem guardar para si aquilo que lhes foi confiado, e seriam passíveis de punição em caso de violação do segredo. Ao contrário, a própria missão do jornalista implica que ele utilize as informações que lhe são repassadas e as torne públicas; não é portanto o conteúdo, mas a fonte que, em certos casos, deve continuar confidencial" (grifo nosso).

Portanto, ressalta-se novamente que o bem jurídico protegido pelo segredo profissional são os direitos personalíssimos do confitente, já que este, a título de confiança e necessidade, expõe fatos de sua vida íntima ou privado ao profissional. Aqui, como explica Benedito Luiz Franco [128], "a identidade do confitente pode, dependendo do caso, ser até revelada, mas o segredo, confiado ao profissional, deve ser preservado, se assim desejou o cliente".

Diferentemente é o sigilo da fonte, cujo objetivo é tutelar a identidade da pessoa que proporcionou a informação, sendo que o conteúdo desta é revelado, por força do serviço público que a imprensa possui de obter e publicar informações.

Por fim, vale destacar que a única hipótese admitida neste trabalho em que o jornalista incorre no crime definido do artigo 154 do Código Penal, vem a ser quando o profissional, atuando como assessor de imprensa, toma conhecimento de fatos secretos de sua empresa e acaba revelando-os sem justa causa. Nesta situação, o jornalista poderá sofrer dispensa por justa causa (artigo 482, alínea g da CLT).

Sobre a autora
Tatiana Moraes Cosate

Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Norte do Paraná, graduada em comunicação social- Jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina, especialista em Direito e processo penal pela Universidade Estadual de Londrina

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSATE, Tatiana Moraes. Liberdade de informação e sigilo da fonte. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2152, 23 mai. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12767. Acesso em: 22 dez. 2024.

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