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Apontamentos acerca do lançamento tributário

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Agenda 27/08/2009 às 00:00

5.O LANÇAMENTO COMO ATIVIDADE VINCULADA

O lançamento é uma atividade vinculada e obrigatória, diz o Código Tributário Nacional no seu art. 142, parágrafo único. [03] Tratando de atos vinculados e discricionários, Celso Antônio Bandeira de Mello assim os distingue:

Atos vinculados seriam aqueles em que, por existir prévia e objetiva tipificação legal do único possível comportamento da Administração em face de situação igualmente prevista em termos de objetividade absoluta, a Administração, ao expedi-los, não interfere com apreciação subjetiva alguma.

Atos ‘discricionários’, pelo contrário, seriam os que a Administração pratica com certa margem de liberdade de avaliação ou decisão segundo critérios de conveniência e oportunidade formulados por ela mesma, ainda que adstrita à lei reguladora de expedição deles.

A diferença nuclear entre ambos residiria em que nos primeiros a Administração não dispõe de liberdade alguma, posto que a lei já regulou antecipadamente em todos os aspectos o comportamento a ser adotado, enquanto nos segundos a disciplina legal deixa ao administrador certa liberdade para decidir-se em face das circunstâncias concretas do caso, impondo-lhe e simultaneamente facultando-lhe a utilização de critérios próprios para avaliar ou decidir quanto ao que lhe pareça ser o melhor meio de satisfazer o interesse público que a norma legal visa a realizar (MELLO, 1998, pp. 265-266).

Destaca, pois, Alberto Xavier (1998, p. 206) que se no Direito Administrativo há uma repartição entre o que é atividade vinculada e atividade discricionária, preponderando a última, uma vez que o legislador não pode prever todas as situações possíveis, no Direito Tributário, os ideais de segurança, conduziram-no a uma estreita aderência ao texto legal.

No lançamento, afirma Marcos Donizeti Sampar (2000, p. 60), devem ser observadas certas normas estabelecidas na legislação, quer em relação à modalidade a ser adotada, quer quanto ao momento de sua realização, não cabendo à autoridade administrativa qualquer juízo sobre sua oportunidade e conveniência. Por isso, não pode a Fazenda Pública efetuar o lançamento de ofício sem que se verifique as hipóteses em que a lei determina que pode e deve ser realizado. Do mesmo modo, não poderá proceder ao lançamento de ofício em substituição ao lançamento por homologação sem antes verificar a hipótese que autoriza tal atividade, prevista no art. 149, inciso V.

Quando a lei atribui ao contribuinte o dever de apurar e efetuar o pagamento do tributo, sem qualquer providência anterior da Fazenda Pública (lançamento por homologação) e, para tanto, lhe concede um prazo determinado para cumprir a obrigação, como ocorre na prática, nada se poderá fazer senão aguardar o decurso desse prazo para, só então, verificar se houve omissão ou inexatidão do pagamento. A partir de então, o sujeito ativo poderá (e deverá) realizar o lançamento de ofício para cobrar o montante do tributo ou a diferença apurada. É a hipótese prevista no art. 149, inciso V, do Código Tributário Nacional (SAMPAR, 2000, p. 58).

Nesse sentido, Hugo de Brito Machado afiança:

Nos casos em que a lei impõe ao contribuinte o dever de pagar o tributo antes do lançamento, a autoridade administrativa só pode tomar a iniciativa de lançar depois de terminado o prazo que a lei confere ao contribuinte para fazer, por sua própria iniciativa, o pagamento (MACHADO, 2000, p. 47).

São, também, esclarecedoras as palavras de Fabiane Bessa:

Ora, ao direito de exigir o pagamento (do qual é titular o sujeito ativo da obrigação tributária) corresponde o dever de pagar. Nesse sentido, a relação obrigacional nasce com a incidência da norma, sendo que, somente na hipótese de descumprimento do dever nela previsto, é que se cogitará do aspecto coativo contido na obligacio. Em outros termos, a obrigação tributária sob exame é dotada de pretensão ante o vencimento (previsto em lei) sem que tenha ocorrido o pagamento (BESSA, 2000, pp. 29-30).

O lançamento, portanto, deve ser efetuado nos termos da lei. Presentes os pressupostos previstos na legislação deve o Fisco proceder ao lançamento. Por outro lado, quando não presentes todos os pressupostos não poderá efetuar o lançamento do tributo.


6.O LANÇAMENTO E A SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO

Conforme vimos linhas acima, o lançamento faz-se necessário, em certos casos, para que a Fazenda Pública possa exigir o pagamento do tributo (lançamento por declaração e lançamento de ofício). Em outras situações, a lei atribui ao contribuinte – sujeito passivo – o dever de apurar o montante do tributo e efetuar seu o pagamento sem qualquer providência anterior da Fazenda Pública (lançamento por homologação). Caso o contribuinte não cumpra o dever de recolher o tributo ou efetue o recolhimento incorreto, cabe à Fazenda Pública, decorrido o prazo para cumprimento da obrigação, proceder ao lançamento de ofício para cobrar o tributo devido ou a diferença a menor apurada, sob pena de decadência.

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Luciano Amaro (2005, pp. 375-376) observa que o lançamento, embora o dever de pagar não decorra sempre desse ato, é sempre necessário para que a Fazenda Pública possa cobrar o crédito não satisfeito pelo contribuinte. Entretanto, pode ocorrer que o sujeito passivo fique temporariamente protegido contra atos de cobrança do Fisco, em virtude de alguma causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário. As causas de suspensão da exigibilidade do crédito tributário estão previstas no art. 151, do Código Tributário Nacional, que assim dispõe:

Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:

I – moratória;

II – o depósito do seu montante integral;

III – as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo;

IV – a concessão de medidas liminares em mandado de segurança;

V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial;

VI – o parcelamento. (BRASIL, 2009, p. 583).

Em face das diversas causas de suspensão, ressaltamos as palavras de Sacha Calmon Navarro Coelho que, ao tratar do prazo para realização do lançamento quando existe óbice judicial, pondera:

Possível em Direito Tributário, sempre, a impetração do mandado de segurança preventivo, é freqüente o fato de os contribuintes aforarem writs em que peçam a suspensão da eficácia das leis fiscais relativamente ao seu caso, requerendo a sustação de quaisquer atos administrativos que tenham por fundamento a lei guerreada. Fica, assim, o Fisco impedido de agir enquanto se discute a quaestio juris (a matéria fica sub judice).

Noutro giro, a Fazenda Pública fica obstada por ordem judicial, não pode nem deve lançar, e, se o fizer, ipso juris, o ato é nulo de pleno direito, não vale. Sequer é anulável. A nulidade se apresenta ex radice. [...]

Se, ocorrida a obrigação, deve a Fazenda, em caso de não-pagamento do seu crédito tributário, operar o lançamento ex officio (art. 150, § 4º, e art. 173, I, do CTN), sob pena de, não o fazendo (preclusão), caducar-lhe o direito ao crédito, não é menos verdadeiro que, havendo ordem judicial obstando à aplicação da lei ao caso concreto, não pode a Fazenda lançar (princípio da actio nata).É a decorrência lógica da falta de fundamento de validez para a prática do ato administrativo do lançamento, já que a lei que o embasaria está suspensa (sub judice). E o lançamento nada mais é do que ato de aplicação de norma geral, impessoal e abstrata, ao caso concreto - individualização normativa (COELHO, 1998, pp. 18-19).

Destacamos, também, a lição de Luciano Amaro (2005, pp. 377-378), segundo o qual a suspensão da exigibilidade pode obstar o próprio lançamento, quando este dependa do não cumprimento de dever legal do sujeito passivo e a causa suspensiva atua no sentido de prorrogar o prazo para o cumprimento desse dever. E argumenta:

Suponha-se, por exemplo, um tributo que o contribuinte tenha o dever legal de recolher sem prévio exame da autoridade administrativa, cujo prazo de pagamento seja prorrogado por uma moratória. [...] Se, nessas hipóteses (de tributo sujeito a lançamento por homologação), é concedida moratória, ela tem, como efeito indireto, o de prorrogar também a ocasião em que o lançamento poderá efetuar-se (por homologação, quando houver pagamento, ou de ofício, se decorrer o prazo adicional para pagamento, sem que este seja efetuado.

[...] É óbvio que, no curso do prazo prorrogado para pagamento, o sujeito ativo não pode exigir que este seja feito. Aliás, isso vale não só para o prazo de moratória, mas também para o prazo originalmente fixado para o cumprimento da obrigação, e não foi necessário que o Código dissesse que, na pendência dos prazos normalmente previstos para pagamento, a exigibilidade do crédito ficaria suspensa (AMARO, 2005, pp. 377-378).

Em síntese, as causas de suspensão podem atuar antes mesmo do lançamento, podendo obstar a sua consecução, seja porque o prazo para o cumprimento da obrigação foi prorrogado ou porque há medida judicial ou administrativa impedindo a aplicação da lei ao caso concreto.


CONCLUSÕES

Como síntese daquilo que foi exposto no presente estudo, podemos extrair as seguintes conclusões:

1. O lançamento é um ato administrativo de aplicação da norma tributária material ao caso concreto, tendo natureza meramente declaratória da obrigação tributária principal, que nasce (juntamente com o crédito tributário) com a ocorrência do fato gerador, conferindo apenas exigibilidade ao crédito tributário nos casos em que, em regra, antecede ao pagamento do tributo (lançamento por declaração e lançamento de ofício);

2. O lançamento por declaração é aquele em que, primeiro, o sujeito passivo (ou terceiro legalmente obrigado) informa (presta declaração); depois, a Fazenda Pública, de posse das informações, efetua e notifica o lançamento;

3. O lançamento de ofício é aquele em que, independente de provocação, a Fazenda Pública, dispondo de informações suficientes, toma a iniciativa de sua consecução, seja por determinação da lei ou em substituição ao lançamento por declaração ou ao lançamento por homologação nas hipóteses previstas na legislação tributária;

4. O lançamento por homologação aplica-se às situações cuja legislação atribui ao sujeito passivo dever de apurar e recolher o tributo, antes de qualquer providência Fazenda Pública, cujo papel é de controle posterior da atividade do sujeito passivo. Havendo omissão deste, total ou parcial, no cumprimento do dever de apurar e recolher o tributo cabe ao sujeito ativo efetuar o lançamento de ofício para exigir o tributo ou a diferença a menor;

5. O lançamento é uma atividade vinculada. Presentes seus pressupostos, deve ser efetuado. Por outro lado, quando não presentes todos seus pressupostos, não pode a Fazenda Pública efetuar o lançamento. Assim, o lançamento de ofício em substituição ao lançamento por homologação só poderá ser realizado após o prazo assinalado para pagamento, quando o sujeito ativo poderá verificar os pressupostos da omissão ou inexatidão do pagamento "antecipado" (art. 149, V, do CTN);

6. As causas de suspensão do crédito tributário podem obstar o próprio lançamento, quando atuam, antes da sua consecução, no sentido de prorrogar o prazo para pagamento ou impedindo a aplicação da lei ao caso concreto;


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 3ª ed. São Paulo: Lejus, 1998.

BESSA, Fabiane. Prescrição, decadência e lançamento por homologação. In. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, n. 54, 2000, pp. 26-43.

BORGES, José Souto Maior. Lançamento Tributário. In. Revista de Direito Tributário. 1998, n. 74, pp. 19-21.

BRASIL. Código Tributário Nacional. In. Vademecum acadêmico de direito. Organização de Anne Joyce Angher. 8ª ed. São Paulo: Rideel, 2009, pp. 563-588. (Coleção de leis Rideel 2009)

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. São Paulo: Saraiva, 1998.

COELHO, Sacha Calmon Navarro. A Decadência e a Prescrição em Matéria Tributária. In. Revista de Direito Tributário. 1998, n. 73, pp. 16-30.

_____ . Curso de direito tributário brasileiro. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

DENARI, Zelmo. Curso de direito tributário. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

MACHADO, Hugo de Brito. A Decadência e os Tributos Sujeitos a Lançamento por Homologação. In. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, n. 59, 2000, pp. 36-51.

_____. Curso de Direito Tributário. 25ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998.

SAMPAR, Marcos Donizeti. Tributos Sujeitos a Lançamento por Homologação, Prazo de Vencimento e Decadência. In. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, n. 53, 2000, pp. 52-66.

VILLELA, Gilberto Etchaluz. Teoria da Exigibilidade da Obrigação Tributária. 1ª ed. Porto Alegre: Síntese, 1999.

XAVIER, Aberto Pinheiro. Do Lançamento Teoria do Ato do Procedimento e do Processo Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.


Notas

  1. Importante observar que tal classificação não escapa às críticas da doutrina. Alberto Xavier (1998, p. 71) aponta que a essa classificação falha por absoluta falta de rigor científico, por não haver identidade de critério, pois contrapõe o lançamento de ofício ao lançamento por declaração pelo critério da iniciativa, já o conceito de lançamento por homologação atende ao critério da necessidade ou não da prática de providência do sujeito ativo anterior ao pagamento. Sacha Calmon Navarro Coelho (2000, p. 669) diz que as espécies previstas no Código Tributário Nacional estão destituídas de fundamentação científica, tratando-se, na verdade, de eventos preparatórios ao ato do lançamento.
  2. A expressão "antecipar o pagamento" contida no art. 150, caput, do CTN não é, segundo a doutrina, a mais adequada, porque conduz o interprete a pensar que o pagamento deveria ser realizado antes do prazo de vencimento previsto na lei. O pagamento, contudo, é devido na data que a lei determinar, portanto, não é antecipado (BESSA, 2000, p. 34).
  3. Art. 142. [...]

Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional. (BRASIL, 2006, p. 602).

Sobre o autor
Carlos Gustavo Silva Rodrigues

Agente Fiscal Tributário do Distrito Federal. Graduado em Direito pelo UniCEUB. Pós-graduado em Direito Tributário Aplicado à Gestão Pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Carlos Gustavo Silva. Apontamentos acerca do lançamento tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2248, 27 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13400. Acesso em: 22 dez. 2024.

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