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O Código de Processo Penal Militar e os tratados internacionais.

Correlação entre o CPPM e o atual posicionamento do STF

Agenda 08/11/2009 às 00:00

A partir de um recente julgado do Supremo Tribunal Federal, voltou à tona o debate sobre a posição hierárquica dos tratados e convenções internacionais no direito interno brasileiro. Nessa decisão (STF, RE nº 466.343/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, DJE nº 104, d. 04.06.2009), a Corte Suprema discutiu sobre a possibilidade ou não da prisão civil por infidelidade depositária judicial, ficando decidido a sua ilegitimidade no sistema jurídico atual.

Essa orientação do STF baseou-se na ratificação do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos pelo Brasil, ambos em 1992. Como os dois tratados proíbem expressamente a prisão civil de depositário infiel, só autorizando a prisão de devedor de alimentos, logo, a partir da adesão do Brasil a esses instrumentos internacionais, a vedação a esse tipo de prisão passa a valer também no direito interno brasileiro. Assim, para chegar a essa conclusão, o STF entendeu, por maioria, que os tratados internacionais sobre direitos humanos têm caráter supralegal, isto é, estão hierarquicamente abaixo da Constituição Federal, porém acima das leis infra-constitucionais.

Após isto, pode-se então perguntar: qual a relação do assunto em tela com o Código de Processo Penal Militar? A resposta a esse questionamento está estampada no § 1º do art. 1º do Decreto-lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969, Código de Processo Penal Militar (CPPM), que aduz: "nos casos concretos, se houver divergência entre essas normas [do CPPM] e as de convenção ou tratado de que o Brasil seja signatário, prevalecerão as últimas".

Logo, pode-se perceber que o legislador, ao editar o CPPM em 1969, já demonstrava uma posição vanguardista em relação aos tratados e convenções internacionais. Melhor dizendo, já dispensava um tratamento supralegal para os tratados internacionais em nosso ordenamento jurídico. Posicionamento este que veio a consolidar-se vários anos após a elaboração do CPPM, mais especificamente na recente decisão supramencionada do STF, bem como em outras subseqüentes no mesmo sentido (v.g., STF, HC 96772/SP, 2ª T., Rel. Min. Celso de Mello, DJE nº 157, d. 20.08.2009).

Ao dissertar sobre o tema, Célio Lobão (2009, p. 40) explica: "Nos casos concretos, se houver divergência entre as normas da lei processual penal militar e as de convenção e de tratado de que o Brasil seja signatário, prevalecerão as últimas […]". Na mesma linha, Jorge César de Assis (2008, p. 21) ensina: "Tratando de eventual divergência entre as normas do CPPM e as de convenção ou tratado de que o Brasil seja signatário, afirma o dispositivo em estudo [§ 1º do art. 1º do CPPM] que prevalecerão as últimas". Desse modo, ambos os doutrinadores destacam a prevalência das normas decorrentes dos tratados sobre o CPPM, que é lei infra-constitucional. Ademais, fica evidente que o tratamento dispensado pelo legislador da lei processual penal militar aos tratados e convenções internacionais, deve-se ao fato de que estes últimos estão em posição hierarquicamente superior em relação às demais leis infra-constitucionais.

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Em suma, apesar de o Código de Processo Penal Militar em vigor ter sido elaborado em 1969, desde aquela época já apresentava conformidade com o teor da visão hoje prevalecente no STF. Ou seja, o CPPM a partir do seu surgimento já dispunha em seu texto — expressamente — a tese da supralegalidade dos tratados e convenções internacionais ratificados pelo Brasil. Com isso, há uma enorme ampliação do rol de direitos e garantias fundamentais também no âmbito da Justiça Militar, advindos dos diversos mecanismos internacionais, como, por exemplo, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. E isso só vem consolidar o disposto no § 2º do art. da Carta Magna, segundo o qual: "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte".


REFERÊNCIAS

ASSIS, Jorge César de. Código de Processo Penal Militar anotado: artigos 1º ao 169. 2. ed. 3. tir. Curitiba: Juruá, 2008. 1º v.

BRASIL. Constituição Federal, Estatuto dos Militares, Código Penal Militar e Código de Processo Penal Militar. Organizador Álvaro Lazzarini. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003.

LOBÃO, Célio. Direito processual penal militar. São Paulo: Método, 2009.

Sobre o autor
André Abreu de Oliveira

Mestre em Segurança Pública, Justiça e Cidadania pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA); Pós-Graduado em Ciências Criminais pelo JusPodivm - Instituto de Ensino Jurídico; Pós-Graduado em Direito Penal Militar e Processual Penal Militar pela Universidade Cândido Mendes; Bacharel em Direito pela Faculdade Dois de Julho; Professor de Direito Penal e Direito Penal Militar; Sócio especial da Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais (AMAJME).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, André Abreu. O Código de Processo Penal Militar e os tratados internacionais.: Correlação entre o CPPM e o atual posicionamento do STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2321, 8 nov. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13811. Acesso em: 23 dez. 2024.

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