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O regime patrimonial entre os cônjuges nos países do Mercosul e no Chile e a harmonização legislativa

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Agenda 01/07/2000 às 00:00

4. Sobre a possibilidade de unificação da legislação dos países do
Mercosul e do Chile em torno do regime patrimonial no casamento

4.1. Opinião

Agora que foram traçadas, embora em linhas gerais, as regras sobre o regimes patrimoniais de bens entre os cônjuges, que vigoram nos países do Mercosul e no Chile, bem assim apontadas nos projetos de novos Códigos Civis do Brasil e da Argentina (nos demais países os Códigos Civis são relativamente recentes e não consta notícia de que estejam sendo reformados) as alterações sobre o regime patrimonial dos cônjuges (no casamento) e dos companheiros (na união estável), já é possível expender uma opinião sobre se é necessária, e também se é viável, a harmonização legislativa nesse campo.

A harmonização legislativa não é apenas necessária. Trata-se de um corolário, um pressuposto indispensável para que se complete a integração entre os países integrantes do Mercosul, a menos que se pretenda retroceder no intento da regionalização do Continente.

Outra não é também a conclusão dos juristas de cada um desses países, o que pode ser nitidamente sentido. Por exemplo, ao apresentar o seu projeto de reforma do Código Civil argentino para a Comissão de Legislação Geral da Câmara dos Deputados, a Comissão Federal incumbida da sua elaboração lembrou à referida Casa Legislativa que nesse projeto foram atendidas "as expectativas de harmonização legislativa que gerou o MERCOSUL." Aliás, no Tratado de Assunção(14), Capítulo I (Propósitos, princípios e instrumentos), no artigo 1, já ficou consignado, dentre outros compromissos, que "Este Mercado Comum implica: (...) O compromisso dos Estados-Partes de harmonizarem suas legislações nas áreas pertinentes, para lograr o fortalecimento do processo de integração."

A integração entre os Países começou no campo das relações comerciais e adentra, agora, em todos os outros setores (educação, cultura etc.). O casamento, que sempre foi possível de ser celebrado entre nacional e estrangeiro, agora deixa de ser apenas uma possibilidade prevista em lei e se torna uma realidade freqüente, dado o aumento do contato entre nacionais brasileiros, argentinos, uruguaios e paraguaios (já se pode até incluir o Chile), decorrente da abertura de fronteiras e da aproximação das formas de tratamento dos cidadãos não nacionais dentro de cada território.

Tal como comentado na introdução desta monografia, a relação patrimonial entre os cônjuges cria repercussões de cunho econômico que não podem ser desprezadas, sob pena de prejuízo para o bom andamento das relações negociais e, é claro, sobretudo prejuízo da valiosa instituição que representa a família.

Imagine-se o seguinte caso hipotético: uma pessoa maior e casada no Brasil, compra, a prazo, um bem imóvel na Argentina e, depois, torna-se inadimplente para com o vendedor, quanto ao pagamento das prestações. Se esse adquirente é casado pelo regime da separação de bens e não possuir bens próprios suficientes para saldar o débito contraído junto ao argentino, por certo que do fato ressairá, para este último, grande dificuldade (senão a impossibilidade) para receber o seu crédito, ainda que judicialmente, já que só poderia acionar o próprio devedor e não o casal.

Portanto, relações jurídicas como essa que foi descrita precisam de ter tratamento jurídico comum nas legislações de cada um dos países que integram o Bloco integrado.

          4.2. Procedimento a adotar para a unificação legislativa

Considerando-se o fato de que cada País é soberano, é claro que a harmonização da legislação deve principiar por tentativas de celebração de acordo ou acordos internacionai, para que, posteriormente, cada país transforme esses acordos em leis internas nos respectivos territórios.

          4.3. Uma proposta

Finalmente, para que não reste de pouco proveito prático este estudo, impõe-se que se lance alguma proposta de regulamentação do regime patrimonial entre os cônjuges (e companheiros), abrangidos os aspectos relativos à sucessão hereditária, à guisa de sugestão para os Governantes dos Países envolvidos no processo de integração regional, quando das negociações para a adoção de uma legislação harmônica.

No projeto que adiante se propõe, não se deterá em tratar de questões de somenas importância, procurando-se destacar tão-somente aquelas regras que ensejam efetivas implicações nas relações além-fronteira e que, necessariamente, deverão algum dia ser harmonizadas no âmbito de cada um dos países integrados.

Eis o projeto, ordenado por artigos, cada um desde logo seguido de uma fundamentação:

          "PROJETO"

LIVRO: DO DIREITO DE FAMÍLIA

TÍTULO: DO DIREITO PATRIMONIAL

SUBTÍTULO: DO REGIME DE BENS ENTRE OS CÔNJUGES

CAPÍTULO: DISPOSIÇÕES GERAIS

1º) O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade dos cônjuges, institui a família e cria a sociedade conjugal.

É de fundamental importância a inserção dessa regra, porque ela estabelece sobretudo a lembrança (que não pode ser olvidada, e funciona como princípio), da verdadeira finalidade do matrimônio, freqüentemente esquecida nos dias atuais, em razão da importância exagerada que se tem dado às coisas materiais, ou seja, ao aspecto econômico. Além disso, destaca a igualdade entre os cônjuges, já que as transformações culturais e as mudanças de hábitos experimentadas pelos povos não deixam mais espaço para que subsistam regras discriminatórias do cônjuge do sexo feminino, ainda hoje existentes em várias legislações. Por último, o dispositivo ressalta a conseqüência econômica do casamento: cria a sociedade composta pelos cônjuges, ou sociedade conjugal.

2º) A administração da sociedade conjugal caberá ao homem e à mulher, em colaboração e sempre no interesse do casal e dos filhos.

Aqui se aplica o Princípio da Igualdade entre os cônjuges, exatamente na parte onde mais surgem problemas: a administração da sociedade conjugal. Além disso, fica estabelecido outro verdadeiro princípio, que deverá servir de orientação na interpretação de quaisquer divergências em torno do assunto: o princípio de que a sociedade existe em função da família que dela emerge.

3º) Os cônjuges devem concorrer mutuamente, na proporção de seus bens e dos rendimentos que tenham, para o sustento da família e a educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial.

Trata-se de um corolário dos princípios da igualdade entre os cônjuges e do que estabelece como objeto essencial da sociedade conjugal o bem estar dos integrantes da família constituída pelo casamento. Daqui decorrem, também, efeitos patrimoniais significativos, já que se torna implícito que as dívidas contraídas por quaisquer dos cônjuges com o sustento da família ou na educação dos filhos se tornam, obviamente, dívidas solidárias do casal.

          4º) A sociedade conjugal termina:

I - pela morte de um dos cônjuges;

II - pela anulação do casamento;

III - pela separação judicial;

IV - pelo divórcio;

V - pelo novo casamento do cônjuge depois de declarada a ausência do outro em decisão judicial transitada em julgado.

Em todos as legislações estudadas, com insignificantes variações, são encontradiças disposições legais estabelecendo essas mesmas hipóteses em que se perpetra a dissolução da sociedade conjugal. Há necessidade, tão somente, de uniformizar as hipóteses de dissolução, já que em alguns países, como por exemplo o Paraguai, a sociedade conjugal também se dissolve pela separação de bens.

A separação de bens deve ser considerada como conseqüência e não causa da dissolução da sociedade conjugal.

Não parece consentâneo com a natureza do instituto do matrimônio instituir a possibilidade de um cônjuge pedir separação de bens, estando ambos em perfeito estado de saúde. Isso implicaria no desaparecimento da confiança mútua entre eles e, nesse caso, melhor é requerer a separação ou o divórcio. Além disso, basta que fique estabelecida a possibilidade de mudança do regime de bens mesmo depois de celebrado o casamento, para que se possa obter um resultado semelhante ao da separação de bens, pois, para tanto, basta adotar o regime da separação total de bens.

No caso de malversação do patrimônio do casal durante a vigência do casamento, por motivos de problemas psíquicos de um cônjuge, mais pertinente do que permitir a divisão de bens é estabelecer a possibilidade da Interdição, mediante processo judicial específico.

5º) Os nubentes, em convenção antenupcial ou mesmo mediante simples opção reduzida a termo, no processo de habilitação para o casamento, podem optar, quanto aos seus bens, por qualquer dos regimes expressamente disciplinhados neste código.

Parágrafo Único. A qualquer tempo é possível a mudança do regime de bens escolhido pelos cônjuges, para outro dentre os que estão previstos neste Código, dependendo, porém, de autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apuradas as razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

A liberdade de escolha do regime de bens constitui uma tendência de todas as legislações. Porém, não se coaduna com o objetivo da harmonização legislativa no Mercosul e no Chile a permissão da liberdade plena para que se adote o que bem aprouver. A liberdade plena conspira contra a segurança dos negócios jurídicos, tornando muito arriscada a celebração de negócios com pessoas casadas, pois dificulta, para quem com elas negocia, conhecer a sua real possibilidade de solvabilidade quanto a obrigações eventualmente assumidas. Uma vez limitada a liberdade de escolha somente a um dentre os regimes regulados em lei, os negócios se tornam mais transparentes. Com efeito, basta indagar daquela pessoa casada com quem se negocia e já se poderá ter uma idéia da sua condição de solvabilidade de obrigações que pretenda assumir.

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De outra parte, no que toca à permissão para alteração do regime, justifica-se plenamente porque, em sendo estabelecida a possibilidade de escolha de qualquer regime antes do casamento, coerentemente, não há razão para criar obstáculo à criação da faculdade de mudá-lo, durante o casamento.

6º) Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.

O regime supletório ou legal deve ser aquele que melhor atenda à eqüidade no que diz respeito à imputação de direitos e obrigações patrimoniais dos cônjuges. Parece que, salvo melhor juízo, o regime de bens que mais se aproxima desse ideal (eqüidade na imputação de direitos e obrigações patrimoniais entre os cônjuges) é o regime da comunhão parcial de bens.

No regime da comunhão parcial de bens, apenas se comunicam os bens, direitos e obrigações adquiridos ou contraídos pelo casal na constância do casamento. Ficam fora os bens próprios dos cônjuges (anteriores ao casamento) ou aqueles adquiridos por doação ou sucessão, as dívidas de cada cônjuge anteriores ao casamento, bens de uso pessoal, livros e instrumentos de profissão, os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge, as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes e, ainda, bens cuja aquisição tiverem por título uma causa anterior ao casamento.

A sociedade conjugal que se forma pelo casamento existe no interesse do casal e dos filhos e, por isso, é presumível que todos os bens adquiridos na constância dessa sociedade tenha advindo do trabalho comum de ambos os cônjuges, bem assim que as dívidas assumidas também sejam comuns nesse período. Logo, reitere-se, o regime que melhor se coaduna com essa ordem natural das coisas é o da comunhão parcial de bens.

          7º) É obrigatório o regime da separação de bens no casamento, sem a comunhão de aqüestos:

I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do matrimônio;

II - da pessoa maior de sessenta anos;

III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Uma norma dessa natureza é imprescindível, como forma não só de resguardar que seja atendida a verdadeira finalidade do instituto do matrimônio, mas também de proteger determinadas pessoas que, por fatores como idade e condição psíquica, são vulneráveis à investida de pessoas mal intencionadas sobre seus bens, sob o pretexto do casamento.

8º) Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher pode livremente:

I - praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desemprenho de sua profissão, salvo alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

II - administrar os bens próprios;

III - desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou alienados sem o seu consentimento ou sem suprimento judicial;

IV - demandar a rescisão dos contratos de fiança ou doação realizados pelo outro cônjuge sem a sua autorização;

V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao concubino ou à concubina, cabendo-lhe provar que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de cinco anos;

VI - praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente.

O artigo acima contém mais um assunto que está regulado de modos um tanto díspares, nas legislações dos países do Mercosul e do Chile, notadamente aquelas nas quais a administração da sociedade conjugal continua confiada apenas ao marido. É um consectário do fato de ter-se estipulado, em dispositivo anterior, a igualdade entre os cônjuges. Assim, essa igualdade deve estender-se aos atos de administração em geral, respeitadas as peculiaridades de certos atos jurídicos e a qualidade de determinados bens, conforme expressamente ressalvado.

9º) Podem os cônjuges, idependentemente de autorização um do outro:

I - comprar, ainda a crédito, as coisas necessárias à economia doméstica;

II - obter, por empréstimo, as quantias que a aquisição dessa coisas possa exigir.

Parágrafo único. As dívidas contraídas para os fins deste artigo obrigam solidariamente a ambos os cônjuges.

A inserção deste artigo tem o mesmo fundamento expendido quanto ao artigo anterior.

10) Exceto no regime da separação absoluta, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, ou sem o suprimento dessa autorização pelo juiz, quando negada sem motivo justo ou por impossibilidade de concedê-la:

I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;

III - prestar fiança ou aval;

IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.

Dispositivo quase idêntico a este consta do projeto de reforma do Código Civil do Brasil. Cuida-se de mais um consectário da igualdade dos cônjuges na gestão dos bens conjugais.

CAPÍTULO: DO REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL

11) No regime da comunhão parcial, comunicam-se os bens que o casal adquirir na constância do matrimônio, salvo exceções expressas neste Código.

Trata-se do regime legal e supletório existente no Brasil e que, de acordo com o projeto de reforma do Código Civil, continuará a sê-lo. Guarda estreita semelhança, este regime, com o da "comunidad de gananciales" do Chile.

Normalmente podem surgir dúvidas sobre se um determinado bem entra ou se não entra na comunhão, em razão da causa de sua aquisição por um dos cônjuges. Por isso, é necessário que existam um ou dois outros artigos exclusivamente para detalhar se entram ou não na comunhão certos bens sobre os quais poderão pairar discussões em relação à sua titularidade (se é bem comum ou se é próprio de um dos cônjuges).

Dispositivos com tal finalidade são encontradiços em todos os Códigos Civis estudados. Assim, neste projeto segue lançada (nos dois artigos seguintes) a mesma sugestão que consta do Projeto de reforma do Código Civil do Brasil, porque parece bem pensada.

12) Excluem-se da comunhão:

I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do matrimônio;

II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;

III - as obrigações anteriores ao casamento;

IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;

V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;

VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;

VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes;

VIII - os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento.(*)

A justificativa deste artigo é atrelada à do artigo antecedente.

(*) Este inciso, no Projeto do Código do Brasil constitui um artigo isolado.

13) Entram na comunhão:

I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges.

II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior.

III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges.

IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge.

V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.

A justificativa deste artigo, igualmente, se atrela à do artigo 11.

14) A administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges.

§ 1º As dívidas contraídas no exercício da administração obrigam aos bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e aos do outro na razão do proveito que houver auferido.

§ 2º Os bens da comunhão respondem pelas obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher para atender aos encargos da família, às despesas de administração e as decorrentes de imposição legal.

§ 3º A anuência de ambos os cônjuges é necessária para os atos, a título gratuito, que impliquem cessão do uso ou gozo dos bens comuns.

§ 4º Em caso de malversação dos bens, o juiz poderá atribuir a administração a apenas um dos cônjuges.

§ 5º Não havendo pacto em contrário, a administração e a disposição dos bens constitutivos do patrimônio particular competem ao cônjuge proprietário.

§ 6º As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges na administração de seus bens particulares em benefício destes, não obrigam os bens comuns.

Este artigo constitui uma fusão dos artigos 1675 a 1678 do Projeto de reforma do Código Civil do Brasil. Considerando-se que o regime em exame é o de comunhão parcial de bens e que não há um regime idêntico (mas apenas similar) nos demais países estudados, convém que seja bem detalhada a forma de distribuição das responsabilidades entre os cônjuges, sobre pontos nos quais há alguma margem para dúvidas.

CAPÍTULO: DO REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL

15) O regime da comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, exceto:

I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar.

II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva.

III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum.

IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade.

V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão.

VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge.

VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Parágrafo único. A incomunicabilidade dos bens acima enumerados não se estende aos frutos, quando se percebam ou vençam durante o casamento.

Qualquer que seja o regime (comunhão total, parcial ou separação), nunca é possível aplicá-lo, na sua acepção plena, quanto a todos e quaisquer espécies de bens ou obrigações, posto que alguns deles têm natureza bastante peculiar e não é correto incluí-los na comunhão (ou excluí-los, dependendo do caso e do tipo de regime de que se cuida). Ao legislador cabe, por casuismo, cada vez que forem sendo detectados esses casos, incluí-los na lei, para estabelecer sua condição de comunicável ou incomunicável, dependendo do caso.

Assim, neste artigo, elaborado a partir de uma fusão dos artigos 1679 a 1681 do Projeto brasileiro de Código Civil, procura-se desde logo inserir aqueles tipos de bens que o cotidiano das relações sociais no casamento já demonstrou que se tratam de bens que não devem ingressar na comunhão total.

16) À administração dos bens no regime da comunhão universal, aplicam-se as mesmas regras relativas ao regime da comunhão parcial de bens, constantes do artigo 14.

Justifica-se a adoção do mesmo regime de administração em qualquer dos regimes, haja vista que não há mais espaço no contexto das relações sociais modernas, para dispensar tratamento diferenciado entre os cônjuges, em que pese valiosas opiniões contrárias, sustentando que toda sociedade, inclusive a conjugal, "precisa de ter um chefe".

17) Extinta a comunhão, efetua-se a divisão do ativo e do passivo, com o que cessa a responsabilidade dos cônjuges para com o credor do outro.

É necessário que a lei delimite com precisão o momento em que cessam as responsabilidades de cada cônjuge quanto às responsabilidades assumidas pelo outro, dando, assim, a necessária segurança para o exercício das relações negociais.

CAPÍTULO: DO REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQÜESTOS

18) No regime de participação final nos aqüestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento. (*)

19) Constituem o patrimônio próprio do cônjuges os bens que cada um possuía ao casar e os por ele adquiridos, a qualquer título, na constância do casamento.

Parágrafo único. A administração dos bens previstos neste artigo é exclusiva de cada cônjuge, que os poderá livremente alienar, se forem móveis. (*)

20) Sobrevindo a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos aqüestos, no qual não serão incluídos os bens próprios, em cuja categoria se inserem os seguintes:

I - os bens anteriores ao casamento e os em que em seu lugar se sub-rogaram;

II - os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade;

III - as dívidas relativas aos bens próprios.

Parágrafo único. Salvo prova em contrário, presumem-se adquiridos durante o casamento os bens móveis. (*)

21) Na hipótese de dissolução da sociedade conjugal por morte, verificar-se-á a meação do cônjuge sobrevivente na forma do artigo anterior.

(*) A redação dos artigos dispensa comentários detalhados, razão pela qual adota-se uma fundamentação que vale para este Capítulo como um todo.

Este regime de bens praticamente equivale ao regime da comunhão de gananciales atualmente em vigor na Argentina, com a diferença de que não é o regime legal (supletório) do Brasil, sendo-o naquele País. O que ocorre é uma verdadeira e absoluta separação durante o casamento e uma comunhão no final do casamento, por ocasião da dissolução da sociedade conjugal, para efeito de divisão dos aqüestos (na Argentida seria para divisão das "ganancias").

Deve ser ressaltado que aqui não foram dados todos os detalhes que precisam de disciplinamento, no caso de optar o País por incluir este regime no seu Direito de Família. Precisará haver algumas disposiçoes expressas, tratando de assuntos como os detalhes sobre as dívidas dos cônjuges, como classificar bens adquiridos com o trabalho conjunto, como fica a propriedade dos bens móveis durante o casamento, se é possível ou não a renúncia ao direito de meação etc..

CAPÍTULO: DO REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS

22) Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real.

23) Ambos os cônjuges são obrigados a contribuir para as despesas do casal na proporção dos rendimentos de seu trabalho e de seus bens, salvo estipulação em contrário no pacto antenupcial.

Os artigos são auto-explicativos, sendo desnecessários quaisquer comentários quanto a este Capítulo.

          TÍTULO: DA UNIÃO ESTÁVEL

24) Há união estável quando o homem e a mulher, não impedidos de casar, viverem como se casados fossem por mais de cinco anos consecutivos. (*)

Parágrafo único. A união estável é reconhecida como entidade familiar em benefício dos filhos, para quaisquer fins; e em benefício dos companheiros, apenas para efeito do direito a alimentos.(*)

25) Na união estável, salvo convenção feita mediante instrumento público entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da separação absoluta. (*)

26) A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil, mas o casamento assim contraído só produzirá efeitos "ex-nunc". (*)

(*) Em que pese o reconhecimento atual, no Brasil e em outros países, da União Estável como uma entidade quase equiparada à família constituída pelo matrimônio, isso não parece salutar, pelo menos para efeito de alcançar os objetivos de preservar a Instituição do casamento e, ao mesmo tempo, dar segurança aos negócios no âmbito do Mercosul e do Chile.

Equiparar a união estável ao casamento equivale a desprestigiar esse instituto, que tem incomensurável importância histórica a ponto de lhe ter sido atribuída a designação de célula "mater" de todas as civilizações modernas; e tem o condão de desestimular, em muito, os casais a contraírem matrimônio.

A União Estável se dá sem quaisquer formalidade pública, diferentemente do casamento, que é um ato solene e só tem existência depois de um registro público. Essa peculiaridade do casamento traz imensa segurança aos negócios jurídicos, o que não se vislumbra na união de fato, em relação à qual nenhuma formalidade pública se exige e, ao revés do casamento, gera tremenda insegurança nas relações negociais.

27) As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato.

Este artigo, com idêntica redação, consta do Projeto de reforma do Código Civil do Brasil. Sua inserção neste projeto se justifica porque tem o condão de definir concubinato como relação ilegal, distinguindo-a da união estável, que é legal, porque se dá entre pessoas não impedidas de casar conforme tem assentado a doutrina pátria.

LIVRO: DO DIREITO DAS SUCESSÕES

TÍTULO: DA SUCESSÃO EM GERAL

CAPÍTULO: DISPOSIÇÕES GERAIS

28) Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros, inclusive testamentários.

Parágrafo único. Aceita, expressa ou tacitamente, a herança, torna-se definitiva a sua transmissão ao herdeiro, com efeito retroativo à data da abertura da sucessão. Tem-se, porém, como não ocorrida a transmissão da herança, quando o herdeiro a renunciar.

Insere-se, aqui, a possessão hereditária pelo sistema da saisine, que, por se tratar, sem dúvida alguma, do sistema mais adequado, sempre tem sido o sistema adotado em todos os países do Mercosul e no Chile, além de continuar, nos projetos de reforma existentes.

29) A união estável não gera direitos hereditários entre os companheiros.

Este artigo guarda coerência com o artigo 26 e comporta a mesma justificativa. Fica ressalvado, conforme já foi feito expressamente no parágrafo único do artigo 24, apenas o direito a alimentos.

É certo que o direito hereditário se baseia principalmente no grau de afeto existente entre o "de cujus" e o herdeiro, o que certamente existe entre companheiros. Porém, razões maiores apontam para a outra opção - de não equiparar a união estável ao casamento -, quais seja, a intenção de não desprestigiar o tão importante instituto do matrimônio e a de dar segurança às relações negociais (esta última, especialmente, porque o que se tem perseguido mais, pelo menos nesta fase, pelo Mercosul, é a segurança nas relações negociais, para que seja possível o aprofundamento da integração comercial).

CAPÍTULO: DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA

30) Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão.

A novidade deste item é a de incluir o nascituro entre os que podem herdar, como se já fossem filhos, o que constitui uma medida de bom senso, sem querer desprestigiar as valiosas opiniões em contrário.

Igual dispositivo consta do projeto de reforma do Código Civil do Brasil.

TÍTULO: DA SUCESSÃO LEGÍTIMA

CAPÍTULO: DA ORDEM DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA

31) A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens; ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge.

III - ao cônjuge sobrevivente.

IV - aos colaterais até o quarto grau.

§ 1º Não herda o cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, estavam separados judicialmente, independente de ter ou não culpa pela celebração; ou se estavam separados de fato há mais de dois anos, independente de ter ou não culpa pela separação, salvo prova, neste caso, de que a convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

§2º Em qualquer dos casos em que concorre com outros herdeiros, o cônjuge sobrevivente herda, sem prejuízo da sua porção conjugal que, na forma da lei, lhe caiba na herança.

§ 3º Em concorrência com os descendentes, caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quata parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com quem concorrer.

§ 4º Entre os descendentes, os de grau mais próximo excluem os mais remotos, salvo o direito de representação.

§ 5º Os descendentes da mesma classe têm os mesmos direitos à sucessão de seus ascendentes.

§ 6º Na linha descendente, os filhos sucedem por cabeça, e os outros descendentes, por cabeça ou por estirpe, conforme se achem ou não no mesmo grau.

§ 7º Na falta de descendentes, são chamados à sucessão os ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente.

§ 8º Na classe dos ascendentes, o grau mais próximo exclui o mais remoto, sem distinção de linhas.

§ 9º Havendo igualdade de grau e diversidade de linha, os ascendentes da linha paterna herdam a metade, cabendo a outra aos da linha materna.

§ 10 Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau.

§ 11 Em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobreviente.

§ 12 Se não houver cônjuge sobrevivente, nas condições estabelecidas no § 1º, deste artigo, serão chamados a suceder os colaterais até o quarto grau.

§ 13 Na classe dos colaterais, os mais próximos excluem os mais remotos, salvo o direito de representação concedido aos filhos de irmãos.

§ 14 Concorrendo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais, cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar.

§ 15 Não concorrendo à herança irmão bilateral, herdarão, em partes iguais, os unilaterais.

§ 16 Na falta de irmãos, herdarão os filhos destes e, não os havendo, os tios.

§ 17 Se concorrem à herança somente filhos de irmãos falecidos, herdarão por cabeça.

§ 18 Se concorrem filhos de irmãos bilaterais com filhos de irmãos unilaterais, cada um destes herdará a metade do que herdar cada um daqueles.

§ 19 Se todos forem filhos de irmãos bilaterais, ou todos de irmãos unilaterais, herdarão por igual.

Este artigo harmoniza o que já disciplinavam, com poucas variações, os Códigos da Argentina, do Uruguai, do Paraguai e do Chile. No Brasil, o cônjuge não herda, havendo descendentes ou ascendentes, pois os primeiros excluem totalmente os segundos, que por sua vez excluem totalmente o cônjuge sobrevivente da herança. Este só exclui os colaterais, que, no Brasil, até o quarto grau, herdam.

Porém, no projeto de reforma, o que já se encontra estipulado para o Brasil é exatamente o que se inseriu acima, com pequenas variações e com forma de organização peculiar.

32) Não sobrevivendo cônjuge, ou companheiro, nem parente algum sucessível, ou tendo eles renunciado a herança, esta se devolve ao Ente Público (*) em cujas circunscrições estiver situada.

(*) No Brasil, em tal hipótese, se devolveria a herança ao Município ou ao Distrito Federal, se localizada nas respectivas circunscrições, ou à União, quando situada em território Federal. Nos demais países, deve-se adaptar o artigo para compreender as Unidades Autônomas correspondentes (Cidade, Província, Departamento, País etc.). Fala-se em "devolução" da herança, porque o termo parece mais apropriado, já que, em verdade, o Poder Público não é um herdeiro.

CAPÍTULO: DOS HERDEIROS NECESSÁRIOS

33) São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.

34) Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, que constituem a legítima.

Os dois artigos deste Título, como o anterior, também harmonizam perfeitamente as legislações dos países do Mercosul e do Chile.

TÍTULO: DAS CONSIGNAÇÕES FORÇOSAS

CAPÍTULO: DA PORÇÃO CONJUGAL

35) A porção conjugal é aquela parte do patrimônio do cônjuge premorto, que a lei designa ao cônjuge sobrevivente que necessita do necessário para sua normal sustentação.

§ 1º Não terá direito à porção conjugal o cônjuge separado, mesmo de fato há mais de dois anos, ou separado de direito, independentemente de não ser culpado pela separação.

§2º O direito à porção conjugal se entenderá existente no momento do falecimento do outro cônjuge e não caducará, no todo ou em parte pela posterior aquisição de bens pelo cônjuge sobrevivente.

§3º O cônjuge sobrevivente que, ao tempo do falecimento do outro cônjuge, não teve direito à porção conjugal, não a adquirirá depois pelo fato de cair em pobreza.

No Brasil, ao invés de assegurar uma "porção conjugal" para o cônjuge que dela necessita para sobreviver dignamente, o Código vigente, no art. 1611 (e o Projeto do novo Código, que o repete, no art. 1843) assegura é o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.

Garantir a porção conjugal, como fazem os demais países do Mercosul e o Chile, parece mais racional. Com efeito, melhor do que assegurar mero usufruto de um imóvel só, é garantir uma porção suficiente à manutenção regular do cônjuge. Essa porção compreende o mínimo necessário não só para a "habitação", mas também para todas as outras necessidades regulares, o que, obviamente, não proporcionaria um mero direito de usufruto a um só imóvel.

Sobre o autor
Marco Aurélio Lustosa Caminha

Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região. Ex-Procurador Regional do Trabalho. Professor Associado de Direito na Universidade Federal do Piauí. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino (Buenos Aires, Argentina). Doutor em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Maranhão.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMINHA, Marco Aurélio Lustosa. O regime patrimonial entre os cônjuges nos países do Mercosul e no Chile e a harmonização legislativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 43, 1 jul. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1626. Acesso em: 23 dez. 2024.

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