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Um olhar sobre o novo Código de Processo Civil (PLS nº 166/2010) na perspectiva das prerrogativas da magistratura nacional (especialmente na Justiça do Trabalho)

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Agenda 08/09/2010 às 08:24

Há aspectos do PLS nº 166/2010 que reclamam reparos, seja pela inconstitucionalidade da norma proposta, seja pela sua inconveniência político-legislativa.

Resumo: O presente artigo examina os termos do novo Código de Processo Civil, tal como encaminhado ao Congresso Nacional brasileiro (PLS n. 166/2010), na especial perspectiva das prerrogativas da Magistratura nacional. Conquanto reconheça a excelência global do projeto, notadamente no propósito de reformular o binômio processo/procedimento para engendrar uma técnica processual de feitio mais instrumental e dinâmico, aponta aspectos que reclamam reparos, seja pela inconstitucionalidade da norma proposta, seja pela sua inconveniência político-legislativa.

Sumário: I. O anteprojeto do novo Código de Processo Civil, à guisa de introdução. Aspectos positivos. II. Introdução crítica às razões de resistência. A questão da independência judicial. III. O anteprojeto de Código de Processo Civil: pontos críticos. IV. Conclusões. V. Bibliografia

Palavras-chave: 1. Novo Código de Processo Civil. 2. PLS n. 166/2010. 3. Magistratura: prerrogativas. 4. Estatuto da Magistratura.


I. O ANTEPROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, À GUISA DE INTRODUÇÃO. ASPECTOS POSITIVOS

O anteprojeto do novo Código de Processo Civil, elaborado pela Comissão de Juristas instituída pelo Ato n. 379/2009 da Presidência do Senado Federal e convolado no Projeto de Lei do Senado n. 166/2010 (do Senador JOSÉ SARNEY) [01], nasce com o propósito primeiro de atender ao princípio do artigo 5º, LXXVIII, da CRFB. Nas palavras do Min. LUIZ FUX, presidente daquela comissão, "o cerne do novo CPC é o ideário da duração razoável dos processos". Para esse efeito, entre outras medidas, elimina-se a figura da ação cautelar como entidade autônoma (excluindo-se o atual Livro III e regulamentando-se difusamente a "tutela de urgência e tutela da evidência"), restringe-se ainda mais a utilização do agravo de instrumento e cria-se o "incidente de resolução de demandas repetitivas" (artigos 895 a 906). Por outro lado, perde-se grande oportunidade de adequar a norma-base do processo civil brasileiro ao novo paradigma digital, estabelecendo o diálogo com a Lei n. 11.419/2006. A omissão, ao que parece, foi intencional, tendo em conta que a inclusão digital ainda não alcançou todo o Poder Judiciário, nem tampouco todos os quadros da advocacia.

De outra parte, o novo texto já nasce sob o pálio da crítica. Diz-se dele, por exemplo, ser de duvidosa necessidade, na medida em que simplesmente revisita, em variegadas matérias, o que hoje já dispõe o Código de Processo Civil de 1973 (cerca de 80% dos dispositivos do novo código — num total de 970 — reproduzem ipsis litteris os artigos do Código BUZAID). Sugere-se, por isso, que melhor seria prosseguir com a estratégia das minirreformas, hábil a produzir iguais efeitos de renovação, sem todavia impactar o meio forense com a revogação integral de um texto legislativo já consagrado e curtido nas caldeiras do tempo, pela obra da doutrina e da jurisprudência.

Mais pontualmente, certo segmento da doutrina tem apontado retrocessos em aspectos que dizem com a instrumentalidade do procedimento e com os poderes instrutórios do magistrado, pela perda de referenciais seguros e pela possível contradição com princípios constitucionais como os do contraditório e da ampla defesa. Recentemente, tal crítica exsurgiu bem condensada na pena de COSTA MACHADO [02]:

E agora, para finalizar este pequeno e despretensioso artigo, elencamos as propostas que, a nosso ver, desqualificam o anteprojeto do CPC: 1) o poder atribuído ao juiz para "adequar as fases e os atos processuais às especificações do conflito" (art. 107, V); "quando o procedimento ou os atos a serem realizados se revelarem inadequados às peculiaridades da causa, deverá o juiz, ouvidas as partes e observados o contraditório e ampla defesa, promover o necessário ajuste" ( art.151, § 1º); 2) a eliminação do efeito suspensivo da apelação ("os recursos, salvo disposição legal em sentido diverso, não impedem a eficácia da decisão"- art.908, caput); 3) o poder concedido ao relator para atribuir o efeito suspensivo à apelação (art.908, §§ 1º e 2º); 4) a eliminação dos embargos infringentes; 5) fixação de nova verba advocatícia pela instância recursal quando o tribunal não admitir recursos ou negar provimento por unanimidade (arts.73, § 6º e 922); 6)a previsão de que "os órgãos fracionários seguirão a orientação do plenário, do órgão especial ou dos órgãos fracionários superiores aos quais estiverem vinculados" (art.847, II); 7) a concessão generalizada de liminares sem exigência de periculum in mora quando "a inicial for instruída com prova documental irrefutável do direito alegado pelo autor a que o réu não oponha prova inequívoca" (art.285, III); 8) disciplina da multa cominatória sem estabelecimento de limite de tempo e de valor (art.503 e parágrafos); 9) eliminação do direito da parte a um certo número de testemunhas; 10) o levantamento de dinheiro depositado a título de segurança do juízo pelo credor (art. 829).

De se ver, pelo excerto, que muitas dessas críticas pontuais — que não têm foros de universalidade — dizem com aquilo que tende a representar justamente o maior sopro de novidade desse novo regramento: a subordinação do procedimento à necessidade do direito material [03](artigo 107, V — a que equivale, p.ex., o «princípio da adequação formal» artigo 265º-A do Código de Processo Civil português [04]), caminhando para um conceito de justa jurisdição, i.e., de jurisdição como estrita função de tutela de direitos materiais [05]. Para esse fim, incrementam-se os poderes diretivos e instrutórios do juiz (v., e.g., os artigos 151, §1º, e 285, III, do anteprojeto), aproximando-se do chamado «modelo de Sttutgart» — e, por essa via, consubstanciando um importante passo qualitativo no sistema processual brasileiro, a romper com certa visão formalista, mecanicista e positivista do processo que ainda impregnava o próprio Código BUZAID.

Nesse plano, portanto, a Magistratura nacional ganha com a edição do novo Código de Processo Civil. Ganha em termos de instrumentalidade processual, em termos de ductibilidade procedimental e em termos de eticidade do discurso. E também ganha, por consequência, em matéria de prerrogativas, notadamente em relação àquelas que só se exercem no processo: a prerrogativa de dirigir o processo (artigos 125, 445 e 446 do atual CPC) e a prerrogativa de instruir e decidir a causa conforme o seu livre convencimento motivado (artigos 130 e 131 do atual CPC), o que é especialmente relevante em sede processual trabalhista, mercê dos amplos poderes de instrução historicamente acometidos aos juízes do Trabalho (artigo 765 da CLT). Significa, em última análise, prestigiar a ação e a decisão em primeiro grau de jurisdição. São, pois, pontos do anteprojeto que devem ser preservados.

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Por outro turno, o anteprojeto tenciona inovar, em alguns contextos, em posição de invadir indisfarçavelmente matérias privativas de lei complementar (artigo 93, caput, da CRFB) e/ou em desacordo com o desiderato constitucional maior de incolumidade da independência judicial. Nisso, inova mal. Vejamos a seguir.


II. INTRODUÇÃO CRÍTICA ÀS RAZÕES DE RESISTÊNCIA. A QUESTÃO DA INDEPENDÊNCIA JUDICIAL

Como é sabido, magistrados devem gozar de plena liberdade de convicção, para instruir e julgar,e de autonomia pessoal no exercício do mister jurisdicional. Sua liberdade de convicção não pode ser arrostada sequer pela instância superior (tanto que lhe é dado ressalvar o próprio entendimento, no 1º grau ou nos órgãos colegiados, ainda quando se curve ao entendimento dissidente). E, por conseguinte, não pode ser punido administrativamente pelas teses jurídicas que perfilhar ou externar, ainda que incomuns ou minoritárias. Não fosse assim, teríamos «não-juízes»: servidores autômatos que, em 1º grau de jurisdição, limitar-se-iam necessariamente a repetir as teses do 2º grau e a reproduzir as emendas das súmulas dos tribunais superiores. Essa certamente não seria uma Magistratura democrática. O que significa dizer, "a contrario sensu", que a liberdade de convicção e a autonomia pessoal dos magistrados, ambas radicadas na base axiológica das normas-regras constitucionalizadas no artigo 95, I a III, da Constituição, perfazem verdadeira condição para um Estado Democrático de Direito.

É exatamente por conta dessa percepção que tanto se debate, no âmbito das associações de juízes, a impropriedade da expressão "hierarquia judiciária" — ainda muito comum nos regimentos internos dos tribunais — e da própria normativa a ela relacionada. Não convém confundir competências funcionais, como são aquelas exercidas pelos tribunais para a revisão das decisões de primeiro grau, com anteposição hierárquica, conceito admissível e até mesmo natural em algumas instituições (como, p.ex., nas Forças Armadas, a ponto de se excepcionar a regra da limitação das prisões aos casos de flagrante delito e mandado judicial — veja-se, e.g., o artigo 5º, LXI, in fine, da CRFB), mas absolutamente impróprio para definir a natureza das relações entre juízes de 1º e 2º grau de jurisdição (ou entre esses e os juízes dos tribunais superiores). Não se discute, nos limites do sistema processual, o poder de revisão dos tribunais, imanente ao próprio "procedural due process of law" (artigo 5º, LIV, da CRFB); nem tampouco o dever intraprocessual de respeito às decisões judiciais de grau superior, no plano jurídico-decisório (o que não significa, entenda-se bem, capitulação no plano jurídico-argumentativo); mas tudo isso nos limites subjetivo-objetivos do processo (ou toda súmula de jurisprudência seria necessariamente vinculativa). Nada mais que isso. O magistrado de 1º grau pode discordar das subsunções jurídicas e das razões de fato e de direito do "decisum" de 2º grau ou até mesmo das instâncias superiores; pode, por isso mesmo, ressalvar seus entendimentos; e, nos casos excepcionais, pode inclusive se escusar de julgar, por entender malferida a sua independência funcional, em razão do tipo de decisão a que terminou «confinado» em razão de decisões superiores (valendo-se, para tanto, do artigo 135, par. único, do CPC) [06]. Apenas não pode rever intraprocessualmente o que foi decidido nas instâncias superiores, ainda que violentem o seu convencimento. Quanto ao mais, porém, não há hierarquias. Leia-se, por todos, em NERY DE OLIVEIRA:

A tal modo, se resulta lógico que a administração centralizada nos Tribunais pressupõe uma obediência aos comandos de gestão e administração por tais Cortes enunciadas, logicamente tais atos administrativos não ensejam qualquer perda dos atributos de independência do juiz, notadamente na sua atividade-fim, mas também indiretamente qualquer ingerência que possa pretender vir a perturbar aquela, ainda que emanada de órgãos internos do Judiciário.  Para que assim fosse, o artigo 95 haveria de comportar exceções, e tais não existem para permitir que juízes de Cortes superiores sejam maiores que outros. 

Na verdade, todos os juízes são iguais, mesmo aquele magistrado da comarca mais humilde e longínqua do País em relação ao ministro do Supremo Tribunal Federal — o que os distingue, basicamente, são as competências jurisdicionais distintas, que confere a uns e outros, em dados momentos, maior status social (e não pouco é lembrar que muitas vezes o juiz da comarca do interior, quase esquecida por todos, é muito mais prestigiado na sua localidade que qualquer ministro do STF, pois são as suas decisões que influem diretamente no cotidiano daquela comunidade). 

Ainda que possa parecer absurdo, a inexistência de qualquer hierarquia entre os Juízes vem capitulada no artigo 6º da Lei 8.906/94, exatamente o Estatuto da Advocacia, quando assevera que «não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos», havendo que se ponderar que tal dispositivo não se dirige apenas à inexistência de subordinação e hierarquia dos advogados em relação a juízes e membros do Ministério Público, mas também entre estes, sob pena também da regra primeira acabar desvirtuada" [07].

Ainda, no escólio de GOMES DA CRUZ [08]:

Temos feito várias referências à independência do magistrado, salientando que as garantias constitucionais se voltam para preservar tão fundamental atributo da magistratura.Logo, todo juiz deve agir com independência, até em relação à instância superior, sabido que esta só possui, em relação ao órgão de grau inferior, competência de derrogação. Claro, não se exclui o poder disciplinar, mas não interferindo diretamente na atuação do juizem matéria processual.

Mais além, em plagas europeias — e há décadas —, o insuperável GOMES CANOTILHO [09] identificou, no princípio constitucional da independência dos órgãos judiciais (consagrado na Constituição portuguesa de 1976 e inerente a todos os Estados Democráticos de Direito), três corolários: o da independência pessoal (donde a impraticabilidade das nomeações interinas e das transferências, suspensões, aposentações e demissões à margem da lei ou em razão das decisões emanadas), o da independência coletiva (autonomia da judicatura ― inclusive orçamentária — em relação aos demais poderes da República) e o da independência funcional. Quanto a essa última, assere que

A independência funcional é uma das dimensões tradicionalmente apontadas como constituindo o núcleo duro do princípio da independência. Significa ela que o juiz está apenas submetido à lei ― ou melhor, às fontes de direito jurídico-constitucionalmente reconhecidas ― no exercício da sua função jurisdicional".

Consequentemente, o juiz de 1º grau não está obrigado a acatar teses ou entendimentos de instância superiores, se pessoalmente não os crê conformes às fontes de direito jurídico-constitucionalmente reconhecidas (a não ser, no caso brasileiro, em hipóteses cobertas por súmulas vinculantes exaradas pelo Supremo Tribunal Federal, mercê da norma ínsita ao artigo 103-A da CRFB). Está, sim, obrigado a acatar o resultado dos arestos que lhe reformam as decisões, nos limites de seus comandos dispositivos concretos. Não mais do que isso. Não se obriga, p.ex., a reproduzir, em nova sentença,os conceitos, as teses e as convicções perfilhadas pelo relator na fundamentação do voto. Nem a seguir a súmula de jurisprudência dos tribunais aos quais se vincula, se o entendimento ali vazado violenta-lhe a convicção. E, por isso mesmo, andou mal o Conselho Nacional de Justiça ao erigir a "obediência a súmulas" como um requisito objetivo de aferição do «merecimento» do magistrado ao tempo da sua promoção (cfr. artigo 93, II e III, da CRFB c.c. artigo 5º, «d» e «e», da Resolução CNJ n. 106/2010 [10]).

Nesse sentido, aliás, tem se pronunciado iterativamente o próprio Conselho Nacional de Justiça, excluindo a possibilidade de se recorrer à instância administrativa disciplinar e/ou revisional para «corrigir» ou «punir» os assim chamados "errores in judicando" (i.e., erros de julgamento — que nada mais são que convicções jurídicas derrubadas em superior instância). Veja-se:

Recurso Administrativo em Revisão Disciplinar. Insurgência contra decisão monocrática que indeferiu pedido de apuração da responsabilidade dos magistrados que atuam em processos judiciais de interesse da requerente e contra o indeferimento de afastamento destes e do desembargador que é parte nos processos na defesa da guarda de seu neto. Recurso não provido

. A Revisão Disciplinar não se presta à indagação de quaestionis juris, nem ao ataque do error in judicando do magistrado. A pretensão de incursão em atos judiciais proferidos em juízo constitui matéria que se posta fora do âmbito de competência do CNJ. Essa atuação no plano judicial só se revê através dos meios postos na legislação processual, pela via do recurso judicial cabível, sendo inadequada e incabível a Revisão Disciplinar para essa finalidade" (CNJ, REVDIS n. 200810000005120 e REP n. 200810000005118, Rel. Cons. RUI STOCO, 65ª Sessão, j. 24.06.2008, in DJU 05.08.2008 — g.n.).

Recurso Administrativo em Reclamação Disciplinar. Arquivamento. Atos judiciais passíveis de recurso. Inexistência de infração funcional. 1) O CNJ não é instância de revisão de decisões proferidas pelos órgãos do Poder Judiciário no exercício da típica atividade jurisdicional. 2) Os fatos trazidos aos autos pelo reclamante não apresentam cometimento de infração funcional. Recurso a que se nega provimento" (CNJ – RD 391 – Rel. Cons. JOSÉ ADONIS CALLOU DE ARAÚJO SÁ, 69ª Sessão, j. 09.09.2008, in DJU 26.09.2008 — g.n.).

Magistrado. Descumprimento de dever funcional. Art. 35, I, da LOMAN. Inexistência. Regular exercício da atividade jurisdicional. Princípio do livre convencimento motivado. Error in judicando. O Juiz tem o dever legal de observar as suas obrigações, no que se inclui ‘cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício’ (LOMAN, art. 35, I). É-lhe assegurado, todavia, o exercício da função com liberdade de convencimento (CPC, art. 131) e independência, de modo a garantir, em última análise, a autonomia e independência do próprio Poder Judiciário (CF, art. 95). Constatado, no caso concreto, que, conquanto se possa considerar equivocada a decisão que condenou terceiro não integrante da relação processual, o ato em questão foi praticado no regular exercício da função e de acordo com a convicção do magistrado sobre a matéria. Não há falar, portanto, em descumprimento de dever funcional e de responsabilização do magistrado. Revisão Disciplinar de que se conhece e que se julga improcedente" (CNJ, RD n. 200830000000760, rel. Cons. ALTINO PEDROZO DOS SANTOS, 80ª Sessão, j. 17.03.2009, in DJU 06.04.2009 — g.n.)

E — antecipo-me — se é assim no plano administrativo disciplinar, não há como ser diferente no plano jurídico-civil ou jurídico-penal, nem se justifica eticamente que se haja de modo diverso no plano administrativo promocional (i.e., na consideração do "merecimento" do agente público para efeito de promoção ou de percepção de vantagens quaisquer).

Aliás, a própria Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar n. 35/79) prevê, em seu artigo 41, que o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir, salvo no caso de impropriedade ou excesso de linguagem. In verbis:

Artigo 41

. Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem, o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir.

E, na mesma alheta, a LOMAN dispõe, no seu artigo 40, que a atividade censória dos tribunais não pode cercear a independência ou malferir a dignidade do magistrado. In verbis:

Artigo 40.

A atividade censória de Tribunais e Conselhos é exercida com o resguardo devido à dignidade e à independência do magistrado.

Se tudo isso é verdadeiro no plano judicial e administrativo, entre magistrados dos diversos níveis da carreira da Magistratura e dos tribunais superiores, não pode ser menos verdadeiro em relação a terceiros. Se o magistrado instrui e julga de acordo com a sua convicção, reportando-se à Constituição da República e às leis do país (da maneira como as lê, inclusive em perspectiva sistemática e/ou teleológica), e se assim fundamenta a sua decisão (porque é exatamente aqui — na fundamentação judicial, não na positividade das leis infra constitucionais — onde tem assento, nos Estados Democráticos de Direito, a maior garantia do jurisdicionado contra as possíveis arbitrariedades do próprio Poder Judiciário), não pode ser responsabilizado, seja no campo administrativo, seja no campo cível, seja ainda — e com maior razão — no campo criminal. Pregar o contrário é pregar uma jurisdição covarde, porque a decisão judicial preocupar-se-á primeiramente com a indenidade do próprio prolator e somente depois com a justiça do caso concreto. É pregar, ainda, uma jurisdição tacanha, repetidora de verbetes que não raro se empedram no tempo. É pregar, por fim, uma jurisdição eficientista (mas não eficaz), que se ocupa de decidir mais e mais rapidamente, produzindo números, resultados e relatórios; mas que, ao cabo e ao fim, já não produz justiça social.

Mas é precisamente neste ponto que peca o anteprojeto do novo Código de Processo Civil. Eis o que diremos na sequência.

Sobre o autor
Guilherme Guimarães Feliciano

Professor Associado II do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Juiz Titular da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté/SP. Doutor pela Universidade de São Paulo e pela Universidade de Lisboa. Vice-Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – ANAMATRA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FELICIANO, Guilherme Guimarães. Um olhar sobre o novo Código de Processo Civil (PLS nº 166/2010) na perspectiva das prerrogativas da magistratura nacional (especialmente na Justiça do Trabalho). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2625, 8 set. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17356. Acesso em: 23 dez. 2024.

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