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Incidência tributária nas operações realizadas pela Internet

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Agenda 01/10/2000 às 00:00

Sumário: 1. Introdução; 2. Os Tributos Na Internet; 3. Conclusão; 4. Notas; 5. Bibliografia


1. INTRODUÇÃO

Com o crescimento do "comércio eletrônico" através dos mais diversos meios, entre os quais a rede mundial de comunicação – Internet - se destaca, surgem novas atividades econômicas que, de logo, tornam-se alvo da ferocidade do Estado, naquilo que melhor sabe impor aos seus súditos, que é o poder de tributar, porque este se encontra distante da chamada redemocratização do pais.

A aquisição de bens e de serviços pela Internet provoca diversas dúvidas quanto à ocorrência de fatos geradores, para fins de incidência de impostos, devido aos novos conceitos doutrinários de mercadorias e de bens corpóreos e incorpóreos, conflitantes com o apregoada pela doutrina clássica, visível no artigo 191 do Código Comercial.

Embora a legislação tenha utilizado o critério econômico para classificar os tributos, tal classificação não afasta um possível conflito tributário entre os Estados e Municípios, porque a legislação não tributou os fatos geradores levando-se em consideração o tipo de atividade da empresa.

Na esfera federal a questão não é de somenos importância, porque as grandes redes nacionais de vendas pela Internet mantêm os seus sites em provedores localizados fora do país, além das compras efetuadas diretamente no exterior.

Este estudo não tem a pretensão de analisar os mais variados aspectos possíveis, em razão de sua brevidade, limitando-nos a examinar a forma pela qual deva ser visto os pedidos de aquisição de mercadorias e de serviços praticados pela Internet, sob a ótica da legislação em vigor.


2. OS TRIBUTOS NA INTERNET

2.1 Sistema Tributário Constitucional

Fruto de uma evolução histórica, o sistema constitucional tributário foi objeto de teorização ou racionalização com a EC n.º 18/65, que com outras alterações foi inserida na Constituição de 1967.

A consolidação dos impostos da mesma natureza definidas por via de referência às bases jurídicas que pudessem revestir, e a concepção do sistema tributário como integrado no plano econômico e jurídico nacional, em substituição ao critério atual e histórico, de origem essencialmente política, da coexistência de três sistemas tributários autônomos, federal, estadual e municipal.(1)

Modernamente, sistema significa o conjunto organizado de partes relacionadas entre si e interdependentes(2)

No Capítulo I do Título VI da atual Carta Política, encontramos o dístico DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL, que podemos definir como sendo o conjunto dos tributos que compõem o ordenamento jurídico, como também as normas tributárias de um determinado país.

O Direito Tributário possui princípios próprios, que são o conjunto das proposições diretoras, características, às quais todo o desenvolvimento seguinte deve estar subordinado. (3)

Além dos princípios, o Direito Tributário também tem os seus institutos jurídicos próprios que podemos definir como sendo a disciplina integral da mesma relação de fato, pelas normas objetivas do Direito, tais como: estatuto do contribuinte, relação jurídica tributária, personalidade tributária (fisco, contribuinte, responsável), lançamento, consulta fiscal, solidariedade, declaração fiscal, execução fiscal e outros.

Esses institutos encontram significação própria no Direito Tributário, que, por vez, difere de seus conceitos estabelecidos em outros ramos do Direito, de modo que em matéria tributária há que se considerar pelo seu significado específico. Todavia, isto não impede ao Direito Tributário valer-se de institutos de outros ramos do Direito.

Define ele as atribuições de competência legislativa em matéria tributária, que é plena, ressalvada pelas limitações impostas pela própria Constituição, em favor da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

2.2Limitações ao poder de tributar

A competência tributária de cada entidade estatal é plena, todavia, como visto, sofre restrições que podem ser chamadas de limitações da competência tributária ou limitações do poder de tributar. Tais limitações são impostas, ora em favor do cidadão, ou da comunidade, ou ainda no interesse de regular o relacionamento entre as pessoas jurídicas titulares de competência tributária.

Podemos definir como limitação do poder de tributar o conjunto de regras estabelecidas pela Constituição Federal, em seus artigos 150 a 152, nas quais residem princípios fundamentais do Direito Constitucional Tributário (4), como os princípios da legalidade, isonomia, irretroatividade, anterioridade, proibição de confisco, liberdade de tráfego, imunidades, e outras limitações visíveis nos artigos 151 e 152.

Para que um ente estatal possa instituir e cobrar os tributos de sua competência é preciso que o faça por intermédio de lei, com vigência no exercício anterior à data de sua cobrança, ressalvadas as exceções constitucionais. Que trate com igualdade todos os contribuintes perante o fisco; não utilize o tributo com fins de confisco de bens nem prejudique a liberdade de tráfego de pessoas e bens, do mesmo modo que a lei instituidora não poderá atingir fato gerador anterior à sua vigência.

A Carta Constitucional retira do campo da tributação, de forma direita ou condicionada, algumas situações de fato, tornando-as imunes da tributação, como a venda de livros, revistas e periódicos e o papel para a sua impressão; e os serviços de educação e assistência social sem fins lucrativos, que cumpram as exigências estipuladas pela lei.

2.3 Espécies de tributos

Os tributos são especificados pela Constituição Federal como impostos, taxas e contribuição de melhoria, bem assim os impostos especiais que visam a proteção da seguridade social, de natureza jurídica extremamente controvertida.

Define-se tributo como toda prestação pecuniária em moeda ou que nela se transforme, compulsória, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei, cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Imposto, nos conforme do artigo 16 do CTN é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. É uma exação não vinculada, isto é, independente de atividade estatal específica.

Taxa, definida pelo artigo 77 do CTN: é o tributo que tem por fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte, cuja competência se atribui a todos os entes tributantes.

A contribuição de melhoria: é o tributo que tem por fato gerador a valorização de imóveis decorrente de obra pública, pouco utilizada devido à sua difícil aplicabilidade prática.

As contribuições especiais são aquelas que a União Federal institui com fundamento nos artigos 149 e 195 da CF. São as sociais e as contribuições de seguridade social, ao passo que os empréstimos compulsórios, tecnicamente, não são tributos, porém, a Constituição Federal os tratou como tal, só podem ser instituídos por lei complementar e a aplicação dos recursos deles provenientes é vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.

As contribuições para a seguridade social dos servidores públicos, também podem ser instituídas pelos Estados, Distrito Federal e Municípios.

2.4 Forma de classificação dos tributos

Na vigência da Emenda Constitucional n.º 18/65, os impostos eram agrupados por categorias econômicas, sendo quatro a saber: a) impostos sobre o comércio exterior; b) impostos sobre o patrimônio e a renda; c) impostos sobre a produção e a circulação e d) impostos especiais.

O Código Tributário Nacional reproduziu a classificação dos impostos sob o critério da Economia, da forma seguinte:

1. Impostos Sobre O Comércio Exterior: Imposto sobre a Importação e Imposto sobre a Exportação;

2. Imposto Sobre O Patrimônio e a Renda: Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis e de Direitos a eles relativos, Imposto sobre a Renda e Proventos de qualquer Natureza;

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3. Imposto sobre a Produção e a Circulação, Imposto sobre Produtos Industrializados, Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços.

O Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços, em função da nova Carta Constitucional, englobam o imposto sobre a circulação de mercadorias e de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicações – ICMS -, de competência dos Estados; o imposto sobre serviços – ISS - não inclusos na esfera estadual e disciplinados por lei complementar, de competência dos Municípios.

Os impostos relativos à operações de crédito, câmbio e seguros, ou relativos a títulos e valores mobiliários, de competência federal, que já eram classificados pelo CTN como sendo impostos sobre a circulação de bens e de serviços, encontram-se disciplinados por leis esparsas.

O ICMS e o ISS são considerados hoje como impostos incidentes sobre a circulação, em virtude de que na produção não temos a mudança de titularidade do bem, isto é, na produção não há circulação do bem, seja ele material ou imaterial, de uma para outra pessoa(5).

Para sustentar esta posição, no que pertine ao imposto sobre serviço, Sérgio Pinto Martins, citado por Walter Gaspar, enumera várias razões, entre as quais destacamos que desde a Emenda Constitucional n. 18, de 1965, o ISSQN foi classificado no capítulo dos impostos sobre a produção e a circulação, e a sua base de cálculo é o preço do serviço, conforme define o art. 9o do Decreto-lei n. 406, de 1968, cujo elemento inexiste na fase de produção, porque para a Economia nesta fase o que se obtém são valores, só se reportando a preço na fase de circulação(6).

Diz, ainda, o autor mencionado, que o prestador de serviço do ISSQN é o contribuinte do imposto, prestação tal que indica o fornecimento de trabalho ou de direitos a terceiros, mediante paga, que somente se verifica na fase de troca ou permuta, na transferência ou uso do bem, portanto, no instante da circulação, particularmente após o surgimento do conceito de atividade de caráter misto, com a EC n. 18/65, onde algumas atividades passaram a ser tributadas tanto pelo ICM quanto pelo ISSQN.

Por último, afirma que o ICM gravava somente bens materiais, e o ICMS da Carta Constitucional de 1988, passou a gravar tanto os bens materiais (mercadorias), quanto os imateriais (serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicações), deixando para o Município a tributação da circulação de serviços de qualquer natureza previstos em Lei Complementar (O ISSQN grava a circulação de bens imateriais).

Neste pensar, podemos concluir que o ISS é um tributo que incide sobre um bem econômico imaterial (serviços) e que se encontra na etapa da circulação, onde se verificam as transferências econômicas de bens, enquanto que o ICMS incide sobre a circulação de mercadorias, bens materiais, corpóreos, e sobre serviços, bens imateriais, incorpóreos.

O imposto sobre produtos industrializados incide sobre a produção de matérias primas ou de mercadorias, e não sobre a circulação destas.

O imposto sobre a exportação incide sobre as aquisições de mercadorias realizadas no exterior, ressalvadas as hipóteses de isenção.

2.5 Bens corpóreos, Bens incorpóreos e bens não corpóreos

Os bens e as prestações são o objeto dos direitos. Todavia, a noção jurídica de bem é mais ampla do que a econômica.

O conceito jurídico compreende toda utilidade física ou ideal, que possa incidir na faculdade de agir do sujeito. Abrange as coisas propriamente ditas, suscetíveis de apreciação pecuniária, e as que não comportam essa avaliação, as que são materiais ou não. Todo bem econômico é jurídico, mas nem todo bem jurídico é econômico. (7)

Deste modo, somente os bens suscetíveis de avaliação econômica são coisas em sentido jurídico. É mister que tenha valor de uso ou de troca e que possam ser apropriados, ou seja, submetidos ao poder de uma pessoa com exclusividade.

Corpóreas são as coisas não perceptíveis somente pelo tato, que pode ser vista, tocada ou apreendida (res quae tangi possunt), a que possui forma externa. Incorpóreos os bens que não têm existência material, pode ser objeto de direito. (8) Na definição de Messineo, as coisas não perceptíveis, tais como os produtos da atividade intelectual e criativa do homem titulados pelas regras sobre direitos autorais e direitos de patente, com eles não se devendo confundir as coisas nas quais as criações se materializam. (9)

As ações humanas que geram os chamados direitos pessoais, ou relativos, denominada de prestação, também são objetos do direito, para o que devem possuir conteúdo econômico e sejam: lícitas, possíveis e determináveis.

Os negócios jurídicos praticados pela internet, e por outros meios eletrônicos, tanto na intermediação de mercadorias como na de serviços, que se tornou conhecido pela expressão "comércio eletrônico", que, por promoverem agregamento de valor, possuem conteúdo econômico no processo de circulação de bens e de serviços, como base da chamada "capacidade contributiva", passam a interessar diretamente a tributação mediante impostos.(10)

Essas operações levam a uma nova reflexão sobre os tradicionais conceitos de bens corpóreos, incorpóreos e não-corpóreos. Os dois primeiros são aqueles criados pelo direito, enquanto que não-corpóreos são aqueles de criação fora do direito, a exemplo do software, pois foge ao tradicional.(11)

2.6 Conceito de mercadorias e de serviços

O tradicional conceito de mercadoria pode ser extraído do artigo 191 do Código Comercial, quando define o que é venda mercantil:

"É unicamente considerada mercantil a compra e venda de efeitos móveis ou semoventes, para os revender por grosso ou a retalho, na mesma espécie ou manufaturados, ou para alugar o seu uso; compreendendo-se na classe dos primeiros a moeda metálica e o papal-moeda, títulos de fundos públicos, ações de companhias e papéis de crédito comerciais, contanto que nas referidas transações o comprador ou vendedor seja comerciante."

Mercadoria, no conceito clássico, são, portanto, os bens móveis, corpóreos, tangíveis, ou semoventes; ou ainda o papal-moeda, títulos de fundos públicos, ações de companhias e papéis de crédito comerciais, para fins de tributação do ICMS.

Na análise de Marco Aurélio Greco, em sentido corrente, "mercadoria" pode ser identificada sob três aspectos. O primeiro em função da natureza de determinados objetos, identificando-se as qualidades de certas coisas (ser móvel, corpórea, tangível etc.), insuficiente para apontar o enquadramento da natureza do software e de outros bens informáticos.

Num segundo sentido entende o autor que "mercadoria" pode ser considerada todo bem negociado por um comerciante, fruto da atividade comercial, abrangendo, assim, os bens corpóreos, incorpóreos e os não corpóreos.

Finalmente, "mercadoria" pode significar tudo aquilo que estiver à disposição em um determinado "mercado", sentido em que pode ser considerado mercadoria até os imóveis, índices, cotações, etc.

Assevera o autor que a Constituição Federal retirou do conceito de mercadoria determinados bens, tributando-os de maneira diversa do ICMS, tal como os imóveis, que sobre a sua transmissão incide imposto próprio, bem assim as operações de crédito, câmbio, seguro, ou relativas a títulos e valores mobiliários, todos aqueles que figuram na parte final do artigo 191 do Código Comercial, que é de 1850, tributados pelo IOF ou IOC.

Pela sistemática do Código Comercial, mercadoria abrange tanto os bens corpóreos (tangíveis) como bens incorpóreos (no sentido de criação do Direito), englobando todos os bens concebidos pela doutrina tradicional. (12)

A conceituação de serviços é informada pela idéia de "causalidade", elemento relevante e definidor da noção de atividade realizada, que pelos seus aspectos, características, qualidades e outros, definiam-se a sua valoração. Assim, para cada atividade corresponde uma certa remuneração.

Através dessa visão formulou-se o conceito de serviços como sendo um tipo de atividade representativa de determinado esforço humano exercido por alguém.

Hodiernamente, mostra-se que a atividade não é mais o único elemento relevante para definir os valores das negociações realizadas. O valor não está mais apenas na atividade do prestador, mas na utilidade obtida pelo cliente. (13)

A introdução da utilidade no conceito de serviços também oferece relevância para fins tributários, por não se limitar à simples atividade exercida.

2.7 Atividade Comercial. Comerciante. Teoria da Empresa.

A origem do vocábulo comércio está ligada à sua fase inicial, quando este consistia na permuta ou troca de produtos, ou seja, o comércio in natura. Fazer comércio é permutar produtos por valores, expressão que provém de commutatio mercium, que significa troca de mercadorias por mercadorias. Rocco definiu a palavra comércio como sendo a atividade humana destinada a promover e facilitar a troca.(14)

No nosso ordenamento jurídico as atividades comerciais foram definidas pela teoria dos atos do comércio, porém o Código Comercial. não elencou os atos reputados comerciais, como o fez o Código francês. Tal elenco foi definido pelo artigo 19 do Regulamento n.º 737, de 1850, que para alguns doutrinadores está revogado, que são:

a) a compra e venda ou troca de bem móvel ou semovente, para a sua revenda, por atacado ou a varejo, industrializado ou não, ou para alugar o seu uso;

b) as operações de câmbio, banco e corretagem;

c) as empresas de fábricas, de comissões, de depósito, de expedição, consignação e transporte de mercadorias, de espetáculos públicos;

d) os seguros, fretamentos, riscos;

e) quaisquer contratos relativos ao comércio marítimo e à armação e expedição de navios.

São, também, atividades consideradas comerciais aquelas exercidas por empresas constituídas sob a forma de sociedade anônima, nos termos do Art. 2o , § 1o , da Lei 6.404/76; as empresas de construção civil, Lei 4.068/62, por praticarem atos do comércio por força de lei, e não necessariamente pela sua natureza econômica.(15)

Não fazem parte das atividades comerciais a venda e a administração de bens imóveis, os serviços de transporte de pessoas, as escolas, a atividade agrícola, os serviços prestados por profissionais liberais e as cooperativas, salvo as de crédito.

Incluem-se entre elas as atividades de seguros, transporte de cargas, bancos. Porém, quanto ao transporte marítimo, a doutrina defende a existência de um direito autônomo, não mais pertencente ao campo do Direito Comercial.

Comerciante é a pessoa que, profissionalmente, presta serviços ou realiza atos de intermediação, com intuito de lucro. Portanto, são características do comerciante: habitualidade, intermediação, objetivo de lucro.

Veja-se que no conceito de comerciante se engloba a prática de prestação de serviços, todavia são atividades relacionadas com a mercancia, a exemplo do transporte de cagas, ou aquelas elencadas no artigo 19, do Regulamento 737, de 1850.

Do ponto de vista subjetivo, a importância da Empresa está no seu titular, responsável pela articulação dos fatores de produção - capital, mão-de-obra e matéria-prima, ou seja, a reunião de capital e trabalho, extraído do conceito da Economia. Sob o aspecto objetivo, consiste na reunião de bens necessários à produção ou circulação de bens ou serviços - maquinaria, marcas, matéria-prima, mão-de-obra, etc.; o aspecto corporativo ressalta o organismo vivo existente na empresa, ou ainda, o aspecto da atividade, sob o ângulo da exploração econômica desenvolvida.

Seja qual for o ponto de vista analisado, a empresa é, em síntese, a reunião de capital e trabalho, no desempenho de uma atividade econômica, seja na área da prestação dos serviços, seja na intermediação de mercadorias, portanto, seja comercial ou civil a sua atividade.

A importância da Teoria da Empresa se verifica na desnecessidade de classificar a sua atividade em civil ou comercial, porque faz desaparecer a divisão de Direito Civil e Direito Comercial, surgindo o Direito Privado, teoria esta já reconhecida em nossos Tribunais, mas ainda não materializada na legislação pátria, que o será com a aprovação do Projeto do Novo Código Civil.

2.8 A incidência tributária e a atividade da empresa

A incidência tributária sobre a atividade da empresa independe de ser ela civil ou comercial, depende, sim, do fato gerador [PVD1], definidor da espécie de imposto que incidirá sobre aquela operação.

Deste modo, se um empresa tem por atividades o comércio e o conserto de computadores, sobre a sua venda recolherá o imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços – ICMS -, e o imposto sobre serviços – ISS - sobre o seu conserto. Por exercer atividade mista, ou seja, uma comercial e outra civil, a empresa será classificada de comercial, por prevalência desta sobre aquela.

A empresa de construção civil que constrói uma ponte, apesar de exercer uma atividade comercial, por força de lei, recolherá o ISS sobre essa obra, porque, para fins de incidência tributária, essa atividade é considerada de prestação de serviços. Ainda com uma particularidade, a base de cálculo[PVD1] para recolhimento do ISS será o preço dos serviços, deduzidos os valores dos materiais empregados na obra e das subempreitadas já tributadas por esse imposto(16)

Os serviços de transporte intermunicipal ou interestadual de cargas, atividade tipicamente comercial, quanto os serviços de comunicação, recolherão o imposto sobre serviços, cuja competência para tributar coube aos Estados, traduzido pelo ICMS, com suporte no inciso II do art. 155 da Constituição Federal; enquanto que sobre o transporte de cargas executado dentro do mesmo Município, incide o ISS, apesar dessa atividade também ser considerada mercantil.

Mais um exemplo da incidência do imposto sobre serviços, sobre uma atividade considerada mercantil, pelo disposto no art. 191 do CCom., é a locação de bens móveis, nos conformes do item 79[PVD1] da lista de serviços.

Como foi visto em no item 2.4, o ICMS e o ISS são impostos que gravam a circulação de bens e de serviços, de valor econômico material ou imaterial, e pelo acima exposto, a incidência dessas duas espécies de impostos não depende do tipo de atividade da empresa, ou seja, se comercial ou civil, a determinação da incidência tributária está na ocorrência do fato gerador, que tipifica o imposto, e define a quem pertence a competência tributária [PVD1].

Atualmente, a importância na definição do tipo de atividade, comercial ou civil, reside na lei de falências e concordatas, ainda aplicável tão somente aos comerciantes, ou aos que exercem atividade mista, por construção doutrinária e jurisprudência; ao passo que para as empresas que exercem atividade exclusivamente civil, a teor da atividade de ensino, aplica-se a insolvência civil.

Não há dúvidas, portanto, que a venda de mercadorias, a grosso[PVD1] ou a varejo, representa uma atividade comercial, sobre a qual incide o ICMS, de competência estadual.

Todavia, sobre as atividades consideradas de prestação de serviços, tanto pode incidir o ICMS estadual, tais como o transporte intermunicipal e interestadual, e de comunicações, quanto o ISS municipal, como na construção civil, locação de bens móveis, ensino, que tanto podem ser consideradas comerciais ou civis as suas atividades.

A Constituição Federal havia outorgado aos Municípios competência para tributar os serviços de comunicações de natureza estritamente municipais, prerrogativa esta que lhes foi retirada pela Emenda Constitucional 3/93.

2.9 As aquisições pela Internet e a sua tributação

As aquisições de bens e de serviços pela Internet, merece uma apurada análise, a fim de se determinar a incidência de impostos sobre as mesmas.

Nas compras de mercadorias via Internet, v.g., a aquisição de uma computador, ou de um outro produto qualquer, pelo sistema de telemarkting, tão comum nos nossos dias, o comprador se conecta com o site do vendedor, formula o pedido, acorda sobre as condições e forma de pagamento, e, por último, recebe o produto comprado em sua residência.

Supondo que o comprador esteja em um Estado da Federação, e o vendedor em outro, o pedido de compra formulado pelo meio físico Internet, em nada se distancia da hipótese desse mesmo pedido ser feito através de um representante comercial, por fax, por telefone ou por correio. Em nenhuma dessas operações se verifica a ocorrência de fato gerador de qualquer espécie de imposto.

Todavia, no momento da remessa da produto (mercadoria) adquirido, por parte do vendedor, a saída da mercadoria do estabelecimento do vendedor representa o fato gerador do ICMS, nos termos do inciso I, do artigo 1o, do Decreto-lei n.º 406/68:

"Art. 1o O Imposto sobre Operações Relativos a Circulação de Mercadorias tem como fato gerador:

I – a saída de mercadorias de estabelecimento comercial, industrial ou produtor;"(17)

Deste modo, no momento em que o vendedor promove a saída da mercadoria de seu estabelecimento, ocorre o fato gerador do ICMS, que será devido ao Estado onde se encontra estabelecido o vendedor, seja o estabelecimento matriz ou filial.

Neste caso, então, não há o que se falar em tributação pela Internet, porque na operação de pedido de aquisição do bem, não se praticou nenhum ato que importasse na ocorrência de fato gerador de qualquer imposto, com a ressalva evidente do impulso telefônico utilizado para tanto, que também ocorreria se efetivado por fax ou pelo próprio telefone, sobre o qual incide o ICMS, em razão de que se trata de um serviço de comunicação.

Como segundo caso, tomemos de exemplo o mesmo internauta que, via Internet, formula uma consultoria sobre processamento de dados a um grande escritório de consultoria em informática localizado em Município diverso do seu, obtendo a resposta à consulta através de uma mensagem, por correio eletrônico.

A hipótese em exame não oferece maior dificuldade. O serviço de consultoria foi prestado pelo escritório respectivo no Município onde se localiza, para quem o imposto sobre serviço deverá ser recolhido, por estar tipificado no item 22 da lista de serviços[PVD1].(18)

Porém, o mesmo internauta adquire pela internet um programa de computador, que lhe é enviado via download de uma página que se encontra num site internacional. Neste caso, como será a incidência tributária?

Outra hipótese que merece maior reflexão é a aquisição de software, em virtude das dificuldades apresentadas, no que pertine à sua natureza jurídica.

2.10 Software e sua natureza jurídica

A legislação vigente considera obras intelectuais as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro e, entre elas, inclui os programas de computador, ex vi, o artigo 7o, e inciso XII, da Lei 9610, de 19 de fevereiro de 1998.

O conceito de programa de computador é encontrável no artigo 1.º da Lei 9.610, que assim o definiu.

"Art. 1.º Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados."

A definição legal não foge do pensamento de Messineo, anteriormente esposado, que a atividade intelectual e criativa do homem não se confundem com as coisas que a materializam.

A criação intelectual é, pois, um bem intangível, imaterial por excelência, mas que exige um suporte físico para se tornar perceptível, tal como um livro, uma partitura, um disquete, ou CD-Room, momento em que a sua circulação econômica faz surgir dúvidas quanto a hipótese de incidência tributária, se essa atividade envolve uma prestação de serviços ou uma venda de mercadorias.

O artigo 8.º da Lei 9.609/98 reporta-se à comercialização de programa de computador, mas ao mesmo tempo assegura aos seus usuários, durante o prazo de validade, a prestação de serviços técnicos complementares relativos ao adequado funcionamento do programa, consideradas as suas especificações.

O software deve ser visto sob dois planos: o primeiro é o do programador que o redige, denominado "programa fonte"; o segundo é o plano do próprio software como conjunto de instruções que a máquina vai entender e executar, denominado "programa objeto", aquele que se encontra gravado num suporte físico. Para o autor, a definição de bem incorpóreo pode assumir um sentido novo (não o clássico) que apontaria na direção de que seriam incorpóreos todos os bens que não fossem corpóreos. Entende ele, que o software é um bem não corpóreo . (19)

O Sistema Tributário Nacional vigente, refletindo em parte a EC n.º 18/65, ao classificar os impostos sob o aspecto da economia, considerou incidentes sobre a circulação de bens e serviços, alguns impostos de competência estadual e municipal.

Na esfera de competência estadual, o imposto sobre a circulação de bens e serviços incide sobre a circulação de mercadorias e dos serviços que lhe foram auferidos diretamente pela Constituição Federal, art. 155, II, ainda que as operações se iniciem no exterior, ou seja, os serviços de transporte interestaduais e intermunicipais, e de comunicações, que passou a ser conhecido pela sigla ICMS. No âmbito municipal, incide o imposto sobre os serviços não previstos no artigo antes mencionado, e definidos em lei complementar, conhecido pelas siglas ISS ou ISSQN.

A definição da espécie de imposto incidente sobre tal circulação econômica da riqueza, como já visto, não se prende ao tipo de atividade empresarial, ou seja, se civil ou comercial, mas pela ocorrência do fato gerador, que indicará tratar-se da incidência do ICMS, estadual, ou do ISS, municipal, nos conformes da legislação vigente.

Ocorre que o autor que mencionamos se opõe a este modo clássico de pensar, pois o considera consentâneo com o Estado de Direito, para quem o ordenamento jurídico não conteria regras que previssem claramente em ser o software uma mercadoria; porém sob a ótica do Estado Democrático de Direito, pode ele vir a ser considerado uma mercadoria, desde que não ultrapasse o sentido da garantia e da legalidade, buscando a essência do preceito e não a sua literalidade.(20)

Apesar de se distanciar do sentido clássico do Direito, a questão é de suma importância. O software, como um programa elaborado por encomenda, enquadra-se perfeitamente numa atividade de prestação de serviços, sobre a qual incide o ISS. Porém, quanto aos chamados "software de prateleira", assim entendido o reproduzido em larga escala e comercialização no varejo, há decisão do Supremo Tribunal Federal que seriam tributados pelo ICMS (RE-19.464-SP, Min. Ilmar Galvão, 1.ª Turma, DJ-30.04.99), cujo posicionamento jurisprudencial não é pacífico. (21)

Sobre o autor
Pedro Victório Daud

promotor de Justiça em Sergipe, titular da Vara de Falências e Concordatas, professor universitário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DAUD, Pedro Victório. Incidência tributária nas operações realizadas pela Internet. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 46, 1 out. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1812. Acesso em: 25 nov. 2024.

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