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O bug do milênio: impactos setoriais

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Agenda 01/09/1998 às 00:00

BANCOS

A Febraban enviou 151 cartas aos fornecedores de equipamentos dos bancos brasileiros, indagando sobre a compatibilidade dos sistemas com o ano 2000. Dessas, apenas 26 cartas foram respondidas. O mesmo procedimento foi adotado quanto às centrais telefônicas brasileiras. Apenas 8 foram respondidas. 113

A adaptação do sistema gerenciador de protestos de títulos dos bancos brasileiros só irá terminar no 2º semestre de 1999. 113

Fusões e aquisições: o banco americano Corestates Financial Corp. foi absorvido pelo First Union Corp. Motivo: medo do Corestates não conseguir se adequar. 55

12% ou 720 bancos americanos foram julgados inadequados pela US Deposit Insurance Corp.; 1% ou 60 bancos, não conseguirão se adequar. 8

Os bancos pequenos em nações desenvolvidas estão atrasados na adaptação 69; menos de 10% dos bancos da América do Sul estão tomando medidas. 83 42

Bancos avisam para clientes guardarem os extratos. 81

New York: Presidente do Banco Central do Estado cancelou férias e pediu para que os executivos evitem viagens.

O Banco da Inglaterra sugere que o dia 31.12.1999 seja feriado. 94

Gastos de adaptação dos sistemas

Porcentagem dos problemas do bug do ano 2000 já resolvida pelos principais bancos

Banco

% Resolvido do Bug do Ano 2000

Banco do Brasil

80

Bradesco

78

Itaú

43

Nossa Caixa Nosso Banco

31

Sudameris

30

Banco Real

24

América do Sul

15

Bemge

10

Caixa Econômica Federal

5

Fonte: Revista Exame 127


SEGURANÇA, ENERGIA, SAÚDE, AVIAÇÃO

Segurança

Energia

Saúde

Aviação


PROBLEMAS REAIS JÁ OCORRIDOS NO MUNDO


JURÍDICO

Processos em andamento nos Estados Unidos
Califórnia
New York
Ohio
Michigan

O Procurador Geral do Estado da Carolina do Norte (EUA), pretende ajuizar uma ação contra os fabricantes de software, hardware e equipamanetos embutidos, cobrando U$ 132,8 milhões de gastos de adaptação nos sistemas estatais.

Nos Estados Unidos, os principais escritórios de advocacia já formalizaram mais de 200 acordos, a maioria envolvendo fabricantes e consumidores de produtos de informática, com cifras em torno de U$ 1 a 10 milhões. 41

Legislação Americana sobre o Bug do Milênio

Projetos de Lei Estaduais tornando alguns Estados imunes a qualquer responsabilidade decorrente da falha de seus sistemas e respectivos reflexos:

Existem, ainda, projetos de lei estipulando e concedendo crédito e incentivos fiscais para aqueles que estiverem adequando seus sistemas nos seguintes Estados: New York, Conecticut, Illinois, Maine.

Existem, também, projetos de lei criando organismos específicos de combate e adaptação do problema do ano 2000 ("Taskforces") nos seguintes Estados: Illinois, Iowa.

O Estado da Califórnia tentou aprovar um projeto que limitava a responsabilidade das empresas fabricantes de equipamentos de informática (hardware, software e equipamentos embutidos) aos custos de adaptação e eventuais danos a integridade física no teto de U$ 250.000. Esse projeto não foi aprovado pela assembléia legislativa do estado e foi arquivado em maio de 1998.

Projetos de Lei Federais (assuntos diversos)

O Senado Americano emitiu a resolução nº 298 que instituiu o comitê especial de acompanhamento e estudo "Year 2000". Esse comitê vem realizando palestras e convocando especialistas para depor perante o congresso de forma que o problema tenha toda a atenção e prioridade que o assunto requer.

O Presidente Bill Clinton deverá apresentar, em breve, um projeto de lei objetivando limitar a responsabilidade das empresas que compartilharem informações sobre como resolver o problema do bug, incluindo as experiências adquiridas. 111128 129 92 15

Em Portugal o governo baixou o Decreto-Lei nº 5898, dispensando os órgãos públicos da obrigatoriedade de realização de licitação (Concurso Público) para compra de equipamentos ou contratação de terceiros para a adaptação. A decisão foi tomada tendo em vista a importância do assunto e prazo ínfimo para a adaptação dos sistemas.

JURÍDICO – BRASIL – RESPONSABILIDADES E INDENIZAÇÕES

A Comissão de Valores Mobiliários ("CVM") baixou a Instrução nº 276/98 estipulando prazo até 31.12.1998 para que as entidades sob sua jurisdição (bolsas, caixas de liquidação e custódia, administradores de fundos, cias. abertas) tomem as medidas necessárias e adeqüem seus sistemas, sob pena de multa. A CVM determinou também que as entidades informem, trimestralmente, as medidas adotadas e a evolução do processo de adequação.

Instituto Brasileiro de Contadores emitiu o comunicado nº 98/004, de 14.05.1998, esclarecendo a comunicação do Banco Central inerente à resolução do Conselho Monetário Nacional ("CMN") nº 2453/97 que determinou a correção e a adequação dos sistemas das instituições financeiras e administradoras de consórcio até dezembro de 1998. Além disso, O CMN determinou também que as instituições informem, semestralmente, as medidas adotadas e a evolução do processo de adequação, impondo também a obrigatoriedade da menção do processo nos relatórios de auditoria.

Responsabilidade Jurídica

O problema do ano 2000, ou Bug do Milênio (Y2K), vai atingir todas as áreas, negócios e até pessoas que não estejam relacionadas ou não possuam computador ou equipamentos eletro-eletrônicos.

Vejamos a seguinte suposição: atualmente muitas aeronaves estão equipadas com sistemas informatizados denominados "fly by wire". Um desses aviões está voando na transição do ano 1999 para 2000 e sofre pane generalizada nos sistemas. Para piorar, o controle de vetoração radar executado em terra também falha, pois seus computadores são antigos "mainframes". A aeronave entra em colapso e não conta com o acompanhamento da sua posição pelo controle de tráfego aéreo. Complicando um pouco mais, a empresa fornecedora de energia elétrica sofre uma pane em seus sistemas, causando a queda de energia no aeródromo, inclusive nas luzes de pista. O avião cai próximo ao aeroporto. Dezenas de vítimas.

Essa hipotética descrição serve como um alerta. Além do conteúdo drástico, enseja responsabilidades civis e criminais. Civis no sentido da atribuição de indenização aos legitimados. Criminais buscando impor a sanção ao responsável, seja por homicídio culposo múltiplo ou lesões corporais culposas. Os diretores de empresas poderão ser responsabilizados.

Responsabilidade é a palavra mágica que norteia os procedimentos reparatórios ou preventivos, objetivando resguardar ou valer direitos. O cerne da questão encontra-se na responsabilidade do fornecedor de produtos ou serviços defeituosos, seja ele o fabricante ou usuário fornecedor. Para esclarecer, tomamos o exemplo dos bancos e instituições financeiras. Os bancos utilizam os sistemas adquiridos de um fabricante de computadores; por outro lado, os bancos vendem seus serviços à população; assim, o banco é consumidor do fabricante de computadores e fornecedor de serviços aos correntistas. Caso os sistemas bancários entrem em colapso e prejudiquem seus clientes, estes poderão processar as instituições financeiras e exigirem a respectiva indenização pelos danos experimentados. O banco, por sua vez, poderá, na maioria dos casos, processar o fabricante de computadores alegando defeito dos sistemas adquiridos e cobrando o ressarcimento das indenizações pagas aos clientes, além dos respectivos danos e lucros cessantes. Todo aquele que sofrer prejuízo em virtude da falha (bug) poderá processar o responsável e cobrar os danos ocorridos. Danos de caráter moral e material.

As pessoas (físicas ou jurídicas) que ainda têm tempo para o reparo e adequação dos respectivos sistemas, devem fazê-lo o quanto antes, sob as expensas do responsável. Se já não há tempo, devem proceder de forma a noticiar o fato, uma espécie de "recall", nos termos das disposições legais em vigor. O seguro também deve ser cogitado como instrumento de apoio.

Para proteger direitos, os contratos devem trazer cláusulas específicas quanto às responsabilidades inerentes aos efeitos do Bug. E isso afeta tanto os que consertam os sistemas ("Bug Busters"), quanto os usuários e fornecedores. Os contratos celebrados com os especialistas no conserto deverão contar com cláusulas específicas, como a confidencialidade, penas relativas a danos imprevistos e a isenção ou assunção de responsabilidades quanto ao sucesso ou fracasso do serviço. Outros contratos que envolvam a prestação de serviços ou negócios entre partes que utilizem sistemas informatizados ou dependam deles, deverão merecer atenção especial quanto à realização do objeto (fim) e suas conseqüências, caso sua finalidade não seja alcançada em virtude do problema do ano 2000.

Em se tratando de relações entre fornecedor e consumidor, vale lembrar a aplicação da inversão do ônus probatório, o que torna difícil a prova quanto ao conhecimento do defeito pelo consumidor, ou seja a omissão deste. As regras do Código do Consumidor aplicam-se, inclusive, às pessoas jurídicas, tanto quanto fornecedoras, quanto consumidoras.

Os acionistas que amargarem prejuízos em decorrência da queda do valor das respectivas ações em razão da inadequação da empresa, poderão, em tese, cobrar os prejuízos dos administradores, fundamentando sua pretensão na quebra do dever de diligência ("due of care"). As fusões e aquisições de empresas deverão ter atenção especial.

Legislação Aplicável

O custo estimado das indenizações judiciais no Brasil alcança, aproximadamente R$ 20 bilhões na área jurídica. (considerando U$ 1 trilhão no mundo)3 41 66 44

Para cada dólar não gasto na adequação, espera-se o desembolso de três 122 a 10 dólares em litígio 57.

Orientação para gerenciar o processo de conscientização: Existe a possibilidade do problema ocorrer? Qual a probabilidade de acontecer?

Sobre o autor
Renato Opice Blum

advogado e economista em São Paulo (SP), professor da FGV, PUC, IBMEC/IBTA, UFRJ, FIAP e ITA/CTA, árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem de São Paulo (FIESP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BLUM, Renato Opice. O bug do milênio: impactos setoriais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. -1765, 1 set. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1816. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

O autor também escreveu o primeiro livro brasileiro sobre o bug do ano 2000 na área legal-financeira ("O bug do ano 2000 – aspectos jurídicos e econômicos") e patrocinou a primeira ação sobre o bug no Brasil. Os direitos autorais deste relatório encontram-se sob a proteção da Lei 9610/98. A divulgação das informações é autorizada, desde que citado o autor deste trabalho, sob pena de sanções civis e criminais.

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