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A carga probatória não é movediça.

Apontamentos críticos sobre a dinamização da "carga probandi"

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Agenda 21/01/2011 às 17:11

5. Críticas à teoria das cargas probatórias dinâmicas

A despeito do grande número de entusiastas da teoria das cargas probatórias dinâmicas – especialmente na Argentina, em razão do trabalho desenvolvido pelo "Ateneo de Estudios del Proceso Civil", dirigido por Jorge Walter Peyrano –, há vários pontos sobre a nova doutrina que merecem ser considerados criticamente.

As presentes considerações críticas, conforme será apontado nas cinco conclusões abaixo, seguem o roteiro de Maximiliano García Grande (Las cargas probatorias dinámicas. Inaplicabilidad), eleito pelo fato de ser, em terreno argentino (especialmente fértil da doutrina), o Autor que mais se debruçou criticamente sobre o tema.

De início, convém então citar García Grande, que esquematizou nas conclusões do seu trabalho estes cinco pontos de crítica à denominada teoria das "cargas probatórias dinâmicas":

"I.La sentencia en casos de falta de prueba eficaz debe estar fundada en las presunciones legales y no en la distribución del onus probandi.

II.La inversión del onus probandi genera contradicción insuperable entre las presunciones del derecho de fondo y la carga probatoria del derecho formal (que debe ser un reflejo de aquellas), porque las normas de forma estarían coerciendo a demostrar la incupabilidad que las normas de fundo presume.

III.Sobre la 'justicia del caso concreto', como fundamento de la teoría, resulta utópico sostener que el juez debe aplicar la justicia de cada caso en concreto, cuando todos sabemos que por el colapso judicial reinante es imposible, en la práctica, que el juez conozca o pueda interiorizarse de cada litigio.

IV.Sobre la "mejor posición de probar", como elemento de la teoría de las cargas probatorias dinámicas, aunque muchas veces no se sepa quien se encuentra en mejores condiciones de aportar el material probatorio, debe estudiarse hasta donde, existiendo el principio constitucional por el cual nadie puede ser coaccionado a declarar en su contra, puede coexistir un instituto que obliga a las partes a probar su inocencia.

V.En varios casos donde se aplica la teoría de las cargas probatorias dinámicas pueden aplicarse institutos ya creados por la legislación o la doctrina, como pueden ser el abuso del proceso y el valor probatorio de la conducta de las partes" (GRANDE, 2005, p. 99-100).

Como já visto, a teoria das cargas probatórias dinâmicas surgiram em contraposição à imutabilidade (rigidez) da distribuição do ônus da prova e à impossibilidade de uma parte, ante a sua posição "desprivilegiada", demonstrar os fatos por seu próprio e único empenho, necessitando-se, então, para a inteiração fática dos autos, do auxílio da parte adversa. Traduz-se, então, como a denomina a doutrina, em um princípio de solidariedade ou de colaboração.

Assim, a parte que esteja em melhores condições de prova de determinado fato, não a realizando, estará sujeita às consequências de sua inércia, operando-se no convencimento do magistrado presunção favorável à parte débil. Pode-se dizer, então, que a teoria tem dois alicerces básicos de sustentação, quais sejam, a carência de prova apta à formação da convicção judicial e a fixação de ônus probatório à parte que o esteja em melhores condições de cumpri-lo (GRANDE, 2005, p. 99).

Acontece que, se a ausência de prova constitui pressupusto para a aplicação dessa doutrina – pois se provas suficientes houver, não haverá que se falar em debilidade de quaisquer das partes –, seria necessário inferir que a dinamização probatória operasse sobre provas inexistentes, sugerindo aparente paradoxo. Defende a doutrina, porém, como visto no tópico anterior, que a dinamização ocorre sobre a carga, viabilizando os efeitos jurídicos da desincumbência probatória. Porém, não é a inércia da parte que constitui fundamento da decisão – inclusive porque, tratando-se de ônus, não se poderia obrigar (coerção) as partes à produção da prova –, mas uma presunção incutida na convicção do magistrado.

Registre-se, então, a primeira crítica à teoria das cargas dinâmicas probatórias, pois não é a suposta alteração na distribuição do ônus probatório que instrumentaliza a convicção judicial (baseada em ausência de produção de provas por quem a devia realizar), supostamente autorizada pela doutrina da dinamização; a convicção judicial orienta-se por intermédio de presunções do fundo de direito, ante a ausência probatória. Ora, não se poderia "dinamizar" o que se deixou de produzir.

Ora, a carga probatória não se destina a determinar a sorte final do litígio, mas apenas se refere ao caminho de análise judicial sobre a produção probatória para, conforme o conjunto de presunções aplicáveis à espécie, verificar qual parte não se incumbiu eficazmente da demonstração dos fatos. E, obviamente, se as carga probatórias não podem cumprir com esse mister "decisório", ainda com menor razão as cargas dinâmicas o cumpririam.

Com efeito, a sentença responsável por dirimir um conflito com ausência ou insuficiência probatória será motivada por presunções, não se destinando a condenar quem tinha a carga e não cumpriu a prova (a condenação supõe a presunção operada no convencimento judicial). Pode-se dizer, desse modo, que as cargas dinâmicas desatam o envolvimento entre a distribuição do onus probandi e as presunções do fundo de direito, obscurecendo esse ponto limiar de encontro do direito material com o processo.11

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Do mesmo modo, a tutela jurisdicional que provê a pretensão autoral não resulta da suficiência probatória levantada pelo demandante, mas se origina da convicção que o acervo de provas engendrou. Afinal, as presunções legais consubstanciam convicções das normas (GRANDE, 2005, p. 61). A recíproca do raciocínio, então, não poderia ser verdadeira, ou seja, o juiz não poderia sentenciar fundado em uma inatividade (senão na presunção).


6. Considerações finais

A doutrina das cargas probatórias dinâmicas não constitui novidade no estudo da distribuição do onus probandi, cujo gérmen, como visto, encontrava-se já presente na teoria de J. Bentham.

Parece-nos, em reflexões finais sucintas, que a carga probatória não é "movediça", como a teoria das cargas dinâmicas sugere, porque o ônus da prova não funciona per se, necessitando-se sempre inquirir as presunções do fundo de direito que militarão no caso concreto para se desvendar a parte prejudicada pela ausência ou pela deficiência do acervo probatório. Vale dizer, as cargas probatórias não se dinamizam sem que estejam atreladas a uma presunção, sugerindo, inclusive, inexatidão na terminologia majoritariamente eleita pela doutrina ("Cargas Probatórias Dinâmicas").

Portanto, a utilidade do estudo sobre as cargas dinâmicas probatórias inteira-se mais sobre a formação de um juízo de convicção, do que sobre um juízo de distribuição de prova (juízo de risco), propondo aos magistrados, principalmente (e aí reside o mérito da teoria), uma exata avaliação da conduta das partes na constituição das provas.

A efetiva contribuição à prova (princípio de solidariedade), o exaurimento das suas possibilidades ou a impossibilidade justificada (provada) de sua produção, sempre transparecerão as reais possibilidades de demonstração, pelas partes, dos elementos fáticos relevantes à controvérsia. Não há exata necessidade de que se sopesem eventuais debilidades das partes, em busca de um utópico equilíbrio. Afinal, mesmo no processo, a "(boa-)fé move montanhas".


NOTAS

1. "En el procedimiento formulario del Derecho Romano se le otorgaba al juez in judicio la posibilidad de declararse incompetente en caso de no arribar a ninguna conclusión" (ODERIGO apud RAMBALDO, 2008, p. 28).

2. "(...) el problema de la carga de la prueba se presenta fundamentalmente cuando el juez debe dictar sentencia y no tiene en el proceso prueba suficiente y eficaz de los hechos alegados por las partes que le produzca certeza suficiente para formar su convicción, ya que puede ocurrir no sólo que no hayan sido probados algunos hechos, sino que otros no hayan sido probados ni como verdaderos ni como falsos, que no se los pueda tener ni de una forma ni de otra" (CARBONE, 2008, p. 200).

3. "La concepción originaria de la carga de la prueba fue conceptualizada por Goldschmidt como 'un imperativo del propio interés', surgiendo posteriormente reglas de distribución de la carga de la prueba" (TEPSICH, 2008, p. 156).

4. Tal regra basilar integra a teoria de Chiovenda, para quem "corresponde al actor probar los hechos constitutivos, esto es, aquellos que normalmente producen determinados efectos juridicos: el demandado debe probar los hechos impeditivos o extintivos" (CHIOVENDA apud TEPSICH, 2008, p. 156).

5. "El onus probandi no parecer tener otra significación que la de señalar la falta de prueba y las consecuencias perjudiciales que tal falta entraña para la parte a la que le correspondía probar" (TEPSICH, 2008, p. 157).

6. Em rumo semelhante, o francês René Demogue defendia a prevalência do princípio da solidariedade na distribuição do onus probandi (SOARES DE FARIA apud AZÁRIO, 2006, p. 45).

7. "Esta teoría impone a cada una de las partes la carga de probar los presupuestos de hecho de la norma jurídica que le resulta favorable. No difere demasiado de la de Micheli, y há sido recepcionada por diversos códigos (WHITE, 2008, p. 59).

8. "La médula de la justicia es la idea de igualdad. Desde Aristóteles, se distinguen dos clases de justicia, en cada una de las cuales se plasma bajo una forma distinta el postulado de la igualdad: la justicia conmutativa representa la igualdad absoluta entre una prestación y una contraprestación, por ejemplo, entre la mercancía y el precio, entre el daño y la reparación, entre la culpa y la pena. La justicia distributiva preconiza la igualdad proporcional en el trato dado a diferentes personas, por ejemplo, el reparto entre ellas de los tributos fiscales (...). La justicia conmutativa presupone la existencia de dos personas juridicamente equiparadas entre sí; la justicia distributiva, por el contrario, presupone tres personas, cuando menos: una persona colocada en un plano superior y que impone cargas o confiere beneficios a dos o más subordinadas a ella" (RADBRUCH apud WHITE, 2008, p. 65).

9. Seguem destacadas as três primeiras conclusões, sobre a teoria das cargas probatórias dinâmicas, resultantes daquele Encontro de estudos. "Primera conclusión. La temática del desplazamiento de la carga de la prueba reconoce hoy como capítulo más actual y susceptible de consecuencias prácticas a la denominada doctrina de las cargas probatorias dinámicas, también conocida como principio de solidaridad o de efetiva colaboración de las partes con el órgano jurisdiccional en el acopio del material de convicción" (PEYRANO, 2008, p. 20). "Segunda conclusión. Constituye doctrina ya recibida la de las cargas probatorias dinámicas. La misma importa un apartamiento excepcional de las normas legales sobre la distribución de la carga de la prueba, a la que resulta procedente recurrir sólo cuano la aplicación de aquellas arroja consecuencias manifiestamente disvaliosas" (PEYRANO, 2008, p. 21). "Tercera conclusión. Se recomienda la regulación legal del ideario ínsito en la doctrina de las cargas probatorias dinámicas. Resultaría, en cambio, inconveniente su incorporación legislativa a través de disposiciones taxativas, demasiado casuísticas y que puedan interpretarse de manera inflexible, dificultándose así el necesario ajuste de la decisión respectiva a las circunstancias del caso" (PEYRANO, 2008, p. 22).

10. "Así aparece el nuevo concepto de carga probatoria compartida, como manifestación de una nueva cultura del proceso judicial caracterizada por la vigencia del principio de solidaridad y el deber de cooperación de todos en procura de un rendimiento del servicio de justicia más eficientes que el actual, donde se encuentra aceptable que, en buena medida, la tarea probatoria es común a ambas partes" (LEGUISAMÓN, 2008, p. 115).

11. "Las cargas probatorias dinámicas contrarían las presunciones legales de derecho, motivo suficiente para no ser aplicadas. (...) Si la teoria de las cargas probatorias dinámicas es fruto del valorable esfuerzo por afianzar la justicia, y nosotros encontramos fallas en la teoría, debemos entonces proponer otras soluciones" (GRANDE, 2005, p. 80).


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Sobre o autor
João Pereira Monteiro Neto

Advogado, pós-graduando em Processo Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MONTEIRO NETO, João Pereira. A carga probatória não é movediça. : Apontamentos críticos sobre a dinamização da "carga probandi". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2760, 21 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18322. Acesso em: 19 dez. 2024.

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