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Interpretação do Direito do Trabalho

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Agenda 17/03/2011 às 15:23

1. Da necessidade da interpretação

O Direito é o conjunto das normas que regulam, de forma coercitiva, as relações em sociedade. O Direito do Trabalho configura um dos ramos do Direito composto pelas normas que regem a relação de trabalho.

Cada norma existente possui um significado ou diversos significados. Assim, interpretar o Direito nada mais é que revelar o conteúdo e o alcance das normas que o compõe. O ato de interpretar opera-se em todos os ramos do Direito, e assim, também, no Direito do Trabalho. Ao interpretar o Direito do Trabalho o intérprete deverá alcançar o sentido social das leis trabalhistas e a função que exercem na sociedade.

Não é correto dizer que o trabalho do intérprete apenas é necessário quando as leis são obscuras. Hoje, a possibilidade, e ainda mais, a necessidade de interpretação das normas jurídicas, precisam ser reconhecidas, mesmo em relação às normas tidas por claras. A interpretação sempre é necessária, sejam obscuras ou claras as palavras da lei ou de qualquer outra norma jurídica. Mas não foi sempre assim.

Alguns doutrinadores por décadas defenderam não haver necessidade de interpretação quando a norma é "clara". Por muito tempo imperou a expressão: "in claris cessat interpretatio" (dispensa-se a interpretação quando o texto é claro).

Tal brocardo representou o mais absoluto império da lei, no processo interpretativo. Sua origem e seu prestígio estavam ligados ao receio ao arbítrio do juiz e ao respeito religioso ao texto da lei.

O brocardo "in claris cessat interpretatio", conforme ensina Carlos Maximiliano [01], embora expresso em latim, não tem origem romana. Como podemos verificar, o ditado "in claris cessat interpretatio" tem uma origem específica no campo do direito de sucessões, notadamente, no que diz respeito às disposições de última vontade.

Entretanto, passou a ser aplicado na atividade jurisdicional, fundamentando-se em mera comodidade, ou seja, alguns julgadores invocavam o brocardo com o fito de "fugir" à discussão de uma interpretação mais aprofundada de algum dispositivo normativo. Desta forma, mantinham-se "coerentes" com seu posicionamento sobre a matéria, negando-se a rediscutí-lo, repensá-lo, reanalisá-lo, afirmando serem suas decisões anteriores como inquestionáveis e perfeitas, ou seja, como se fossem verdades absolutas das quais dependam, inclusive, a paz de espírito de sua consciência, além de sua própria crença no ideal da justiça. Visto sobre o seu prisma jurídico, o in claris cessat interpretatio teve uma a grande aceitação em momentos da história fortemente marcados pela supervalorização da letra da lei.

A utilização atual desse brocado é motivo de uma grande discussão doutrinária que questiona a sua validade no contexto atual. Na atualidade, os defensores do brocado in claris cessat interpretatio reafirmam a sua veracidade diante da clareza de uma lei. Para eles, existem leis suficientemente claras que dispensam maiores reflexões interpretativas. Francisco de Paula Baptista [02] é um dos autores que entendem dessa forma. Diz ele que a interpretação "não tem lugar sempre que a lei, em relação aos fatos sujeitos ao seu domínio, é clara e precisa". Ele chega inclusive a elencar minuciosamente os momentos em que a interpretação deve ser utilizada: A necessidade de interpretar uma lei pode nascer:

1. defeitos em sua redação, resultando daí obscuridade e equivoco em seu sentido; 2. da concisão habitual e inevitável com que são escritas todas as leis, nascendo daí dúvidas não em seu sentido direto, mas em sua conformidade ou não-conformidade com os diversos casos ocorrentes, cumprindo, então, salvar incoerências e contradições virtuais de seus espíritos com as palavras; 3. de silencio.

Verifica-se uma supervalorização que o autor dá à maioria dos textos legais que, no seu entender, bastar-se-iam em si mesmos, inexigindo uma análise interpretativa que lhes revelasse o sentido e o alcance.

Raimundo Bezerra Falcão [03] aponta como uma das três deficiências desse entendimento exatamente a impossibilidade de se ter um texto absolutamente claro. Enfatiza ele: "Como saber se a lei é clara sem que ela seja previamente entendida? No exato momento em que alguém entende uma lei e, ao lado disso, chega inclusive a ajuizá-la de estar encerrando clareza, é porque já lhe captou o sentido. Interpretou-a, pois."

Neste sentido encontra-se próprio Carlos Maximiliano, já citado anteriormente, ao demonstrar que o objetivo da Hermenêutica é "descobrir o conteúdo da norma, o sentido e o alcance das expressões do direito. Obscuras ou claras, deficientes ou perfeitas, ambíguas ou isentas de controvérsias, todas as frases jurídicas aparecem aos modernos como susceptíveis de interpretação".

Atualmente é pacífico o entendimento de que o referido brocardo, que defende a não aplicação da interpretação quando a lei for clara, restou-se ultrapassado, principalmente em razão da maciça carga de subjetivismo ao se determinar o o conceito e os limites de uma norma considerada "clara".

É claro que há situações normativas que exigem maior ou menor esforço do intérprete para descobrir seu sentido e alcance; mas sempre deve haver o exercício do trabalho interpretativo.


2. Das Escolas de interpretação

O histórico do surgimento das Escolas de Interpretação evidencia que inicialmente existia um apego exagerado à literalidade do texto da norma. Porém, percebesse que tal posicionamento, com a passar dos anos, tende a ser cada vez mais flexibilizado.

Segundo Von Jhering, citado por Caio Mario [04] evidencia que o direito romano, a princípio, não se valia senão dos elementos literais, restringindo a interpretação à procura do que se achava fixado na palavra. Este apego à forma é natural em todos os povos que atravessam fase menos desenvolvida de sua evolução, não apenas no tocante ao direito, mas a todas as manifestações de inteligência. Somente quando o romano atingiu mais adiantado grau de cultura, ao alcançar o estágio de plenitude de seu florescimento, e conseguiu expressar-se na criação de conceitos abstratos, pôde formular regras de hermenêutica sob a dominação do elemento lógico, e assentou, então, que a interpretação é algo mais do que conhecimento literal da linguagem da lei, por envolver também a perquirição da sua força e da sua vontade.

A partir dali diversas foram as escolas que surgiram acerca das técnicas de interpretação.

Segundo Alice Monteiro de Barros [05], a classificação das escolas de hermenêutica resume-se em três grupos: escolas de estrito legalismo ou dogmatismo, escolas de reação ao estrito legalismo e escolas que preconizam um direito mais livre.

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Segundo ela situam-se entre as escolas presas ao legalismo: a Escola Exegética (defende a absoluta supremacia da lei), a Escola dos Pandectistas Alemães (embora menos radical que a Escola Exegética, ela defendia a absoluta intenção do legislador) e a Escola Analítica de Jurisprudência (pela qual a lei sobrepõe-se aos valores e à ética).

Em contraposição ao positivismo exagerado surgem as Escolas Históricas, que levam em consideração a evolução do Direito. Dentre elas estão: Escola Histórico-Dogmática (criada por Savigny, leva em consideração o sistema em que a norma está inserida para interpretá-la), a Histórico-Evolutiva (criada por Saleilles, determinava a adaptação das normas às novas realidades) e a Teleológica (fundada por Von Ihering, cuja finalidade é a proteção dos interesses, que, quando em conflito, deveriam ser conciliados).

Em defesa a uma ainda maior liberdade de atuação ao intérprete da norma jurídica surgem as seguintes escolas: Escola de Livre Pesquisa Científica Francesa (inspirada na obra de Gény, cria técnicas de supressão de lacunas, aparentemente adotada pelo art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), a Escola do Direito Livre (o intérprete deve valer-se também da sociologia quando a lei não for adequada e justa), a Escola Sociológica Americana (pondera valores sociais na aplicação da norma) a Escola da Jurisprudência de Interesses (o intérprete deve investigar quais os interesses antagônicos e privilegiar aquele que o legislador procuvou prevalecer), a Escola Realista Americana (criada por Jerome New Frank, defende que a sentença nada mais é que a concretização dos traços intelectuais e temperamentais do juiz), a Escola Egológica (determina que o juiz deve julgar de acordo com sua ciência e consciência) e a Escola Vitalista do Direito (na aplicação no Direito leva em consideração as convicções da sociedade em determinado momento histórico).

Por fim surgiu a Teoria da Argumentação, a qual possui um conjunto de técnicas discursivas que permitem aumentar a adesão das mentes às teses que se apresentam. Escapando às certezas do cálculo. Esta teoria defende que a argumentação pressupõe a fundamentação racional que justifica o agir humano.


3. Classificação da interpretação

Rico e diversificado é o campo que trata das classificações doutrinárias acerca da interpretação. Ao conceituá-las alguns doutrinadores chegam à beira da confusão.

Mister faz-se evidenciar a coerência na classificação adotada por Alice Monteiro de Barros, já citada anteriormente:

Segundo a ilustríssima doutrinadora, "quanto ao agente ou à origem, a interpretação pode ser autêntica ou pública (Cunha Gonçalves e Caio Mario), quando realizada pelo órgãos do poder público (Legislativo, Executivo e Judiciário)", as demais interpretações são denominadas privadas ou doutrinárias.

Considerando seus elementos ou sua natureza, a interpretação pode ser denominada como: literal ou gramatical (análise morfológica e sintática do texto), lógica ou racional (leva em consideração os motivos que fundamentaram a edição da norma), histórica (análise da evolução histórica da norma) e sistemática (persegue as idéias gerais inspiradoras da legislação em conjunto).

"Quanto ao resultado ou aos efeitos, a interpretação pode ser: a) declarativa ou enunciativa, b) ab-rogante; c) extensiva; d) restritiva."

Seria declarativa quando o legislador restringe-se à determinar o sentido exato das palavras. Seria ab-rogante quando, num conflito de preceitos, prevalece a que tiver maior grau de importância. Seria extensiva ou ampliativa quando vai além do que o determinado pela norma, e a restritiva seu inverso, quando limite o campo alcançado pela norma.

Já em relação ao seu fim a interpretação seria teleológica, à qual foi inclusive adotada pelos artigos 5º da Lei de Introduçaõ ao Código Civil e 8º da Consolidação das Leis do Trabalho: o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum e do interesse público.


4. Hermenêutica constitucional e o Direito do Trabalho

A Constituição é um sistema de normas que confere unidade a todo o ordenamento jurídico, disciplinando de forma unitária e congruente as estruturas fundamentais da sociedade e do Estado.

A hermenêutica constitucional tem características que a torna especial, pois determina regras gerais de interpretação, as quais devem ser seguidas em todos os ramos do Direito, inclusive pelo Direito do Trabalho.

Maurício Godinho [06] resume com perfeição a atual situação da hermêutica jurídica evidenciada não só Direito do Trabalho como também por todos os demais ramos do Direito:

Um dos grandes desafios do moderno Direito do Trabalho Brasileiro é realizar mais plenamente em seu interior a dimensão constitucional construída em 1988. A hermenêutica constituicional desde a Carta Magna de 1988, ganhou relevância destacada no plano material e processual trabalhistas (e nos demais ramos, evidentemente).

Alguns obstáculos têm se apresentado nas últimas décadas com respeito à esse tema. De um lado o manejo do ultrapassado critério de análise de eficácia das normas constituicionais (dividido em autoexecutáveis e não autoexecutáveis). Ou de moderno critério que as divide em eficácia contída e eficácia limitada.

De outro lado a recusa a conferir efeitos jurídicos reais a função normativa dos princípios jurídicos.

Acrescenta-se ainda, a insuficiente utilização do critério hermenêutico moderno intitulado interpretação normativa em conformidade com a Constituição, que evita as equações as vezes excessivamente formais, rigorosas, excludentes e maniqueístas das dualidades inconstitucionalidade/constitucionalidade, revogação/recepção, em benefício de uma linha interpretativa agregadora dos comandos impostos pela Constituição com as dimensões compatíveis e/ou adequaveis das normas infraconstitucionais confrontadas (tal interpretação conforme foi criada por Paulo Bonavides).

Por fim, e ainda insuficiente construção de uma sólida jurisprudência de valores constitucionais, de conteúdo e direção essencialmente sociais, na linha dos princípios, regras, fundamentos e valores que melhor caracteriza a Carta Magna.

Em todo o mundo, após os horrores vivenciados durante a Segunda Guerra Mundial, consolidou-se no pensamento jurídico-político uma perspectiva de valorização que se convencionou chamar de direitos fundamentais.

Há quem diga que a expressão "direitos fundamentais" é sinônima da expressão "direitos humanos". Porém a corrente majoritária segue sustentando a diferenciação.

O mais importante critério de distinção tem sido o critério do plano ou esfera de positivação, ou seja, direitos humanos são direitos reconhecidos e positivados pela ordem jurídica internacional, enquanto direitos fundamentais são direitos positivados no plano ou na ordem jurídica constitucional.

Essa tendência a valorização dos direitos fundamentais ocasiona um distanciamento do dogmatismo formal, que marcou o constitucionalismo originário, conduzindo a ordem jurídica ao neoconstitucionalismo.

O neoconstitucionalismo consiste no reconhecimento da força normativa dos princípios e dos direitos fundamentais, consagrado pela Carta Constitucional de 1988, os quais determinam um "dever-ser" a ser seguido por todos os ramos e esferas do Direito.

Segundo essa corrente moderna, neoconstitucionalista, não devemos interpretar as normas constitucionais a partir das leis. Pelo contrário, a interpretação deve vir sempre de cima para baixo, ou seja, da Constituição para as leis e não das leis para a Constituição.

Aplicando-se essa interpretação moderna ao Direito do Trabalho afirmamos que primeiramente devemos observar se estão sendo obedecidos os direitos fundamentais para depois interpretar-se a norma trabalhista.


5. Breve resumo acerca da interpretação neoconstitucionalista

Segundo uma perspectiva objetiva, os direitos fundamentais traduzem valores básicos e consagrados na ordem jurídica, devendo orientar qualquer aplicação ou interpretação do ordenamento jurídico; e, segundo uma perspectiva subjetiva, configuram direitos concretos, garantidores de vantagens aos seus titulares.

Apesar do crescente fortalecimento do neoconstitucionalismo, os direitos fundamentais tradicionalmente eram aplicados apenas de forma vertical, limitando a atuação do Estado.

No entanto, vem-se ventilando a possibilidade de aplicação horizontal destes direitos fundamentais, tema que suscita controvérsias.

Segunda a teoria americana do state action os direitos fundamentais não possuem eficácia horizontal, posto que o Estado seria o único sujeito passivo desses direitos, não sendo aplicáveis às relações privadas.

A teoria da eficácia indireta ou mediata determina que os direitos fundamentais são aplicáveis às relações privadas mas apenas de forma indireta, ou seja, voltada ao legislador, o qual deverá implementar os direitos fundamentais, chamados por Alexy de "direito à prestações", e não poderá editar lei que viole os direitos fundamentais, o denominado "direito de defesa".

A teoria da eficácia direta ou imediata, adotada pela CRFB através do §1º, art 5º, determina que o juiz deve aplicar os direitos fundamentais diretamente na solução do caso concreto, sem a necessidade de intervenção do legislador. Neste sentido verbetes 1 e 2 da Jornada de Trabalho.

Assim, a hermenêutica constitucional dos direitos fundamentais se realiza para a promoção da máxima realização constitucional. Direitos fundamentais constituem regras, princípios e valores constitucionais que, ao serem concretizados, necessitam de uma justificação externa do raciocínio jurídico, pautada na razoabilidade.

Willis Santiagos Guerra Filho [07], nesse passo adotando classificação bastante aceita, apontas três subprincípios, espécies do gênero proporcionalidade, os quais visualizam elementos, conteúdos parciais para a efetivação da ponderação de interesses:

a) máxima do sopesamento ou princípio da proporcionalidade em sentido estrito; b) princípio da adequação; c) princípio da exigibilidade ou máxima do meio mais suave.

Interpretando estes três subprincípios conclui-se que diante de uma impossibilidade de obtenção de um denominador comum aos bens jurídicos em conflito, haverá de observar que a mitigação que se faça a qualquer deles deverá ser a menor possível; as restrições a um direito fundamental só devem ocorrem quando forem inevitáveis, e apenas serão lícitas quando na exata medida do necessário à harmonização pretendida. Não será legítima a decisão quando, a pretexto de resolver o conflito, elimine um dos direitos fundamentais ou lhe retire a substância elementar.

Assim podemos concluir que a ponderação de interesses não se trata de sentimento jurídico, mas sim de uma técnica dogmática a qual só deve ser aplicada quando extremamente necessária.

Mister se faz o respeito a todos os direitos fundamentais pelo intérprete no momento da subsunção.


6. Interpretação do Direito do Trabalho

Apesar de alguns doutrinadores da esfera trabalhista já explanarem em seus manuais explicações acerca dos métodos de interpretação constitucional, apenas os trazem de maneira isolada, como se fossem técnicas a serem aplicadas apenas à Constituição.

Tais doutrinadores parecem ignorar o fato de a Constituição ser o ápice de todo o ordenamento jurídico.

Felizmente existem alguns doutrinadores que, sempre preocupados com as novidades do mundo jurídico, já evidenciam a necessidade de aplicação da interpretação neoconstitucionalista também ao Direito do Trabalho. Neste sentido evidencia Vólia Bomfim [08]:

O universo jurídico deve ser sempre analisade de forma holística, em seu conjunto, em conformidade com o filtro constitucional, no sentido de que nenhuma lei está livre de ser interpretada por qualquer uma das técnicas apresentadas, porque todas têm pontos importantes, com vantagens e desvantagens. A grande beleza do Direito está no fato de comportar diversas formas de interpretar, como um admirador de uma obra de arte que impregna o ar com sua forma de olhar a tela. (grifo nosso)

Assim como determina o neoconstitucionalismo, as leis devem ser interpretadas a partir da Constituição e não o contrário. As leis não podem submeter a Constuição ao seu livre arbítrio.

No âmbito do Direito do Trabalho, tal ofício torna-se mais fácil e prazeroso na medida que sua interpretação deve levar em consideração a finalidade pela qual foi criado, ou seja, a proteção ao trabalhador. E privilegiando tal finalidade estar-se-á consequentemente concretizando os direitos fundamentais expressos na Constituição de 1988.

Ao interpretar normas trabalhistas deve-se levar em consideração pelo menos dois princípios essenciais: o princípio do in dubio pro misero e o princípio da norma mais favorável.

A aplicação do princípio do in dubio pro misero só se torna possível nas normas que comportam mais de uma interpretação, ou seja, normas de caráter polissêmico. Normas de interpretação uníssona não são hábeis à aplicação do referido princípio.

Segundo o princípio do in dubio pro misero, dentre as possíveis interpretações aplicáveis ao texto da norma deve-se optar sempre por aquela que maior privilégio confere aos interesses trabalhador, parte hipossuficiente da relação de trabalho.

Entretanto, ao se interpretar conforme o interesse do trabalhador, não é permitido alterar o conteúdo expresso da lei. Até mesmo porque, se assim fosse, tratar-se-ia de uma intervenção extremamente drástica na esfera de competência do legislador – mais drástica do que a própria declaração de nulidade dessa mesma lei. Tal hipótese permitiria ao ente legiferante a possibilidade de uma nova normatização da matéria, traindo, portanto, a eminente natureza de sua tarefa primitiva, qual seja, interpretar a norma já existente (e não criar uma nova norma).

No tocante ao princípio da norma mais favorável há a determinação de que, existindo mais de uma norma aplicável ao caso em concreto, deve-se optar por aquela que melhor favoreça o trabalhador.

Segundo a ilustre doutrinadora Vólia Bomfim, já ciatada anteriormente, para a determianção de qual seria a norma mais favorável devemos utilizar critérios de comparação segundo as teorias atomista, do conglobamento e intermediárias:

Atomistas é o critério de interpretação e integração de normas que leva em conta o benefício isolado contido em cada norma, aglutinando-os, acumulando-os numa só. A segunda teoria (conglobamento) se preocupa com a norma como um todo, respeitando seu conjunto, Aplica, exclusivamente, após o confronto, aquele que for mais favorável ao trabalhador, em seu bloco, ignorando a outra. A teoria intermediária, por sua vez, não faz a interpretação somando os benefícios de ambas as normas, relativas ao mesmo grupo de matéria, nem ignorando uma norma em prol da outra, em seu conjunto. Seleciona os institutos existentes entre as duas normas para cotejá-los e, a partir daí, escolher o mais benéfico de cada norma para aplicá-la ao trabalhador.

Nestes termos, no conflitos entre normas válidas e favoráveis, devemos adotar uma das três teorias supracitadas para resolver o conflito. Vale ressaltar que a jurisprudência tem adotado a teoria do conglobamento, mas a doutrina prefere a teoria intermediária.

Isto posto, na interpretação das normas trabalhistas devemos primeiramente aplicar o filtro constitucional e posteriormente a norma ou a interpretação que melhor se adapte aos interesses do trabalhador.

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Juliana Marques Teixeira. Interpretação do Direito do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2815, 17 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18688. Acesso em: 22 dez. 2024.

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