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A República dos procuradores

Agenda 01/09/2000 às 00:00

Os fatos aqui narrados são amedrontadores. A sociedade não se deu conta mas a Nação corre o risco de tornar-se uma República de procuradores, e maus procuradores. Agora, determinados membros do Ministério Público do Trabalho extrapolam no exercício de suas prerrogativas constitucionais. Aliás, situação que se prolonga no tempo e que a sociedade, aceita, sob o jugo do medo. Vivemos sob o Estado-Terror, onde o inocente deve provar à sociedade que o é.


Cito um fato recente. Em documento devidamente constituído, termo lavrado perante a Procuradoria do Trabalho da 15ª Região, inquérito civil 08145-0225/99-08, na data de 10 de maio de 2000, o Ministério Público do Trabalho, pasmem, sem o devido processo legal, dando as costas ao Poder Judiciário e ignorando os mais elementares princípios do Direito, simplesmente, num ato só: 1- avaliou, 2- analisou, 3- julgou e por fim condenou trabalhadores de cooperativa de trabalho legalmente constituída por prática de ato ilegal, declarando-a, ainda, ilegítima.

Decorrente desse estupro jurídico, presunção de ilegalidade e ilegitimidade, o Ministério Público atirou os trabalhadores cooperados, da pior maneira possível, à avaliação negativa da sociedade, já que o mencionado termo de audiência é público. Toda conclusão daquela procuradoria decorreu da justificativa, não menos aberrante, de que há contra os trabalhadores cooperados procedimento administrativo em andamento a fim de apurar supostas irregularidades no campo das relações de trabalho, e que, por esse motivo, mera investigação, a sua cooperativa seria ilegítima e ilegal. Os danos decorrentes desse inconcebível pré julgamento, para não dizer preconceito (uma vez que julgamento só há na Justiça e pela Justiça), já são sentidos pelos mencionados trabalhadores cooperados. Isso porque sua cooperativa está sendo preterida no mercado. Pior castigo do que ficar sem trabalho não há.

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Não bastassem os irreparáveis danos provocados por esse aberratio jurídico, os trabalhadores dessa mesma cooperativa ainda sentiram-se seriamente atingidos em sua honra, uma vez que lhes foi imputada participação em sociedade ilícita, ilegítima, como se criminosos fossem, sendo que sua cooperativa observou todos os preceitos constitucionais e infraconstitucionais de formalização e funcionamento.


Como facilmente se conclui, o princípio de presunção de inocência nesse caso foi jogado na lata do lixo pelos procuradores, muito embora tal presunção seja literalmente prevista no artigo XI: 1 da Declaração dos Direitos do Homem, sem mencionar o artigo X da mesma Declaração onde está expressamente previsto que "todo homem tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial..."

Não bastasse o atentado à dignidade da pessoa humana, conseqüência das arbitrariedades cometidas pelo MP, que não são poucas, atenta ainda esse órgão contra o Estado Democrático de Direito quando limita o exercício constitucional da livre iniciativa, garantido no artigo 1º inciso IV da Carta Magna, ao restringir a contratação de cooperativas de trabalho legal. Pior castigo à sociedade como um todo, não há.

Não bastassem os fatos até aqui narrados sabemos que cabe somente ao Poder Judiciário, em especial à injustamente atacada Justiça do Trabalho, julgar dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores (artigo 114 da Constituição Federal). Mas como se observa, diante da "sentença prévia" proferida pelo referido ministério, na mais deslavada manifestação de oposição à ordem pública, pouco lhe importa a figura do magistrado, pois para esses senhores, supostos procuradores de Deus na terra, os juízes e a Justiça não passam de fantoches.

Sobre o autor
Eduardo Pastore

advogado trabalhista em São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PASTORE, Eduardo. A República dos procuradores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 45, 1 set. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1891. Acesso em: 23 dez. 2024.

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