Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Acesso à Justiça

Exibindo página 3 de 4
Agenda 21/06/2011 às 12:21

6. SUPERAÇÃO DOS OBSTÁCULOS AO ACESSO À JUSTIÇA

A questão do acesso à Justiça ganha relevância no Brasil após a Constituição Federal de 1988 que conferiu garantias ao pleno acesso à Justiça, como a criação da Defensoria Pública e a ampliação dos legitimados a defender os interesses coletivos.

Assim, sob a ótica constitucional, descreveremos nesse capítulo alguns instrumentos criados pelo legislador, amparado na doutrina, na busca de soluções para os entraves ao acesso à Justiça.

6.1. ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL E GRATUITA AOS CARENTES

A assistência judiciária tem sua origem nas Ordenações do Reino desde 1603 (vide capítulo 4.1), mas somente com a Constituição de 1988 assegurou-se em seu artigo 5º, inciso LXXIV que: "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".

Nota-se, portanto, que a Constituição não garantiu apenas a assistência judiciária e o acesso ao juízo, mas ampliou esse amparo a assistência jurídica integral e gratuita, ou seja, garantiu, também, a assessoria jurídica preventiva e extrajudicial, bem como a isenção "de todas as despesas que se fizerem necessárias para o efetivo acesso à justiça" [128].

Nesse mesmo diapasão, a Constituição garantiu a gratuidade aos pobres do registro de nascimento, da certidão de óbito (art. 5º, inc. LXXVI), nas ações de habeas corpus e habeas data (art. 5º, inc. LXXVII); além, da isenção do pagamento de taxas para o exercício do "direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder" (art. 5º, inc. XXXIV, alínea "a") e para "a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal" (art. 5º, inc. XXXIV, alínea "b").

Ademais, a assistência judiciária é basicamente regulada pela Lei nº 1060 de 1950 e para sua concessão basta uma simples afirmação de que o indivíduo não tem condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família (art. 4º); e em seu artigo 2º estabelece quem são seus os beneficiários:

"Art. 2º. Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no país, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou do trabalho.

Parágrafo único. - Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família".

Quanto a sua prestação, a Constituição prevê que é indispensável o advogado para a administração da justiça, por isso a assistência judiciária tem sido prestada pelos Estados através das Defensorias Públicas ou Procuradorias do Estado, conforme dispõe o artigo 134 da Constituição Federal: "A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV"; e pelos "convênios realizados com as seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil, que elaboram, após habilitação prévia, listas de advogados para as várias comarcas" [129].

No tocante a Defensoria Pública, somente com a edição da Lei Complementar nº 80 de 1994 que organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, e dá outras providências é que a instituição sai da mera abstração do texto constitucional para ser colocada em prática com a missão de atender aos necessitados em todos os seus graus. No entanto, muitos Estados ainda não instalaram as Defensorias Públicas, mesmo já possuindo legislação estadual nesse sentido [130].

Desta forma, o legislador tenta minimizar o problema decorrente do custo do processo através da assistência judiciária gratuita, destacando-se o papel determinante da Defensoria Pública e de seu fortalecimento para o acesso à Justiça da população carente.

6.2. EFETIVIDADE DA TUTELA DOS DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

A complexidade da sociedade contemporânea com seus conflitos de massa [131] dá ensejo a direitos transindividuais, por isso vêm à baila as formas e mecanismos para tutelá-los quando lesados.

6.2.1. AÇÃO CIVIL PÚBLICA

A Lei nº 7.347 de 1985 disciplina a Ação Civil Pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; reconhecida como ação constitucional pela Constituição de 1988 em seu artigo 129, inciso III [132]; em consonância com as disposições do Código de Defesa do Consumidor que conceitua os direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos em seu artigo 81 [133].

Possuem legitimidade para propor essa ação o Ministério Público, a Defensoria Pública, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e as autarquias, empresas públicas, fundações e sociedades de economia mista, bem como as associações que estejam constituídas há pelo menos um ano e incluam, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (art. 5º e incisos da referida Lei).

Ressalte-se que em relação ao requisito da pré-constituição das associações, este, segundo o artigo 5º, §4º da lei: "poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido".

Frise-se que a lei obriga o Ministério Público a atuar como fiscal da lei se não intervier como parte (art. 5º, §1º) e possibilita que ele ou qualquer outro legitimado assuma a titularidade da ação em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada (art. 5º, §3º). Além de permitir, ainda, o litisconsorte facultativo de qualquer das partes (art. 5º, §2º).

No que concerne as custas, emulamentos, honorários pericias e quaisquer outras despesas processuais, a lei prevê que não haverá adiantamento e nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé (art. 18), tudo em prol da efetividade do acesso a defesa dos interesses coletivos.

Sobretudo, o aspecto mais relevante da lei está no âmbito da validade da coisa julgada [134] que terá efeito erga omnes quando o pedido não for julgado improcedente por insuficiência de provas, conforme dispõe do art. 16 da lei:

"Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova".

6.2.2. AÇÃO POPULAR

A Ação Popular está presente no ordenamento jurídico brasileiro desde a Constituição de 1934, sendo regulada pela Lei nº 4.717 de 1965 [135]. Hoje, a ação popular constitucional encontra-se no artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal de 1988, nos seguintes termos:

"LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência".

Destarte, qualquer cidadão tem legitimidade para exercê-la constituindo "manifestação direta da soberania popular consubstanciada no art. 1º, parágrafo único da Constituição: todo poder emana do povo" [136], ou seja, dá a oportunidade do cidadão participar ativamente na vida pública, exercendo "diretamente a função fiscalizadora, que, por regra, é feita por meio de seus representantes nas Casas Legislativas" [137].

Cabe, assim, definir a ação popular constitucional brasileira, segundo José Afonso da Silva, como:

"Instituto processual civil, outorgado a qualquer cidadão como garantia político-constitucional (ou remédio constitucional), para a defesa do interesse da coletividade, mediante a provocação do controle jurisdicional corretivo de atos lesivos do patrimônio público, da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural" [138].

Além do que, cumpre salientar que para retirar o entrave financeiro e garantir maior tutela aos interesses coletivos, assim como na Ação Civil Pública, o cidadão, legitimado para propô-la, está isento de custas e do ônus de sucumbência se não agir de má-fé.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

6.2.3. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO

O mandado de segurança coletivo é um novo instituto criado pela Constituição de 1988, previsto em seu artigo 5º, inciso LXX, in verbis:

"LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;

LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

a) partido político com representação no Congresso Nacional;

b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados;"

De tal sorte que, o mandado de segurança coletivo possibilita que partidos políticos, sindicatos, entidades de classes ou associações defendam interesses coletivos, difusos ou individuais homogêneos, estendendo, assim, a "legitimidade para agir a uma entidade ou instituição representativa de uma coletividade" [139].

6.2.4. MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO

O mandado de injunção é outro remédio constitucional previsto no artigo 5º, inciso LXXI, da Constituição de 1988, senão vejamos: "LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania".

O mandado de injunção tem por finalidade precípua conferir imediata aplicabilidade à norma constitucional que garante direitos, liberdades e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, em virtude do Poder Público se manter inerte, omisso, na expedição de normas regulamentadoras [140].

Com isso, o mandado de injunção coletivo, nada mais é do que a ampliação da legitimidade ad causam para impetrar tal instituto às associações e aos sindicatos, uma vez que a Constituição da República expressamente autoriza essa representação, nos seguintes termos, respectivamente: artigos 5º, inciso XXI: "as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente"; e 8º, inciso III: "ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas".

6.2.5. OUTROS INSTRUMENTOS PROCESSUAIS CRIADOS PARA A GARANTIA DOS DIREITOS INDIVIDUAIS, COLETIVOS E DIFUSOS

Além dos instrumentos mencionados, outros, segundo a Carta Magna de 1988, merecem ser citados como meios para se obter a efetividade do acesso amplo à Justiça.

Portanto, retira-se da Constituição Federal de 1988: a) o habeas corpus, previsto no artigo 5º, inciso LXVIII: "conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder"; b) o mandado de segurança individual (art. 5º, inc. LXIX); c) o habeas data, disposto no artigo 5º, inciso LXXII: "conceder-se-á "habeas-data": a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo"; e d) a ação direta de inconstitucionalidade (art. 102, inc. I, alínea "a", primeira parte), a ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, inc. I, alínea "a", segunda parte), e a argüição de descumprimento de preceito fundamental (art. 102, §1º).

6.3. AVANÇOS TECNOLÓGICOS

Com o surgimento da informática, dos computadores e da internet, facilitou-se a transmissão de dados e informações, sendo que hoje, em um mundo globalizado, essa transmissão é feita quase que instantaneamente, em tempo real.

Ocorre que o Poder Judiciário não conseguiu acompanhar essa revolução tecnológica, e a informática ainda é pouco utilizada, pois é notório a ausência de equipamentos nos fóruns brasileiros, ou quando há estão obsoletos e ultrapassados. Mas o Judiciário caminha lentamente para sua modernização, porquanto, segundo Nilson Naves: "nenhuma instituição que, nos dias correntes, deseje cumprir sua missão a contento pode ficar indiferente aos caminhos abertos pelos avanços tecnológicos" [141].

Nas lições de Luiz Guilherme Marinoni:

"Em vista do avanço da tecnologia e em especial da informática, é dever do Poder Judiciário aparelhar-se de modo a facilitar a atuação dos advogados. O acesso a informação sobre a situação em que se encontram os feitos, por exemplo, deve ser totalmente informatizado, permitindo que o advogado possa obter informações de modo mais simples e seguro" [142].

Assim, destacam-se alguns benefícios que tecnologia pode propiciar a prestação jurisdicional. São eles: a) o barateamento do processo; b) maior agilidade nos trâmites processuais, pois permite uma comunicação rápida entre as partes e o juízo, com o mínimo de custo; e c) a diminuição dos espaços físicos, pois, somado a falta de aparelhagem do Poder Judiciário, a alta burocracia e o excesso de formalismo exigem espaços amplos para acondicionar os processos, ainda, de papéis, pois o arquivamento é necessário para se garantir a segurança jurídica das decisões.

Ademais, vale mencionar que o legislador infraconstitucional já elaborou lei, Lei nº 11.419 de 2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial no âmbito civil, penal e trabalhista, bem como dos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição, todavia faltam recursos para aparelhar o Poder Judiciário como se deve.

6.4. MEIOS ALTERNATIVOS DE PACIFICAÇÃO SOCIAL

O Estado reinava quase que, exclusivamente, absoluto no exercício da função pacificadora, através de seu poder jurisdicional, negando a autotutela e pouco estimulando a autocomposição. Ocorre que o Estado vem falhando na sua missão pacificadora, principalmente, devido à demora na prestação da justiça, direito este garantido pela Carta de 1988, em seu art. 5º, inciso LXXVIII: "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".

Assim, aliado aos outros problemas enfrentados nesse estudo, a morosidade da prestação jurisdicional é fator de angústia e infelicidade pessoal, por isso, "vai ganhando corpo a consciência de que, se o que importa é pacificar, torna-se irrelevante que a pacificação venha por obra do Estado ou por outros meios, desde que eficientes" [143], logo, essas dificuldades têm levado os juristas a excogitar meios alternativos para a solução dos conflitos, representados particularmente pela conciliação e pelo arbitramento [144].

O enfoque, principal, dessas vertentes alternativas, segundo Ada Pellegrini Grinover e outros, é a desformalização do processo na busca da pronta solução aos litígios, constituindo fator de celeridade [145], obviamente, não se esquecendo pela busca do efetivo acesso à ordem jurídica justa.

A conciliação ganha maior destaque nos dias de hoje, conforme se verifica no Código de Processo Civil que atribui ao juiz, no artigo 125, inciso IV, o dever de "tentar, a qualquer momento, conciliar as partes", além do que possibilita ao juiz, antes do saneamento do processo, verificando tratar-se de causa que versa sobre direitos disponíveis que admitam transação, designar audiência preliminar a fim de obter a conciliação entre as partes (art. 331). O Código de Processo Civil reforça, ainda, a tentativa de conciliação antes da audiência de instrução e julgamento (art. 448).

Como diz Luiz Guilherme Marinoni sobre os escopos da conciliação:

"Avulta, no entanto, a sua finalidade de pacificação social, pois a conciliação permite que as causas mais agudas do litígio sejam consideradas e temperadas, viabilizando a eliminação do conflito no plano sociológico. Este efeito é importante na atual sociedade de massa, em que se sucedem pequenos conflitos nas relações de vizinhança, consumo etc., situações em que a coexistência é duradoura no tempo e fundamental a convivência cordial entre as pessoas fundamental" [146].

Dentro dessa seara, encontram-se os Juizados Especiais que tiveram suas raízes nos "Conselhos de Conciliação e Arbitramento, instituídos pelos juízes gaúchos; depois, Juizados Informais de Conciliação, criados em São Paulo para tentar somente a conciliação de pessoas em conflito sem nada julgar em caso de não conseguir conciliá-las" [147].

Os Juizados Especiais ganharam status constitucionais com Carta Magna de 1988 nos artigos 24, inciso X, e 98, inciso I, nos termos seguintes, respectivamente:

"Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

X - criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas;"

"Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:

I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau".

Atualmente, os Juizados Especiais estão regulados pela Lei nº 9.099 de 1995, e são orientados, conforme o artigo 2º, pelos "critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação"; na esfera federal instituiu-se os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal com a Lei nº 10.259 de 2001, que segundo seu artigo 1º aplica-se a Lei nº 9099/95 no que couber.

Assim, os Juizados Especiais buscam romper com o formalismo processual adotando procedimentos mais simples, ágeis e baratos, eliminando, por exemplo, o pagamento de custas, taxas ou despesas em primeiro grau de jurisdição (art. 54 da Lei 9099/95) e a imprescindibilidade de patrocínio técnico, atribuindo capacidade postulatória as próprias partes nas causas de valor até vinte salários mínimos (art. 9º da Lei 9099/95); ampliando o uso da equidade nos julgamentos, pois possibilita ao Juiz, nos termos do artigo 6º da Lei 9099/95 adotar "em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum"; e possibilita a realização de atos processuais em horário noturno (art. 13 da Lei 9099/95), uma vez que, segundo José Renato Nalini, o Judiciário é serviço público essencial, e como tal, precisa funcionar sem interrupção [148].

Outro aspecto importante a ser ressaltado que contribui para facilitar o acesso à Justiça, segundo Luiz Guilherme Marinoni, é o fato de que por ser o Juizado menos burocrático e informal que os outros órgãos do Poder Judiciário acaba sendo "mais simpático ao cidadão comum, que deixa de se sentir intimidado ao entrar nos salões da administração da justiça" [149].

Quanto à arbitragem, muito utilizada no âmbito internacional, porém de inexpressiva atuação no Brasil, tevê seus contornos traçados pelo Código Civil de 1916, mas só recentemente através da Lei nº 9099/95, nos artigos 24 a 26, e, hoje, regulada em lei própria pela Lei nº 9307 de 1996 que revogou as disposições dos artigos 1.037 a 1.048 da Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916, Código Civil Brasileiro; e os arts. 101 e 1.072 a 1.102 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, é que a arbitragem "oferece esperança de vir a ser utilizada efetivamente como meio alternativo para a pacificação de pessoas em conflito" [150].

A arbitragem tem por principio básico a autonomia da vontade das partes que poderão livremente eleger qualquer pessoa capaz e de confiança para dirimir a controvérsia (art. 13 da Lei 9307/96), e, ainda, poderão escolher as regras de direito que serão aplicadas, desde que não violem os bons costumes e a ordem pública (art. 2º, §1º da Lei 9307/96), bem como convencionar que se realize com base nos princípios gerais do direito, no usos e costumes e nas regras internacionais de comércio (art. 2º, §2º da Lei 9307/96).

Para melhor elucidação, cumpre destacar o esboço delineado por Antônio Carlos Cintra e outros da dinâmica do juízo arbitral, objeto da Lei nº 9307/96:

"a) convenção de arbitragem (compromisso entre as partes ou cláusula compromissória inserida em contrato: lei cit., art. 3º); b) limitação aos litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1º); c) restrições à eficácia da cláusula compromissória inserida em contratos de adesão (art. 4º,§2º); d) capacidade das partes (art. 1º); e) possibilidade de escolherem as partes as regras de direito material a serem aplicadas na arbitragem [...]; f) desnecessidade de homologação judicial da sentença arbitral (art. 31); g) atribuição a esta dos mesmos efeitos, entre partes, dos julgamentos proferidos pelo Poder Judiciário (valendo inclusive como título executivo, se for condenatória: art. 31); h) possibilidade de controle jurisdicional ulterior, a ser provocado pela parte interessada (art. 33, caput e §§); i) possibilidade de reconhecimento e execução de sentenças arbitrais produzidas no exterior (arts. 34 e ss). Mas os árbitros,não sendo investidos do poder jurisdicional estatal, não podem realizar a execução de suas próprias sentenças nem impor medidas coercitivas (art. 22, §4º)" [151].

6.5. REFORMAS NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

A Lei nº 5.869 de 1973 instituiu o Código de Processo Civil vigente, e desde então inúmeras leis de forma direta ou indireta vêm modificando o processo para atender as reais necessidades da sociedade moderna, exigente por celeridade e efetividade na prestação jurisdicional, não cabendo nesse sucinto estudo descrevê-las todas, mas merecem destaque as mais recentes com ênfase no anteprojeto do Novo Código de Processo Civil, senão vejamos:

a) Lei nº 11.187 de 2005 alterou dispositivos do Código relativos ao recurso de agravo, basicamente, limitando a interposição do agravo de instrumento, muito utilizado como medida protelatória que abarrotava as instâncias superiores, estabelecendo que das decisões interlocutórias caberão agravo na forma retida, não paralisando o processo até decisão final do juízo inferior;

b) Lei nº 11.232 de 2005 criou a fase de cumprimento de sentença e revogou dispositivos relativos à execução fundada em título judicial, essencialmente, transformando a execução de titulo judicial, que era ação autônoma, em uma fase do processo cognitivo, sendo chamado, segundo a doutrina, de um "processo sincrético" [152], em que se reúnem na mesma relação jurídica processual o processo de conhecimento e de execução;

c) Lei nº 11.276 de 2006, alterou vários dispositivos do Código, especificamente, visando barrar recursos protelatórios e uniformizar a jurisprudência, introduzindo o §1º do artigo 518 em que o juiz pode não receber o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal;

d) Lei nº 11.277 de 2006 incluiu no Código o artigo 285-A em que o juiz, quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá dispensar a citação e proferir sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada, privilegiando a celeridade processual;

e) Lei nº 11.280 de 2006, modificou diversos dispositivos do Código, destacando-se a criação do §5º no artigo 219 do Código, que estabeleceu o pronunciamento de ofício do juiz quanto à prescrição;

f) Lei nº 11.418 de 2006 acrescenta ao Código dispositivos que regulamentam o §3º do art. 102 da Constituição Federal, especificamente, visando limitar os recursos ao Supremo Tribunal Federal introduziu o requisito da repercussão geral ao Recurso Extraordinário [153].

Ademais, na tentativa de se alcançar o efetivo acesso à Justiça, tramita no Congresso Nacional projeto para instituir um novo Código de Processo Civil que busca dar maior simplicidade nos procedimentos e celeridade no desfecho das lides, tendo como pilares 5 (cinco) objetivos:

"1) estabelecer expressa e implicitamente verdadeira sintonia fina com a Constituição Federal; 2) criar condições para que o juiz possa proferir decisão de forma mais rente à realidade fática subjacente à causa; 3) simplificar, resolvendo problemas e reduzindo a complexidade de subsistemas, como, por exemplo, o recursal; 4) dar todo o rendimento possível a cada processo em si mesmo considerado; e, 5) finalmente, sendo talvez este último objetivo parcialmente alcançado pela realização daqueles mencionados antes, imprimir maior grau de organicidade ao sistema, dando-lhe, assim, mais coesão" [154].

Assim, com base nesses objetivos, cumpre pontuar as principais reformas do projeto do Novo Código de Processo Civil, segundo disposto em sua Exposição de Motivos:

a)Incluirá expressamente princípios constitucionais;

b)Quanto ao princípio do contraditório, este, segundo norma expressa, deverá ser respeitado mesmo estando o juiz diante de matéria de ordem pública;

c)O depósito de quantia relativa às multas referentes ao cumprimento de obrigação in natura ou da ordem judicial deverão incidir de imediato, só podendo ser levantado depois do trânsito em julgado ou quando esteja pendente agravo de decisão que nega seguimento ao recurso especial ou extraordinário, para dar maior efetividade a norma;

d)Quanto à publicidade, preverá regra de que todos os recursos devem constar em pauta, para que as partes tenham oportunidade de tomar providências que entendam necessárias;

e)Quanto à segurança jurídica, prezando a uniformidade e estabilidade jurisprudencial o novo Código aduzirá no Livro IV: "A jurisprudência do STF e dos Tribunais Superiores deve nortear as decisões de todos os Tribunais e Juízos singulares do país, de modo a concretizar plenamente os princípios da legalidade e isonomia". Por outro lado, assegurando a mudança de posicionamento dos Tribunais, expressará: "A mudança de entendimento sedimentado observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando o imperativo de estabilidade das relações jurídicas"; além do que instituirá a possibilidade da modulação dos efeitos dessa mudança: "Na hipótese de alteração da jurisprudência dominante do STF e dos Tribunais superiores, ou oriunda de julgamentos de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica".

f)Reduzirá o prazo decadencial da Ação Rescisória para um ano;

g)Possibilitará "a suspensão do procedimento das demais ações, tanto no juízo de primeiro grau, quantos dos demais recursos extraordinários ou especiais, que estejam tramitando nos tribunais superiores, aguardando julgamento, desatreladamente dos afetados" [155];

h)Criará o incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, "que consiste na identificação de processos que contenham a mesma questão de direito, que estejam ainda no primeiro grau de jurisdição, para decisão conjunta" [156], e será instaurado "perante o Tribunal local, por iniciativa do juiz, do MP, das partes, da Defensoria Pública ou pelo próprio Relator" [157];

i)Prestigiará, ainda, de forma mais intensa, a autocomposição, em que deverá se realizar audiência de conciliação antes de apresentada contestação, devendo o réu comparecer, sob pena de incorrer em ato atentatório à dignidade da justiça;

j)Possibilitará a intervenção do amicus curiae [158] em todos os graus de jurisdição;

k)Mitigará os requisitos de admissibilidade dos recursos interpostos perante os Tribunais Superiores em face de questões relevantes ao aprimoramento do Direito, em consonância com o princípio da instrumentalidade;

l)Extinguirá alguns incidentes, como exemplo: a impugnação ao valor da causa e a concessão do benefício da assistência gratuita; bem como as exceções de incompetências, que serão matérias alegáveis em preliminar de contestação; além do que extinguirá a ação declaratória incidental, ação declaratória incidental de falsidade de documento e o incidente de exibição de documentos;

m)Simplificará as formas de intervenção de terceiros, destacando-se a unificação da denunciação da lide e do chamamento ao processo em um só instituto;

n)Extinguirá, também, as ações cautelares nominadas, bastando à demonstração do fumus boni iuris e do periculum in mora para que a providência pleiteada seja deferida;

o)Delimitará a tutela de urgência [159] e da evidência [160], desaparecendo o livro das Ações Cautelares;

p)O prazo para todos os recursos será uniformizado em 15(quinze) dias, exceto os embargos de declaração;

q)No recurso de apelação será retirado o juízo de admissibilidade em 1º grau;

r)Na execução, se eliminará a distinção entre praça e leilão, assim como a necessidade de duas hastas públicas, sendo que desde a primeira hasta poderá o bem ser alienado por valor inferior ao da avaliação se não tratar-se de preço vil;

s)Extinguirá os embargos de arrematação e tornará a ação anulatória o único meio para se impugnar a arrematação;

t)O agravo retido será extinto, alterando-se o regime de preclusões e as matérias que antes ele atacava serão impugnadas na apelação;

u)Os embargos infringentes deixarão de existir, mas "o relator terá o dever de declarar o voto vencido, sendo considerado parte integrante do acórdão, inclusive para fins de prequestionamento" [161];

v)Retirará a possibilidade jurídica do pedido como uma das condições da ação, dirimindo controvérsia antiga da doutrina, assim, na sua falta o juiz decidirá pela improcedência da ação;

x)Com o escopo de por fim definitivamente a toda controvérsia levada ao Judiciário será criado mecanismos "para que, sendo a ação proposta com base em várias causas de pedir e sendo só uma levada em conta na decisão do 1º e do 2º grau, repetindo-se as decisões de procedência, caso o tribunal superior inverta a situação" [162], retornará o processo ao 2º grau, para que as demais sejam apreciadas; da mesma forma ocorrerá "se se tratar de ação julgada improcedente em 1º e em 2º grau, como resultado do acolhimento de uma razão de defesa, quando haja mais de uma" [163]. Com o mesmo intuito poderão as partes modificar os pedidos e as causas de pedir até a sentença, desde que respeitado o contraditório, bem como o juiz poderá adaptar o procedimento de acordo com as peculiaridades da causa.

Sobre o autor
Luis Henrique Garbellini

Graduado em Direito. Universidade Estadual de Londrina. Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil. Universidade Gama Filho.Pós-graduando em Direiro Civil e Processo Civil. Universidade Gama Filho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GARBELLINI, Luis Henrique. Acesso à Justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2911, 21 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19379. Acesso em: 26 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!