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Democracia e desenvolvimento sustentável nas cidades brasileiras.

Debatendo a Agenda 21, o Orçamento Participativo e os Planos Diretores

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A Agenda 21 como Instrumento de Gestão Participativa das Cidades

A Agenda 21 é um documento derivado de acordo internacional firmado por 179 países, na Conferência Internacional sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada no Rio de Janeiro, em 1992. Tal documento é constituído de 40 capítulos e 115 áreas prioritárias, contendo mais 2.500 recomendações práticas que deve ser seguidas pelos seus signatários.

Entre os vários capítulos da Agenda 21 existe um específico, o de número 28, dirigido à implementação deste compromisso em âmbito local. Conforme a própria justificativa do capítulo, como muitos dos problemas e soluções tratados na Agenda 21 têm suas raízes no ambiente local, a participação e cooperação das autoridades locais será um fator determinante na realização dos objetivos por ela previsto.

Ainda segundo a Agenda 21,

as autoridades locais constroem, operam e mantêm a infraestrutura econômica, social e ambiental, supervisionam os processos de planejamento, estabelecem as políticas e regulamentações ambientais locais e contribuem para a implementação de políticas ambientais nacionais e subnacionais. Como nível de governo mais próximo do povo, desempenham um papel essencial na educação, mobilização e resposta ao público, em favor de um desenvolvimento sustentável (ONU, 1996). – sic

Nesse sentido, cabe a cada autoridade local estabelecer um diálogo com seus cidadãos, organizações da sociedade civil e com setor econômico e aprovar uma Agenda 21 própria da sua comunidade.

Este diálogo deverá ser realizado por meio de consultas e da promoção de consensos, onde as autoridades locais ouvirão todos os atores sociais, obtendo as informações necessárias para a construção coletiva das melhores estratégias. O processo de consultas também deverá aumentar a consciência das pessoas em relação às questões do desenvolvimento sustentável e mobilizá-las para o alcance das metas acordadas.

Outra questão essencial ao bom funcionamento da Agenda 21 consiste na proposição e execução dos programas, políticas, leis e regulamentos das autoridades locais destinados ao cumprimento dos objetivos socialmente pactuados, os quais estarão em permanente processo de revisão e avaliação. Ainda segundo o documento deve ser buscado financiamento para implementação das propostas, como uma forma de concretizá-las.

É importante destacar que o Capítulo 28 ao falar na necessidade de realizar "consultas" junto à população, orienta a promoção de consensos entre os diversos setores da sociedade na formulação de estratégias e ações. Como estes consensos deverão ser obedecidos, as consultas não possuem caráter meramente informativo como pode ser pensado à priori, mas deliberativo. Ou seja, o papel da população na construção e implementação da Agenda 21 vai muito além de uma mera exposição de demandas.

Apesar de propositiva e ampla, a Agenda 21 não goza do mesmo status jurídico impositivo de Leis como o Estatuto das Cidades e Plano Diretor. Sua força consiste na sua legitimidade e no reconhecimento por parte dos setores interessados. Está fundamentada num compromisso ético político, o que não impediu, entretanto, a sua colocação em prática em diversas partes do mundo.

Segundo pesquisa realizada pela ONG canadense "Internacional Council for Local InstituteICLEI" (2002), numa pesquisa intitulada "Second Local 21 Surve", realizada entre 2000 e 2001, mais de 6.000 municípios/localidades de 113 países já desenvolveram a sua Agenda 21. Tais dados, entretanto, já sofreram grande modificações, posto que naquela época nem o governo brasileiro havia ainda aprovado a sua Agenda 21 Nacional, o que ocorreu apenas em 2002.

No Brasil, de acordo com dados do Ministério do Meio Ambiente existiam, em 2007, 544 processos em andamento, mas na época da realização da pesquisa do ICLEI, este número ainda estava reduzido a 2801. Contudo, com a inclusão da Agenda 21 como programa do Pano Plurianual Federal a partir de 2004, e realização de uma consulta pelo Fundo Nacional do Meio Ambiente – FNMA em 2003, além do efeito derivado da aprovação da própria Agenda 21 Brasileira, ocorreu aumento significativo de processos locais.

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Mas a Agenda 21 não pode ser vista apenas como um documento de compromissos, mas sim como um processo político aberto, que objetiva a transformação da sociedade através da construção de uma nova ética político-social que promova uma mudança de hábitos e comportamentos.

Não é um espaço onde se buscam atingir apenas objetivos ambientais e nem representa a elaboração de um plano de governo. Trata-se de um planejamento de futuro, que consiste na elaboração de ações concretas, de curto, médio e longo prazo, com a definição de metas, recursos e responsabilidades (KHOLER, 2003, p. 23)

Segundo Dione Maria Freitas (2003), o processo de elaboração da Agenda 21 inclui em suas etapas uma forma de planejamento pró-ativo, com o protagonismo da população, que é instigada a conhecer, compreender/diagnosticar a sua realidade e a pensar/priorizar ações que sirvam de ponte para a consolidação de objetivos comuns. Rubens Harry Born (2003, p. 23), por sua vez, afirma que "a Agenda 21, em qualquer esfera, constitui-se em processo e instrumento de transformações do conteúdo e das formas de elaborar e gerir políticas de desenvolvimento".

Tal situação coloca a Agenda 21 no centro do debate das políticas públicas voltadas para o desenvolvimento local sustentável, especialmente quando enfocamos a realidade enfrentada pelas cidades em todo o globo.


5. Considerações Finais

Vários são os autores que destacam o poder das atuais tecnologias desenvolvidas pela humanidade, como Giddens, Lipietz, Habermas, Santos, dentre outros, ao ponto alguns afirmarem que vivemos em uma sociedade de risco (Conf. GIDDENS, 1991). Mas, se olharmos com calma, vivemos também em um momento de grandes oportunidades.

A construção de um modelo sustentável de desenvolvimento não pode ser considerado como um caminho fechado, único, determinista, mas sim como um processo aberto, um horizonte em construção, diversificado e indeterminado.

É neste sentido que colocamos o debate realizado neste artigo. O crescimento da esfera local como espaço de protagonismo político, além de várias outras características, sustenta-se na proximidade dos acontecimentos que nesta esfera se realizam em relação às pessoas e ao grau de concretude das ações.

avanço do processo de globalização em curso fragilizou, em alguns aspectos, a estrutura do Estado-nação, motivo pelo qual alguns apontam que a esfera local é o novo ambiente para constituição de alternativas e, muitas vezes, o substituto daquele. Todavia este não é um processo inteiramente real, e uma prova disto é o avanço progressivo de políticas ambientais locais de planejamento impulsionadas por ações do estado nacional, como por exemplo o Estatuto das Cidades ou a Agenda 21 Brasileira, o que demonstra ainda há uma profunda dependência da esfera local do universo do ambiente nacional-estatal.

A prova do vigor do Estado-nação como formulador de políticas públicas pode ser comprovada no processo de desmonte de estruturas que compõem a administração pública durante o período das privatizações neoliberais das décadas de oitenta e noventa em todo o globo.

Mas este vigor do nacional não impede que as ações locais promovam efetivam transformações, inclusive com o fortalecimento da esfera pública. Os diversos processos participativos desenvolvidos no Brasil, como a Agenda 21, a elaboração de mais de 1.700 planos diretores entre 2001 e 2006, além do orçamento participativo, que se espalhou de Porto Alegre para vários recantos do mundo, também são prova de que a esfera local é uma grande formuladora de inovações no campo das políticas públicas, especialmente aquelas voltadas para a radicalidade democrática.

Mas não podemos esquecer que o tempo e o espaço em que vivemos são diferentes daqueles conformados pelas escalas oficiais. Por exemplo, o desenvolvimento de um Plano de Desenvolvimento Local Sustentável em uma cidade dentro de uma bacia hidrográfica não pode deixar de se relacionar com as demais cidades que ocupam o mesmo espaço ambiental, sob pena de as ações por ela realizadas não surtirem os efeitos desejados. O mesmo ocorre quando uma fábrica poluidora é instalada nas margens de um rio, ou ao lado de um condomínio habitacional. Os impactos sempre são divididos com a vizinhança.

A lógica das políticas voltadas para a sustentabilidade e para a democracia participativa nos chama para um novo compromisso, em que devemos reconhecer que não estamos sozinhos neste mundo e que somos apenas passageiros neste amplo universo onde vivemos.


Referências Bibliográficas

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Nota

  1. Na pesquisa do ICLEI haviam apenas 38 processos locais de Agenda 21 no Brasil em 2001.
Sobre os autores
Sandro Ari Andrade de Miranda

Advogado no Rio Grande do Sul, Doutorando em Sociologia.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MIRANDA, Luciana Leal Matos; MIRANDA, Sandro Ari Andrade. Democracia e desenvolvimento sustentável nas cidades brasileiras.: Debatendo a Agenda 21, o Orçamento Participativo e os Planos Diretores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2920, 30 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19430. Acesso em: 23 dez. 2024.

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