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Delação de corréu como fundamento da sentença condenatória.

Uma questão controvertida

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Agenda 09/08/2011 às 16:37

Sumário: 1. Introdução. 2. Interrogatório: meio de prova ou autêntico meio de defesa? 3. Da necessidade da incidência plena do contraditório sobre o interrogatório do corréu quando existente a delação. 4. Da nulidade da sentença firmada em prova colhida sem contraditório. 5. Considerações finais.

RESUMO: O presente estudo tem como objetivo precípuo demonstrar que a delação formulada por um corréu pode ser utilizada pelo órgão judicante, de forma legítima, como único fundamento de uma sentença penal condenatória. Contudo, necessário que se permita também a participação da autodefesa no interrogatório do delator. Isto porque a defesa no processo penal materializa-se e perfaz-se quando assegurados ao acusado o contraditório pleno: defesa técnica e autodefesa, durante a instrução - ocasião na qual a prova é colhida. Desse modo, se a delação é utilizada na formação do convencimento do magistrado, bem assim como única forma de arrimar uma condenação, sem participação da autodefesa, tal sentença padece de nulidade absoluta, por ofensa gritante aos ditames embutidos na Carta Republicana de 1988.

PALAVRAS-CHAVES: processo penal. Delação. Corréu. Instrução. Ampla defesa. Contraditório. Sentença. Nulidade.


1. INTRODUÇÃO

A vigente Constituição Federal veio a lume erigindo como garantia fundamental o sagrado Princípio do Contraditório, embutido em nosso ordenamento constitucional desde a Carta Política de 1937 (art. 122, n.11, segunda parte). Ao edificar a Lex Legum vigente, entretanto, o legislador constituinte originário foi mais contundente ao tratar do referenciado princípio, eis que lhe forneceu maior campo de incidência. É dizer-se: no ordenamento anterior somente havia previsão expressa do contraditório quando se tratava de processo penal, sem menção às contendas administrativas e civis, motivo por que se debatia acerca da incidência do contraditório apenas às lides penais, incluindo-se a doutrina daquela época pela garantia do contraditório em todas as espécies de processos.

Os embates de outrora não mais persistem. A atual previsão do Princípio do Contraditório, talhada no Título II, art. 5º, inc. LV, do Diploma Fundante, é inconteste ao asseverar que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". Aliás, a localização constitucional do Princípio do Contraditório foi estratégica, evidenciando a importância que lhe dispensou a Constituinte, uma vez gozar do status de cláusula pétrea(art. 60, § 4º, IV, CF), donde resulta jamais poder ser suprimido do ordenamento jurídico nativo, senão por outra reunião do poder constituinte originário.

Por sua vez, abarcando o princípio do contraditório, avulta-se outro princípio de grandeza peculiar, também detentor de foro constitucional, qual seja, o princípio da Ampla Defesa-fundamental nas querelas penais. De tal arte, a ampla defesa origina para o Estado a obrigação de propiciar aos acusados todos os contornos possíveis para concretização de uma defesa plena, v.g.: ciência da acusação, possibilidade de reação, autodefesa (direito de audiência, direito de presença e direito a postular pessoalmente) [01], defesa técnica, bem assim, complementando as garantias já referenciadas, assegura a assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos (art. 5º, LXXIV, da CF).

Dentre os meandros contidos em um processo penal, deparamo-nos, sempre que possível, com o interrogatório do acusado – desdobramento do direito de audiência, consectário do direito de autodefesa - momento propício para o imputado apresentar sua versão dos fatos encartados na denúncia (ou queixa-criminal), bem como ocasião na qual o magistrado tem, no mais das vezes, o seu primeiro contato com aquele que enquadrou sua conduta à moldura de uma das disposições típicas catalogadas no Código Penal [02].

Com efeito, é no interrogatório, ainda, que a ampla defesa se desnuda por uma das suas vertentes. Referimo-nos à citada autodefesa. Por conseguinte, já podemos concluir que, no exercício de sua autodefesa, quando do seu interrogatório, na esfera judicial, é perfeitamente aceitável que, num processo em que figure mais de um imputado, qualquer um deles queira desvencilhar-se da responsabilidade penal que então lhe é irrogada, indicando outro(s) figurante(s) no feito como sendo o(s) responsável(veis) pelo Tatbestand. Trata-se da famigerada delação ou chamada de corréu.

Ocorre que, no momento do interrogatório de um dos réus, é vedada a participação dos demais, consoante a dicção do art. 191 do Código de Processo Penal. Isto em razão do caráter da judicialidade do supradito ato processual, em outras palavras: somente o juiz pode interrogar o réu, ninguém mais (sistema presidencialista). A inteligência do prefalado dispositivo é impedir que cada um dos acusados se beneficie das respostas dadas pelo réu que o antecedeu; que as declarações de um possam influir nas dos subsequentes; que o relato de cada acusado seja espontâneo etc [03] . Por conseguinte, eis que surge a questão problema do presente estudo: sendo interrogatório judicial capitulado pela mencionada cártula processual como meio de prova, como admitir a delação do corréu como único fundamento de uma sentença condenatória, se não existe previsão legal da completa incidência do contraditório em tal momento processual, pois ausente a autodefesa(ou seja: por imposição de lei, o delatado não se faz presente em audiência quando é delatado, conquanto sua defesa técnica seja efetiva)?

Termos o propósito precípuo, nesse contexto, de compatibilizar a coexistência harmônica e integral dos princípios do contraditório (em favor do delatado) e da ampla defesa (em favor do delator), quando do interrogatório prestado no âmbito judicial. Com isso, restará possibilitada a utilização da delação do corréu como fundamento solitário de um provimento jurisdicional condenatório, concretizando-se, por sua vez, o devido processo penal constitucional, do qual brotam as garantias de que precisam as partes para a formação de um processo justo (fair play), estribado na essencial paridade de armas.

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2. INTERROGATÓRIO: MEIO DE PROVA OU AUTÊNTICO MEIO DE DEFESA?

Como é cediço, o atual Código de Processo Penal foi confeccionado em ocasião anterior ao surgimento do atual ordenamento constitucional, e, como sói acontecer, teve alguns de seus dispositivos não recepcionados pelo Texto Magno, que trouxe consigo princípios até então somente conhecidos pela parte doutrinária e jurisprudencial do Direito.

Perfilhando as palavras da Professora Ada Pellegrini Grinover, quando comentou os anteprojetos de lei de reforma do Código de Processo Penal, percebe-se que a Constituição de 1988 introduziu, no sitema penal, princípios e regras com as quais o aludido Codex processual de 1941 entrou em conflito, de modo que muitas de suas normas perderam eficácia em face da nova ordem jurídica ou, então, passaram a exigir interpretação de modo diverso do tradicional, sob pena de não se coadunarem com a nossa Lei Fundante. É nesse confuso quadro de instabilidade que nos interessa a parte que se encontra alojada no Capítulo III, Título VII, Código de Ritos. Cuida-se do interrogatório do acusado (arts. 185 usque 196).

Como se pode perceber, a inserção do interrogatório na parte condizente às provas, deu a impressão de que o legislador quis lhe conferir tal natureza, ou seja, de meio de prova. Parte da doutrina, contudo, logo destoou desse entendimento. De efeito, fatia de processualistas de renomada chega até mesmo a considerá-lo apenas e tão -somente ato de defesa (v.g.Tourinho Filho). Essa posição nos parece a mais acertada, porquanto mais condizente ao moderno direito de defesa e aos preceitos constitucionais vigentes. Entretanto, em verdade, a natureza mista do interrogatório, diga-se de passagem, é predominante no seio dos processualistas de nosso direito.

Advogando a natureza mista do interrogatório, o saudoso Professor Mirabete [04] nos ensina que "mesmo quando o acusado se defende no interrogatório, não deixa de apresentar ao julgador elementos que podem ser utilizados na apuração da verdade, seja pelo confronto com as provas existentes, seja por circunstâncias e particularidades das próprias informações prestadas". Conclui seu pensamento de forma contundente, afirmando que "(...) mesmo o silêncio do acusado, se não pode ser interpretado em prejuízo do réu, pode fornecer ao juiz convicção íntima para condenação quando encontra amparo em outros elementos dos autos. Conceitualmente, portanto, o interrogatório, ato privativo do juiz que não sofre interferência das partes, é meio de prova e oportunidade de defesa".

Em que pese a força dos argumentos daqueles que militam pelo caráter misto do interrogatório, não se pode olvidar que uma força maior deriva da Cártula Constitucional. Por bem dizer, ao consagrar o direito ao silêncio (art. 5º, LXIII) como garantia constitucional àqueles que figurem como suspeitos da prática de crimes, deixou o legislador constituinte nítida função defensiva ao interrogatório, mormente se levado em conta que o aviso do direito de permanecer calado se impõe ao magistrado [05] que conduzirá a instrução, sob pena de nulidade.

Assaz pertinente ao presente estudo, o magistério da Professora Ada Pellegrini Grinover [06] quando assevera que "(...) por intermédio do interrogatório- rectius, das declarações espontâneas do acusado submetido ao interrogatório -, o juiz pode tomar conhecimento de notícias e elementos úteis para descoberta da verdade. Mas não é para essa finalidade que o interrogatório está preordenado". Por certo, pensamento ao qual nos filiamos, o interrogatório pode constituir fonte de prova, mas não meio de prova: não está ordenado ad veritatem quaerendam.

Outrossim, impende consignar que doutrina e jurisprudência já eram acordes, mesmo antes da vigência da lei nº 10.792/03, em sinalizar que os arts. 186, in fine, e 198, in fine, ambos do Código de Processo Penal, não mais vigoram em nosso ordenamento, desde o advento do atual texto constitucional. Rezava o primeiro dispositivo, em sua parte derradeira, que o silêncio do réu, quando do seu interrogatório, poderia ser interpretado em prejuízo de sua própria defesa; ao passo que aqueloutro acenava para possibilidade de o silêncio do acusado servir de elemento construtor do convencimento do magistrado. Comezinho perceber que a derrocada dos citados trechos de lei ocorreu já pelo surgimento constitucional do direito ao silêncio, Ora é obvio que o exercício de uma garantia fundamental não poderia ocasionar nenhuma espécie de prejuízo. Homenageou-se, por certo, o adágio latino: nemo tenetur se detegere.

Apesar de não ter inovado no que condiz ao direito ao silêncio, é bom que se diga, a Lei nº 10 792/03 inovou em aspectos de relevo, positivando anseios de há muito acalentados por forte parcela da doutrina e jurisprudência, tais como: a presença do defensor no interrogatório (art.185, caput); interação entre autodefesa e defesa técnica(art. 185, §2º); possibilidade das partes formularem perguntas, após o interrogatório (art. 188, caput) – o que, em nossa ótica, não acabou com a judicialidade do interrogatório, pois que ainda cabe ao magistrado ponderar sobre a real necessidade de se formular a pergunta das partes, mantendo em suas mãos o comando do referido ato processual. Nesse passo, vê-se que todas essas modificações são direcionadas pela caracterização do interrogatório como autêntico ato de defesa.

Por fim, há que se acompanhar a tendência dos recentes textos normativos, que dispensam posição cronológica ao interrogatório, em explícito favor do réu. Melhor dizendo: o interrogatório passa a ser realizada ao final da instrução, ocasião em que o imputado já pode visualizar o direcionamento do conjunto probatório e apresentar sua versão dos fatos, abraçando o caminho que melhor lhe aprouver (vide art. 81, caput, daLei nº 9.099/95). Nesse mesmo tom, permitimo-nos trazer à colação os ensinamento da Profª Ada Pellegrini Grinover [07], a qual constata que a "(...) realização do interrogatório após a colheita de toda prova irá propiciar, sem dúvida, maiores facilidades para o exercício da autodefesa do acusado, especialmente pela possibilidade de optar pelo silêncio (art. 5º, LVIII, C.F.), diante de uma prova insuficiente".


3. DA NECESSIDADE DA INCIDÊNCIA PLENA DO CONTRADITÓRIO SOBRE O INTERROGATÓRIO DO CORRÉU QUANDO EXISTENTE A DELAÇÃO

O interrogatório, conforme visto alhures, é momento de defesa para aquele que figura no pólo passivo da relação processual penal. Por outro lado, a defesa, para ser válida, deve ser plena, açambarcada por todos os meios a ela inerentes. Conseguintemente, pode o réu, quando do seu interrogatório, na esfera judicial, lançar mão da delação ou chamada de corréu, repartindo/transferindo a outro(s) imputado(s) parte ou toda a responsabilidade que então lhe é dirigida em uma contenda penal.

Em face dessa atitude (rectius: delação), eventualmente tomada pelo interrogado, podemos chegar a duas constatações distintas. Por primeiro, tomemos como exemplo um processo criminal em que figurem, no mínimo, dois réus: Tício e Mévio, sendo que Mévio, fora denunciado pelo Ministério Público tão-somente com base nas declarações prestadas por Tício, ainda no âmbito policial. Neste momento da persecutio criminis - sublinhe-se - vigora o princípio in dubio pro societate, motivo pelo qual mero indício ganha aptidão para incentivar a deflagração da ação penal, donde se conclui ter agido com acerto o órgão ministerial ao denunciar Mévio. Ocorre que, em juízo, as provas coligidas apontam somente Tício como culpado pelo crime apurado.

Pergunta-se: pode o julgador considerar Mévio da mesma forma culpado, com base na delação formulada por Tício, tanto na fase inquisitorial como depois em juízo?

Em segundo, vejamos outro exemplo. Agora, suponhamos que Gaio e Nondas tenham sido denunciados pelo Ministério Público, bem assim que Gaio tenha também figurado na peça acusatória por delação de Nondas durante o inquérito policial. Desta feia, passada a instrução, descobre-se que Nondas é culpado e que sua delação firmada na fase policial e ratificada em juízo é verídica, pois que em harmonia com demais provas conduzidas ao feito. Pergunta-se: pode o julgador considerar Gaio da mesma forma culpado com base na delação formulada por Nondas tanto na fase inquisitorial como em juízo?

Veja-se que temos duas situações aparentemente semelhantes, porém, com repercussões distintas. No segundo exemplo, respondemos, sem maiores obstáculos, que o magistrado tem possibilidade de arvorar seu decreto condenatório utilizando a delação, em razão de a mesma encontrar-se em sintonia com as demais provas, formando um cenário harmônico. Assim, uma vez lastreada em outros elementos trazidos ao bojo do processo, a delação serve como fundamento do provimento condenatório, como sói acontecer com a confissão extrajudicial não ratificada em juízo, mas que está em consonância com os demais elementos probatórios reunidos nos autos.

Problema, todavia, ocorre quando a chamada do corréu não encontra amparo nas provas contidas no feito – como inicialmente exemplificado. Nesses casos, atribuição feita a outrem no interrogatório policial ou mesmo em juízo, sem amparo nas demais provas dos autos, não pode ser valorada isoladamente como fundamento do comando da condenação. Entendemos que, em hipóteses desde jaez, o magistrado não pode arrimar sua sentença condenatória tão-somente na delação do corréu, sob pena de serem feridos princípios consagrados no recinto constitucional, pois ausente a autodefesa na formação de tal prova, ao menos que faça uso da solução advogada por parte da doutrina e por nós abraçada.

A solução citada, a qual nos filiamos, vai ser caracterizada pela abertura plena do contraditório, mais incisivamente: efetivação da autodefesa, no interrogatório do corréu, no momento em que fizer alusão à conduta de outro imputado, para, somente assim, servir a delação à conduta de outro imputado, para, somente assim, servir a delação como prova hábil a firmar uma sentença condenatória, pois que já não mais teria em si o apanágio da inquisitoriedade, de há muito superado pela dialeticidade na formação do conjunto probatório.

Tal entendimento vem encontrando ressonância na melhor doutrina nacional.

O professor Guilherme de Souza Nucci deflagra, de forma veemente, a bandeira da necessidade da existência do contraditório nas situações acima ventiladas, e o faz nos seguintes termos, ad litteram" havendo, nas declarações de co-réu, referência à conduta de co-autor, para existir a possibilidade de o juiz utilizar tais dados contra quem foi incriminado,é essencial que seja permitido às partes participarem da colheita de provas. (…) quando um co-réu incriminar outro, deve ser permitido pelo juiz que as partes façam perguntas reperguntas e esclareçam. Do contraditório será uma prova totalmente inquisitiva, que irá produzir danos a quem dela não participar" [08]. Conclui, por fim, de forma brilhante, admoestando que, in verbis:" melhor afetar a lei ordinária (o Código de Processo Penal, que não permite reperguntas [09], nem a presença de co-réu em interrogatório do seu comparsa), do que a Constituição (princípios do contraditório e da ampla defesa)".

Sem desgarrar da esteira de fundamentação ora expendida, a Professora Ada Pellegrini Grinover, citada por Antônio Scarance Fernandes [10], nos brinda com raciocínio bastante perspicaz, ao qual aderimos incondicionalmente. Para a citada doutrinadora, "a palavra de um acusado, com relação aos demais, é testemunho e consequentemente, meio de prova: e prova alguma pode ser colhida senão sob o pálio do contraditório". Arremata, então, ponderando que a proibição de reperguntas ao corréu, que delata o outro irrogado, durante o interrogatório, enseja gritante ofensa ao texto constitucional, tanto mais quando a delação serve como único fundamento para condenação.


4. DA NULIDADE ABSOLUTA DA SENTENÇA FIRMADA EM PROVA COLHIDA SEM CONTRADITÓRIO

E qual a implicação prática/processual de se abrir espaço para o desencadeamento do princípio do contraditório, pela vertente da autodefesa, no interrogatório do corréu delator? A resposta é facilmente localizada no sistema de nulidades erigido pelo Código de Processo Penal e aperfeiçoado pelo implemento da Constituição Federal vigente. Desde logo, adiantamos que tal conduta serve como forma de revestir a delação de legitimidade para que, assim, logre supedanear um provimento condenatório hígido.

Vejamos.

A doutrina pátria dominante firma posição no sentido de que qualquer espécie de supressão a princípios constitucionais se resolve em forma de nulidade absoluta, sendo o prejuízo evidente, donde se tem por prescindível a demonstração da nódoa processual. Nesse sentido, a tantas vezes aqui citada Professora Grinover é inconteste em firmar que "sendo a norma constitucional-processual norma de garantia, estabelecida no interesse público, o ato processual inconstitucional, quando não juridicamente inexistente, será sempre absolutamente nulo, devendo a nulidade ser decretada de ofício, independentemente de provocação da parte interessada." [11].

Por sua vez, para que se possa falar em motivação válida e apta a produzir os efeitos dela esperados, na forma preconizada pelo art. 93, inc. IX, da Constituição Cidadã, mister se faz que seja visceralmente ligada em prova obtida dentro dos lindes do devido processo legal, com todas as garantias a ele inerentes. O festejado Prof. Amilton Bueno de Carvalho [12] vaticina que sempre haverá de existir "correspondência dos argumentos de sentença com a lei e o material probatório colhido em processo público e contraditório", ao passo em que conceitua tal procedimento como "garantia formal de controle do arbítrio judicial". Em outras palavras: a motivação do órgão judicante deve ser fulcrada em prova regularmente formada.

Nesses termos, depreende-se que, caso não haja espaço oportunizado à presença do corréu delatado no interrogatório do corréu delator, com direito, inclusive, à formulação de perguntas por aquele - via defensor, jamais poderá o membro do Judiciário sustentar uma condenação apenas em testemunho angariado de forma inquisitiva, sem que seja respaldado por demais elementos de convicção constantes do feito. Isto porque seria manifesta a inobservância aos preceitos magnos do contraditório, da ampla defesa e, por certo, do due process of law, que contém os aludidos princípios, bem como todos os outros princípios processuais [13]. Via de consequência, o decisum assim prolatado estaria eivado pela nulidade absoluta, resultante da transgressão de normas repousantes em plano superior.

Sobre o autor
Paulo Roberto Fonseca Barbosa

Juiz de Direito, titular da Comarca de Ribeirópolis/SE. Pós graduando em ciências criminais-ISBA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARBOSA, Paulo Roberto Fonseca. Delação de corréu como fundamento da sentença condenatória.: Uma questão controvertida. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2960, 9 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19733. Acesso em: 25 dez. 2024.

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