INTRODUÇÃO
Se existe uma premissa que deve permear o pensamento de todos os elaboradores, aplicadores e estudiosos do Direito, é que este jamais pode ser visto como algo estático: ubi homo, ibi societa, ubi societa, ibi jus. Se a sociedade evolui, o direito também deve fazê-lo, sob pena de sua validade ser abalada e, com ela, o equilíbrio necessário entre vigência e eficácia. Contudo, em dias hodiernos, onde ainda que a sociedade determine o direito - mantendo-se a máxima "ubi societa, ibi jus" -, muitas vezes ocorre que a declaração destes por meio de normas positivadas tem tardado em decorrência da morosidade ou mesmo omissão dos órgãos legiferantes.
Talvez por isso, quis o constituinte de 1988 atribuir permanente atualidade ao Texto Maior, ao permitir que os direitos e garantias ali insertos não excluíssem outros que a sociedade consagrasse como tal, ainda que não expressamente arrolados; valendo-se para tanto do § 2º do art. 5º da Constituição Federal, que torna o rol de direitos fundamentais nela presente enunciativo, e não taxativo.
A pretensão do presente trabalho consiste em demonstrar que a não-taxatividade foi, e ainda é, eficaz solução para que o Estado exerça sua função jurisdicional de atuação quanto a bens supremos, por não restringir a proteção jurídica apenas aos direitos fundamentais expressos em título específico do texto constitucional. Por fim, será também abordado o reconhecimento da existência de direitos implícitos, inerentes a outros já protegidos por força normativa, permitindo que o texto constitucional já existente seja ampliado ou "adequado", com o escopo de atender aos novos anseios sociais1.
1.- A EVOLUÇÃO TEÓRICA DO CONSTITUCIONALISMO E O RECONHECIMENTO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.
A desejada - e conveniente naquele momento histórico - omissão estatal, pregada na primeira geração do direito constitucional, era imprescindível para a conquista da almejada liberdade, mas não resolveu todos os problemas. A bem da verdade, o non facere do Estado sufocador findou com algumas mazelas da época, mas não impediu que outras surgissem, pois, diante da completa inércia do Estado, é de esperar-se o cometimento de arbitrariedades por um grupo ou classe social em detrimento de outros.
A consequência disso foi a exigência de uma atuação estatal positiva nas áreas sociais, presente na segunda e ainda mais nítida na terceira geração do direito, ainda que o Estado devesse permanecer inerte no atinente à vida privada, nas "liberdades individuais" 2.
Essa atuação pública positiva não tardou a assumir um caráter eminentemente protecionista, onde o poder estatal passa a representar cada vez mais um papel ativo para as conquistas sociais. Nunca antes na história da humanidade o Estado assumira tão grande múnus de garantidor da igualdade econômica, social e, sobretudo, de guardião de direitos – individuais e coletivos.
Com a valorização da pessoa humana e o papel garantista desempenhado pelo Estado, as Constituições das novas gerações/dimensões passaram a apresentar estrutura que claramente identifica o momento vivido e suas prioridades: primeiro o Texto Constitucional cuida de normatizar acerca dos direitos e garantias dos cidadãos tutelados por ele, reservando compartimentos posteriores à organização estatal e demais temas a serem regulados3.
Nesse novo momento – o neoconstitucionalismo –, o formalismo exacerbado cede lugar ao Estado constitucional, com forte prevalência axiológica, onde a fórmula binomial Direito=lei muitas vezes é substituída por princípios e valores. Agora, ganha nitidez a maior atenção constitucional aos direitos fundamentais, ou seja, ao mínimo que o Estado deve garantir para assegurar existência digna aos seus cidadãos.
A maior atenção das constituições às denominadas normas jusfundamentais faz com que estas gozem de especial tratamento por parte do poder constituinte originário, como demonstra o §1º do art. 5º da Constituição de 1988, que assegura aplicabilidade imediata aos direitos fundamentais.
Um segundo aspecto que corrobora para o entendimento da relevância dispensada aos direitos fundamentais é sua difícil alterabilidade e impossível redutibilidade, sendo, assim, tratados como cláusulas pétreas, às quais Alexandre de Moraes denomina "núcleo intangível da Constituição", embora o próprio autor ressalte que tal intangibilidade refira-se apenas à impossibilidade de "destruição e enfraquecimento", sendo contudo possível a alteração in mellius. (MORAES, 2002, p. 364)
2.– PÓS- POSITIVISMO E NÃO-TAXATIVIDADE.
Uma das características marcantes do neoconstitucionalismo refere-se ao desapego à rigidez formal. Com o amadurecimento da ciência jurídica, percebeu-se que problema comumente decorrente do apego exacerbado, e mesmo irracional, à premissa de que a existência de um direito decorre somente de sua declaração por meio de texto normativo, é que quando verificada a morosidade ou omissão legislativa, esta passa a constituir efeito obstativo à evolução jurídica, não conseguindo-se, portanto, acompanhar o momento vivido pela sociedade.
Porém, a obsolescência jurídica, no atual estágio do Direito, torna-se inconcebível, pois a partir do momento em que o Estado avocou a si o monopólio da função jurisdicional, constituiu-se essa em um poder/dever, sintetizado pelo princípio da inafastabilidade da jurisdição, segundo o qual o Estado/juiz jamais poderá, fulcrado na inexistência ou obscuridade normativa acerca do tema posto em lide, esquivar-se de entregar às partes em litígio o correspondente direito.
Logo, viu-se a necessidade de relativizar a rigidez positivista, criando uma teoria "intermediária", que não despreze o valor normativo – e a observância do procedimento adequado para a elaboração e revogação de leis –, mas que incorporasse valores morais, tendo por pilares a diferenciação teórica entre direito e moral, com a inserção de termos como liberdade, dignidade e igualdade; que permita a discricionariedade jurisdicional e a abertura do Direito à sociedade como fonte emanadora da norma4.
A partir de então, o julgador veio a ocupar espaço não apenas de mero "arauto" de um direito expresso em normas estagnadas. Tem origem assim o pós-positivismo, que atribuiu ao magistrado o título de intérprete do direito, e conseguintemente, das normas. É dizer, passou-se a permitir que as normas fossem vislumbradas conforme o momento social vivido, sem contudo permitir o distanciamento em relação aos princípios norteadores, de observância necessária.
Tal momento representa fato importante ao neoconstitucionalismo, vez que as normas – em especial as destinada à proteção dos direitos fundamentais – passaram a reconhecer, por muitas vezes, não serem capazes de exaurir frutuosamente o tema a que se destinam, permitindo a incorporação de outros direitos fundamentais aos já protegidos em compartimento específico. Tal reconhecimento e admissão se dão por meio da denominada cláusula de não-taxatividade.
Segundo a mais autorizada doutrina, a cláusula de não-taxatividade, também chamada de cláusula de abertura, fora observada constitucionalmente, pela primeira vez no Brasil, na Carta Magna de 1891, em seu artigo 78, ao normatizar que "a especificação das garantias e direitos expressos na Constituição não exclui outras garantias e direitos não enumerados, mas resultantes da forma de governo que ela estabelece e dos princípios que consigna". Na vigente Constituição de 1988, encontra-se disposta no § 2º do art. 5º, com a seguinte redação:
"Art. 5º (omissis)
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais de que a República Federativa do Brasil seja parte "
Primaz faz-se ressaltar o especial significado da palavra princípios, presente no texto sub examine, reforçando o anteriormente exposto acerca da valorização principiológica a figurar como caractere no neoconstitucionalismo e do desapego ao formalismo exacerbado, pregado pelo pós-positivismo5, pois, como leciona Paulo Bonavides "a importância vital que os princípios assumem para os ordenamentos jurídicos se torna cada vez mais evidente, sobretudo se lhes examinarmos a função e presença no corpo das Constituições contemporâneas, onde aparecem como os pontos axiológicos de mais alto destaque e prestígio com que fundamentar na Hermenêutica dos tribunais a legitimidade dos preceitos da ordem constitucional. (BONAVIDES, 2003, p. 289.)
Das lições de Luiz Roberto Barroso podem ser extraídas três balizas, que caracterizam e explicam o neoconstitucionalismo, podendo ser enumeradas como: uma de caráter histórico, que consiste na formação do Estado Constitucional de Direito ou simplesmente Estado Constitucional; uma de caráter filosófico, que seria exatamente o pós-positivismo, caracterizado pela evidenciação dos direitos fundamentais e a convergência paradigmática entre Direito e ética; e outra de caráter teórico, na qual estão inseridas a atribuição de potencialidade normativa à Constituição, a expansão do campo de abrangência constitucional e o aprimoramento dogmático-interpretativo do texto da Constituição.
Nesse enredo, o constituinte de 1988 tomou acertada medida ao incorporar a cláusula de não-taxatividade à Carta Maior, reconhecendo a existência de direitos fundamentais além do seu artigo 5º. Com isso, em muitos casos, tem se entendido que não é necessária uma mudança no texto normativo – no caso em comento, especificamente no texto constitucional – para a proteção a um bem tutelável como direito fundamental. O que tem ocorrido é um acréscimo declarativo, reconhecendo determinado direito como fundamental, sobretudo por meio do STF, como guardião – e maior intérprete – da Constituição. Mas isso, e peremptório faz-se ressaltar, apenas quando o texto normativo for autorizador de tal ampliação conceitual, como o fez a Carta Maior brasileira.
3– MENS LEGISLATORIS E AMPLIAÇÃO HERMENÊUTICA OU IMPLICITUDE DE DIREITOS.
Dos aspectos do neoconstitucionalismo anteriormente enumerados, talvez aquele que mais profundamente trouxe inovações foi o de sentido teórico, permitindo a formação do processo de constitucionalização do Direito e também a liberdade interpretativa do texto constitucional.
Em um primeiro momento histórico, a interpretação, ou hermenêutica jurídica, consistia apenas em perquirir-se qual fora a mens legislatoris, ou seja, a intenção do legislador ao elaborar determinada norma. Atualmente, em que pese tal questionamento ser relevante, não é o único a ser feito. Necessário se torna saber qual interpretação da norma mais se coaduna com a realidade social vigente6.
Assim, há que se ressaltar que a cláusula de não-taxatividade fez bem mais que reconhecer a existência de direitos fundamentais por todo o texto constitucional. Antes mesmo disso, permitiu que do conceito de direitos fundamentais não estivesse alijado o bem jurídico que a sociedade consagrasse como tal na progressiva marcha do Direito, tornando-se assim, mecanismo de ampliação do rol dos direitos fundamentais e, numa única expressão, pode ser definida como cláusula de criatividade interpretativa ou hermenêutica.
Portanto, mesmo quando se conceitua os direitos fundamentais como sendo aqueles positivados constitucionalmente, tal positivação deve ser encarada à luz da não-taxatividade e também da implicitude, demandando não apenas a proteção a outros direitos fundamentais dispersos por todo seu Texto Magno, mas também àqueles provenientes da ampliação conceitual atribuída a determinado direito fundamental expresso na Constituição, e que estariam, dessa forma, expressos, ainda que de forma indireta ou decorrente.
Um clássico exemplo de ampliação conceitual refere-se ao direito à vida. Atualmente, tem-se entendido que dentro do conceito de vida está englobado (abrangido) muito mais que a concepção biológica do termo. Assim, a norma expressa no caput do art. 5º da Constituição Federal seria protetiva também de bens jurídicos como saúde, educação, lazer, felicidade e tantos outros, implicitamente compreendidos pelo direito à vida, ou ainda, valendo-se das irrefutáveis palavras de José Afonso da Silva, "A vida humana não é apenas um conjunto de elementos materiais. integram-na, valores imateriais, como os morais". (SILVA, 2008, p. 201)
O direito à vida – assim como muitos outros – é, portanto, mais que uma norma isolada, e sim uma janela jusfundamentalista, podendo conduzir à proteção de outros direitos, atualmente indispensáveis para a manutenção da dignidade humana, pois "A Constituição Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto à subsistência". (MORAES, 2009, p. 36)
Para maior supedâneo à tese, ressalte-se que, o STF, por ocasião do julgamento da ADIn 939-7/DF (RTJ 150/68), ressaltou que no Texto Maior, não estão mencionados todos os direitos e garantias fundamentais, tampouco tal rol é taxativo. Demonstrado está, que a Corte Constitucional vale-se da cláusula de não-taxatividade e do conceito de direitos fundamentais implícitos, como sendo aqueles que, embora não presentes de forma expressa no texto constitucional, mormente no rol do artigo 5º, são aclamados como tal pela sociedade hodierna, podendo aparecer também como derivação de um direito fundamental positivado.
Os direitos fundamentais implícitos poderiam também ser denominados direitos fundamentais decorrentes, na medida que "acompanham" e surgem da definição de outros já protegidos constitucionalmente, para ampliar-lhes a abrangência de proteção7.
Segundo Ingo Wolfgang Sarlet, haveria uma categoria de direitos fundamentais não escritos que podem ser deduzidos através do ato interpretativo com base nos direitos constantes no catálogo, bem como no regime e nos princípios fundamentais adotados pela nossa Carta Maior. Tal conceituação não é outra senão a de direitos fundamentais implícitos. (SARLET, 2001)
Com isso, o neoconstitucionalismo levou à permissão do aumento do rol de direito tidos como fundamentais – sem que isso implique em alteração ao texto constitucional – por dois meios, a saber: a) o reconhecimento da existência de direitos fundamentais espalhados por outros compartimentos do Texto Maior, que não o seu Título II; e b) a defesa de bens juridicamente tuteláveis, ainda que não expressos na Norma Maior, mas que implícitos e insertos em outros reconhecidos como fundamentais. São, portanto, direitos fundamentais porque decorrentes de direitos fundamentais. A ambas as categorias podendo-se aplicar o regime jurídico destinado propriamente à defesa das normas jusfundamentais.
CONCLUSÃO
Assim, diante da atual conjuntura, atribuir a um "novo direito" o título de fundamental não passa necessariamente pela alteração material da norma constitucional, podendo resultar de uma ampliação hermenêutica, pois o próprio texto da Carta Maior permitiu fazê-lo.
O aumento do rol dos direitos fundamentais, enquanto fenômeno decorrente do neoconstitucionalismo, consiste em gênero do qual são espécies o reconhecimento da existência de direitos fundamentais arrolados por toda a Constituição; e a ampliação hermenêutica ou implicitude de direitos, decorrente do pós-positivismo, com o abandono da rigidez formalista e a valorização de princípios e da moral enlaçada ao Direito, daí emanando uma interpretação axiológica e reticente das normas
Assim, é de afirmar-se que, atualmente, existem três grupos de direitos fundamentais8, a saber: 1) aqueles arrolados na Constituição de 1988 especificamente no título II, destinado aos Direitos e Garantias Fundamentais; 2) os dispersos por todo o texto constitucional, conforme autorização outorgada pela cláusula de não-taxatividade expressa no art. 5º §2º; e 3) aqueles que, por ampliação hermenêutica, são admitidos como tal por estarem implícitos em outros já salvaguardados sob a adjetivação de fundamentais.
REFERÊNCIAS:
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2003.
MENDES, Gilmar Ferreira.; COELHO, Inocêncio Mártires.; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 5ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
BARROSO, Luís Roberto. O começo da história: a nova interpretação constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. In: Direitos humanos e globalização: fundamentos e possibilidades desde a teoria crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. São Paulo: Atlas, 2002
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. São Paulo: Atlas, 2009
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo, Ed. Malheiros, 2003.
BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Lições de teoria constitucional e de direito constitucional. Salvador, JusPodivm, 2007.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 26º ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 31ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. São Paulo: Malheiros, 7 ed , 2009.
FERREIRA, Manoel Gonçalves Filho. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 26. ed.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva. 12. ed., 2008.
CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Forense Universitária,1991.
GARCIA, Maria. Mas, quais são os direitos fundamentais? Revista de direito constitucional e internacional, n. 39, ano 10, abr.-jun. 2002.
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NOTAS.
- Nesse sentido, Pontes de Miranda esclarece que "Constituição que se impõe ao tempo e esse não lhe consegue corroer os textos, ou alterá-los em discussão normal, é Constituição que só deixa ao povo, ou às gerações que nela não veem solução para os seus destinos, o recurso da revolução" (in: Comentários à Constituição de 1967 com a emenda nº 1 de 1969, 3ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1987, tomo III, pág. 145).
- Sobre o tema, valiosa a síntese de Celso de Mello, quando diz que: "enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos da terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem em um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade".
- Juridicamente, o fato de as normas destinadas à proteção dos direitos fundamentais passarem a integrar o texto das constituições torna-se valiosa informação quando se trata de definir a natureza jurídica das mesmas, pois, como esclarece José Afonso da Silva, "Atualmente, [...] nos ordenamentos nacionais (as normas acerca de direitos fundamentais) integram as constituições, adquirindo o caráter concreto de normas jurídicas positivas constitucionais, por isso, subjetivando-se em direito particular de cada povo". E mais adiante: "Desde que, no plano interno, assumiram o caráter concreto de normas positivas constitucionais, [...] Sua natureza passara a ser constitucional, o que já era uma posição expressa no art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, a ponto de, segundo este, sua adoção ser um dos elementos essenciais do próprio conceito de constituição" (SILVA, 2008, p. 175 e 179).
- Luis Roberto Barroso, com a precisão didática e sapiência que lhe são próprias, ensina-nos que "a superação histórica do jusnaturalismo e o fracasso político do positivismo abriram caminho para um conjunto amplo e ainda inacabado de reflexões acerca do Direito, sua função social e sua interpretação. [...] A valorização dos princípios, sua incorporação, explícita ou implícita, pelos textos constitucionais e o reconhecimento pela ordem jurídica de sua normatividade fazem parte desse ambiente de aproximação entre Direito e Ética". (BARROSO, 2004, p. 296.)
- Sobre o tema, Paulo Ricardo Schirer, em transcrição da palestra proferida na I Jornada de Direito Constitucional da UniBrasil, em outubro de 2004, brilhantemente aduz que "Portanto, observa-se que na fase pós-positivista, os princípios passam a caracterizar o próprio ‘coração das Constituições’, iluminando a leitura de todas as questões da dogmática jurídica, que devem passar pelo necessário processo de filtragem constitucional axiológica ".
- Na mesma seara de pensamento, proferem José Fabio Rodrigues Maciel e Cristina Y. Kusahara Morelli que "A hermenêutica assumiu papel de destaque na reflexão jurídica contemporânea. O processo hermenêutico considera a norma parte integrante do sistema jurídico, mas a percebe, também, como meio para a solução de conflitos que não se caracterizam por suas dimensões estritamente legais, pois comportam aspectos sociais e valorativos, determinantes para a própria eficácia do direito. Fica evidente a necessidade de uma hermenêutica que trabalhe o direito de forma concreta, assumindo alguns pressupostos metodológicos que permitam pensar na elaboração de uma nova leitura para um novo direito" (in: ‘Interpretação do Direito no Pós-positivismo: A Importância dos Princípios Constitucional’. Revista do Curso de Direito da Faculdade de Humanidade e Direito, v.6, n6, 2009).
- Acerca desta abrangência protetiva decorrente da hermenêutica, serve de exemplo o julgamento do HC 79512, em que se discutia a proteção fundamental dispensada pela inviolabilidade domiciliar, entendendo-se que "Conceito de ‘casa’ para efeito de proteção constitucional. Amplitude dessa noção conceitual, que também compreendem os espaços privados não abertos ao público, onde alguém exerce atividade profissional: necessidade, em tal hipótese, de mandado judicial (CF, art. 5º, XI). Para fins de proteção jurídica a que se refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o conceito normativo de ‘casa’ revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer compartimento privado não aberto ao público, onde alguém exerça profissão ou atividade [...] compreende, observada essa específica limitação espacial (área interna não acessível ao público), os escritórios profissionais, inclusive os de contabilidade, ‘embora sem conexão com a casa de moradia propriamente dita’" (HC 93.050, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 10-6-08, DJE de 1º-8-08 - STF) [Grifamos]
- Cumpre asseverar a existência também dos direitos fundamentais oriundos de tratados internacionais de que a República Federativa do Brasil faça parte, não enumerados neste texto por constituírem matéria ampla e complexa, digna de ser abordada em trabalhado apartado.
(STF – Pleno – MS nº 22.164/SP – Rel. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça, Seção I, 17 nov. 1995, p. 39.206, [citado por MORAES, Alexandre de. In: Direito constitucional. São Paulo: Atlas, 2009, p.31]).