1. As operações de paz: fundamentos jurídicos e características gerais
As operações de paz, fenômeno complexo e de características mutáveis, foram concebidas para ser uma forma legítima do uso da força no âmbito internacional. Como consistem, em tese, na expressão armada da vontade coletiva dos membros das Nações Unidas, as operações são um dos meios juridicamente admissíveis de ação coercitiva. Ainda que, em seus primórdios, elas apresentassem características unicamente defensivas, constituídas por mandatos restritivos e por equipamentos de baixa letalidade, as operações de paz, mesmo as denominadas operações de manutenção da paz, em sentido estrito, são uma forma de uso da força legalmente fundamentada na idéia de segurança coletiva.
Embora tenham sido freqüentes desde a fundação da ONU, as operações não estão expressamente previstas na Carta de São Francisco. Sua legalidade decorre, por conseqüência, de interpretação teleológica, sistemática e extensiva do documento constitutivo da ONU, principalmente daquelas regras referentes à amplitude da competência da Assembléia Geral (Art. 11, 1, da Carta da ONU) e do Conselho de Segurança (Art. 24, 1, da Carta da ONU). Este, especialmente, constitui órgão fundamental na execução de quaisquer medidas coercitivas, inclusive nos casos de uso moderado da força pelos empreendimentos de manutenção e de construção da paz, operações que, na atualidade, são consideradas multidimensionais, uma vez que envolvem, em grande medida, finalidades múltiplas e recursos humanos civis.
Os objetivos, as regras e os princípios da organização seriam letra morta, caso a ação armada, ainda que coletiva, fosse absolutamente vedada. As características principais e os princípios que regem as operações de paz foram construídos, consuetudinariamente, com base nas disposições da Carta, na observância das normas de direito humanitário e na própria prática de formação de contingentes militares multinacionais. A classificação das operações de paz decorreu, por sua vez, da necessidade de distinguir ações militares de intensidade variada, dotadas de poder de destruição modulado conforme as características do caso concreto.
A experiência das primeiras operações de paz (e.g. UNTSO, Oriente Médio, 1948; UNEF I, Sinai/Faixa de Gaza, 1956; ONUCA, Congo, 1960; UNYOM, Iêmen, 1963; UNFICYP, Chipre, 1964; UNIPOM, fronteira entre Índia e Paquistão, 1965) possibilitou a formulação de princípios que deveriam reger as sua ações militares. Esses princípios, segundo Eugênio Diniz, podem ser sistematizados da seguinte forma:
a) condução pelos funcionários da ONU: os efetivos militares pertencem aos Estados, mas eles agem em nome das Nações Unidas, ainda que, em caso de infração à norma de conduta militar, sejam julgados pela jurisdição de seus respectivos países;
b) consentimento das partes envolvidas no conflito: a interferência da ONU deve ser legitimada pelas autoridades locais, sob pena de violação do inciso 7 do Art. 2.º da Carta;
c) imparcialidade em relação às partes em conflito: os contingentes da ONU não atuarão como aliados de nenhuma das partes, ainda que objetivem a minimização das baixas de ambas;
d) uso restrito da força: os militares da ONU só poderão agir em legítima defesa e nos limites do mandato da missão.
A complexidade dos cenários de conflito, a observância dos preceitos da Carta de São Francisco (e.g. promoção dos direitos humanos, art. 1.º da Carta) e os insucessos de algumas operações foram determinantes para que esses princípios fossem reinterpretados. Em determinadas situações, a imparcialidade na zona de combate, por exemplo, poderia significar a conivência em relação a atos violadores de direitos humanos, o que contrariaria preceito basilar da organização. O consentimento das partes, por sua vez, não poderia ser requisito absoluto para ação, uma vez que, em certas situações, a segurança da população civil e o fornecimento de ajuda humanitária mínima não são autorizados pelas lideranças combatentes. Os princípios das operações, por conseqüência, tiveram de ser readaptados às situações mais complexas e violentas, a fim de que a busca por resultados concretos não colocasse em risco os componentes da operação e as populações afetadas pelo conflito.
No que concerne à tentativa de regulamentação jurídica das operações, deve-se citar o relatório Agenda para Paz, apresentado, em 1992, pelo Secretário-Geral da ONU, Bouthros Bouthros-Ghali. Esse documento constitui esforço de sistematização das ações que objetivam a manutenção de paz. Nele são mencionados quatro procedimentos distintos de manutenção da paz: diplomacia preventiva (preventive diplomacy, art. 23 e ss), pacificação (peacemaking, art. 34 e ss) , manutenção da paz (peace-keeping, art. 46 e ss) e construção da paz após o conflito (post-conflict peace-building, art. 55 e ss). O primeiro é baseado no capítulo VI da Carta da ONU (solução pacífica de controvérsias); os outros três, por sua vez, são fundamentados, ainda que implicitamente, nos capítulos VI e VII, uma vez que, dependendo da situação, podem requerer o uso da força que extrapola os limites da atividade meramente defensiva e policial. No relatório, na seção IV, referente à pacificação, mencionam-se as unidades de imposição da paz (peace enforcement units, art. 44 e 45), as quais, no entendimento de Eugênio Diniz, são uma novidade conceitual, uma vez que a constituição desses corpos militares implica grande incremento do poder de fogo da operação, o que, por conseqüência, aumenta o grau de letalidade desta.
No ano de 2000, no mandato de Kofi Annan, o Secretariado das Nações Unidas encomendou relatório acerca da possibilidade de ampla revisão das ações concernentes à paz e à segurança. No relatório Brahimi, resultante da iniciativa de Annan, declarou-se que as características e a amplitude dos mandatos das operações de paz deveriam ser adequadas aos seus objetivos. Em situações nas quais fossem necessários armamentos mais pesados e maior poder de iniciativa para seus componentes, as operações de paz deveriam agir sob a salvaguarda das devidas autorizações legais, as quais seriam fundamentadas no capítulo VII da Carta de São Francisco.
Principalmente após os fatos que ocorreram durante a UNOSOM II (Somália) e a UNAMIR/UNOMUR (Ruanda), nas quais se tornou evidente a desproporção entre os meios materiais dos contigentes militares e as finalidades da operação, a ONU entendeu que era necessária uma revisão realista de seus procedimentos relacionados à segurança internacional ainda que isso desagradasse delegações de países que temiam a ingerência indevida e excessiva da organização em assuntos internos. Como, nos mandatos citados, os membros da operação foram prejudicados por restrições legais e pela baixa ofensividade dos armamentos utilizados, a revisão mencionada no relatório Brahimi objetivava o incremento do potencial ofensivo das operações confome as necessidades do caso concreto. As tropas, por conseguinte, deveriam, segundo novo entendimento, ser dotadas dos meios necessários para autopreservação e para o alcance de seus objetivos. Quanto mais ambiciosos os objetivos, portanto, maiores deveriam ser a amplitude do mandato da operação e o poder bélico das tropas. Se, anteriormente, todas as operações tinham fundamento jurídico em interpretação sistemática, extensiva e teleológica dos dispositivos do capítulo VI e VII (ou, conforme o Secretário-Geral Dag Hammarskjold, no capítulo VI e meio), após o relatório Brahimi, as operações militarmente mais complexas passaram a ser baseadas diretamente no capítulo VII.
A fundamentação no capítulo VII altera, substancialmente, as características das operações de paz, pois, na prática, derroga os princípios referentes ao consentimento das partes e ao uso restrito da força. No inciso 7 do Art. 2.º da Carta da ONU, a regra da não intervenção em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição interna é excetuada pela aplicação do capítulo VII:
7. Nenhuma disposição da presente Carta autorizará as Nações Unidas a intervir em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição interna de qualquer Estado, ou obrigará os membros a submeterem tais assuntos a uma solução, nos termos da presente Carta; este princípio, porém, não prejudicará a aplicação das medidas coercitivas constantes do capítulo VII.
(grifos nossos)
A possibilidade de constituir missões com base no capítulo VII transforma as operações de paz em verdadeiras unidades militares. Em decorrência disso, ocorre relevante ampliação de seu poder no campo de batalha. Em vista do aumento do potencial ofensivo, elas passam a constituir as forças armadas, ainda que temporárias, da Organização das Nações Unidas. Como exemplos de operações cujo mandato é expressamente baseado no capítulo VII, citam-se: UNMIBH (Resolução 1088/1996 do CS, Bósnia Herzegovina), UNMISET (Resolução 1590/2005 do CS, Timor Leste), UNMIS (Resolução 1590/2005, Sudão), MINUSTAH (Resolução, 1608/2005, Haiti).
2. O Brasil nas operações de paz das Nações Unidas
Embora o Brasil tenha participado, com freqüência, das operações de paz constituídas sob mandato das Nações Unidas, nota-se que a política externa brasileira apresenta restrições e reservas no que concerne à amplitude e à índole das ações militares em território estrangeiro. Estas, quando fundamentadas no capítulo VII da Carta da ONU, não são, em regra, plenamente endossadas pelo Brasil, conforme verificado, em momento recente, no caso da Resolução 1973/2011, proferida no decorrer da insurreição popular na Líbia. Essa norma, apesar de conter expressa condenação do governo líbio pela afronta aos direitos humanos e por crimes contra a humanidade, aspectos de extrema gravidade, possibilita, no entendimento da diplomacia brasileira, o uso excessivamente amplo de meios armados, o que caracteriza intervenção ilegítima nos assuntos internos do Estado africano, além de contrariar o princípio da solução pacífica dos conflitos, contido na Carta da ONU (capítulo VI) e reproduzido na Constituição Federal de 1988 (inciso VII do art. 4.º).
A posição brasileira deve ser analisada com base na tradição diplomática do país e nos incisos do art. 4.º da Constituição Federal, dispositivo que contém os princípios regentes das relações internacionais do Brasil. Na história da política externa brasileira, os conflitos, por mais graves que sejam, são, preferencialmente, solucionados por meios pacíficos, conforme é evidente no estudo do processo de fixação de limites com os países vizinhos, tarefa que costuma ser bastante conflituosa em outras regiões do mundo (LAFER, 2004). Os princípios III, IV e VII, que são, respectivamente, autodeterminação dos povos, não intervenção e solução pacífica dos conflitos, são, por sua vez, limitadores das ações militares externas do país, mesmo se estas forem executadas sob mandato de organização internacional. A prática da guerra de conquista, a intervenção nos assuntos internos de outra soberania e a aplicação de medidas coercitivas como forma de solucionar divergências não são, portanto, admissíveis segundo o ordenamento jurídico nacional.
As operações baseadas no capítulo VII da Carta da ONU são, em regra, caracterizadas por maior grau de letalidade e por mais amplo poder de intervenção. Elas são compostas, conforme nomenclatura do relatório Agenda para a paz, por unidades de imposição da paz (peace enforcement units), o que pode descaracterizar a neutralidade da ação. Em que medida essas ações são coerentes com a tradição diplomática brasileira e com os princípios da Constituição de 1988 são questões ainda não respondidas de maneira satisfatória.
Para o Brasil, participar de uma operação de paz, principalmente se fundamentada no capítulo VII, significa participar de uma coalizão de guerra, embora o confronto bélico, em sua forma convencional, seja inconciliável com os preceitos vigentes no direito das gentes e com os princípios do Estado brasileiro. A participação brasileira nas operações de paz, além disso, implica, necessariamente, a mobilização de militares nacionais e o dispêndio, em território estrangeiro, de recursos econômicos escassos do país, uma vez que, em um primeiro momento, a missão deve ser custeada pelos Estados que a compõem. Os resultados da operação, por sua vez, não beneficiam, diretamente, o povo brasileiro, ainda que seu êxito favoreça toda a coletividade de Estados. Compreender em que medida o Estado deve participar das operações de paz é conhecimento de interesse geral da população brasileira, aspecto que reforça a necessidade de tratamento público e transparente do tema.
O direito internacional público restringe o uso da força a situações excepcionais. As operações de paz são uma forma lícita de uso da força, uma vez que, em tese, decorrem da vontade coletiva dos Estados em favor da manutenção da paz no âmbito internacional. O Brasil, país que, tradicionalmente, desenvolve política externa pacífica e legalista, tem participado, ao longo dos anos, de operações de paz constituídas pela Organização das Nações Unidas e por outras organizações internacionais (e.g. Organização dos Estados Americanos). Das sessenta e três operações constituídas desde a criação da ONU, o Brasil participou de mais de trinta, ainda que, muitas vezes, sua contribuição tenha sido apenas simbólica. A participação brasileira de maior relevância tem ocorrido no Haiti, como líder das forças da MINUSTAH, Operação das Nações Unidas para Estabilização do Haiti, constituída no ano de 2004.
A despeito de sua importância na agenda externa brasileira, há, no âmbito interno, grande desconhecimento acerca das operações de paz, deficiência que impossibilita o julgamento adequado do tema, inclusive sob o prisma jurídico. A população nacional e, com freqüência, os meios de comunicação e a comunidade acadêmica ignoram a relevância e a complexidade dessas ações militares multinacionais, as quais constituem manifestação do princípio da segurança coletiva e forma legalmente admissível de ação armada em benefício da sociedade internacional.
As operações de paz são, com freqüência exagerada, avaliadas apenas sob a perspectiva política, como se apenas expressassem a vontade e o interesse das grandes potências. Embora essa perspectiva, decorrente do realismo político hobbesiano, não seja carente de fundamento, como se verifica da análise do oligárquico processo de decisório do Conselho de Segurança da ONU, a concepção das operações de paz não pode ser avaliada apenas com base no jogo de poder.
As relações internacionais, no entendimento de Celso Lafer, podem ser analisadas em três dimensões distintas: dimensão das relações econômicas, dimensão dos valores e dimensão estratégico-militar. Em cada da uma delas, predomina uma perspectiva distinta das relações internacionais. Nas relações econômicas, por causa das necessidades convergentes de trocas comerciais e de investimentos recíprocos, predomina a visão grociana de cooperação e de colaboração entre os Estados. Na dimensão dos valores, a busca por ideais a serem concretizados (e.g. plena garantia dos direitos humanos, desenvolvimento econômico sustentável), predomina a perspectiva liberal e utópica decorrente do Projeto da Paz Perpétua, de Immanuel Kant. Na dimensão estratégico-militar, por fim, na qual são tratados os assuntos de paz e de guerra, predomina a perspectiva hobbesiana das relações internacionais. Como os assuntos, nessa dimensão, estão relacionados a situações limite, que envolvem a própria sobrevivência do Estado, na forma de coletividade soberana, predomina o realismo egoísta, impulsionado pela esperança de ganhos relativos na sociedade internacional. (LAFER, 2004, p. 184)
O realismo hobbesiano não é, no entanto, a única maneira de analisar a dimensão estratégico-militar, ainda que seja, de fato, a mais eficiente. A própria idéia de entidade internacional, como a ONU e a Sociedade das Nações, que, com base no direito, organiza as relações entre Estados e que garante a paz entre os povos é, em sua origem wilsoniana, projeto utópico e liberal. No cerne da ideia das operações, por sua vez, existem aspectos idealistas, necessários na busca da plena vigência do estado de direito, originários da perspectiva kantiana das relações internacionais, na qual o litígio interestatal seria solucionado por instância de poder superior aos Estados nacionais. A base jurídica das operações de paz, por sua vez, apesar de ser fenômeno cujas especificidades foram construídas consuetudinariamente, decorre da consolidação, ainda que precária, de um ordenamento jurídico internacional, dependente do tipo de cooperação explicitada por Grócio, porém dotado de órgão executivo eficaz (Conselho de Segurança da ONU), mesmo que discriminatório e intergovernamental.
3. Considerações finais
A ampliação da importância internacional do Brasil e o ativismo do país em favor da reforma da Carta da ONU indiciam que os temas relacionados à dimensão estratégico-militar adquirem relevância cada vez maior para os formuladores de políticas públicas. Compreender, nas perspectivas política e jurídica, o funcionamento das operações de paz (compromissos internacionais consolidados na agenda diplomática nacional), sem reduzir o problema ao jogo de poder das relações internacionais, é fundamental para ajustar as necessidades internas às possibilidades externas (LAFER, 2004). O recurso mais freqüente ao capítulo VII da Carta é aspecto que torna essa compreensão ainda mais complexa sob a perspectiva brasileira, uma vez que participar das missões coercitivas de paz (peace enforcement operations) implica contribuir para composição de verdadeira aliança de guerra, cujo grau de letalidade e de intervenção pode não ser adequado às posições tradicionais do país, inclusive no que concerne à irredutível defesa da estrita legalidade internacional.
A política externa, na qualidade de política pública, deve objetivar a realização dos interesses nacionais. Deve, por conseqüência, em um país democrático, haver liame evidente entre a participação nas operações da ONU - conduta de Estado, determinada pela vontade conjugada do Executivo (art. 84, VII e XIII, da CF) e do Legislativo (art. 49, I, da CF), que onera a população nacional - e as demandas e princípios inerentes ao povo brasileiro. Por meio deste artigo interdisciplinar, com ênfase no direito internacional público, o autor buscou destacar essa relação - que, muitas vezes, é implícita - entre as ações militares externas do país e o interesse nacional, o qual, em parte, se vislumbra nas normas constitucionais, especialmente aquelas de conteúdo programático e principiológico.
A despeito das deficiências, das incompletudes e das desigualdades patentes do ordenamento internacional, este é constituído por um conjunto de normas que prescrevem as condutas lícitas e ilícitas dos Estados. As operações de paz, ainda que sejam, em diversos aspectos, problemáticas e ineficazes, são, como explicado supra, a materialização da vontade coletiva dos Estados. O Brasil, como membro originário das Nações Unidas, deve apresentar conduta compatível com os preceitos da Carta, inclusive no que concerne à manutenção da segurança internacional e às operações de paz como forma legítima de garantia desta. De que forma a participação nas operações de paz pode consolidar o comprometimento do Estado brasileiro com a ordem instituída em São Francisco é questão ainda não respondida.
Ao longo da história das relações internacionais, é comum que os países que adquirem maior importância no âmbito internacional sejam demandados, ainda que de forma indireta, a participar mais ativamente de assuntos vinculados à paz e à guerra. Esse processo ocorreu com os Estados Unidos e com o Japão, no final do século 19, e com a China, em período recente. Os Estados Unidos, por exemplo, após assumirem condição de grande potência econômica, mesmo diante de posicionamentos isolacionistas da opinião publica interna, foi impelido a adotar função cada vez mais efetiva na organização da sociedade internacional, especialmente nos temas relacionados à economia e à segurança internacional. Após a Primeira Guerra Mundial, o retorno dos EUA ao isolamento criava, internacionalmente, uma situação insustentável, conforme pode ser inferido da análise dos fatos do período entreguerras.
Embora em proporções diversas, processo semelhante ocorre com os grandes países emergentes (e.g. Brasil e Índia), os quais são cada vez mais necessários no debate dos grandes temas globais, materializados em foros de concertação política como, por exemplo, o G20 financeiro, direcionado aos problemas do sistema monetário internacional, e o BASIC (Brasil, África do Sul, Índia e China), dedicado ao diálogo de quatro grandes países emergentes acerca do meio ambiente. O Brasil, por causa de seu potencial econômico, de sua tradicional participação construtiva na solução de litígios internacionais e de sua crescente relevância para o equacionamento dos denominados temas globais, deve adquirir, em futuro próximo, papel mais importante nas questões relacionadas à segurança. A busca pela reforma da Carta das Nações Unidas, processo no qual estaria incluída a ampliação do Conselho de Segurança, acarreta a necessidade de compreensão apropriada dos mecanismos de ação militar multilateral e de preservação da segurança coletiva. A posição legalista e pacifista do Brasil deve ser coerente com a necessidade de executar, em casos específicos, medidas de força que garantam a preservação da paz e da segurança da sociedade de Estados.
Em decorrência desse novo papel desempenhado pelo Brasil no âmbito internacional, bem como por causa da tradição do país em operações de paz, o estudo do tema é fundamental para subsidiar, para contestar ou para revisar, em termos teóricos e práticos, as posições que serão adotadas pelo governo em nome do povo brasileiro. Este, por sua vez, embora, historicamente, se interesse mais por assuntos de natureza doméstica, será, progressivamente, mais incitado a opinar acerca da política externa do país, inclusive no que concerne a operações paz e a intervenções armadas em locais distantes do mundo. Seriam estas missões um ônus desmesurado e evitável imposto ao povo brasileiro ou o simples cumprimento de uma inescapável obrigação internacional? As respostas a essa questão, para que sejam construtivas e consistentes, devem ser baseadas no conhecimento amplo dos interesses domésticos e da realidade normativa e política do ambiente internacional. A pretensão do autor, por meio deste despretensioso artigo, foi a de contribuir, ainda que modestamente, na construção coletiva desse conhecimento acerca da relação entre o interno (o Brasil) e o externo (sociedade internacional), vínculo instigante que determina as próprias características da identidade nacional.
4. Bibliografia
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DINIZ, Eugênio. O Brasil e as operações de paz. In. ALTEMANI, Henrique & LESSA, Antônio Carlos (org.). Relações Internacionais do Brasil: temas e agendas. V.2. São Paulo: Saraiva/IBRI, 2006.
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SEITENFUS, Ricardo. Manual das Organizações Internacionais. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2000.
5. Documentos
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