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Política de cotas raciais para ingresso na universidade pública.

Análise da constitucionalidade

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Agenda 24/12/2011 às 08:44

4. A QUESTÃO DAS COTAS

4.1. PANORAMA SOCIAL HODIERNO DO NEGRO NO BRASIL

O Brasil abriga a segunda maior população negra do mundo. No Censo de 2000 os pretos e pardos eram mais de 75 milhões de pessoas em todo o país.

Do ponto de vista proporcional, o maior município negro do Brasil é a cidade sergipana de Nossa Senhora das Dores. No ano 2000, esta cidade era um verdadeiro quilombo, pois os negros correspondiam a 98,7% da população. Santo Inácio do Piauí vinha em segundo lugar, com 97,2% de negros. Entre as maiores concentrações de pretos e pardos também encontrava-se Caapiranga, no Amazonas, Serrano do Maranhão, no Maranhão e Pracuuba, no Amapá.

De acordo com a revista Tempo em curso,7

No mês de abril de 2010, o rendimento habitual médio do trabalho principal da PEA metropolitana branca foi de R$ 1.825,24, e o da PEA metropolitana preta & parda foi de R$ 939,48. O mesmo indicador, entre os trabalhadores brancos do sexo masculino, correspondeu a R$ 2.105,37; e entre as trabalhadoras brancas a R$ 1.495,41. Entre os trabalhadores pretos & pardos, aquele mesmo indicador foi de R$ 1.070,57 para os homens e de R$ 771,13 para as mulheres.

O argumento de que a desigualdade no Brasil é de classe é falso na medida em que estudos sobre mobilidade social constatam que para o mesmo nível de renda, ou seja, mesma origem social, brancos tem possibilidade de ascensão social bem maior que pretos e pardos. Senão veja-se:

Brancos são muito mais eficientes em converter experiência e escolaridade em retornos monetários, enquanto que os não brancos sofrem desvantagens crescentes ao tentarem subir a escada social.8

A mobilidade social do negro, ou seja, sua ascensão relativa ao conjunto da sociedade, mantém-se em patamares residuais. Não houve alteração do quadro de oportunidades no mercado de trabalho, principal fonte de renda e de mobilidade social ascendente.9

As probabilidades de fugir às limitações ligadas a uma posição social baixa são consideravelmente menores para os não brancos que para os brancos de mesma origem social. Em comparação com os brancos, os não brancos sofrem uma desvantagem competitiva em todas fases do processo de transmissão do status. 10

4.2. A CONSTITUCIONALIDADE DA DISCRIMINAÇÃO POSITIVA NO ENSINO SUPERIOR

Segundo o disposto na norma do artigo 206, inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil, reproduzida no enunciado do artigo 3º, inciso I, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a todos deve ser assegurada igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.

A educação, consagrada em nossa Carta Magna como direito fundamental, considerada serviço público essencial, deve ser entendida não apenas como o simples aprendizado da leitura, da escrita e do cálculo, mas como o direito ao pleno desenvolvimento da personalidade humana, como preparo ao exercício da cidadania.

Segundo os ensinamentos de José Celso de Mello Filho, o conceito de educação:

é mais compreensivo e abrangente que o da mera instrução. A educação objetiva propiciar a formação necessária ao desenvolvimento das aptidões, das potencialidades e da personalidade do educando. O processo educacional tem por meta: (a) qualificar o educando para o trabalho; e (b) prepará-lo para o exercício consciente da cidadania. O acesso à educação é uma das formas de realização concreta do ideal democrático.

O direito à educação teve diferentes enfoques durante a história das constituições brasileiras, sempre dentro do modelo político adotado em cada época. Desde a primeira Constituição, em 1824, quando existia o entendimento de que a educação deveria ficar a cargo da família e da Igreja Católica; passando pela de 1937, elaborada sob um regime fascista, que elaborou diretrizes que deveriam obedecer a formação física, intelectual e moral da infância e da juventude e pela de 1967, que foi antecedida de diversos atos jurídicos antidemocráticos iniciados com o Golpe de Estado de 1964.

A Constituição mesma já considerou que o acesso ao ensino fundamental, obrigatório e gratuito, é direito público subjetivo; equivale dizer que é direito plenamente eficaz e de aplicabilidade imediata, segundo a classificação de José Afonso da Silva, isto é, direito exigível judicialmente, se não for prestado espontaneamente.

Como diria Norberto Bobbio, apud Hédio Silva Júnior, o exercício da interpretação demanda um olhar sobre a floresta, e não sobre a árvore, de sorte que não basta destacar uma regra específica referente à igualdade. Impõe-se cotejar tal regra com o regime constitucional da igualdade. Isto é, considerá-la em conexão com as demais regras do sistema jurídico.

De acordo com Hédio Silva Júnior 11, a dimensão positiva do princípio da igualdade encontra sustentação em três espécies de regras constitucionais.

A primeira, de teor rigorosamente igualitarista, de alta densidade semântica, atribui ao Estado o dever de abolir a marginalização e as desigualdades, destacando-se, entre outras:

Art. 3º, III – erradicar a [...] marginalização e reduzir as desigualdades sociais [...]

[...]

Art. 23, X – combater [...] os fatores de marginalização;

[...]

Art. 170, VII – redução das desigualdades [...] sociais; [...]

Já uma segunda espécie de regras fixa textualmente prestações positivas destinadas à promoção e integração dos segmentos desfavorecidos, merecendo realce:

Art. 3º, IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação;

[...]

Art.23, X – combater [...] as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos;

[...]

Art. 227, II – criação de programas [...] de integração social dos adolescentes portadores de deficiência; [...]

Por último, mas não em último lugar, tem-se as normas que textualmente prescrevem discriminação, discriminação justa, como forma de compensar desigualdade de oportunidades, ou, em alguns casos, de fomentar o desenvolvimento de setores considerados prioritários, devendo ser ressaltadas:

Art. 7º, XX – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei:

[...]

Art. 37, VIII – a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios e sua admissão;

[...]

Art. 145, § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte [...];

[...]

Art. 170, IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País;

[...]

Art. 179. – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.

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Voltando-se os olhares para o plano das regras infraconstitucionais, destacam-se:

a) O Decreto-Lei nº 5 452/43 (CLT), que prevê, em seu artigo 354, cota de dois terços de brasileiros para empregados de empresas individuais ou coletivas;

b) O Decreto-Lei nº 5 452/43 (CLT), que estabelece, em seu artigo 373-A, a adoção de políticas destinadas a corrigir as distorções responsáveis pela desigualação de direitos entre homens e mulheres;

c) A Lei nº 8 112/90, que prescreve, em seu artigo 93, cotas para os portadores de deficiência no serviço público civil da União;

d) A Lei nº 8 213/91, que fixou, em seu artigo 93, cotas para os portadores de deficiência no setor privado, compreendida como reserva sistemática de acesso;

e) A Lei nº 8 666/93, que preceitua, em seu artigo 24, inciso XX, a exigibilidade de licitação para a contratação de associações filantrópicas de portadores de deficiência;

f) A Lei nº 10 678/03, que cria a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial; e

g) A Lei nº 9 504/97, que preconiza, em seu artigo 10, § 2º, cotas para mulheres nas candidaturas partidárias.

Acerca das cotas referidas no item "g", assim se manifestou o TSE:

Vinte por cento, no mínimo, das vagas de cada partido ou coligação deverão ser preenchidas por candidaturas de mulheres. Tal texto do parágrafo 3° do artigo 11 da Lei nº 9 100/95, não é incompatível com o inciso I do artigo 5º da constituição (TSE – Recurso Especial nº 13 759 – Rel. Nilson Vital Naves – j. 10-12-1996).

Segundo Joaquim B. Barbosa Gomes,

As leis 9.100/95 e 9.504/97 tiveram a virtude de lançar o debate em torno das ações afirmativas e, sobretudo, de tornar evidente a necessidade premente de se implementar de maneira efetiva a isonomia em matéria de gênero em nosso país. As cotas de candidaturas femininas constituem apenas o primeiro passo nesse sentido. Se é certo que é preciso tempo para se fazer avaliações mais seguras acerca da sua eficácia como medida de transformação social, não há dúvida de que já anunciam alguns resultados alvissareiros, como o incremento significativo, em termos globais, da participação feminina nas instâncias de poder. (grifado)

A utilização do critério racial como sucedâneo de distribuição de direitos encontra ampla aceitação na produção internacional. O Brasil, inclusive, ratificou alguns destes textos, e. g., a Convenção Internacional pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, ratificada pelo Decreto nº 65 810/69, que no artigo 1º, item 4, preceitua que

Não serão consideradas discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar progresso adequado de certos grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem de proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contanto que tais medidas não conduzam, em conseqüência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem alcançado os seus objetivos.

Há, ainda, a Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino, promulgada pelo Decreto nº 63 223/68:

Art. 1. Para os fins da presente Convenção, o termo "discriminação" abarca qualquer distinção, exclusão, limitação ou preferência que, por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião pública ou qualquer outra opinião, origem nacional ou social, condição econômica ou nascimento, tenha por objeto ou efeito destruir ou alterar a igualdade de tratamento em matéria de ensino e, principalmente:

a) privar qualquer pessoa ou grupo de pessoas do acesso aos diversos tipos ou graus de ensino;

b) limitar a nível inferior a educação de qualquer pessoa ou grupo;

c) sob reserva do disposto no artigo 2 da presente Convenção, instituir ou manter sistemas ou estabelecimentos de ensino separados para pessoas ou grupos de pessoas; ou

d) de impor a qualquer pessoa ou grupo de pessoas condições incompatíveis com a dignidade do homem.

Art. 2. Para os fins da presente Convenção, a palavra "ensino" refere-se aos diversos tipos e graus de ensino e compreende o acesso ao ensino, seu nível e qualidade e as condições em que é subministrado.

Na classificação da LDB 12 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), em seu artigo 16, a educação superior se enquadra no sistema federal de ensino, que abrange as instituições educacionais mantidas pela União e pelos estabelecimentos de educação superior particulares.

O acesso ao ensino superior está enfatizado no art. 208, V da CF/88 e no art. 44, II da LDB.

Da análise desses dispositivos legais extrai-se que o acesso ao ensino superior se faz pela análise do mérito/capacidade de cada estudante que conclua o ensino médio; o que, na grande maioria das instituições de ensino superior, se aplica por meio de exame vestibular.

O vestibular é a principal forma de ingresso na universidade, pois é por ele que o conhecimento do candidato é aferido e a legitimidade de assento em um banco universitário é garantida.

No entanto, não está claro o que se quer dizer com o termo capacidade. Afinal não será qualquer capacidade pessoal levada em consideração no exame de admissão. Certamente, a capacidade referida é aquela que está de acordo com as atividades-fim da instituição.

Fazem-se questões de cunho meramente cognitivo, avaliando somente a capacidade intelectual e o grau de conhecimento do candidato.

As ações afirmativas atuariam como mecanismo de incentivo à educação e ao aprimoramento de jovens integrantes de grupos minoritários, que invariavelmente assistem ao bloqueio de seu potencial de inventividade, de criação e de motivação ao aprimoramento e ao crescimento individual, vítimas das sutilezas de um sistema jurídico, político, econômico e social concebido para mantê-los em situação de excluídos.

Essa igualdade de oportunidades, na forma de inclusão social, viria a propiciar o combate às distorções econômicas e sociais verificadas ao longo do tempo e relacionadas, por exemplo, ao direito à educação, ao emprego, ao salário.

Cabe elucidar o princípio da igualdade e suas duas concepções, formal e material, neste trabalho, tendo em vista que os objetivos das ações afirmativas, em especial a restauração do equilíbrio entre grupos historicamente excluídos e o resto da sociedade, estão intimamente ligados ao conceito de políticas afirmativas.

A concepção do princípio da igualdade e dos direitos fundamentais tem origens ligadas ao pensamento cristão, como fonte remota; a doutrina do direito natural dos Séculos XVII e XVIII; o pensamento iluminista; e, posteriormente, o manifesto comunista e as doutrinas marxistas; a doutrina da Igreja, a partir do Papa Leão XIII e o intervencionismo estatal.

A primeira maneira de utilização da concepção de igualdade como princípio foi a formal. A formal é a igualdade perante a lei, tendo seu conceito estreitamente ligado aos moldes do Estado Liberal Burguês. Este modelo estatal primava pela liberdade, com supremacia dos direitos civis e políticos, em confronto com a ausência de qualquer direito social, econômico e cultural.

"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]".

A Constituição Federal de 1988 no primeiro artigo do título que trata dos direitos e garantias fundamentais (art. 5º, caput), traz o princípio da igualdade em sentido formal.

Segundo José Afonso da Silva,

Nossas constituições, desde o Império, inscreveram o princípio da igualdade, como igualdade perante a lei, enunciado que, na sua literalidade, se confunde com a mera isonomia formal, no sentido de que a lei e sua aplicação tratam a todos igualmente, sem levar em conta as distinções de grupos. A compreensão do dispositivo vigente, nos termos do art. 5º, caput, não deve ser assim tão estreita. O intérprete há que aferi-lo com outras normas constitucionais, [...] especialmente, com as exigências da justiça social, objetivo da ordem econômica e da ordem social.

A Constituição procura aproximar os dois tipos de isonomia, na medida em que não se limita ao simples enunciado da igualdade perante a lei; menciona também igualdade perante homens e mulheres e acrescenta vedações a distinção de qualquer natureza e qualquer forma de discriminação.

A visão da igualdade formal, por se demonstrar ineficaz em seu sentido prático, insuficiente para tornar as mesmas oportunidades acessíveis a todos, foi perdendo espaço para a idéia da igualdade material.

Na lição de Joaquim B. Barbosa Gomes,

[...] Cuida-se, nos dias atuais, de se consolidar a noção da igualdade material ou substancial, que, longe de se apegar ao formalismo e à abstração da concepção igualitária do pensamento liberal oitocentista, recomenda, inversamente, uma noção dinâmica, militante de igualdade, na qual necessariamente são devidamente pesadas e avaliadas as desigualdades concretas existentes na sociedade, de sorte que as situações desiguais sejam tratadas de maneira dessemelhante, evitando-se assim o aprofundamento e a perpetuação de desigualdades engendradas pela própria sociedade.

Como já demonstrado acima, em capítulo próprio, muito embora o Brasil tenha ratificado, em 1968, a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial, aprovada pela Organização das Nações Unidas em 1965, o debate sobre a situação dos negros só se iniciou em 1995, no Governo do Fernando Henrique Cardoso, sob pressão dos movimentos negros. O então presidente admitiu oficialmente, pela primeira vez na história brasileira, que os negros eram discriminados.

Apesar desse primeiro passo, de reconhecimento oficial do racismo no Brasil, pode-se dizer que até agosto de 2000 o governo brasileiro não havia empreendido grandes esforços para que a discussão e implementação de ações afirmativas entrasse na agenda política e/ou nacional brasileira.

Insta destacar que o documento oficial brasileiro apresentado à Conferência das Nações Unidas Contra o Racismo, em Durban, na África do Sul (31 de agosto a 7 de setembro de 2001), defendeu [...] a adoção de medidas afirmativas para a população afro-descendente, nas áreas de educação e trabalho.

O documento propôs a adoção de ações afirmativas para garantir o maior acesso de afro-descendentes às universidades públicas, bem como a utilização, em licitações públicas, de um critério de desempate que considere a presença de afro-descendentes, homossexuais e mulheres, no quadro funcional das empresas concorrentes.

A Conferência, em suas recomendações, especialmente nos seus parágrafos 107 e 108, endossa a importância de os Estados adotarem ações afirmativas, enquanto medidas especiais e compensatórias voltadas a aliviar a carga de um passado discriminatório, daqueles que foram vítimas da discriminação racial e de outras formas de intolerância correlata.

Antecipando-se ao Governo Federal, o estado do Rio de Janeiro destacou-se como pioneiro na aplicação de políticas afirmativas raciais por meio de lei.

Entre os anos 2000 e 2001, foram editadas as Leis Estaduais nº 3.524 e 3.708, que fizeram ingressar nas universidades estaduais, em 2003, a primeira turma pelo sistema de cotas.

Após debates entre a direção das universidades, o governo do estado e setores do Movimento Negro, houve a elaboração da Lei nº 4.151/2003, que unificou e modificou as leis anteriores, prevendo em seu artigo 5º que seriam reservadas aos estudantes carentes um mínimo de 45% das vagas, distribuídas da seguinte forma: 20% para estudantes da rede pública de ensino; 20% para negros e 5% para pessoas com deficiência.

Depois da realização de diversos estudos, foi elaborada a Lei nº 5.346, de 11 de dezembro de 2008, que criou o novo sistema de cotas para ingresso nas universidades do estado do Rio de Janeiro.

As vagas passaram a ser reservadas da seguinte forma (art. 2º): 20% para estudantes negros e indígenas, 20% para estudantes oriundos da rede pública de ensino e 5% para pessoas com deficiência e filhos de policiais civis e militares, bombeiros militares e inspetores de segurança e administração penitenciária, mortos ou incapacitados em razão do serviço.

Com tal exemplo, a partir da implantação pelas universidades do Rio de Janeiro, várias outras instituições de ensino superior começaram a adotar políticas afirmativas.

A Universidade do Estado da Bahia (UNEB), por intermédio da Resolução nº 196/2002, estabeleceu a cota mínima de 40% das vagas para a população afrodescendente, relativas aos cursos de graduação e pós-graduação (medida implementada no processo seletivo/vestibular/2003), cuja seleção operou-se em dezembro de 2002.

Em junho de 2004, a Universidade de Brasília foi a primeira Universidade Federal a implementar a política de cotas raciais, com a adoção do Plano de Metas para a Integração Social, Étnica e Racial, que reservou 20% de suas vagas para estudantes negros.

Há, ainda, instituições que adotam sistema diverso das universidades acima. Estas implementaram, como ação afirmativa racial, uma política de bônus, na qual o alunos afrodescendentes teriam acrescidos em sua nota final uma nota bônus, a fim de minimizar as diferenças entre os grupos étnicos.

Assim, verifica-se que, baseadas na autonomia universitária, as instituições utilizam-se de meios diversos para a instituição das cotas.

Existem aquelas que aplicam as políticas afirmativas por meio de resoluções dos conselhos universitários e algumas se valem dos próprios editais dos vestibulares.

A UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), por meio da Resolução nº 008/2007, disciplinou:

A autonomia universitária está prevista no art. 207. da Constituição Federal de 1988, nos seguintes termos: "As Universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão".

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei nº 9.394/96, consagra a autonomia universitária no capítulo IV, que trata do ensino superior. Os artigos 53 e 54 demonstram os limites e atribuições das instituições de ensino superior.

Tal autonomia vem ganhando destaque nas discussões a respeito da implantação das políticas de ação afirmativa nas instituições públicas de ensino. Tanto nas ações propostas contra as Resoluções Normativas que instituem, quanto nos projetos de lei acerca do tema.

É dever do Estado, garantir o acesso aos níveis mais elevados do ensino, conforme artigo 208, inciso V, da Constituição Federal de 1988, e tal acesso deverá ser feito em igualdade de condições e permanência na escola.

Sobre o autor
Gerson Mesquita de Brito

Assistente jurídico. Advogado. Professor. Graduado em Direito pelo Instituto de Ciências Jurídicas e Sociais Professor Camillo Filho, em Teresina (PI). Pós-graduando em Direito Constitucional Aplicado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRITO, Gerson Mesquita. Política de cotas raciais para ingresso na universidade pública.: Análise da constitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3097, 24 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20705. Acesso em: 22 nov. 2024.

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