1. Introdução
As noções gregas de thémis e díke deram origem a uma vasta literatura de cunho linguístico, filosófico e mesmo filosófico-jurídico. Autores de variadas áreas do conhecimento debateram e debatem incansavelmente acerca dos significados que os dois termos apresentavam para as sociedades da Grécia Antiga. Hoje algum consenso vige sobre o assunto, mas controvérsias há que persistem. No primeiro momento deste trabalho, faremos breve exposição das múltiplas interpretações que ao longo das décadas foram atribuídas a thémis e díke. Em seguida, confrontaremos os conceitos com duas figuras mitológicas: a Titânida Têmis e a deusa Dique, respectivamente. Entendemos que, assim como tais personagens não se podem confundir, thémis e díke dizem respeito a ideias distintas. Note-se que incontáveis poetas, mitólogos e historiadores gregos escreveram sobre Têmis e Dique; daí que, a fim de lapidarmos nosso estudo, focar-nos-emos nas obras de Homero (Ilíada e Hinos homéricos) e Hesíodo (Teogonia e Trabalhos e Dias). Na parte final, buscaremos associar a dualidade de Têmis (thémis antropomorfizada) e Dique (díke antropomorfizada) à clássica oposição, no Direito, entre jusnaturalismo e juspositivismo, perspectivas que serão explicadas mais adiante.
2. Thémis/Têmis e Díke/Dique
Historiadores da primeira metade do século XX sugeriam que, primitivamente, o termo thémis correspondia à justiça (aqui equacionada ao direito [01]) dentro do âmbito da família, ao passo que díke compreenderia a justiça interfamiliar (Arnaoutoglou, 2009, p. 12). Conforme complementa Benveniste, a thémis seria exercida verticalmente, de cima para baixo, por um chefe ou rei (basileus), e a díke engendraria uma configuração horizontal, já que se prestaria a reger as relações entre famílias, que, salvo exceções, ocupariam um mesmo patamar no grupo social (Pattaro, 2005, p. 270). Essa teoria permaneceu inconteste por muitos anos, até que foram realizadas compilações mais exaustivas dos empregos e usos de ambos os termos nos registros históricos e literários da Grécia Antiga. Constatou-se que thémis e díke eram noções bem mais complexas do que outrora se imaginara, tornando-se as definições tradicionais – as da primeira metade do século XX – incapazes de abranger a multiplicidade de “novos” sentidos (Arnaoutoglou, 2009, p. 12-13).
Debruçando-se sobre escritos tanto de mitólogos e poetas quanto de dramaturgos e filósofos, Jean Rudhardt (1999, p. 25-26) organiza em cinco categorias os domínios de incidência da thémis (conceito), que podem se correlacionar a cinco papéis de Têmis (a deusa): I) práticas rituais; (II) condutas de teor afetivo, tidas como normais [02]; (III) deveres dos homens em sociedade; (IV) coerência do indivíduo para consigo mesmo; e (V) estabilidade do cosmos. O autor sustenta que a thémis “não é uma substância, não é uma instituição, não está definida por um conjunto de leis passíveis de serem claramente enunciadas” (Rudhardt, 1999, p. 23, tradução nossa); não é juridicamente exigível, não promove qualquer pressão objetiva e, a despeito disso, sua influência é irrecusável. Manifesta-se, especula Rudhardt, sob a forma de um sentimento moral, talvez de ordem religiosa. O que ora se expôs consigna apenas uma interpretação; todavia, na medida em que são relativamente escassas as menções a thémis/Têmis em todo o repertório de mitos gregos, cremos tratar-se de uma interpretação plausível. Um único adendo que nos parece importante para completar a concepção de Rudhardt: segundo Arnaoutoglou (2009, p. 22), a thémis encerra um coletivo de princípios primordiais, prévios à sociedade. E princípio primordial não seria uma redundância? Não exatamente (assim pensamos), e a seguir passamos a justificar nossa resposta, tentando ligar thémis, enquanto conceito, à deusa Têmis.
Têmis é filha de Úrano (Céu) e Gaia (Terra), pertencente, pois, à linhagem dos Titãs (Teogonia, 132). Veneranda, Zeus convida-a a figurar no Olimpo entre os demais deuses, e desposa-a logo após Métis; dessa união emergem as Horas (Dique, Eunômia e Irene) e as Moîras antropomorfizadas (Teog., 901) [03]. Como é sabido, os Titãs representam forças primevas, e Têmis não é diferente. O Direito Divino que ela empunha – ou melhor, que encarna – é anterior à Ordem da Cultura instituída por Zeus, bem como anterior ao surgimento do homem e ao nascimento das Horas (as estações), suas filhas. Sobretudo, Têmis é mais antiga que Crono e, por conseguinte, é o direito que precede o próprio tempo; daí a Titânida personificar os supracitados “princípios primordiais” [04], noções morais desde sempre conhecidas e compartilhadas por toda a humanidade, e por isso consideradas naturais. Junito Brandão (2000, p. 201) aponta que thémis/Têmis se expressa por meio de Leis Eternas. Tal perenidade não deriva simplesmente do fato de Têmis ser uma deusa, imortal. Em leitura nossa, captamos a sensação de que, nos mitos, Têmis se protrai, no plano temporal, para frente e para trás; se tomarmos como referencial do “momento presente” a Ordem da Cultura, iniciada quando Zeus vira soberano do Universo, pode-se ver que Têmis extrapola os limites desse novo status quo: em direção ao passado, pois é Titânida; e em direção ao futuro, pois é divindade oracular [05]. Enfim, a palavra da deusa vigeria tanto num pretérito remoto quanto num porvir ainda por chegar. Resta ainda uma última característica de Têmis digna de análise: entre os domínios sobre que incide a influência da deusa, inclui-se a estabilidade do cosmos, como já se registrou. Ora, uns atribuem à Titânida a ideia da Guerra de Troia, a fim de “se equilibrar a densidade demográfica da Terra” (Brandão, 2000, p. 201), ou seja, justamente para preservar a saúde do mundo. Ademais, à Têmis é comumente imputado o encargo de presidir as assembleias dos imortais [06] (Ilíada, XX, 5) e, ao desempenhar essa função de árbitra e coordenadora, ela garante a harmonia e ordem entre os deuses; aliás, uma vez que estes representam forças da natureza e/ou instituições humanas, a Titânida estaria contribuindo para um balanço de proporções bem mais amplas até: estaria assegurando a estabilidade cósmica. Entretanto, saliente-se que ela assim procede a comando de Zeus, autoridade suprema do Universo; Têmis depende do poder do Cronida, e ele, se quisesse, conforme Homero, bem poderia subverter a ordem natural das coisas; optando por não fazê-lo, Zeus ouve sua segunda esposa e primeira conselheira, e reciprocamente a deusa escuta os “sussurros de sabedoria” daquele que construiu o status quo no pós-Titanomaquia (Hino Homérico a Zeus, XXIII apud Atsma, 2000-2008a). É essa maior a abrangência de atribuições – que se remetem aos homens, aos imortais e ao cosmos – que distingue o direito divino thémis do nómos (o direito humano, o direito da pólis) e da díke.
Segundo Havelock, a díke engloba “[r]itos ou padrões de comportamento vigentes, que são aceitos ou esperados... Esses códigos podem ser encarados tanto como ‘costumes esperados’ (nomoi) quanto como ‘hábitos esperados’ (ethè)” (1978, p. 182 apud Pattaro, 2005, p. 286). Enrico Pattaro refina o argumento de Havelock e sugere que a díke não consistiria exatamente nas normas humanas em si (isso seria o nómos), mas sim num juízo de valor à luz de tais normas. A díke se refere àquilo que está objetivamente de acordo com o direito; é o agir correto, consoante às regras consuetudinárias em vigor (Pattaro, 2005, p. 283). Daí que a recorrente tradução de díke para “justiça” deve ser vista como uma aproximação. Nesse caso, por “justiça” não se tem em mente a acepção contemporânea do vocábulo – de justiça como um senso, um valor ou um ideal –, mas sim algo mais palpável: “o justo”, o que é certo, o que se adéqua ao direito dos homens. Se a thémis diz respeito ao que é moralmente exigível porque conforme as Leis Eternas (e naturais), a díke compreende o que é juridicamente exigível porque conforme as leis humanas, o nómos.
E em suas aparições ao longo da mitologia, a deusa Dique realmente se volta para os assuntos dos homens, seja punindo quem se desviar da díke, seja remediando a Hýbris (o descomedimento), seja cobrando dos magistrados que profiram sentenças retas. Na Teogonia, Dique é filha de Têmis e Zeus; com suas duas irmãs, Eunômia (Equidade ou a Boa Ordem) e Irene (Paz), integra a tríade das Horas, as estações. Não é coincidência que as deusas representantes dos atributos de uma cidade virtuosa estejam ligadas a fenômenos naturais. Conforme o pensamento predominante na Grécia Antiga, “[a] ordem social não é senão o aspecto que entre os homens assume a ordem da natureza” (Torrano, 1995). Se na pólis a justiça, a boa ordem e a paz forem preservadas, então os deuses assegurarão a fecundidade do solo e dos rebanhos; ao contrário, se o descomedimento e a violência reinarem, esterilidade e fome sobrevirão (Trabalhos e Dias, 225-247). Em Trabalhos e Dias, em determinada passagem Dique é retratada como uma divindade que, quando desrespeitada e afastada da cidade pelos mortais, nela permanece, vagando invisível e chorando, a distribuir infortúnios para quem a destratou (Trab., 219-224); em outro trecho, não é Dique a responsável pela retribuição dos atos e julgamentos tortos, mas Zeus: “quando alguém a fere [a Justiça] com mentira injuriosa, ela senta ao lado de seu pai, Zeus o filho de Crono, e conta a ele das intenções más dos homens, até que as pessoas paguem pela loucura tola de seus príncipes” (Trab., 258-261). O Cronida protege Dique contra desonra de qualquer sorte, pois detém autoridade para tanto. Assim, se Hesíodo recomenda ao irmão Perses que ouça a Justiça e acolha o trabalho (Trab., 213), o aedo admoesta os “reis comedores de presentes” [07] de seu tempo ameaçando-os ao invocar Zeus (Trab., 252-255), senhor de todos os deuses, inclusive da Justiça. Pregar que Dique deva ser seguida é uma coisa; outra bem diferente é fazê-la prevalecer acima de tudo, para o que é necessário o poder do soberano do Universo.
3. Têmis e o jusnaturalismo e Dique e o juspositivismo
E como associar Têmis e Dique às correntes, no Direito, do jusnaturalismo e do juspositivismo, respectivamente? Em primeiro lugar, é de bom tom esclarecer que tal associação configura tão somente um esforço de se identificar caracteres comuns entre as deusas e as perspectivas jurídicas. Em segundo lugar, importa que definamos estas. O jusnaturalismo defende que, além e acima do direito escrito, há o Direito Natural, cujas normas servem como parâmetro da justiça perfeita e devem, idealmente, nortear o legislador na elaboração do ordenamento jurídico de seu Estado. “O adjetivo natural... indica que a ordem de princípios não é criada pelo homem e que expressa algo espontâneo, revelado pela própria natureza.” (Reale, 2008, p. 375) A fundamentação do Direito Natural tem variado ao longo da História: para os estóicos, era o equilíbrio cósmico; para a teologia medieval, a vontade divina; no Iluminismo, a razão. Hoje, impera a ideia de que o Direito Natural advém da natureza humana; significa que, simplesmente por ser humano, o homem possui direitos inalienáveis, estejam eles elencados ou não numa constituição. Já o juspositivismo rejeita a existência de um Direito Natural. “Para o positivismo jurídico só existe uma ordem jurídica: a comandada pelo Estado e que é soberana”; o Direito Natural é tido como pertencente à esfera da metafísica, e portanto é desprezado, visto que não pode ser cientificamente apreciado (Reale, 2008, p. 374, 384-385).
Por fim, as comparações. O Direito Natural é eterno e universal; assim como Têmis, cuja influência se protrai no tempo rumo ao passado (pois é Titânida) e ao futuro (pois é divindade oracular) e que atua sobre o âmbito dos mortais, dos deuses e do Universo em geral. O Direito Positivo restringe-se aos limites do Estado. À semelhança de Dique, que se volta estritamente para os assuntos dos homens e está intimamente concatenada ao nómos; logo, a deusa cessaria sua manifestação com o fim da vida humana ou da vida da pólis; a correlação aqui se dá por intermédio da cidade-Estado grega, que, por ser a unidade política principal da Hélade, pode equivaler em essência ao Estado, central no cenário internacional presente.
O Direito Natural é imutável, bem como (quase) o são as leis que Têmis encarna; afinal, apenas Zeus pode alterar a ordem natural das coisas. Já o Direito Positivo é mais flexível, porque histórica e socialmente contingente; igualmente, cabe especular que Dique, já que julga o comportamento dos homens à luz dos bons costumes vigentes, pode sofrer transformação em seu modus operandi, caso o direito consuetudinário venha a mudar; a díke da reforma legislativa de Sólon distingue-se da díke da época dos Eupátridas, por exemplo.
O conteúdo do Direito Natural consiste de valores abstratos, etéreos até; tanto que, genealogicamente, certos autores entrevêem em Sófocles – no diálogo de Antígona com o rei Creonte, em que se mencionam “leis não-escritas” [08], não positivadas, imaterializadas – um quê de jusnaturalismo; a qualidade “abstratos” também se adéqua aos “princípios primordiais” de Têmis. Em contrapartida, o Direito Positivo compõe-se por normas reais, concretas, materializadas, similarmente ao nómos, que Dique tem por referência.
O Direito Natural não é dotado de coercibilidade, ou seja, ninguém pode ser jurídica ou judicialmente obrigado a cumpri-lo; analogamente, Têmis preserva a estabilidade do cosmos com sutileza. A Titânida aconselha Zeus, modera assembleias no Olimpo, enuncia profecias, sugere cursos de ação: não coage os seres a ocuparem seu devido lugar num Universo ordenado; a ordem persevera porque fundada em “princípios primordiais”, tão naturais quanto é, para nós, a respiração. Ademais, vale mesmo lembrar que para Rudhardt a thémis se expressa sob a forma de um sentimento moral. Por seu turno, o Direito Positivo apresenta coercibilidade, uma vez que respaldado pela soberania do Estado; bem assim Dique, quando destratada, reage – solitariamente ou recorrendo à autoridade do pai Cronida – com retribuição bastante tangível; aliás, em algumas versões peculiares do mito, a deusa vê sua força ainda mais potencializada: em Ésquilo (Coéforas, 639 apud Atsma, 2000-2008b), é representada portando uma espada forjada por Aîsa [09] (o Destino); em Platão (Leis, 716c apud Atsma, 2000-2008b), a implacável Nêmesis (a Vingança ou a Indignação) é sua mensageira.
Ressalte-se que na contemporaneidade se encontra superada a dicotomia entre juspositivismo e jusnaturalismo, visto que ambos têm suas deficiências. Sínteses vêm sendo esboçadas, combinando as normas positivas que a doutrina juspositivista tem em mira com os valores e ideais tão prezados pela ótica jusnaturalista (Reale, 2008, p. 381). Paralelamente, embora desconheçamos um mito que conjugue a participação de Têmis e Dique, pensa-se que, não obstante os papéis distintos, as deusas agem de maneira concertada; afinal, para os gregos de outrora, a ordem natural, domínio de Têmis, e a ordem social, domínio de Dique, eram indissociáveis. As funções da Titânida e sua filha são (devem ser) tão conciliáveis quanto hoje pretendem (devem) ser o Direito Positivo e o Direito Natural.
Se convergências podem ser vislumbradas entre as divindades e as perspectivas jurídicas, explicite-se que também se verificam diferenças. Todavia, nosso intuito neste trabalho não foi lidar com divergências, e logo sobre elas não teceremos comentários, a fim de evitar alongarmo-nos mais. Em suma, concluiu-se que há, sim, afinidades entre Têmis e o jusnaturalismo, de um lado, e Dique e o juspositivismo, de outro, de modo que se depreende que essas facetas do Direito já eram entrevistas, mesmo que numa abordagem protojurídica, na mitologia da Grécia Antiga.
Referências bibliográficas
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_____. Moirai. In: The Theoi Project: Greek Mythology. 2000-2008c. Disponível em: <http://www.theoi.com/Daimon/Moirai.html>. Acesso em: 22 abr. 2011.
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NADER, Paulo. Introdução ao estudo do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
PATTARO, Enrico. A treatise of legal philosophy and general jurisprudence, vol. I. Dordrecht (Holanda): Springer, 2005. Disponível em: <http://books.google.com>. Acesso em: 21 abr. 2011.
RUDHARDT, Jean. Thémis et les Hôrai: recherche sur les divinités grecques de la justice et de la paix. Geneva: Droz, 1999. Disponível em: <http://books.google.com>. Acesso em: 21 abr. 2011.
Notas
1. Tradicionalmente, a justiça e o direito bem podiam confundir-se, de sorte que o justo significava aquilo que estivesse de acordo com o direito, e injusto era o ato contrário ao direito. Modernamente, quando falamos em direito, em geral queremos nos referir ao chamado direito objetivo, isto é, o arcabouço de normas (ordenamento jurídico) destinadas a regular a vida em sociedade. Por sua vez, a justiça consistiria, em tese, na meta principal do direito. Uma definição de justiça reside na máxima do jurisconsulto romano Ulpiano: “Justiça é a constante e firme vontade de dar a cada um o que é seu”, seja de acordo com o mérito, a culpa ou um critério diverso (Nader, 2008, p. 105). A famosa concepção aristotélica a respeito da “verdadeira igualdade” também vem a calhar: “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se desigualam”. Contudo, a justiça nem sempre equivale ao direito. Tanto que é perfeitamente possível conceber uma lei ou uma decisão judicial injusta; basta que atentem contra os princípios da isonomia e da proporcionalidade, consagrados na prescrição de Aristóteles supracitada. Aliás, se existem autores que consideram irreconciliáveis os valores da ordem e da justiça, ressaltando que o direito deve privilegiar um em detrimento do outro (BULL, Hedley. The anarchical society. New York: Palgrave, 1977), há aqueles que enquadram a justiça plena no rol dos objetivos utópicos.
2. Por exemplo, a thémis estaria presente nas tragédias, permitindo que uma esposa pranteasse o desaparecimento de seu marido (Rudhardt, 1999, p. 25).
3. Em variantes posteriores, Zeus e Têmis geram, além das Horas e das Moîras, Astreia (a constelação de Virgem e, para alguns, a mesma entidade que Dique), as Ninfas do rio Erídano e as Hespérides. Em Ésquilo, Têmis é mãe de Prometeu (Grimal, 1990, p. 427).
4. Poder-se-ia perguntar de que princípios, mais especificamente, está-se falando. Num aparecimento bem mais recente do que em Homero e Hesíodo, na obra de Diodoro Sículo, Têmis foi quem primeiro instruiu os homens sobre piedade, hospitalidade, boa governança e decoro numa assembleia (Biblioteca Histórica 5.67.3 apud Atsma, 2000-2008a).
5. Ensinou mântica a Apolo e ocupou o santuário em Delfos antes de legá-lo a ele (Grimal, 1990, p. 427. Ver ainda: Hino Órfico a Têmis, 79; Ésquilo, Eumênides, 1 e segs. apud Atsma, 2000-2008a).
6. Bem como é ela a responsável pela partilha das honrarias durante os banquetes no Olimpo (Il., XV, 84 e segs.), dando a cada deus o que merece e na medida em que merece, exercendo assim a justiça divina.
7. Alvos das críticas de Hesíodo, os Eupátridas eram nobres proprietários das maiores glebas, e por isso mesmo faziam as vezes de donos da pólis e exerciam a atividade jurisdicional, a composição dos litígios. Sua legitimidade advinha do privilégio da thémis, que alegavam conhecer e aplicar, enquanto na verdade arbitravam os conflitos em função de seus próprios interesses (Brandão, 2000, p. 151-152).
8. No diálogo, Antígona vê-se impedida de enterrar seu irmão devido a decreto do tirano Creonte, e diz a este: “tuas ordens não valem mais do que as leis não-escritas e imutáveis dos deuses, que não são de hoje e nem de ontem e ninguém sabe quando nasceram” (apud Reale, 2008, p. 375). É natural que os mortos sejam enterrados e, ao instituir o contrário, Creonte estaria atentando contra uma lei natural.
9. Aîsa às vezes identificada com Átropos (a terceira das Moîras personificadas, a Inflexível); vezes outras é sinônimo da Moîra amorfa; e numa terceira versão Moîra e Aîsa são entidades distintas, mas que desempenham as mesmas funções (Atsma, 2000-2008c).