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Processo Administrativo

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Agenda 01/10/2001 às 00:00

6. Tipologia

A doutrina, utilizando-se de critérios diversos, intenta sistematizar em tipologias e classificações os diversos tipos de procedimentos administrativos que se apresentam na rotina da Administração Pública. Alerte-se, desde logo, que não se trata de empresa fácil, dada a enorme gama de variações possíveis, nem sempre apreensíveis em esquemas classificatórios.

Procedimentos internos e externos. Os primeiros, também chamados intra-administrativos, são aqueles que se originam de uma relação entre órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ou entre tais órgãos e seus servidores, efetivos, comissionados ou temporários (Exemplo: processos preparatórios à celebração de convênios, processos disciplinares). O segundo é aquele que se desenvolve entre o Poder Público e particulares (Exemplo: licitação para aquisição de equipamentos ou concessão de serviço ou bem público). Não se deve assimilar interno a secreto e externo a público. Todo procedimento, interno ou externo, deve ser, a princípio, público, salvo quando o contrário determinar interesse público relevante ou a preservação da imagem e honra de pessoas. O afastamento da regra da publicidade deve fazer-se mediante decisão fundamentada da autoridade administrativa competente, decisão esta passível de controle administrativo ou jurisdicional, quando eivada de ilegalidade.

Procedimento declaratório e procedimento constitutivo. Os primeiros têm escopo e efeitos declaratórios, servindo para atribuir qualificações jurídicas a pessoas, a coisas, a relações, como os processos que culminam na concessão de títulos acadêmicos, na inscrição em quadros profissionais, ou na emissão de certidões negativas de débito para com o Fisco. O segundo, para além da mera declaração, culminam, através do seu ato final, na constituição, modificação ou desconstituição de uma determinada situação jurídica. É o caso da licitação, que encerra com a adjudicação do objeto da licitação ao vencedor do certame, ou da expedição de licença ambiental, que permite ao particular, sob determinadas circunstâncias, proceder a corte de árvores.

Os processos constitutivos podem apresentar três feições: a) podem ser ablatórios (conducentes à privação de bens, como no caso da desapropriação por interesse público); b) podem ser concessórios (ampliando a esfera jurídica do administrado, como no caso da concessão ou permissão de uso de bem público); e c) podem ser autorizatórios (impedindo ou consentindo que o particular faça algo).

Procedimento constitutivo ou impugnativo. Sob uma outra ótica, distinta da anterior, o procedimento pode ser constitutivo ou impugnativo. O primeiro, também chamado de processo de 1º grau ou ainda preparatório, tem por finalidade a emissão de atos administrativos, via de regra decidindo conflitos na primeira instância da via administrativa. O segundo, também chamado de procedimento recursivo, destina-se a impugnar ou recorrer, para uma segunda instância administrativa, de uma dada decisão administrativa tomada na primeira.

Procedimentos nominados e inominados. São nominados os processos administrativos que têm, no ordenamento jurídico-postivo, um "nomen iuris" próprio, com procedimento fixado em lei. Exemplo: procedimento licitatório, procedimento disciplinar. São inominados, por outro lado, aqueles que não têm senão uma denominação genérica, sem disciplina legal específica, e cujos contornos procedimentais obedecem apenas aos princípios gerais do processo. É o caso dos chamados processos de expediente, que analisaremos a seguir.


7. Atos e formalidades

Estruturado e conduzido com base nos princípios acima e comportando a atuação de órgãos, agentes públicos e particulares, o procedimento administrativo não prescinde da prática de atos e da observância de algumas formalidades no que se refere à sua instauração e desenvolvimento. Analisaremos, agora, os atos e formalidades mais corriqueiros no processo administrativo, sempre recordando que o grau de formalidade ou informalidade depende, em última instância, da matéria versada e das finalidades do processo em questão. Tratando-se do processo administrativo de âmbito federal (Lei 9.784/99), vale a regra geral já suscitada de que os atos e termos não dependem de forma determinada, senão quando a lei expressamente a exigir (art. 22).

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Instauração e autuação. O procedimento pode originar-se de ofício (exemplo: auto de infração) ou mediante provocação de parte (denúncia, reclamação, petição, etc.). Instaurado o processo administrativo, por ato da autoridade competente, atendendo ou não a provocação de alguém, com designação ou não de comissão, este deve ser autuado desde seu início. Como anota Nelson Nery Costa (Processo administrativo e suas espécies, Forense, Rio de Janeiro, 1997, p. 30), o processo administrativo compreende a reunião ordenada e cronológica das peças processuais que o integram, coberto por uma capa que contenha informações relativas ao assunto, interessados, nome da repartição, data e local. Depois de formalizado, deve ser numerado e sua tramitação pelos órgãos públicos precisa ser anotada. A capa do processo é a folha inicial, devendo a numeração das demais folhas sucedê-la. Cada juntada de documento deve ser comprovada, através de termo de juntada, emitido pela autoridade competente. Pode ocorrer apensamentos de outros processos conexos com o principal, para que haja melhor esclarecimento e uniformidade de decisões.

Formalização dos atos e termos. Em razão do princípio da formalidade (não formalismo), e das exigências de controle, inerente às atividades administrativas, todos os atos do processo, produzidos pelas partes envolvidas, deverão assumir forma escrita. Mesmo os processos marcados pela oralidade, com audiências de instrução com oitiva de testemunhas ou acareação de pessoas deverão, ao final, serem reduzidos a termo.

Segundo a LPA (art. 22), os atos do processo devem ser produzidos por escrito, em vernáculo, com a data e local de sua realização e a assinatura da autoridade responsável (§ 1º). Salvo imposição legal, o reconhecimento de firma somente será exigido quando houver dúvida de autenticidade (§ 2º). O processo deverá ter suas páginas numeradas sequencialmente e rubricadas (§ 4º).

Produção de prova. A prova, dependendo do caso, poderá ser apresentada tanto pela Administração quanto pelo administrado. Quando produzida pela administrado, tal ocorre em virtude do direito de defesa, que implica a possibilidade de oferecer e produzir prova, permitindo-se, em princípio, a ampla produção, vedadas somente aquelas não permitidas em direito (Exemplo: escuta telefônica clandestina e outras provas obtidas por meios ilícitos).

Assim, no curso do procedimento, em conformidade com seu objeto, poderão ser apresentados os seguintes meios de prova: a) prova documental (certidões, atestados, declarações, fotografias, video-cassetes, gravações feitas em recintos públicos, etc.), sendo admitidos tanto documentos públicos quanto privados; b) prova testemunhal (depoimentos de servidores públicos e particulares); e c) prova pericial, quando o deslinde de uma dada situação exigir o concurso de conhecimentos técnicos especializados (Exemplo: perícias relativas a danos ambientais).

Segundo a LPA (art. 36), cabe ao interessado a prova dos fatos que tenha alegado. Contudo, quando o interessado declarar que fatos e dados estão registrados em documentos existentes na própria Administração responsável pelo processo ou em outro órgão administrativo, o órgão competente para instrução proverá, de ofício, a obtenção dos documentos ou das respectivas cópias (art. 37). O interessado, poderá, ainda na fase instrutória e antes de tomada a decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo (art. 38). Por outro lado, deve-se considerar que os elementos probatórios deverão ser considerados na motivação do relatório e da decisão (§ 1º).

Sendo o procedimento conduzido por comissão, órgão ou autoridade pública singular, esta, detentora da prerrogativa de condução e direção do processo, e tendo em vista os imperativos de eficiência, economia e celeridade, sem comprometimento da ampla defesa, poderá rejeitar a prova oferecida, total ou parcialmente, quando esta for impertinente ou meramente protelatória, devendo fazê-lo através de despaho fundamentado. Neste diapasão, pela LPA, "somente poderão ser recusadas, mediante decisão fundamentada, as provas propostas pelos interessados quando seja ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias" (art. 38, § 2º).

Na valoração das provas, a Administração não se encontra enclausurada dentro de parâmetros fixos, não se admitindo, por outro lado, a valoração discricionária e arbitrária. Vigora aqui o princípio da apreciação crítica e da livre convicção, a qual, ao manifestar-se em julgamento ou decisão, deve expressar-se de forma fundamentada, revelando de forma explícita os caminhos de sua formação. Assim, chegado ao termo do procedimento, a decisão a ser tomada deve ser motivada.

Prolação da decisão administrativa. O processo, em sua estruturação dialética e progressiva, destina-se à formação de uma decisão administrativa, que consubstancia um ato administrativo, prenhe, como todo ato jurídico, de efeitos jurídicos. Pode-se afirmar, neste sentido, que a Administração Pública, através de seus agentes e órgãos competentes, tem não só a prerrogativa, mas fundamentalmente o dever de resolver, de decidir as questões que lhe são postas de forma legítima, atendidos os requisitos legais. Deve-se, portanto, evitar toda a morosidade, prolatando-se a decisão administrativa no prazo legal, ou quando este não se encontra previsto em lei, dentro de um prazo razoável. Pela LPA, "a Administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em matéria de sua competência" (art. 48).

Deve-se atentar para a especificidade das decisões colegiadas, ou seja, proferidas, ao termo do procedimento, por um órgão colegiado. Na decisão colegiada, com lembra Lúcia Valle Figueiredo (Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 2ª ed., p. 298), o ato expressado por apenas um dos membros do colegiado (que pode receber o nome de relator), normalmente de forma oral, não se constitui em decisão propriamente dita. Somente o será quando aceito pela manifestação dos outros integrantes do colegiado, presente o "quorum" mínimo, nos termos previstos em lei, regulamento ou regimento interno. A não observância do "quorum" implica em nulidade da decisão tomada. A votação, por seu turno, normalmente observa o princípio majoritário, ou seja, vence a proposição que consegue o maior número de votos. Quando não exigida expressamente uma maioria absoluta, subentende-se que a deliberação pode ser tomada mediante maioria simples, isto é, com 50% mais 1 (um) dos presentes, observado o "quorum" mínimo.

Havendo posições individuais divergentes, estas, quando manifestadas e expressas, têm força para eximir o vencido na votação as conseqüências que podem advir da decisão colegiada. É o que pode ocorrer, por exemplo, nas licitações, quando se permite que membro da comissão licitante declare seu voto (Lei nº 8.666/93, art. 51, § 3º). Cite-se como outros exemplos de decisão colegiada a tomada por Conselhos de Contribuintes em processos administrativos fiscais, ou Conselhos de Usuários em procedimentos relativos a serviços públicos.

Muitas vezes ocorre o chamado silêncio da Administração. Instada a se manifestar sobre determinado assunto, de interesse individual, corporativo ou público, o Poder Público não se manifesta. Ou mesmo sendo processada uma determinada pretensão, a decisão administrativa, em processo administrativo, não é pronunciada em tempo razoável. Em ambos os casos é o famoso "engavetamento". Tal silêncio deve ser interpretado como uma denegação tácita do pedido formulado. De fato, a Administração foi convocada, mediante petição da parte administrativa interessada (particular, pessoa jurídica, associação, servidor público), a se manifestar sobre determinada. A inércia, omissão, ou mesmo má vontade do Poder Público não pode prejudicar direitos ou interesses legítimos, ou mesmo obstaculizar o acesso a instâncias superiores. Segundo Nelson Nery Costa (Processo Administrativo e suas espécies, Forense, p. 32), este silêncio é fato jurídico administrativo relevante, consistindo em indeferimento tácito da petição direcionada à Administração. Assim, em face do laconismo da Administração Pública, o interessado fica habilitado a desencadear as medidas cabíveis, devendo-se considerar que medidas são cabíveis. Pode recorrer à instância administrativa superior, ou mesmo acionar a via judicial.

Sobre o autor
Robertônio Santos Pessoa

professor de Direito Administrativo da UFPI, membro da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB, mestre em Direito pela USP, doutorando em Direito Administrativo pela UFPE, especialista em Direito Comparado pela Faculté des Affaires Internacionales du Havre (França)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PESSOA, Robertônio Santos. Processo Administrativo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2107. Acesso em: 26 dez. 2024.

Mais informações

Texto publicado na Revista da Justiça Federal do Piauí nº 1, vol. 1, jul/dez 2000

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