I – INTRODUÇÃO SISTEMÁTICA AO TEMA
Questão tormentosa e que vem surgindo de forma cada vez mais evidente na prática de nossos tribunais, e que, portanto, merece que estudemô-la com um pouco mais de cuidado e atenção, é aquela atinente à possibilidade de substituir-se os bens oferecidos à penhora no curso de um processo de execução fiscal, ou requerer o reforço da supramencionada penhora.
Antes de mais nada devemos definir a penhora como ato público estatal, geralmente praticado pelo oficial de justiça, que representando o ius imperi do Estado encarnado na jurisdição, promove a constrição judicial de bens do devedor, gravando-os e indisponibilizando sua alienação, entre outros efeitos. É a medida executiva típica da mais comum das execuções, qual seja, a por quantia certa contra devedor solvente.
Também é de sabença geral que as Execuções Fiscais têm disciplina sistemática própria, já que seu processamento é regido pela Lei nº 6.830/80 – Lei de Execuções Fiscais – o Códex Processual Pátrio somente se aplica subsidiariamente nesta seara ( art. 1º da Lei nº 6.830/80 ).
Ora, com uma leitura rasteira do indigitado diploma legal parece que o problema que propusemos acima não oferece maiores dificuldades, já que em seu art. 15, II, a Lei nº 6.830/80 admite expressamente a substituição em questão. Senão, vejamos :
Art. 15. Em qualquer fase do processo, será deferida pelo juiz:
I – ao executado, a substituição da penhora por depósito em dinheiro ou fiança bancária; e
II – à Fazenda Pública, a substituição dos bens penhorados por outros, independentemente da ordem enumerada no art. 11, bem como o reforço da penhora insuficiente.
Quanto ao item I do art. 15 realmente não se põem maiores discussões, já que configura medida voluntária do devedor que em nada prejudica a outra parte autora, aliás, ao contrário, beneficia-a, encurtando consideravelmente o iter processual típico das execuções fiscais, que como espécie de execução por quantia certa não dispensa as formalidades traçadas no capítulo IV (arts. 646/731) do Código de Processo Civil Brasilleiro. A execução fiscal prescindirá então do penoso procedimento de penhora, avaliação, registro da penhora, edital, hasta/leilão e arrematação do bem penhorado, que quase nunca satisfaz as partes.
É claro que para existir esta permuta entre o depósito em dinheiro e o bem penhorado o juiz deve observar a idoneidade do depósito e sua capacidade de garantir a execução. Assim :
" Somente por depósito em dinheiro suficiente a cobrir o principal, juros, multa, correção monetária e demais encargos legais, pode ser substituída a penhora nos termos do art. 15, n. I da Lei n. 6.830, de 1980 " (TFR, AgI. 43.667, ac. de 17-8-1983, Rel. Min. Pedro da Rocha Acioli, DJU, 15 set. 1983, p. 13896-7).
No mesmo sentido :
" (permite-se ao executado a substituição da penhora por depósito em dinheiro) desde que no valor correspondente ao débito devidamente atualizado ( RSTJ 81/104, RJTJESP 97/299, 97/300, 104/291, 114/308 ), incluindo juros, multa de mora e demais encargos legais " ( TFR – 4ª Turma, Ag 49.791-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, j. 11.3.87, negaram provimento, v.u., DJU 2.4.87.,p.5.699 ).
Entretanto :
" O depositário não tem qualidade para requerer a substituição da penhora ( rt 623/80 ) " ( THEOTONIO NEGRÃO, 2.000, p. 1.252 )
Em verdade, todas as celeumas doutrinárias e jurisprudencias concentram-se no item II do art. 15. A Lei permitiu a substituição, isto é fato. Mas em que termos foi permitida ? Será que poderá ocorrer sempre que a Fazenda Pública julgar necessário ? E mais, o juiz está adstrito de forma inescapável a esta norma de modo que ante uma requisição de substituição somente cabe-lhe deferi-la ?
Estas perguntas envolvem princípios de enorme importância em nosso ordenamento jurídico, quais sejam o da legalidade, razoabilidade e isonomia, que por seu turno desdobram-se em princípios processuais específicos, como iremos demonstrar adiante.
II – A FAZENDA COMO PARTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E AS CONSEQUÊNCIAS DESTE FATO
Com efeito, a Fazenda Pública participa da Administração Pública, quer encaremos esta última em seu aspecto funcional, tendo como função precípua – mas não exclusiva – a aplicação da Lei de ofício ( Seabra Fagundes ), no que se difere das outras duas funções de Estado, a saber, a formulação de normas gerais, abstratas, obrigatórias e aptas à regular o convívio social dos indivíduos ( Hans Kelsen ) e a solução dos conflitos concretos através da heterocomposição da lide por força da monopolização da justiça operada pela jurisdição (Humberto Teodoro Júnior); quer a encaremos em seu aspecto de pertinência objetiva ao aparelho estatal, fazendo parte do Poder Executivo.
" Administração pública, portanto, é a gestão de bens e interesses qualificados da comunidade no âmbito federal, estadual ou municipal, segundo os preceitos do Direito e da Moral, visando ao bem comum.
No Direito Público – do qual o Direito Administrativo é um dos ramos – a locução Administração Pública tanto designa pessoas e órgãos governamentais como a atividade administrativa em si mesma. Assim sendo, pode-se falar de administração pública aludindo aos instrumentos de governo como à gestão dos interesses da coletividade.
Como bem acentua Alessi, subjetivamente a Administração Pública é o conjunto de órgãos e serviços do Estado e objetivamente é a expressão do Estado agindo in concreto para satisfação de seus fins de conservação, de bem-estar individual dos cidadãos e de progresso social. " ( HELY LOPES MEIRElLES, 1.996, p.79 ).
Como parte da Administração Pública que é, a Fazenda Pública está adstrita ao princípio da legalidade, insculpido com letras insofismáveis no art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil. Assim, a Fazenda Pública somente pode fazer aquilo que está expressamente permitido, sendo que todo o resto encontra-se proibido para a mesma. É o célebre brocardo posto desde tempos imemorriais, quando inicialmente cogitou-se da distinção essencial entre o Direito Público e o Direito Privado : para o particular o que não está proibido está permitido, enquanto para o poder público aquilo que não está ordenado está proibido.
Neste sentido o princípio da legalidade no âmbito do Direito Público encontra formulação especial, já que para o particular significa que este pode fazer tudo aquilo que não está proibido por Lei, conforme vimos de ver. Tal inversão justifica-se pelas prerrogativas e sujeições conferidas à Administração Pública.
No campo de nossa investigação, a possibilidade de substituiução ou reforço de penhora configura uma destas prerrogativas da Administração Pública, especialmente se considerada como litigante em um processo judicial. É claro que esta prerrogativa não pode estar revestida de um caráter absoluto. Tal não se adequaria a um Estado Democrático de Direito, pois colocaria as partes do processo em uma relação de desigualdade, afetando as garantias da justiça formal, entre elas, o devido processo legal e a igualdade entre as partes litigantes.
Assim manifesta-se o festejado prof. Humberto Theodoro Júnior, que assevera :
" (... ) As partes do processo executivo, todavia, são tratadas desigualmente. Ao executado faculta-se requerer a substituição da penhora somente por depósito em dinheiro ou fiança bancária (art. 15, I ). Já para a Fazenda, faculta-se postular a substituição dos bens penhorados por quaisquer outros, sem maiores especificações (... ).
O poder de substituição conferido ao devedor é bastante restrito, e só pode ser exercitado de forma a melhorar a liquidez da garantia em prol do exequente. Para a Fazenda, contudo, a faculdade foi outorgada em termos excessivamente amplos, com liberação expressa até mesmo da observância da ordem de gradação legal prevista no art. 11. Tem-se a impressão de que o legislador teria pretendido, na prática, reconhecer à Fazenda um poder discricionário de escolha dos bens do devedor para garantir a execução fiscal. Por isso, o critério de substituição ficaria sujeito apenas à conveniência de melhor segurança e maior liquidez da penhora.
Houve até quem entendesse que o juiz se teria tornado mero prolator de ordem de remoção ou substituição de bens, desde que a requeresse a Fazenda, uma vez que a disposição legal não " faz qualquer referência à motivação do pedido ou à possibilidade de o juiz indeferi-lo. " [ Ricardo Mariz de Oliveira, Dívida Ativa da Fazenda Pública,rt Informa, 261:5. Cf. Silva Pacheco, Comentários, cit., n. 133. P. 94. ]
É claro, porém – (... ) – que a interpretação do texto legal não há de ser meramente literal, mas terá de levar em conta os princípios basilares que regem a atuação do juiz no comando do processo, e com os quais não podem conviver pretensões caprichosas e despidas de qualquer fundamentação séria.
Se própria Lei de Execução Fiscal garante ao devedor o direito de nomeação de bens à penhora, não pode conceder à Fazenda um poder arbitrário capaz de anular o direito do devedor. "( HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, 1995:68/69 )
III – A TEORIA DOS ATOS ADMINISTRATIVOS VINCULADOS E DISCRICIONÁRIOS APLICADA AO PROBLEMA EM FOCO
Ocorre que a faculdade posta para Fazenda Pública de requerer a substituição da penhora não é considerado um ato arbitrário, mas antes discricionário. Voltaremos a este ponto.
Por outro lado o deferimento da requisição de substituição da penhora não é mera liberalidade do juiz, não configurando um ato discricionário do magistrado, mas antes revela-se ato vinculado à hipótese legal do simples requerimento de substituição, feito pelo executante.
O art. 15, II, da Lei 6.830/80 fala claramente que " em qualquer fase do processo, será deferida pelo juiz " a substituição; se o legislador quisesse deixar à livre apreciação do juiz o deferimento ou não da medida diria " poderá ser deferida pelo juiz " a substituição. Mas tal de fato não ocorre, de sorte que a conduta que a Lei almeja por parte do magistrado encontra-se prevista, vinculada: deferimento da substituição, se tal for requerido pelo exequente. Não há alternativa para o juiz, senão a legalmente prevista. Esta é a real mens legis da Lei sob comento.
Alguns doutrinadores não concordam com esta interpretação, dizendo que em nosso ordenamento jurídico, fundado em um Estado Democrático de Direito, não pode haver uma total vinculação que não dê conta de prever situações concretas nas quais este princípio de estrita vinculatividade, aplicado a ferro e fogo, abra margens ao surgimento de injustiças flagrantes.
Tal seria o caso se a Fazenda Pública pudesse indistintamente requerer a substituição de bens do executado desmotivadamente, por razões que escapam ao âmbito propriamente jurídico, ao qual estamos todos adstritos, inclusive e de forma especial, a Administração Pública. A corrente de doutrinadores supradita, formada em sua maioria por administrativistas, defende que a Lei não quer que ocorram tais situações, exigindo que a Administração motive todos seus atos de forma jurídica, inclusive os discricionários, para que se evite o odioso arbítrio.
Realmente, dizem estes autores, a motivação é o elemento fundamental diferenciador dos conceitos de discricionariedade e arbítrio. Senão vejamos o que sustenta a abalizada doutrina de Helly Lopes Meirelles :
" Já temos acentuado, e insistimos mais uma vez, que ato discricionário não se confunde com ato arbitrário. Discrição e arbítrio são conceitos inteiramente diversos. Discrição é liberdade de ação dentro dos limites legais: arbítrio é ação contrária ou excedente da lei. Ato discricionário, portanto, quando permitido pelo Direito, é legal e válido; ato arbitrário é, sempre e sempre, ilegítimo e inválido.
A discricionariedade administrativa encontra fundamento e justificativa na complexidade e variedade dos problemas que o Poder Público tem que solucionar a cada passo e para os quais a lei, por mais casuística que fosse, não poderia prever todas as soluções, ou, pelo menos, a mais vantajosa para cada caso ocorrente. " ( HELY LOPES MEIRELLES, 1.996, p.151 )
O eminente professor Celso Antônio Bandeira de Mello não nos permite dúvidas nesta matéria, quando preceitua :
" Não se confundem discricionariedade e arbitrariedade. Ao agir arbitrariamente o agente estará agredindo a ordem jurídica, pois terá se comportado fora do que lhe permite a lei. Seu ato, em consequência, é ilícito e por isso mesmo corrigível judicialmente. Ao agir discricionariamente o agente estará, quando a lei lhe outorga tal faculdade ( que é simultaneamente um dever ), cumprido a determinação normativa de ajuizar sobre o melhor meio de dar satisfação ao interesse público por força da indeterminação legal quanto ao comportamento adequado à satisfação do interesse público no caso concreto.
(... ) se de ato discricionário se tratar, salvo alguma hipótese excepcional, há de se entender que o ato não motivado está irremissivelmente maculado de vício e deve ser fulminado por inválido, já que a Aministração poderia, ao depois, ante o risco de invalidação dele, inventar algum motivo, "fabricar" razões lógicas para justificá-lo e alegar que as tomou em consideração quando da prática do ato." ( CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELO, 1.999, p. 151, 285 e 286 )
Desse modo, o ato da Fazenda Pública requerer a substitição do bem oferecido à penhora não é totalmente discricionário e nem o ato do magistrado é puramente vinculado. Entre estes dois termos surge a questão da motivação.
Sem entrarmos em discussões que muitas vezes representam apenas bizantinices, podemos acolher o conceito de motivação do Professor Florivaldo Dutra de Araújo, dada a excelência do mesmo, nos servirá plenamente aos propósitos do presente trabalho :
" Entre os requisitos procedimentais do ato administrativo está a motivação, também dita fundamentação ou justificação, que é a exposição capaz de deixar claro que o ato tenha sido praticado segundo motivos reais aptos a provocá-lo, que estes motivos guardam relação de pertinência lógica com o conteúdo do ato e que este tenha emanado da autoridade competente, em vista da correta finalidade legal.
(... )
O fundamento do dever de motivação dos atos administrativos é o próprio regime jurídico-administrativo a que estão subordinados. O regime jurídico administrativo, tendo como princípios maiores a supremacia do interesse público sobre o privado e a indisponibilidade do interesse público, constitui noção abrangente, que abarca vários fundamentos apontados para o dever de motivação, tais como os princípios da legalidade, da moralidade e da razoabilidade dos atos administrativos. Significa, ademais, a tradução jurídica da dignidade que se atribui à motivação no Estado que se pretenda democrático. " ( DUTRA DE ARAÚJO, 1992, p. 186 )
Os motivos do requerimento de substitição devem ser explicitados, e nesta seara contamos com os ensinamentos do professor Humberto Teodoro Júnior (opus cit. p.69) :
" Por isso, merecer acohida a lição de Antônio Nicácio, para quem "a Fazenda Pública só pode pedir a substituição do bem penhorado se houver razão suficiente para tanto. (... )
Como exemplos de motivos justos para pedir a substituição da penhora podemos lembrar :
- existência de ônus real ou gravame;
- intercorrência de arrestos ou penhoras sobre o mesmo bem;
- bens excessivamente valiosos em relação ao valor da execução;
- bens situados fora da comarca da execução;
- bens danificados ou deteriorados;
- bens de custódia excessivamente onerosa;
- bens de escassa aceitação no mercado, e, por isso, de difícil alienação em leilão etc. "
IV – PEQUENO APANHADO JURISPRUDENCIAL
A jurisprudência – que ainda não se pode dizer abundante – não tergiversa, conforme pode-se colher dos extratos abaixo apresentados :
" Existentes, localizados e penhorados bens patrimoniais da pessoa jurídica executada, descabe a substituição por outros do patrimônio pessoal dos sócios, até que, não arrematados, ou não adjudicados, reavaliados, fique demonstrada a insuficiência do valor para quitar a dívida fiscal atualizada " ( RSTJ 83/31 )
" O requerimento deve ser justificado, não ficando ao arbítrio da Fazenda Pública, por mera conveniência ou comodidade, pretender a substituição ( RJTJESP 120/335 ). Neste sentido : STJ-1ª Turma, Resp 53.652-9 – SP, rel. desig. Min. Cesar Rocha, j. 6.2.95, negaram provimento, dois votos vencidos, DJU 13.3.95, p. 5.259. " ( THEOTONIO NEGRÃO, 2.000, p. 1.252 )
" O inc. II do art. 15, da Lei 6.830/80, que permite à Fazenda Pública, em qualquer fase do processo, postular a substituição do bem penhorado, deve ser interpretado com temperamento, tendo em conta o princípio, contido no art. 620 do CPC, segundo o qual "quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo menos gravoso", não convivendo com exigências caprichosas, nem com justificativas impertinentes" ( STJ – RTJE 137/164, maioria ).
" Na execução fiscal, se não restou demonstrada a inconveniência na indicação dos bens oferecidos a penhora pelo devedor, não se justifica a substituição, feita de forma mais gravosa, recaindo a constrição sobre imóvel onde funciona o estabelecimento comercial da executada " ( STJ – RT 758/168 )
" Há que distinguir : a substituição só é possível se a nomeação de bens à penhora foi feita pelo exequente; se pelo executado, a substituição só tem lugar, a requerimento da Fazenda Pública, no caso de nomeação ineficaz ( CPC 656 )
A insuficiência da penhora se apura pela avaliação ( CPC 685 – "caput" e II ), ou pela alienação judicial ( CPC 667 – II )
[ em contraposição ao direito de requerer reforço da penhora concedida à Fazenda Pública ] Igual direito de substituição assiste ao executado, se os bens penhorados forem excessivos ( CPC 685 – I )
Cabe agravo contra a decisão que determina reforço de penhora sem observar o disposto no CPC 685 – II ( RTFR 147/17)." (THEOTONIO NEGRÃO, 2.000, p. 1.252/1.253)
" EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. LEILÃO. FAZENDA PÚBLICA. ADJUDICAÇÃO PELO PREÇO DA AVALIAÇÃO, EM CASO DE LEILÃO NEGATIVO. ART. 24 DA LEI FEDERAL N. 6.830, DE 1980. MERA FACULDADE. DIREITO À RENOVAÇÃO DO LEILÃO ATÉ QUE A FAZENDA VENHA A RECEBER SEU CRÉDITO. AGRAVO PROVIDO.
Arredar a substituição do bem penhorado, ou o reforço da penhora, será legitimação de obstáculo à plena realização do crédito tributário, sem justificação válida.
(... )
Via de regra, a penhora é irretratável.
Não obstante, pode ela ser ampliada ou substituída, nas execuções fiscais, na hipótese de leilão negativo, positivado que o bem apreendido é insuficiente para o resgate integral do crédito fiscal excutido, o que quer dizer que pode o credor pleitear a apreensão de novos bens como reforço do já penhorado, ou substituição do mesmo.
Anote-se que tal faculdade, como já dito, não constitui direito irrestrito do credor, pois, sempre, há de ser o pedido justificado, para que o Juiz, com o seu poder de comando, o aprecie.
E, na hipótese vertente, a falta de licitante é circunstância que positiva encontrar-se o bem penhorado e leiloado desprovido de valor suficiente para a cobertura do crédito excutido.
(... )
( TJSP, Agl 50.372-2, ac. de 26 –10-1982, RJTJSP, 82 : 253 ) "
( HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, 1995: 284/287 )
" (... )
Entretanto, essa faculdade de substituição não se transforma num direito automático da Fazenda em obtê-la só pelo fato de inexistir licitantes, em relação aos bens leiloados.
O Juiz é que deve examinar se há motivo para que ocorra a substituição dos bens penhorados face ao pedido da Fazenda. Assim é que deve ser interpretado o dispositivo legal, sob pena de a execução fiscal tornar-se direito potestativo do órgão fiscal, eliminando qualquer defesa, ou a intermediação do Juiz, o que importaria na violação do parágrafo 4º do art. 153 da CF – EC n.1, de 1969.
O parágrafo 4º do art. 153 da CF dispõe : "A lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual".
"A primeira consequência apontada pelos estudiosos, na análise do significado do parágrafo 4º, é o impedimento, dirigido ao Legislativo, de suprimir ou restringir a apreciação judiciária"( cf. Ada Pellegrini Grinover, As garantias constitucionais do direito de ação, p. 154 ). Na mesma linha exegética é a lição do Prof. José Frederico Marques : "Lei alguma pode limitar, amputar ou desconhecer esse direito individual do cidadão que é o direito à prestação jurisdicional" ( Ensaio sobre a jurisdição, 1959, p. 63 )
Dessarte, ainda que o art. 15 da lei mencionada diga que, em qualquer fase do processo, será deferida pelo Juiz a substituição da penhora, sua exegese deve ser direcionada pelos valores albergados na garantia constitucional, cabendo ao Poder Judiciário examinar se tal medida deve ou não ser efetuda.
(... )
( TJSP, AgI 64.131-2, ac. de 5-10-1983, Jurisprudência Brasileira, 99 : 18; e RJTJSP, 86:256. )
( HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, 1995: 287/289 )
" EXECUÇÃO FISCAL – PENHORA – TÍTULOS SEM COTAÇÃO EM BOLSA – LEGÍTIMA RECUSA DA EXEQUENTE.
Pode a Fazenda Pública exequente ao argumento de que o título oferecido a constrição judicial pelo executado não tem cotação em bolsa, recusá-lo ocasião em que lhe é de ser devolvido o direito de nomeação. "
(Agravo nº 112.910/5 – Comarca de Belo Horizonte – Rel.: Des. ALOÍSIO QUINTÃO – DJMG – 080399)
V – CONCLUSÃO
Bem se vê que a substituição ou o reforço da penhora, postos como faculdades da Fazenda Pública no art. 15, II, da Lei nº 6.830, devem ter sua utilização temperada pelo bom senso, sendo que sempre serão motivados, por tratarem-se de atos discricionários. Na ocasião do requerimento cabe ao Poder Judiciário deferir a substituição ou reforço da penhora, se o motivo aludido pela Fazenda for realmente relevante, já que o ato do magistrado neste ínterim é regrado, vinculado pelo Legislador, conforme a leitura do artigo supradito.
BIBLIOGRAFIA
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo.
Malheiros Editores, 11ª Edição – Revista, atualizada e ampliada. São Paulo, 1.992.
DUTRA DE ARAÚJO, Florivaldo. Motivação e Controle do Ato Administrativo. Editora Del Rey, 1ª Edição. Belo Horizonte, 1.992.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. Malheiros Editores, 21ª Edição – Atualizada por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo, 1.996.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Lei de Execução Fiscal – Comentários e Jurisprudência. Editora Saraiva, 4ª Edição – Revista. São Paulo, 1.995.
THEOTONIO NEGRÃO. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. Editora Saraiva, 31ª Edição – Atualizada. São Paulo, 2.000.