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Da (in)constitucionalidade da pena mínima cominada ao crime de estupro

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Agenda 17/11/2012 às 13:15

CAPÍTULO II

O IUS PUNIENDI DO ESTADO

2.1 TEORIA GERAL DA PENA

A partir do momento em que o Estado assumiu a função de punir, de retribuir com pena os indivíduos que praticassem uma conduta contrária àquela tida como socialmente adequada, inúmeros foram os avanços experimentados pela Ciência Penal, que não mais se conformava com a mera vingança privada.

Séculos se passaram, inocentes sucumbiram para que a sociedade moderna desfrutasse da evolução do Direito Penal, cujo princípio da legalidade, talvez seja, hodiernamente, sua maior expressão. Já dizia Cesare Beccaria (1999, p. 27), que as leis “são condições sob as quais homens independentes e isolados se uniram em sociedade, cansados de viver em contínuo estado de guerra e de gozar de uma liberdade inútil pela incerteza de conservá-la”. E ainda acrescenta:

Homem algum entregou gratuitamente parte da própria liberdade, visando ao bem público, quimera esta que só existe nos romances. Se isso fosse possível, cada um de nós desejaria que os pactos que ligam os outros não nos ligassem. Cada homem faz de si o centro de todas as combinações do globo. A multiplicação do gênero humano, pequena por si só, mas muito superior aos meios que a estéril e abandonada natureza oferecia para satisfazer as necessidades que cada vez mais se entrecruzavam, é que reuniu os primeiros selvagens. As primeiras uniões necessariamente formaram outras para resistir àquelas e, assim, o estado de guerra transportou-se do indivíduo para as nações. Foi, portanto, a necessidade, que impeliu os homens a ceder parte da própria liberdade. É certo que cada um só quer colocar no repositório público a mínima porção possível, apenas o suficiente para induzir os outros a defendê-lo. (BECCARIA, 1999, p. 28-29).

O Estado, através da sua função ético-social, visa garantir segurança a sociedade mediante a proteção dos bens jurídicos essenciais e a prevenção das condutas ofensivas. Os homens socialmente organizados, ao renunciarem parte de sua liberdade em prol de sua tranqüilidade, atribuíram ao Estado o monopólio da função de punir - ius puniendi - com uma sanção todos aqueles que praticassem um ato penalmente ilícito.  Através da regra sancionadora, o Estado passou a garantir  obediência aos imperativos presentes no preceito primário da norma (MARQUES, 2000).

A sanção é o elemento distintivo do Direito Penal dos demais ramos do Direito. Tamanha é a distinção que o Direito Penal é o único ramo do direito cuja nomenclatura é dada pelo tipo de sanção, e não pela natureza das relações que ali estabeleceram. A propósito, são oportunas as lições de José Frederico quando diz que “o direito de punir descansa, agora, no preceito sancionador e seu objetivo é o de impor uma diminuição na esfera dos direitos do réu, submetendo-o à coação em que se formaliza a regra secundária da norma penal” (MARQUES, 2000, p. 132).

O mandamento primário da norma jurídica traz a definição do ato ilícito, enquanto que o secundário, os efeitos da violação da norma jurídica. Uma vez violada a norma penal - com a prática de fato típico - nasce para o Estado o direito de punir, e para o réu a obrigação de se sujeitar as sanções impostas decorrentes da prática do mal cometido (MARQUES, 2000).

É necessário esclarecer que pena é uma espécie de sanção que é imposta pelo Estado, como retribuição ao cometimento de determinado ato ilícito e que deve obedecer ao princípio do devido processo legal insculpido na Constituição Federal de 1988. Trata-se de sanção, pois a pena é devida a uma conseqüência de violação de um imperativo jurídico descrito no preceito primário da norma penal incriminadora (MARQUES, 2000). Rogério Greco (2007, p. 4) ressalta que, “a pena é simplesmente o instrumento de coerção de que se vale o Direito Penal para a proteção dos bens, valores e interesses mais significativos da sociedade”.

A necessidade de uma definição - clara e prévia, pode-se acrescentar - do tipo penal incriminador, no entanto, não mais satisfazia aos anseios da sociedade. O Estado, para bem se desincumbir do seu dever de exercer o ius puniendi, deveria se preocupar com que a sanção a ser imposta atingisse a sua finalidade retributiva/ intimidativa, e na exata medida da sua necessidade. Nesse sentido, as lições de José Frederico Marques (2000, p. 136):

A pena é um conceito ético e por isso não pode contribuir para o aviltamento da personalidade humana. As sanções que, a título de castigo, rebaixam e diminuem o homem, degradam o seu caráter e atentam contra a consciência moral, não podem ser acolhidas pelo direito penal de Estados democráticos onde os direitos fundamentais do ser humano constituem valores reconhecidos e tutelados pela ordem jurídica. O castigo e o sofrimento inerentes à pena, além de proporcionados ao mal cometido, estão limitados pelas exigências éticas que o direito assegura, de respeito à  dignidade da pessoa humana.

Montesquieu, com efeito, há muito já dizia que toda pena que não derive da absoluta necessidade, é tirânica. Todo ato de autoridade de homem para homem que não derive da absoluta necessidade é tirânico (BECCARIA, 1999).

A punição tem evoluído no sentido da brandura e proporção, e hoje a idéia é que a pena não deve ser considerada como um castigo, compensação, pois esses termos nos levam ao sentimento de vingança, embutido no talião primitivo, em que o mal cometido deveria ser retribuído na mesma proporção, olho por olho, dente por dente. Afinal, um direito adequado à civilização moderna, não pode tomar como base a lei da compensação como seu critério inspirador (BETTIOL, 2003, e MARQUES, 2000).

A pena como justa recompensa de dar a cada indivíduo o que merece é um meio indispensável para manutenção de uma sociedade juridicamente organizada. A partir do instante em que um bem ou valor tenha relevância para a sociedade, como condição de progresso, desenvolvimento e conservação da vida em comunhão, tutela mais enérgica é exigida para colocá-la sob o amparo seguro (MARQUES, 2000). Se não houvesse interesse da sociedade no tocante a punição do violador do ordenamento jurídico, não havia razão de o Direito Penal tutelar valores necessários à comunhão em detrimento da dignidade da pessoa humana.

A reação do Estado ao fenômeno delituoso deve guardar consonância com os fins da pena, quais sejam: retributivo e intimidativo. O primeiro constitui o núcleo da pena, pelo qual é atribuída uma justa recompensa ao autor do delito, de modo que a violência bruta não dissolva as bases morais da sociedade, uma vez que o Estado só deve punir em nome das necessidades sociais e nos limites condizentes com o mal praticado pelo delinqüente. O fim intimidativo da pena corresponde à intenção de abstenção da realização de novos crimes. É de caráter preventivo, à medida que com a aplicação de uma pena justa ao delinqüente, esse castigo possa servir de corretivo, como bem enfatiza o ideário popular (MARQUES, 2000).

Nélson Hungria (s.d, apud MARQUES, 2000, p.146) traz uma interpretação relevantemente propícia:

A pena por isso transfunde na consciência do malfeitor como um mais forte motivo de inibição e o sofrimento, que lhe é inerente, representa, incontestavelmente, do ponto de vista relativo, um meio de emenda, um instrumento de regeneração.

Diante das considerações expostas, fica evidente que a pena só deve ser utilizada quando os demais meios coercitivos falharem - ultima ratio -, como resposta a conduta do ofensor e como reparação pela inobservância da norma, não devendo ficar além ou aquém da reprovação que lhe embasa e ademais, não deve cingir-se ao seu caráter aflitivo, devendo servir como meio de evitar a prática novos delitos e demover os outros de agir dessa forma. Para concluir, é oportuno citar o magistério de Cesare Beccaria (1999, p. 52):

É, pois, necessário selecionar quais penas e quais os modos de aplicá-las, de tal modo que, conservadas as proporções, causem impressão mais eficaz e mais duradoura no espírito dos homens, e a menos tormentosa no corpo do réu.

2.2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS NORTEADORES DA PENA

A Filosofia e a Teoria Geral do Direito teve sua parcela de contribuição na construção doutrinária da normatividade dos princípios, cujo objetivo era superar a oposição clássica entre Direito Natural/ Direito Positivo (BONAVIDES, 2008).

Paulo Bonavides diz que a teoria dos princípios deve estar enraizada no coração das Constituições. Na visão de Dworkin:

As regras são aplicáveis à maneira do tudo ou nada (na all nothing). Se ocorrerrem os fatos por elas estipulados, averba ele, então a regra será válida e, nesse caso, a resposta que der deverá ser aceita; se tal, porém não acontecer, aí a regra nada contribuirá para a decisão” (DWORKIN, apud BONAVIDES, 2008, p.282).

Nos dizeres de Elpídio Donizetti (2009), ispirado na visão de Dworkin, as normas processuais se desdobram em regras e princípios.

Enquanto as regras se exaurem por si mesmas, ditando o que se deve e o que não se deve fazer, o que se pode e o que não se pode, os princípios são diretrizes de otimização, ou seja, são normas que ordenam que algo seja cumprido na maior medida possível e dentro das possibilidades jurídicas e fáticas de cada caso concreto (DONIZETTI, 2009).

 Nesse diapasão, Paulo Bonavides (2008, p.257) acrescenta que “a idéia de princípio deriva da geometria, onde se designa as verdades primeiras”, possuindo as seguintes funções: interpretativa, diretiva, limitativa e fundamentadora (2008).

Corroborando com tal entendimento José Afonso da Silva (2009) afirma que os princípios são verdadeiras ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas, ou seja, são núcleos de condensações nos quais confluem valores e bens constitucionais. Princípios e regras são espécies de normas, sendo os primeiros as diretrizes gerais de um ordenamento jurídico (ou de parte dele). Seu espectro de incidência é muito mais amplo que o das regras. Assim, os princípios, que começam por ser a base de normas jurídicas, podem estar positivamente incorporados, transformando-se em normas-princípios e constituindo preceitos básicos da organização constitucional (SILVA, 2009).

A ideia de peso ou valor só se aplica aos princípios, e isso é o que se distingue das demais normas ao passo que, havendo um conflito entre aqueles deve prevalecer o que mais se identifica como válido ao caso em questão (BONAVIDES, 2008).

Com efeito, é de se enfatizar que os princípios gerais são provenientes das antigas Constituições da segunda metade do século XX, se tornando fonte primária de normatividade, de forma que já se solidificaram no ordenamento jurídico como valores supremos ao redor do que gravitam os direitos, bem como as garantias e as competências de uma sociedade constitucional (BONAVIDES, 2008).

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 Os princípios penais ganharam grande importância com a Constituição de 1988 e, sem dúvidas, ganharam status de protetores das garantias individuais ligadas à pessoa humana. Os chamados princípios constitucionais penais embasadores da ordem jurídica penal foram ganhando uma importância cada vez maior para os juristas da atualidade, quando perceberam ali dimensões nunca antes imaginadas.

 Atualmente, é de suma importância que o legislador, responsável pela elaboração da disciplina punitiva paute-se nos direitos fundamentais consagrados na Carta Magna, mas como a Constituição não previu expressamente todos os princípios norteadores da pena é com base em construções de política criminal, doutrinárias e jurisprudenciais que o legislador, intérprete e juiz devem se nortear ao analisar o caso concreto, afinal, como dizia Nilo Batista (2002, p.86):

Se o fim da pena é fazer justiça, toda e qualquer ofensa ao bem jurídico deve ser castigada; se o fim da pena é evitar o crime, cabe indagar da necessidade. Da eficiência e da oportunidade de cominá-la para tal ou qual ofensa.

Vale acrescentar que como vivemos uma verdadeira renovação do Direito Constitucional Brasileiro, que também repercute no Direito Penal e Processual Penal, predomina nos dias atuais que a Carta Magna tem força normativa, tendo os direitos e garantias fundamentais aplicação imediata. Em razão disso, é dever do legislador e aplicador do Direito obedecer às diretrizes que ordenam o Direito Penal.

Em suma, sob a influência dos pensamentos iluministas, as Constituições trazem em seu conteúdo princípios fundamentais, ou postulados constitucionais penais. Como é sabido, estes são aqueles relacionados à matéria penal, com características garantidoras, podendo ser divididos em explícitos, que estão elencados de forma expressa no texto constitucional, e implícitos, que estão contidos em normas constitucionais e delas são extraídas.

Neste contexto analisar-se-á alguns princípios norteadores da pena: princípios da ofensividade, necessidade ou intervenção mínima, culpabilidade, individualização, pessoalidade da pena e proporcionalidade, como limites ao legislador e aplicador dos postulados penais.

2.2.1 Princípio da Ofensividade Como Limite Do Ius Puniendi

O princípio da ofensividade ou lesividade é também conhecido pelo brocardo latino nulla necessitas sine injuria, que significa que não haverá necessidade sem ofensa. Surgiu no período iluminista com o objetivo de desfazer a confusão até então existente entre o direito e a moral (GRECO, 2010). Tem como principal objetivo punir condutas que representem ofensas a bens jurídicos, quais sejam, aquelas condutas graves que lesionam ou colocam em perigo de lesão bem jurídico socialmente relevante (GOMES, 2007).

O princípio em voga serve de orientação tanto para o legislador, que fica vinculado a elaborar a norma penal incriminadora - somente se necessária à proteção de determinado bem jurídico -, como para o juiz e intérprete, como critério de interpretação. Essa dupla função é demonstrada através da função político criminal - momento em que se decide pela criminalização da conduta – e, função interpretativa - momento em que se interpreta e aplica-se a lei penal (GOMES, 2007). 

A atividade legiferante e o magistrado devem respeitar o princípio da ofensividade, uma vez que este princípio tem como escopo limitar o direito de punir do Estado (ius puniendi) e limitar o próprio Direito Penal (ius poenale). Essas funções são complementares e subsidiárias, pois quando o legislador não cumpre seu papel, surge o dever do juiz e intérprete atuarem. Luís Flávio Gomes (2007, p.478) categoricamente afirma:

O Direito Penal já não é obra exclusiva do Poder Legislativo. É fruto de um trabalho intenso e complexo que envolve a letra da lei (os enunciados legais), assim como sua confomação com os textos constitucionais. De tudo isso emana o novo Direito Penal (de cunho garantista e naturalmente constitucional). Enganam-se os que estudam e ensinam o Direito Penal visto e lido exclusivamente na literalidade dos dispositivos legais. A letra da lei é tão-somente o ponto de partida (é mera expressão do ius puniendi). Pode também ser o ponto de chegada (pode constituir o próprio ius poenale), porém quando no caminho se descobre que a lei ordinária se choca com o Texto Maior, este há de prevalecer. E quem diz isso? Os intépretes e aplicadores do texto legal, com a diferença que os intérpretes fazem doutrina, enquanto os juízes fazem o “Direito”.

O princípio da ofensividade impõe uma separação entre o direito, a moral e a religião. Uma conduta que contraria ideia religiosa ou moral não pode ser considerada como criminosa, eis que só podem ser castigados os comportamentos que tenham resultado jurídico, ou seja, que resultem em lesão ou perigo concreto de lesão. Embora não esteja previsto expressamente no texto constitucional, o princípio em tela detém base constitucional e legal. A propósito, o artigo 13 do Código Penal preleciona: “O resultado de que dependa a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa [...]” (CÓDIGO PENAL, 1940).

Não basta que a conduta extrapole o âmbito pessoal e atinja o social, mas que ela esteja tipificada como ilícita no ordenamento penal. Seja qual for a perspectiva, a Teoria do Direito do Autor não mais prepondera, pois não se pune mais o ser de uma pessoa, mas somente o agir, já que o Direito Penal é formado pelo um conjunto de normas que regem as relações entre os humanos (GRECO, 2007). Dito de outro modo, sempre que houver conflito entre a moralidade e legalidade, esta deve prevalecer.

É importante destacar que o juízo de tipicidade já não se esgota na mera constatação da subsunção formal da conduta à letra da lei, uma vez que ainda se faz imprescindível indagar sobre o bem jurídico e sua necessária afetação. A tipicidade como elemento integrante do conceito tripartide de crime criado por Hans Welsel e adotado pelo Direito Penal, se desdobra em tipicidade formal e tipicidade material. Para que haja a presença desta é necessário que haja o desvalor da conduta e o resultado de modo a afetar um bem jurídico relevante de terceiro (GOMES, 2007).

Tais considerações levam a crer que o Direito Penal só deve atuar caso um bem jurídico esteja realmente sendo atacado, pois uma vez violada a esfera privada de uma pessoa, surge para o Estado o dever de punir aqueles infratores que se enquadram em determina conduta tipificada em lei (tipicidade formal).

2.2.2 Princípio da Necessidade da Pena ou da Intervenção Mínima

Na atual civilização faz-se necessário invocar o Direito Penal para que ele possa proteger os direitos fundamentais da pessoa humana, de forma a reprimir todas aquelas condutas que causem lesões a bens jurídico-penais. Podemos conceituar bens jurídicos como sendo aqueles que se perfazem das relações sociais positivamente valoradas. Isto é, “bem jurídico penal, por conseguinte, é uma relação social valorada positivamente por uma norma penal” (GOMES, 2007, p. 488).

Tendo em vista que a proteção penal não é exclusiva, tampouco, absoluta, faz-se necessário selecionar aqueles comportamentos que interessem a tutela penal. Logo, surge o princípio da necessidade apontado desde a Revolução Francesa e o Iluminismo como limitador do poder criativo do crime. Já preceituava o artigo 8° da Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 que a lei apenas deveria estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias (LUISI, 2003).

Na esteira de tais considerações é forçoso concluir que o objetivo primordial do princípio da necessidade é selecionar proporcionalmente qual o bem jurídico mais importante, e qual merece a devida proteção penal, pois, se assim não fosse, estaríamos diante de punições desnecessárias e inúteis e a pena, evidentemente, não é atormentar, muito menos aflingir ou desfazer o delito já cometido, ao contrário, os fins da pena se resumem em causar impressões mais eficazes e duradouras no espírito dos homens (BECCARIA, 1999).

Do princípio da necessidade se desencadeiam o princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos, princípio da ofensividade - já comentado anteriormente - e o princípio da intervenção mínima (LUISI, 2003). 

Como é sabido, o Direito Penal não é o ramo do direito destinado a intervir na vida das pessoas. Ao contrário, ele tem como missão preservar os bens jurídicos elencados pelo legislador como mais importantes ao harmonioso convívio social. Dessa forma, sua intervenção deve ser excepcional, ou mínima, ultima ratio, ou seja, ele só deve agir quando os demais ramos do direito se mostrarem ineficientes para solucionar o caso concreto. Considerando-se a intervenção mínima do Estado, este não deve ser acionado para reprimir condutas que não sejam significativas.  O princípio da intervenção mínima estatal tem como escopo orientar e limitar o legislador, preconizando pela criminalização de uma conduta quando se constituir meio necessário para a proteção jurídica. Nesse sentido, Rogério Greco (2007, p. 51):

As vertentes do princípio da intervenção mínima são, portanto, como que duas faces de uma mesma moeda. De um lado, orientando o legislador na seleção dos bens mais importantes e necessários ao convívio em sociedade; de outro, também servindo de norte ao legislador para retirar a proteção do Direito Penal sobre aqueles bens que, no passado, gozavam de especial importância, mas que hoje, com a evolução da sociedade, já podem ser satisfatoriamente protegidos pelos demais ramos do ordenamento jurídico.

Oportunamente, Luiz Regis Prado (1999, p. 84) acrescenta que:

O princípio da intervenção mínima ou subsidiariedade estabelece que o Direito Penal só deve atuar na defesa dos bens jurídicos imprescindíveis à coexistência pacífica dos homens e que não podem ser eficazmente protegidos de forma menos gravosa. Desse modo, a lei penal só deverá intervir quando for absolutamente necessário para a sobrevivência da comunidade, como ultima ratio.

O Estado de Direito só deve utilizar a lei penal como seu último recurso, devendo atuar, somente, quando estritamente necessário, mantendo-se subsidiário e fragmentário. Embora o princípio da intervenção mínima não esteja previsto constitucionalmente, integra a política criminal impondo-se ao legislador e ao intérprete do direito (BATISTA, 2002). Dessa forma, compreende-se que o Direito Penal deve aguardar a ineficácia dos demais ramos do direito e, somente, quando fracassarem as demais barreiras protetoras do bem jurídico deverá intervir a fim de disciplinar a conduta do indivíduo.

A subsidiariedade e a fragmentariedade são desdobramentos do princípio da intervenção mínima, pois norteia a intervenção em abstrato do Direito Penal. Segundo Nilo Batista (2002) a fragmentariedade surgiu pela primeira vez na parte especial do Tratado de Direito Penal Alemão de 1896 e desde então se faz presente no Direito Brasileiro.

 No postulado da fragmentariedade tem-se que a função maior atribuída à lei penal não é absoluta, o que dá entender que somente as agressões significativas devem ser levadas em consideração, pois o uso excessivo da sanção criminal condena o sistema penal a uma função meramente simbólica e negativa, não alcançando o Direito Penal seu objetivo maior que é a proteção de bens jurídicos relevantes. Por sua vez, a subsidiariedade do Direito Penal já pressupõe uma fragmentariedade, consistindo, pois, num remédio que só deve ser ministrado em casos de extrema necessidade.

2.2.3 Princípio da Culpabilidade

Durante muito tempo na história das civilizações perdurou a responsabilidade objetiva. O agente que cometia um delito obrigatoriamente respondia pelas suas conseqüências, sendo irrelevante se o resultado era produto de sua vontade. Era punido pelo que era, e não pela ofensa que tinha causado a bem jurídico de terceiro (LUISI, 2003).

 Todavia, desde os primórdios, Roma já analisava a vontade do agente como fundamento da pena, exigindo a Lei das Doze Tábuas a figura do dolo (LUISI, 2003).

Os romanos já diferenciavam dollus bonus do dollus malus. Aquele consistia na astúcia utilizada pelo agente para se defender do seu inimigo. Já o  dollus malus se caracterizava pela astúcia de engano com o fim de prejudicar alguém, sendo um ato voluntário pelo qual estava presente a consciência da injustiça (LUISI, 2003).

Mesmo com o surgimento das idéias iluministas, a responsabilidade objetiva não havia sido superada, de modo que só em meados do século XX surgiu uma visão científica acentuando o entendimento da relação do agente como responsável pelo fato criminoso (LUISI, 2003).

Luiz Luisi (2003) em sua obra Os Princípios Constitucionais Penais afirma que a Teoria Causalista enfocada por Franz Von Liszt teve grande destaque na criação do conceito de culpabilidade, eis que reduziu esse elemento ao dolo e a culpa, e daí em diante vários estudiosos, como Hans Welsel, começaram a desbravar tal conceito, findando na Teoria Normativa Pura da Culpabilidade, traduzida no juízo de reprovação que tem como objeto um fato injusto e subjetivamente típico.

Com a Teoria Normativa Pura da Culpabilidade passou-se a analisar a conduta do indivíduo a fim de verificar se ele havia agido com consciência da ilicitude ou não. Dessa forma, o dolo e a culpa passaram a integrar o tipo e a culpabilidade passou a adquirir uma fisionomia exclusivamente normativa (LUISI, 2003).

Com o finalismo de Welsel, a culpabilidade assumiu uma postura puramente normativa, passando a ser o juízo de reprovação ao agente do fato delitivo. Dolo e culpa passou a integrar a tipicidade. Esta se desdobra atualmente em conduta, resultado, nexo de causalidade, tipicidade formal e tipicidade material. A culpabilidade tem como requisitos: a imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa. Portanto, a partir da teoria tripartide de Welsel não se confunde mais culpabilidade com responsabilidade subjetiva, pois para que haja a prática de um crime são necessários que estejam presentes os seguintes elementos: fato típico, antijurídico e culpável (GOMES, 2007).

O princípio da culpabilidade, indiscutivelmente, ao lado de todos já comentados aqui, também cumpre sua função limitadora do ius puniendi, porém, não pode ser confundido com o conceito de culpabilidade decorrente de Política Criminal, que é aquele pelo qual isenta de pena determinados sujeitos que não tenham capacidade de se motivar no sentido da norma.

Da análise crítica proposta por Nilo Batista (2002, p. 103) se extrai:

O principio da culpabilidade deve ser entendido, em primeiro lugar, como repúdio a qualquer espécie de responsabilidade pelo resultado, ou responsabilidade objetiva. Mas deve igualmente ser entendido como exigência de que a pena não seja infligida senão quando a conduta do sujeito, mesmo associada causalmente a um resultado, lhe seja reprovável.

 A Constituição Federal de 1988 no seu inciso LVII dá a culpabilidade um gabarito constitucional no artigo 5°, dizendo que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória (CONSTITUIÇÃO FEDERAL,1988). No artigo retro citado é notório que nossa Carta Magna exigiu que fosse provada e declarada a culpabilidade do agente, seja autor ou partícipe de um fato típico e antijurídico.

A culpabilidade também está presente no artigo 29 do Código Penal, presente, neste caso, como limitador máximo da pena, pois diz que cada um deve ser punido na medida de sua culpabilidade (CÓDIGO PENAL, 1940).

 Acrescentando, o artigo 59 do Código Penal diz que o juiz no momento da aplicação da pena deve levar em consideração a culpabilidade do agente, funcionando neste caso como graduação da pena, devendo ser levado em consideração no momento da análise das circunstâncias judiciais a reprovação da conduta do indivíduo (GOMES, 2007).

Numa primeira acepção, o termo culpabilidade se contrapõe ao da inocência, cuja raiz é constitucional. Quando se afirma que a pessoa é culpada é porque já foram derrubadas todas as provas contundentes e válidas no processo.

Nilo Batista (2002, p.104) conclui:

O princípio da culpabilidade impõe a subjetividade da responsabilidade penal. Não cabe, em direito penal, uma responsabilidade objetiva, derivada tão só de uma associação causal entre a conduta e um resultado de lesão ou perigo para um bem jurídico. É indispensável a culpabilidade. No nível do processo penal, a exigência de provas quanto a esse aspecto ao aforisma “cupabilidade não se presume”. A responsabilidade penal é sempre subjetiva.

Resumindo, em primeiro lugar, a culpabilidade, como fundamento da pena, refere-se ao fato de ser possível a aplicação de uma pena ao agente de um fato típico e antijurídico. Para isso, se faz necessária a presença da capacidade de culpabilidade, consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa. A ausência de qualquer desses elementos específicos do conceito dogmático da culpabilidade é suficiente para impedir a aplicação de uma sanção penal. Em segundo lugar, a culpabilidade funciona como fundamento da pena, limitando-a e impedindo-a que seja imposta aquém ou além da medida prevista para proteger determinada lesão a um bem jurídico.

Pelo princípio em estudo, conclui-se, que não haverá pena sem culpabilidade, decorrendo daí três conseqüências materiais: não há responsabilidade objetiva pelo simples resultado; a responsabilidade é pelo fato e não pelo autor e a culpabilidade é a medida da pena.

2.2.4 Princípio da Individualização da Pena

Nos dizeres do mestre Nélson Hungria (s.d, apud LUISI, 2003, p. 52), a individualização da pena deve ser entendida como “retribuir o mal concreto do crime com o mal concreto da pena, na concreta personalidade do criminoso”.

A legislação constitucional pátria trouxe o dito princípio no seu artigo 5°, XLVII, dispondo que: “a lei regulará a individualização da pena [...]” (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). 

Registre-se que a individualização da pena necessariamente possui três fases distintas: a legislativa (momento da cominação), a judicial (momento da aplicação) e a executória ou administrativa (momento da execução). O primeiro momento a lei delimita para cada tipo penal uma ou mais penas proporcionais com a importância do bem jurídico defendido e conforme o grau de lesividade da conduta. Nesta fase, ainda se estabelece as espécies de penas que podem ser aplicadas, exclusiva, cumulativa ou alternativamente. Além disso, estabelecem as regras que possibilitam ulteriores individualizações (LUISI, 2003).

 Com efeito, todos os três momentos fazem parte do princípio da proporcionalidade que será explanado logo a seguir.

O segundo momento é o da individualização da pena pelos magistrados que diante do caso concreto vão decidir o quantum que será aplicado, dentro dos limites estabelecidos pelo preceito secundário, determinando, inclusive, o modo de execução.

As regras básicas da individualização da pena estão previstas no artigo 59 do Código Penal, ou seja, na primeira fase da aplicação da pena, e não podem deixar de ser observadas pelo juiz. Embora estejam na lei, enseja certa discricionariedade ao magistrado, mas sempre dentro dos limites do preceito primário e secundário trazido pelo tipo penal, pois o juiz está preso aos parâmetros que a lei estabelece. Assevera Luiz Luisi (2003, p.54):

É forçoso reconhecer estar habitualmente presente nesta atividade do julgador um coeficiente criador, e no mesmo irracional, em que, inclusive inconscientemente, se projetam a personalidade e as concepções da vida e do mundo do juiz.

A terceira e última fase ocorre com a execução ou individualização administrativa. Poderíamos afirmar que é nessa fase que a sanção começa a atuar, de fato, sobre o delinqüente.

Relativamente a essa etapa a Lei Maior prevê no seu artigo 5°, XLIX: “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral” (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). Já o inciso XLVIII do mesmo dispositivo impõe que o cumprimento da pena se dará em estabelecimentos que atendam a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado.

Por conseguinte, é de suma importância as finalidades almejadas com a individualização da pena, devendo-se sempre ter em mente seu caráter ressocializador e retributivo.

2.2.5 Princípio da Pessoalidade da Pena

O princípio da pessoalidade da pena está previsto no artigo 5°, XLV da Constituição Federal, que assim dispõe:

Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido (CONSTITUIÇÃO, 1988).

Desta feita, vislumbra-se que o princípio em discussão tem correlação com o princípio da responsabilidade pessoal, que proíbe a imposição de pena por fato de outrem. A responsabilidade deve ser individual, posto que ninguém responderá criminalmente além dos limites da própria culpabilidade (GOMES, 2007).

 Já é pacífico tal entendimento nas nações civilizadas que a pena só atingirá o condenado, pois como não é uma forma de reparação econômica do dano, mas, sim, um castigo, só poderá responder por ela àquele que cometeu o delito, com a privação de sua liberdade de forma que seja suficiente para sua ressocialização (LUIZI, 2003).

No entanto, não se pode olvidar que a pena pode gerar danos e sofrimentos a terceiros, em especial a família da vítima. Assim, é por isso que determinadas legislações vêm disciplinado a criação de institutos que auxiliam tanto a família do sentenciado, como a vítima do delito.

Corroborando com tal entendimento, o artigo 22, XVI da Lei 7210/84 assim dispõe: “A assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à liberdade” (LEI DAS EXECUÇÕES PENAIS, 1984). Ainda no artigo 29, § 1°, b, impõe-se que o produto da remuneração do trabalho do preso deverá atender “à indenização dos danos causados pelo crime, desde que judicialmente e não reparados por outros meios”.

2.2.6 Princípio da Proporcionalidade

Com a evolução do pensamento penal, um jovem milanês percebeu, nos idos do século XVIII, que a ideia da necessidade da resposta penal estatal estava estritamente ligada ao pensamento de que a pena correta é a pena justa, adequada, proporcional. Com efeito, aos 24 anos de idade, Cesare Beccaria bradou ao mundo que as penas somente têm legitimidade se proporcionais à conduta tida como criminosa, na medida de suas gravidades. Estavam lançadas as sementes do princípio da proporcionalidade do Direito Penal, princípio este cuja importância vem cada vez mais se acentuando, de modo a demandar reflexões e estudos por toda a comunidade jurídica (BECCARIA, 1999).

Embora não esteja expressamente previsto no texto constitucional é encontradiço de forma implícita primeiramente na Constituição Federal de 1988 que em seu artigo 1°, III vem previsto como forma de garantir a dignidade da pessoa humana, como também no artigo 2°, I que objetiva construir uma sociedade justa (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).

Ademais, a doutrina garante ao princípio da proporcionalidade (ou razoabilidade como prefere chamar os norte - americanos, ou proibição do excesso como denominado pelos alemães) força normativa, de modo que sua aparição se dá como garantia especial, traduzida na exigência de que toda e qualquer atividade estatal se der somente por motivos de necessidade, de forma adequada e na justa medida com o fim de obter uma máxima e eficácia otimização dos direitos e garantias individuais ligadas à pessoa humana (BARROS, 2003).

Alude Suzana Toledo de Barros (2003):

A expressão proporcionalidade tem um sentido literal limitado, pois a representação mental que lhe corresponde é a de equilíbrio: há nela, a idéia implícita de relação harmônica entre duas grandezas. Mas a proporcionalidade em sentido amplo é mais do que isso, pois envolve também considerações sobre a adequação entre meios e fins e a utilidade de um ato para a proteção de um determinado direito. A sua utilização esbarra no inconveniente de ter-se de distinguir a proporcionalidade em sentido estrito da proporcionalidade tomada em sentido lato e que designa o princípio constitucional.

Além de pautar a atividade do legislador, o princípio ora em comento serve também de norte para o aplicador do direito que a partir do caso concreto deverá fazer uma técnica de ponderação entre a violação do bem jurídico e garantias constitucionais.

Já dizia Flávio Gomes (2007, p. 553) que:

O princípio da proporcionalidade conta com interconexão com praticamente todos os demais princípios (intervenção mínima, culpabilidade, etc). Em certo sentido é um princípio complementar, mas necessário, de todos eles, porque os demais não asseguram a indispensável proporção entre o delito e a pena, a exigência de proporção se determina mediante um juízo de ponderação entre a “carga coativa” da pena e o fim perseguido pela cominação legal.

A essência da proporcionalidade guarda relação com as exigências da retribuição, bem como da prevenção, pois é uma idéia de justiça imanente do Direito uma vez que visa a dar a cada qual o que é seu, proporcional à sua conduta. Nesse sentido, vale a seguinte citação: “Não há pena mais efetiva que a pena justa e proporcional: a pena exorbitante pode chegar a ser criminógena” (GOMES, p. 556, 2007).

Nesse contexto, o princípio da proporcionalidade tem aplicação na aferição da constitucionalidade das leis, quando nos deparamos com a colisão de direitos e garantias constitucionais. Pois, o legislador mesmo perseguindo fins estabelecidos pela Carta Magna, poderá editar leis incompatíveis com a mesma, ou seja, inconstitucionais. A proporcionalidade, como uma das facetas da razoabilidade demonstra que nem todos os meios justificam os fins (BARROS, 2003).

O que se quer demonstrar, pois, com o presente estudo, é que a individualização da pena, notadamente se considerada em sua primeira fase, que é a da cominação abstrata, da fixação pelo legislador do seu quantum, deve guardar estrita observância ao princípio da proporcionalidade.

Citando mais uma vez Beccaria, o legislador deve estabelecer as penas abstratas de acordo com a gravidade de cada crime, eis que:

Se o prazer e a dor são a força motriz dos seres sensíveis, se entre os motivos que impelem os homens para ações mais sublimes foram colocados, pelo invisível legislador, o prêmio e o castigo, a distribuição inexata destes produzirá a contradição, tanto menos observada, quanto mais comum, de que as penas castigam os delitos a que deram origem. Se pena igual for cominada a dois delitos que desigualmente ofendem a sociedade, os homens não encontrarão nenhum obstáculo mais forte para cometer o delito maior, se disso resultar maior vantagem (1999, p. 39).

A pena, além de só poder ser legítima quando constitui o meio necessário para efetiva proteção de um bem jurídico, há de ser proporcional à importância do bem, à gravidade da ofensa e à intensidade de culpabilidade do agente. O princípio em tela deve estar presente na norma penal incriminadora ao fixar em abstrato a medida da pena.

O momento de aplicação do princípio da proporcionalidade é, assim, o do estabelecimento em abstrato das penas.

Em suma, o princípio da proporcionalidade – que obriga em primeiro lugar o legislador – exige a concretização de um juízo de adequada ponderação entre o bem ou interesse que se lesa ou que se coloca em perigo (gravidade do delito) e o bem que se restringe ou que se priva por meio da pena.

Transportando tais considerações para o nosso direito positivo, basta um exame superficial para se perceber quão corriqueira é a violação do princípio da proporcionalidade, princípio este que, na jurisprudência do Pretório Excelso, tem fundamento constitucional na medida em que representa o aspecto substancial do devido processo legal, que vem expressamente contemplado no art. 5º, LIV, da Constituição Federal de 1988. Logo, é um princípio constitucional geral do Direito (GOMES, 2007).

O que se depreende é que a aplicação da proporcionalidade repousa na necessidade de construir um Direito pela utilização da norma cogente positivada de forma coerente, harmonizando, sempre que possível, os interesses contrários que formam uma mesma relação jurídica. E quando ocorrerem colisão entre conflitos é preciso que haja ponderação, de modo que se verifique qual deles possui o maior peso diante do caso concreto.

Desta forma, o princípio da proporcionalidade como limitador da atividade estatal representa a exata medida em que deve agir o Estado, não significando que deva agir de forma demasiada, tampouco, insuficiente na realização de seus objetivos. Além da força limitadora, o princípio em tela está relacionado à proteção da pessoa humana e partindo desse pressuposto, toda vez que for desrespeitado, haverá violação imediata ao princípio da dignidade da pessoa humana, elencado pela Constituição Federal como um dos seus fundamentos. Ocorrerá a violação do princípio da proporcionalidade sempre que o legislador e aplicador do Direito, diante de dois valores legítimos a sopesar, priorizar um a partir do sacrifício exagerado de outro.

Sobre a autora
Hyanara Torres Tavares de Souza

Graduada pelo Centro Universitário de João Pessoa - Unipê. Pós graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Uniderp - Anhanguera - LFG. Advogada do Detran-PB.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Hyanara Torres Tavares. Da (in)constitucionalidade da pena mínima cominada ao crime de estupro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3426, 17 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23038. Acesso em: 22 nov. 2024.

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