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Perspectivas brasileiras para uma regulação estatal da publicidade de alimentos

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Agenda 22/03/2013 às 14:05

Apesar de juristas, legisladores e setores da sociedade civil proporem meios normativos de regulamentação publicitária mais precisos, existe uma forte resistência dos setores que prezam pelo sucesso financeiro das indústrias de alimentos.

Resumo: O presente artigo trata da legitimidade e da legalidade de uma regulação estatal da publicidade infantil de alimentos, tendo em vista que o anúncio de produtos deste gênero está ligado à elevação nas taxas de obesidade infantil. Através de uma revisão bibliográfica de livros, artigos e textos legais, o estudo aborda o tema a partir de pontos distintos, mas complementares: primeiramente, analisamos a vulnerabilidade da criança frente aos comerciais e os meios existentes para protegê-las; em seguida, apresentamos evidências da relação entre publicidade infantil e o mau comportamento alimentar das crianças, algo que aumenta as taxas de obesidade. Conclui-se que tais pontos são fundamentos para uma regulação governamental da publicidade de alimentos no Brasil, sobretudo aqueles destinados ao público infantil.

Palavras-chave: Direito do Consumidor; Publicidade de Alimentos; Obesidade Infantil; Regulamentação Estatal.

Sumário: 1. Introdução; 2. Consumo e Publicidade – evolução histórica; 3. Criança – sua vulnerabilidade e a necessidade de proteção jurídica frente à publicidade comercial; 4. Obesidade infantil e Publicidade; 5. A regulamentação publicitária nos países desenvolvidos; 6. Perspectivas Brasileiras para uma Regulação Estatal da Publicidade de Alimentos; 7. Conclusão.


1. Introdução

A Organização Mundial da Saúde afirma que, atualmente, as doenças e agravos não transmissíveis (DANT) – dentre elas: doenças cardiovasculares, câncer, diabetes e obesidade – consistem em grave problema para saúde humana e para o desenvolvimento sócio-econômico dos países (OMS, 2010, p. 4). Além da elevada morbidade proveniente dessas patologias, a maioria das mortes causadas por elas são prematuras e poderiam ser evitadas. No mundo, elas já são responsáveis por mais de 60% das mortes, fundamentando uma atuação a nível global no plano normativo e de saúde pública (WHO, 2006, p. 3).

A obesidade está entre as DANT que mais vêm ampliando sua incidência na população mundial. Estima-se que os gastos públicos com a enfermidade consumam de 2% a 7% dos orçamentos de saúde nos países desenvolvidos (FERREIRA, 2006, p. 71). A própria OMS a considera como a epidemia global do século XXI, havendo estimativas de que quase 50% da população mundial será obesa em 2025. Os números são preocupantes, pois a obesidade, patologia que pode ser evitada, consiste em fator de risco para inúmeras outras DANT, dentre elas as doenças cardiovasculares e o câncer, as duas campeãs em mortalidade.

A obesidade afeta pessoas de todas as faixas etárias, inclusive a infantil. No Brasil, estima-se que a patologia afete 15% das crianças, sabendo-se que o sobrepeso já se encontra presente em 30% da população infantil brasileira (HENRIQUES, 2010, p. 75), índices que se elevam a cada ano. A obesidade infantil não só está relacionada com maiores riscos de obesidade e outras DANT na vida adulta, mas também com problemas imediatos (OMS, 2010, p.4), como resistência a insulina, hipertensão, alergias e distúrbios de ordem psicológica e social.

A OMS tem por conclusivo que a publicidade de alimentos dirigida às crianças é um dos pontos centrais a serem considerados na luta contra a obesidade infantil, entendendo que: (a) a maioria dos anúncios destinados a esse público é de alimentos ricos em gordura, açúcar ou sódio; (b) o público infantil é vulnerável à capacidade persuasiva da publicidade comercial. No ano de 2004, a OMS, em conjunto com a Assembléia Mundial da Saúde (AMS), direcionou seus esforços para a necessidade dos países membros criarem ou aperfeiçoarem os meios regulatórios da publicidade voltada para as crianças. Atendendo recomendações desses órgãos, governos de diversos países têm criado diferentes mecanismos regulatórios (GOMES, 2011, p. 48), de modo a restringir ou excluir o conteúdo publicitário destinado às crianças.

Na realidade brasileira, onde as crianças são recordistas mundiais em número de horas diante da TV – 4 horas e 54 minutos (HENRIQUES, 2010, p. 72) – a tentativa de regulação da publicidade infantil de alimentos tem sido tema de inúmeras polêmicas, dentre elas a suspensão da RDC nº 24/2010 da Anvisa1 dias após sua entrada em vigor, além da dificuldade de tramitação de projetos de lei de conteúdo regulatório que circulam na Câmara e no Senado. Comparado a outras democracias, o Brasil é caracterizado por ser extremamente liberal quanto à regulação da prática publicitária. Apesar de seu sistema jurídico considerar a vulnerabilidade da criança frente aos anúncios comerciais e determinar a sua proteção integral, possibilitando a regulação da publicidade, não existem dispositivos legais específicos que orientem a aplicação das restrições. Quando esses tipos de dispositivos são propostos, esbarram nos interesses das indústrias de alimentos e bebidas não alcoólicas e das agências publicitárias, setores do mercado responsáveis por altos e sempre crescentes faturamentos.

O CONAR (Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária), órgão de controle constituído pelas próprias empresas, tem se posicionado contra qualquer tipo de regulamentação legal à publicidade. Para o conselho, a atividade de autorregulação já seria suficiente para um controle efetivo do conteúdo abusivo que emanem dos anúncios publicitários. Além disso, costumam utilizar o termo “liberdade de expressão comercial” para alegar que a atividade da publicidade comercial deve ser considerada como direito fundamental, e restringi-la seria atentar contra os princípios de um Estado democrático de Direito.

No extremo oposto, a sociedade civil tem se organizado no sentido de buscar meios de comprovar a legitimidade e a legalidade da regulação publicitária no Brasil. No que se refere à legitimidade, uma gama de estudos científicos têm sido utilizados não apenas para demonstrar os efeitos deletérios que uma alimentação inadequada provoca na infância, mas também para revelar o quanto as crianças são influenciáveis pelos anúncios publicitários.

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A legalidade de uma regulação estatal da publicidade infantil é fundamentada em diferentes documentos legais brasileiros, dos quais se destacam a Constituição Federal, o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Esses diferentes textos normativos são tidos, por muitos, como motivadores da produção de normas que venham a regular de forma específica a publicidade comercial. Com base nisso, diferentes mecanismos legais estão sendo desenvolvidos com o objetivo de realizar tal regulação, seja direta ou indiretamente. São eles: (a) projetos de lei do Congresso Nacional; (b) a RDC nº 24/2010 da ANVISA; e (c) o Marco Regulatório das Comunicações que está sendo amplamente discutido pela sociedade brasileira.

O presente estudo objetiva analisar os aspectos relacionados com a legitimidade e a legalidade de uma regulação estatal da publicidade de alimentos no Brasil. No que concerne à legitimidade, serão utilizados fundamentações científicas que demonstram a fragilidade da criança frente aos anúncios publicitário, bem como as graves conseqüências da obesidade infantil. A legalidade, por sua vez, será abordada com base em documentos legais, publicações de especialistas do meio jurídico, pareceres, projetos de lei, artigos científicos e livros.


2.Consumo e Publicidade – evolução histórica

O século XVIII vivenciou céleres modificações sociais e econômicas nunca antes vistas na história da humanidade. Até então, as comunidades produziam o suficiente para suprir suas necessidades e a sua organização social e político-econômica era inteiramente baseada na produção artesanal, agrícola e feudal (LIMA, 2010, p. 1687). As famílias formavam uma mesma unidade econômica de produção (TOFFLER, 2005), sendo constituídas por uma variedade de indivíduos de diferentes gerações, o que permitia a divisão interna de trabalho.

Quando, em 1767, o escocês James Watt aperfeiçoou a máquina a vapor e a introduziu nas fábricas de tecidos, o mundo conheceu um ritmo de produção extremamente eficaz (LISBOA, 2011,p. 3). Este foi o marco da Revolução Industrial, que teve como primeiro grande impacto a enorme aceleração do ritmo de produção. Não havia mais espaço para o retrógrado modelo de produção agrária artesanal. Deste modo, ocorreu um intenso movimento migratório que levou as populações rumo aos centros urbanos industriais, modificando definitivamente uma série de paradigmas até então vigentes.

O trabalho, que antes era desempenhado conjuntamente pela família “dentro de casa” seria agora executado nas fábricas. Talvez seja esse o primeiro impacto sentido na estrutura familiar: de indivíduos que agiam cooperadamente visando à sobrevivência comum, passaram a ser sujeitos que se encontram nos horários de folga do trabalho. Surge a família monoparental (formada por pai, mãe e filhos, apenas; e não mais primos, tios e avós).

O desenvolvimento tecnológico seguiu em ritmo intenso. Em breves exemplos: a produção de algodão para fiação aumentou doze vezes nos trinta anos seguintes à introdução da máquina de tear; a produção do carvão decuplicou em quarenta anos; a de ferro gusa cresceu quase vinte vezes, em cinqüenta anos (LISBOA, 2011, p. 3). O resultado disto: uma grave crise provocada por considerável excedente de bens, devido uma produção que superava o consumo. Assolini (2008, p. 3) expõe que a saída dessa crise estaria na estimulação das compras; em deixar o consumo superar a produção. Mas como isso ocorreria de modo efetivo?

Eis que se implanta na sociedade o hábito de consumo, fundamentado em uma lógica: diferente dos tempos remotos, onde um indivíduo pobre terminaria seus dias sem possibilidade de ascender socialmente, a era industrial permitiria que as pessoas pudessem obter o sonhado status. Para isso, bastaria adquirir os “bens de luxo” que estavam sendo barateados pela produção em massa. É o surgimento da publicidade comercial, tal como conhecemos hoje. Seu objetivo fundamental foi criar nas mentes dos indivíduos o que Cristóvão Buarque (1990) chamou de “ânsia consumista”, que seria o impulso de comprar algo não por necessidade, mas por desejo; a crença de que, deste modo, o sujeito será reconhecido socialmente; o grande domínio do ter sobre o ser. Este foi o cerne da publicidade comercial: criar o hábito de se adquirir os excedentes da produção.

Nas palavras de Ana Karmen Lima (2010, p. 1688):

“Nesse intenso e complexo processo, há a coisificação do homem. O cidadão perde tal qualidade para se transformar em simples receptor da demanda empresarial. Acarreta, ainda, a discriminação social, pelos “estilos de vida” que são criados, o incentivo ao desperdício e ao descartável, banalizando valores e esvaziando o sentido das coisas. O ato de consumir se exaure como um ato completo de significado, sem se cogitar do que ou para o que se consome. A produção e os serviços não se baseiam nas necessidades individuais, mas na possibilidade de lucro”.

Para fins de desenvolvimento deste trabalho, é necessário diferenciar os conceitos de publicidade comercial, publicidade (não adjetivada) e propaganda. Conforme a diferenciação de Vidal Nunes (2008, p. 275):

a) Publicidade Comercial: atividade desenvolvida para fomentar o consumo, seduzindo o consumidor para a aquisição de determinado produto ou serviço;

b) Publicidade: meio pelo qual o Estado dá transparência às suas decisões e informa a população;

c) Propaganda: visa a divulgação de idéias, teorias e princípios.

Portanto, a publicidade comercial não tem cunho ideológico ou político, sendo considerada mero instrumento da atividade econômica.

A indústria da publicidade é responsável por aproximadamente 1% do PIB mundial – movimentou aproximadamente US$ 582 bilhões em 2009, segundo informações do Banco Mundial (BM – Banco Mundial, 2010). De todos os países do mundo, o Brasil é o terceiro que mais investe em publicidade, fato que proporciona grande poder econômico aos grupos que atuam na área.

Verifica-se hoje que parte considerável dos recursos destinados a publicidade são investidos em comerciais infantis, fato verificado também no Brasil, onde 250 milhões de dólares são movimentados. Mas por que as crianças, que não costumam ter independência para realizar grandes compras, estão sendo alvos da publicidade comercial? É o que veremos no tópico que se segue.


3. Criança – sua vulnerabilidade e a necessidade de proteção jurídica frente à publicidade comercial

No mundo, o consumo infantil gera lucros de cerca de US$ 15 bilhões por ano e o poder de persuasão das crianças nas compras dos adultos aproxima-se de US$600 bilhões (SANTOS, 2007, p. 6). Isso se explica pelo fato das crianças influenciarem cerca de 80% do consumo doméstico, seja de produtos infantis ou não. Quando as agências de publicidade direcionam sua atenção aos meninos e meninas, estão interessados tanto no seu poder de influência quanto no fato de que eles serão o público consumidor de amanhã. Promover a fidelidade dos pequenos a uma marca é garantir que eles tenham preferência por seus produtos no futuro.

A sociedade pós-moderna é marcada pelo distanciamento nas relações sociais, inclusive dentro da família. Enquanto os pais estão ausentes durante grande parte do dia, as crianças ficam cada vez mais expostas aos meios de comunicações, dentre os quais, a TV encontra-se em primeiro lugar. Como dito anteriormente, a criança brasileira é a campeã mundial em horas diante da telinha: são quase cinco horas dedicadas a ela, número superior ao da quantidade de horas diárias que passam nas escolas (apenas quatro). Para 80% das crianças, assistir TV é a principal atividade de lazer (HENRIQUES, 2010, p. 73). Essa situação torna-se mais drástica se considerarmos que a criança tem uma vulnerabilidade natural frente aos anúncios publicitários. Pesquisas comprovam que bastam apenas 30 segundos para uma marca influenciar uma criança (ASSOLINI, 2008, p. 7).

Algumas características básicas tornam a criança altamente influenciável pelos produtos expostos diante de si. Sabe-se que até os oito anos elas não têm capacidade de distinguir a publicidade do conteúdo de programação televisiva. Até os 12 anos não são capazes de compreender o caráter persuasivo dos anúncios comerciais. Sobre essas características é que agem as técnicas de marketing que são dirigidas às crianças: seduzem-nas através de elementos conhecidos do seu cotidiano. Cenários, personagens e roteiros são provenientes do seu mundo íntimo, que transita entre o real e o imaginário, o que facilmente acaba por despertar nelas o desejo pelos produtos anunciados (RODRIGUES, 2007).

A pesquisadora Corinna Hawkes, em estudo comissionado pela OMS, avaliou os mecanismos regulatórios de mais de 70 países, demonstrando ao final que a maioria das regulamentações publicitárias das nações estudadas reconhece as crianças como um grupo especial que necessita de considerações específicas e estipula que a publicidade não deve ser prejudicial ou exploradora da sua credulidade (HAWKES, 2006, p.35).

O ordenamento jurídico brasileiro, ao mesmo tempo em que reconhece a fragilidade do público infantil frente aos anúncios comerciais, carece de mecanismos mais precisos voltados à efetivação de seus dispositivos legais, o que acaba por provocar um distanciamento do que a lei expressa e de como sociedade se comporta (neste caso: de como a publicidade comercial se difunde pelos meios de comunicação sem encontrar limites significativos à sua prática).

A Constituição Federal de 1988 elenca no caput do seu artigo 227:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Alguns elementos importantes podem ser retirados das linhas supracitadas, com o fim de desenvolvermos a linha teórica deste estudo: (a) o Poder Constituinte direciona o dever de cuidado das crianças e adolescentes não apenas à família, entendendo que a sociedade e o próprio Estado têm um papel indispensável no seu desenvolvimento; (b) a menção à “absoluta prioridade” demonstra a primazia que esta faixa etária possui no que se refere à proteção de seus interesses; (c) expõe que não será admitida qualquer forma de exploração.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069 de 1990, reforça o caráter prioritário que têm as crianças e os adolescentes, sabendo-se que a sua condição peculiar como pessoas em desenvolvimento deve ser respeitada acima de tudo. O ECA, porém, não disciplina a publicidade de forma específica.

O Código de Defesa do Consumidor (CDC), Lei nº 8.078 de 1990, é mais preciso sobre como disciplinar a questão. Em seu artigo 37, § 2º, ele explicita que é inadmissível a publicidade que se aproveite da deficiência de julgamento da criança, assim como a que é capaz de induzi-la a se comportar de forma prejudicial à sua saúde.

CDC, art. 37, § 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança (grifou-se).

O modelo brasileiro de regulamentação à atividade publicitária é centrado na auto-regulação, mecanismo de controle realizado pelas próprias empresas do ramo publicitário. O Código Brasileiro de Autoregulamentação Publicitária discorre sobre os interesses de crianças e adolescentes e informa que “nenhum anúncio publicitário dirigirá apelo imperativo de consumo diretamente à criança”, conforme previsão do artigo 37:

Art. 37, II - Quando os produtos forem destinados ao consumo por crianças e adolescentes seus anúncios deverão:

a. procurar contribuir para o desenvolvimento positivo das relações entre pais e filhos, alunos e professores, e demais relacionamentos que envolvam o público-alvo;

b.respeitar a dignidade, ingenuidade, credulidade, inexperiência e o sentimento de lealdade do público-alvo;

c. dar atenção especial às características psicológicas do público-alvo, presumida sua menor capacidade de discernimento;

d. obedecer a cuidados tais que evitem eventuais distorções psicológicas nos modelos publicitários e no público-alvo;

e. abster-se de estimular comportamentos socialmente condenáveis.”

(grifou-se)

Apesar de estar compatível com a CF, ECA e CDC, questões inerentes à própria concepção do CONAR impede que estes dispositivos sejam realmente efetivos. A primeira delas é que a adesão ao conselho é optativa, ou seja, o CONAR não envolve todas as agências de publicidade ou veículos de comunicação do país2. Em segundo lugar, por ser um conselho de iniciativa privada, o CONAR não tem o poder coativo que possui o Estado. Em decorrência disto as decisões tomadas por tal Conselho não são sancionadoras (SILVA, 2011, p. 5). Dentre advertências e recomendações, nada garante que o anúncio que fira dispositivos legais seja retirado de circulação e, muito menos, que exista responsabilização civil ou criminal. Mariana Ferraz, representante do IDEC (Instituto de Defesa do Consumidor), relatou que publicitários entrevistados por uma pesquisa do Instituto comentaram um método eficiente para burlar o CONAR: transmitem as mensagens de publicidade potencialmente agressivas na sexta feira à noite (ou na véspera de feriados prolongados), sendo que o CONAR só retornará às suas atividades na segunda feira, dia em que a mensagem é retirada do veículo de comunicação. Deste modo, a publicidade já causou seus efeitos persuasivos no público, e o CONAR nada poderá fazer (relato proferido em Audiência Pública realizada na CDEIC em 18/06/2009, que tratou do PL 5.921/2001).

Enquanto não são criados mecanismos regulatórios que coloquem em prática o que prediz a CF e outras tantas normas existentes no sistema jurídico brasileiro, as crianças permanecem expostas aos efeitos nocivos que a publicidade comercial é capaz de provocar em seu desenvolvimento. E esses efeitos não são poucos: ampliação do consumismo, erotização precoce, a violência pela busca de produtos caros ou de marcas conhecidas, o materialismo excessivo, o desgaste das relações sociais e, por fim, o aumento da incidência de obesidade infantil (HENRIQUES, 2009, p. 3), que será especificado no próximo tópico.

Sobre o autor
Raoni Rodrigues

Acadêmico de Direito. Fisioterapeuta (Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública). Especialista em Saúde Pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Raoni. Perspectivas brasileiras para uma regulação estatal da publicidade de alimentos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3551, 22 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24016. Acesso em: 2 nov. 2024.

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