Resumo: Pretende-se demonstrar com o presente trabalho, por meio de pesquisa bibliográfica e documental, a possibilidade de se compatibilizar, harmonizar, as técnicas de Gestão por Competências ao setor público, atentando à Lei de Licitações (Lei 8.666/93, que nada mais visa do que assegurar o tratamento isonômico entre os administrados) e aos princípios da Administração Pública e do Direito Administrativo. Dessa forma, demonstrar-se-á que a implementação da gestão por competência ao setor público não é apenas possível, mas salutar, desde que respeitados os princípios gerais da administração pública (art. 37, “caput”, da Constituição Federal de 1988) e cumprido o imperativo constante tanto no art. 37, II, de nossa Carta Magna (investidura em cargo ou emprego público por meio de “concurso público”) quanto no art. 22, § 4°, da Lei 8.666/93, cuja redação é a seguinte: “Concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias”. Tais ponderações quanto à observância dessas normas de Direito Administrativo (ramo do Direito que regulamente a atuação estatal) são imprescindíveis, na medida em que, como é cediço, o referido ramo do Direito se apresenta como uma conquista dos regimes republicanos e democráticos, visando à submissão não apenas do povo a certas regras positivadas, mas também dos governos. Outro aspecto relevante destacado no presente artigo é que para a boa implementação da gestão por competência no setor público, faz-se necessário um cuidado para que não ocorra o que Torrez e Ramos (2000)[1] chamam de “desprofissionalização do trabalho”, decorrente de uma polivalência de funções. Isso, como será visto, é um risco real que decorre principalmente de práticas que têm como pressuposto a falácia de que aquele que bem executa determinado ofício também seria um excelente gestor, caso alçado a essa condição. Outra situação que exemplifica a problemática da possível “desprofissionalização do trabalho” no setor público, caso a gestão por competência não seja adequadamente implementada, é aquela decorrente da simples unificação de cargos, extinguindo-se uns (sempre por lei) com funções específicas e bem definidas (decorrentes de uma especialização, cujo objetivo não é outro senão o aprimoramento de cada servidor público naquilo em que labora) para criar outros cargos “polivalentes”, com imensuráveis atribuições genéricas e pouco definidas.
Palavras-chave: Gestão. Competência. Administração Pública.
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por objetivo demonstrar a possibilidade de aplicação de técnicas de gestão de pessoas, precipuamente a gestão por competências, ao setor público, compatibilizando-as à observância da Lei de Licitações (Lei 8.666/93) e dos princípios da Administração Pública (Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência) e do Direito Administrativo.
O termo “Gestão Pública”, como bem observado pelo Dr. Luiz Alberto Esteves Scalope[2], vem sendo utilizado atualmente com grande frequência, principalmente no sentido de atribuir à Administração Pública uma certa “cientificidade administrativa” que lhe faltava, ou seja, visa a indicar que a Administração Pública passou a ser gerida enfim segundo as recomendações construídas pela “Ciência da Administração”.
Essa ideia está de certa forma arraigada no senso comum principalmente pelo fato de que a organização privada é o que imediatamente se apresente como contraponto à administração pública. Assim, por se acreditar que os formatos da administração privada estão funcionando para seus proprietários, pelos supostos métodos científicos de gestão aplicados, e por se considerar que advêm de procedimentos e técnicas "neutras", isentas de ingerências políticas (não apenas no sentido de política partidária, mas também, e principalmente, política institucional), essa ideia induz a se acreditar que a simples transposição de um modelo para o outro (do privado para o público) seria uma alternativa viável de se levar o Estado a uma forma mais eficiente de consecução de seus objetivos.
A título de registro, faz-se necessário consignar que a maior falha de se fazer uma análise tão superficial sobre o tema consiste no fato de praticamente se isentar de responsabilidade aquele setor que, em geral, tem a maior parcela na culpa pela ineficiência estatal e paradoxalmente se apresentam como solução para o problema, qual seja: os detentores do poder econômico, que buscam justamente flexionar, flexibilizar, as normas de Direito Público (que nada mais visam do que a estruturação do Estado de modo a garantir um tratamento isonômico de todos os concidadãos) para, ao tratá-las como normas de Direito Privado, subvertê-las aos seus próprios anseios por poder político.
Paulo Bonavides[3], renomado constitucionalista brasileiro, defende de forma veemente que liberalismo não se confunde, nem é sinônimo de democracia e conclui que a Revolução Francesa estagnou em meio caminho de concretizar os ideais democráticos. Ou seja, à luz dos ensinamentos do autor, conclui-se que para que se implemente uma Gestão Pública “eficiente” (art. 37, “caput”, da CF/88), não há a necessidade de se implementar a política de estado mínimo (submetendo o interesse público ao interesse econômico), mas tão somente de se adequar os conhecimentos gerados pela Ciência da Administração à realidade do setor público, o qual é regido pelo Direito Administrativo.
A seu turno, Direito Administrativo, segundo Hely Lopes Meirelles[4], é o “conjunto harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes e as atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado”.
Odete Medauar[5], por sua vez, assim leciona:
Em essência, o direito administrativo é o conjunto de normas e princípios que regem a atuação da Administração Pública. Inclui-se entre os ramos do direito público, por tratar primordialmente da organização, meios de ação, formas e relações jurídicas da Administração Pública, um dos campos da atividade estatal.
O direito administrativo pode ser visualizado do ponto de vista científico como um setor de estudo no âmbito do Direito, dotado de objeto complexo normativo destinado a reger o funcionamento de uma das partes do organismo estatal.
Celso Ribeiro Bastos[6], por outro lado, ensina que:
Direito administrativo é o ramo do direito que regula, predominantemente, um dos poderes do Estado, qual seja, o Executivo. Cabe-lhe, fundamentalmente, disciplinar as atividades que regem a função administrativa. Atividade que se diferencia das demais por constituir campo de aplicação de um regime jurídico próprio, o que acaba por tornar o objeto deste ramo do direito também individualizado.
O Direito Administrativo sofre grande influência do direito constitucional, mas, ao mesmo tempo, distancia-se dele por voltar-se mais à realização da função administrativa, ao desempenho da atuação do Estado na sua manifestação mais próxima do cidadão, na medida em que é o Poder Executivo aquele que vai prestar os serviços e regular as atividades, pondo-se mais em contato com o administrado.
O direito administrativo varia segundo as concepções de Estado e não é o mesmo, seguramente, num Estado autoritário, que num Estado democrático.
Em síntese, o direito administrativo cuida do regime jurídico aplicado à função administrativa. É composto tanto de normas jurídicas, como de princípios jurídicos que atuam com vistas a transformar em manifestações concretas as prescrições abstratas da lei, mantendo sempre os fins por esta descritos.
São múltiplas as facetas da expressão “função administrativa”, que compreende não só o atuar administrativo, como os próprios sujeitos administrativos, é dizer, os órgãos e entes que estão no exercício da função administrativa. A maneira como eles a exercem, a utilização de meios ou faculdades e o respeito a regras, uma vez que a atividade jurídica administrativa envolve também respeito aos direitos individuais, exemplificam umas das facetas abrangidas pelo atuar administrativo.
Destarte, quanto às concepções sobre Direito Administrativo, não há grandes divergências entre os doutrinadores, visto que convergem em afirmar que o mesmo é a área do direito que tem como finalidade regular a atuação da Administração Pública, tendo como fontes a lei, a doutrina, a jurisprudência, os costumes e os princípios gerais do direito. Como consectário, os contratos administrativos, na medida em que são espécies de atos da administração pública, devem igualmente ser feitos em conformidade com as fontes de direito retro mencionadas.
Observa-se, portanto, que o Direito Administrativo se apresenta como uma conquista dos regimes republicanos e democráticos, visando à submissão não apenas do povo a certas regras positivadas, mas também dos governos.
Pode-se dizer, inclusive, que o Direito Administrativo foi, ao longo dos anos, de suma importância para a formação dos Estados, possibilitando as condições de atingirem seus objetivos de forma ordenada, pautados na lei, na doutrina, na jurisprudência, nos costumes e, principalmente, em princípios como, por exemplo, o da legalidade, moralidade e supremacia do interesse público sobre o privado.
Por sua vez, como bem ensina o mestre Eros Roberto Grau, ministro aposentado do STF, em sua obra “Licitação e contrato administrativo (estudos sobre a interpretação da lei)”[7], o processo de licitação tem como finalidade resguardar o interesse público, pautando?se pelo princípio da isonomia. Sem o processo licitatório, presume-se que houve dano ao interesse público, pois não houve possibilidade de acesso de todos os agentes capacitados à licitação, fator determinante para garantir a concreção da garantia de igualdade (isonomia).
Licitação é, por definição, o processo geral e impessoal utilizado pela Administração para selecionar, dentre várias propostas apresentadas por particulares, que pretendem contratar com o Erário, a que mais atende aos anseios da coletividade.
Eros Roberto Grau, 1995, por sua vez, ensina que:
A licitação está voltada a um duplo objetivo: o de proporcionar à administração a possibilidade de realizar o negócio mais vantajoso – o melhor negócio -, e o de assegurar aos administrados a oportunidade de concorrerem, em igualdade de condições, à contratação pretendida pela Administração[8].
Nesse diapasão, determina o art. 37, II, da Constituição Federal de 1988, que “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei”, lei essa que vem a ser 8.666/93, em cujo bojo traz consignado que “concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias” (art. 22, § 4°, da referida Lei).
Como corolário, o que este trabalho buscará é, por meio do método indutivo (ou seja, partindo de uma análise casuística para a elaboração de uma regra), com o respaldo de consultas a fontes primárias e secundárias, analisar as referidas contratações sob a óptica da Constituição, do Direito Administrativo, de seus princípios e da legislação vigente a respeito da matéria, procurando mostrar, de forma objetiva, a possibilidade de se aplicar técnicas de Gestão de Pessoas, precipuamente a gestão por competências, à Administração Pública, conciliando-se tais técnicas à inexorável aplicação dos Princípios da Administração Pública e do Direito Administrativo.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
É perfeitamente possível a compatibilização das técnicas de gestão de pessoas, precipuamente a gestão por competências (a gestão por competências nada mais é do que uma ferramenta para uma estratégica gestão de pessoas) ao setor público, atentando à Lei de Licitações (Lei 8.666/93, que nada mais visa do que assegurar o tratamento isonômico entre os administrados) e aos princípios da Administração Pública e do Direito Administrativo.
Tal premissa restará demonstrada à luz do ordenamento jurídico brasileiro, segundo o qual licitação é o processo administrativo em que a sucessão de fases e atos leva à indicação de quem vai celebrar o contrato com a Administração. O certame visa, portanto, a selecionar quem vai contratar com a Administração, por oferecer proposta mais vantajosa ao interesse público, de modo que a decisão final do processo licitatório aponta o futuro contratado.
É um processo administrativo porque, além da sucessão de atos e fases, há sujeitos diversos (os licitantes) interessados no processo, que dele participam, perante a Administração, todos, inclusive esta, tendo direitos, deveres, ônus e sujeições.
Portanto, o procedimento licitatório tem como finalidade satisfazer o interesse público, fundamentando-se no princípio da isonomia.
José Cretella Júnior define licitação como sendo “o processo geral e impessoal empregado pela Administração para selecionar, entre várias propostas apresentadas, por particulares, que pretendem oferecer serviços ou bens ao Estado, a que mais atende ao interesse da coletividade”.[9]
Por sua vez, Hely Lopes Meirelles[10], em perfeita consonância com o autor anteriormente citado, ressalta ainda a importância da licitação (da qual o concurso público é espécie) para que haja o efetivo respeito à eficiência e à moralidade dos negócios administrativos. Isso porque somente por meio de uma ampla concorrência entre os licitantes é que a Administração poderá ter a certeza de estar contratando com os mais aptos.
Na mesma esteira seguem os ensinamentos de Eros Roberto Grau, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, segundo o qual a licitação tem por fito dois objetivos precípuos, quais sejam, 1) proporcionar à Administração a possibilidade de realizar o negócio mais vantajoso e 2) assegurar aos administrados a oportunidade de concorrerem, em igualdade de condições (sem ingerências políticas), à contratação pretendida pela Administração.[11].
A licitação, sendo assim, tem como pressuposto a competição, que nada mais é do que a possibilidade de acesso de todos os agentes econômicos capacitados à licitação. Sem a presença da licitação, portanto, presume-se que houve dano ao interesse público, pois não houve possibilidade de acesso a todos os agentes econômicos capacitados à licitação, fator determinante para garantir a efetivação do princípio da isonomia.
Conforme versa Hely Lopes Meirelles,
Licitação e contrato administrativo são, pois, temas conexos, porque este depende daquela. Toda licitação conduz a um contrato; todo contrato objetiva uma obra, um serviço, uma compra ou alienação de um interesse público[12].
Os contratos administrativos, assim como os demais atos da administração, devem pautar-se nos princípios administrativos. José Cretella Júnior, em linhas gerais, afirma que contrato administrativo é uma espécie do gênero contrato da Administração.[13]
O que caracteriza o contrato da Administração é a presença do Estado, da pessoa pública, no instrumento celebrado. Tem-se como contrato todo acordo de vontades, pactuado livremente pelas partes a fim de criar obrigações e direitos recíprocos. De uma forma geral, todo contrato é negócio jurídico bilateral e comutativo, ou seja, realizado entre pessoas que se obrigam a prestações mútuas e equivalentes em encargos e vantagens.
Sob a égide do direito público, entretanto, o contrato está sujeito a algumas restrições quando é executado pela Administração Pública. Uma destas peculiaridades do contrato pactuado pela administração pública, é a necessidade de um processo licitatório, a fim de se observar os princípios tanto da Administração Pública quanto do Direito Administrativo: legalidade; supremacia do interesse público; presunção da legitimidade; auto-executoriedade; princípio da especialidade; princípio da auto-tutela; impessoalidade; moralidade; publicidade; hierarquia; indisponibilidade do interesse público; princípio da razoabilidade; princípio da isonomia e princípio da eficiência.
Como leciona Hely Lopes Meirelles[14], o processo licitatório pode se apresentar nas seguintes modalidades: concorrência, tomada de preços, convite, concurso, leilão e pregão. Pode-se aferir portanto que licitação é gênero, do qual as modalidades são espécies, cada uma com suas características próprias, que se destinam a tipos de contratação específicos.
Destarte, como consectário de todo o exposto, conclui-se que as técnicas de gestão de pessoas, com foco na gestão por competências, terão de ser conciliadas com a implementação de concursos públicos, modalidade de licitação indissociável da contratação de pessoas no setor público.
A seu turno, sob o prisma da nova concepção de Gestão de Pessoas, há uma série de competências, tanto individuais quanto coletivas, que os colaboradores (anteriormente denominados tão-somente de “trabalhadores”) precisam desenvolver para melhor se adequar a este mercado de trabalho cada vez mais competitivo que caracteriza a famigerada “Era do Conhecimento”.
Dessa forma, pode-se inferir que a importância das competências (e da gestão por competência) consiste na busca constante pelo entendimento e mapeamento daquelas que uma organização ou um grupo necessita, de modo a requisitá?las (direcionando o processo seletivo/certame) e promovê?las dentro do quadro dos colaboradores dessa organização, sempre no intuito de promover seu alto desempenho.
Cabe consignar que o conceito de “competência”, por sua vez, pode ser entendido como sendo um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes que implicam esse alto desempenho, devendo a seleção das mesmas ser adequada à realidade de cada órgão.
Um aspecto importante a ser considerado para a boa implementação da gestão por competência no setor público consiste no cuidado para que não haja o que Torrez e Ramos (2000)[15] chamam de “desprofissionalização do trabalho”, decorrente de uma polivalência de funções.
Esse é um risco real que decorre principalmente de práticas que têm como pressuposto a falácia de que aquele que bem executa determinado ofício também seria um excelente gestor dessa mesma atividade, caso alçado a essa condição. Muito embora isso, na prática, quase nunca se confirme, há aqueles que motivados por interesses classistas defendem tal situação no intuito de ascender, sem concurso público (situação essa que, como amplamente demonstrado anteriormente, é ilegal e inconstitucional, pois ofende tanto ao art. 37, II, da CF/88 quanto ao art. 22, § 4°, da Lei 8.666/93), a cargos de gestores dos Órgãos aos quais pertençam. Tal situação pode ser exemplificada com a situação protagonizada pelos agentes, escrivães e papiloscopistas que entraram em greve em agosto/2012 trazendo à tona um antigo pleito da categoria, qual seja, tentar, por meio de uma reengenharia dos cargos, alcançar funções de gestores do Departamento de Polícia Federal[16].
Um documento encontrado no site do Sindicato dos Policiais Federais no Estado do Pará (SINPEF/PA), entidade vinculada à FENAPEF (Federação Nacional dos Policiais Federais), assim explica textualmente o referido pleito sindical:
“Diante desse quadro de descaso, resta a nosso ver aos servidores do Departamento de Polícia Federal, a certeza de que a proposta de reestruturação da Carreira Policial Federal passando a ser composta por um CARGO ÚNICO, denominado POLICIAL FEDERAL, já aprovada em vários congressos e encontros patrocinados pela Federação Nacional dos Policiais Federais, seja a inadiável a sua realização, passando esse cargo único POLICIAL FEDERAL a ser composto por apenas três classes, e denominações dos atuais cargos da Carreira servindo para nomear, doravante, as funções operacionais desse Cargo Único. Assim, pois, seria: CARREIRA POLICIAL FEDERAL, COMPOSTA PELO CARGO ÚNICO – POLICIAL FEDERAL; DIVIDIDO EM TRÊS CLASSES – SEGUNDA, PRIMEIRA E ESPECIAL; EXERCENDO SUAS ATIVIDADES ATRAVÉS DAS SEGUINTES FUNÇÕES OPERACIONAIS: DELEGADO, PERITO, ESCRIVÃO, AGENTE E PAPILOSCOPISTA”[17].
Outra situação que exemplifica a problemática da possível “desprofissionalização do trabalho” no setor público caso a gestão por competência venha a ser mal implementada é aquela decorrente da simples unificação de cargos, extinguindo-se uns (sempre por lei) com funções específicas e bem definidas (decorrentes de uma especialização, cujo objetivo não é outro senão o aprimoramento de cada servidor público naquilo em que labora) para criar outros cargos “polivalentes”, com imensuráveis atribuições genéricas e pouco definidas. Isso foi (e ainda é) objeto de acalorados debates, principalmente na área da Segurança Pública, como o existente em torno do Projeto de Lei 6.690/02, por meio do qual se pretendia unificar todas as Polícias e o Copo de Bombeiro, ou dentro da própria Polícia Federal, em que entidades vinculadas à categoria dos agentes, escrivães e papiloscopistas (profissional responsável por, dentre outras funções, coletar impressões digitais) defendiam a fusão de todos esses cargos em um único cargo.
Todavia, para se evitar isso, basta que os cargos sejam, quando da implementação do programa de gestão por competência, individualmente considerados e, como explicado por Gramigna[18], defina-se os perfis correspondentes a cada área de trabalho/cargo.
O modelo de gestão por competência que pode mais facilmente ser implementado (adaptado) no setor público, a seu turno, é aquele conhecido como MRG (idealizado por Maria Rita Gramigna[19]). O modelo em tela é calcado nas competências organizacionais e individuais dos colaboradores que, por sua vez, dão suporte para que os macro e micro objetivos organizacionais sejam alcançados.
Gramigna, 2007, para explicar sua metodologia, utiliza a metáfora da “árvore das competências”, considerando três elementos (as raízes, o tronco e a copa) que, associados, desenvolvem o todo das competências possíveis de um indivíduo e de uma organização.
Segundo a autora, cada pedaço da árvore necessita de um olhar distinto, já que uma planta considerada saudável cresce e floresce naturalmente, dando, por assim dizer, “frutos saudáveis”. Assim, a ampliação de competências humanas se mostra – bem como o crescimento das árvores – também um processo natural, de acordo com a autora.
Nesse contexto, a “raiz” estaria ligada à atitude das pessoas (ao “querer ser” e ao “agir”), o “tronco” estaria ligado ao conhecimento (associado à maneira como as pessoas lidam com as informações que possuem) e, por fim, a “copa da árvore” corresponderia às habilidades das pessoas.
Desse modo, para a implementação da gestão por competências segundo o método MRG, faz-se necessário percorrer cinco etapas, a saber: 1) a sensibilização da cúpula do Órgão para a necessidade; 2) definição dos Perfis correspondentes a cada área de trabalho/cargo; 3) avaliação do potencial e formação do Banco de Talentos; 4) capacitação dos colaboradores e 5) Gestão do Desempenho.
No que concerne à primeira etapa, faz-se mister ressaltar que para que haja, de fato, a sensibilização dentro das organizações, é importante que algumas medidas sejam adotadas no sentido de verificar se as diretrizes e missões setoriais estejam sintonizadas com a missão da instituição. Caso isso não ocorra, há a necessidade de se implementar um alinhamento entre os micro e os macro objetivos institucionais, seja por meio de seminários, seja por meio de reuniões, verificando-se sempre se todos os postos de trabalho têm suas atividades descritas de forma clara e objetiva, a fim de que cada um saiba exatamente sua função na estrutura organizacional da instituição à qual pertençam.
Quanto à definição dos perfis, a seu turno, como bem sintetizou Carolina Bithencourt Rubin ao explanar sobre a obra de Gramigna, constata-se que essa triagem dos perfis de competências pode ser implementada de diferentes formas, podendo, por exemplo, “acontecer por meio de reuniões orientadas para consultoria interna – com a presença de diretores e pessoas?chave e workshops ministrados por consultoria externa ou interna, onde serão focadas as partes conceitual e metodológica, bem como o comprometimento e a divisão de responsabilidades e papéis no processo” [20].
A terceira fase do processo de implementação da gestão por competência segundo o método sugerido por Gramigna consiste na formação de um banco de talentos que visa a permitir aos gestores da instituição fazer uma análise do seu potencial humano.
A autora em comento chama ainda a atenção para a existência de alguns “pecados” pertinentes à terceira etapa (avaliação do potencial e formação de Banco de Talentos), que exigem certos cuidados. Para a autora, esses “pecados” são a preguiça, a avareza, inveja, ira e luxúria. Por isso, faz?se necessário que a instituição conheça sua força de trabalho disponível, identificando seus pontos de excelência e as dificuldades de cada colaborador.
A fase de capacitação, a seu turno, é a penúltima etapa da implantação de um programa de gestão por competências. Seu objetivo é habilitar (ou como o próprio nome diz, “capacitar”) os colaboradores de uma determinada organização, por meio de treinamentos, de modo a desenvolver em cada qual as competências necessárias para que a instituição possa alcançar um desempenho de excelência.
Por fim, a última etapa da implantação de um programa de gestão por competências é a gestão de desempenho, pois após mapear e definir perfis, verificar as performances, montar o banco de identificação de talentos e os capacitar, chega o momento de avaliar os resultados. (GRAMIGNA, 2007).
De acordo com Gramigna (2007), recorrendo a um método de gestão por competências como o MRG, as organizações podem rever suas prioridades e necessidades mais urgentes, aumentando investimentos e ações para programas de capacitação nas áreas ou na otimização da competência de determinado colaborador.
Desse modo, observa-se a claramente que a implementação do método de gestão por competência MRG ao setor público se harmoniza perfeitamente com os princípios gerais da administração pública (art. 37, “caput”, da Constituição Federal de 1988) e respeita o imperativo constante no art. art. 37, II, de nossa Carta Magna (investidura em cargo ou emprego público por meio de “concurso público”) e no art. 22, § 4°, da Lei 8.666/93, qual seja: “Concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias”.