I – Do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI:
O Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, desde a Emenda Constitucional nº 18, de 1965, substituiu o antigo Imposto de Consumo da Constituição de 1946, está previsto no artigo 153, inciso I, da Constituição Federal de 1988, conservando a mesma estrutura e característica do IPI previsto na Constituição anterior.
É um imposto seletivo e não-cumulativo, compreendendo o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores.
A seletividade é cobrada em função da essencialidade do produto. Assim, ele deve ser graduado de acordo com a importância do produto.
É um dos tributos tidos como não sujeitos ao princípio da anualidade ou anterioridade, sendo que pode ser aumentado ou diminuído, e cobrado no mesmo exercício financeiro, conforme disposto no artigo 150, parágrafo 1º, da Constituição. Assim, suas alíquotas podem ser alteradas no mesmo exercício financeiro. A Constituição anterior, artigo 21, inciso V, permitia também alterar a base de cálculo do imposto, o que na Constituição atual é vedado.
Assim, o artigo 153, inciso I, da Constituição Federal de 1988, vem disciplinado basicamente conforme a Lei 4.502, de 30 de Abril de 1964, e Decreto 2.637, de 25 de Junho de 1998 – Regulamento do IPI – RIPI.
Segundo o professor Hugo de Brito Machado[1], o imposto recai sobre o produto, sendo em princípio, irrelevante sua destinação, assim como o processo econômico de que se originou.
II – Do Fato Gerador do Imposto:
O fato gerador deste imposto é a industrialização conforme artigo 46, parágrafo único, do CTN:
Para os efeitos deste imposto, considera-se industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para consumo[2].
Portanto, a materialidade do fato gerador é a industrialização e não o desembaraço, a arrematação e a saída como quer dizer o artigo 46 do CTN, sendo este último aspecto temporal e não a sua materialidade, sendo neste sentido a jurisprudência:
TRIBUTÁRIO. IPI. FATO GERADOR. 1. O IPI incide sobre produtos industrializados. Estes, pela lei, são os que sejam submetidos a qualquer tipo de operação que lhes modifique a natureza ou a finalidade, aperfeiçoando-os para o consumo. 3. O desembaraço aduaneiro de mercadoria importada é fato gerador de IPI, quando for o produto industrializado de procedência estrangeira[3].
Todavia, a tributação do IPI alcança os produtos industrializados no exterior, cuja industrialização não ocorre no território nacional, quando prescreve incidência no momento do desembaraço ou da arrematação, se abandonado ou apreendido e levado a leilão. No caso de desembaraço aduaneiro, incorporam-se à base de cálculo todas as taxas e despesas cobradas ou debitadas pelo contribuinte ao comprador ou destinatário.
III – Do Transporte Interestadual e Intermunicipal.
Embutido no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, assim constante da lista de serviços, encontra-se o transporte interestadual e intermunicipal. No que se refere ao imposto sobre este serviço trata-se daqueles que eram tributados pelo Imposto sobre Serviços de Transporte Rodoviário – ISTR, de competência Federal, previsto no artigo 21, inciso X, da Constituição anterior, hoje extinto.
IV – Inclusão do Frete na Base de Cálculo do IPI (Lei 7.798/89):
Tributário. Base de Cálculo do IPI. II - O Frete, que se constitui despesa de transporte, não integra a base de cálculo do IPI incidente sobre a mercadoria cujo fato gerador é a saída do produto do estabelecimento industrial, porque não se apresenta como componente da operação de que decorre o fato gerador do imposto, mormente quando a saída se dá com a cláusula CIF[4].
As indústrias, ao promoverem as saídas de seus produtos no mercado interno, as fazem de dois modos distintos: Condição Free on Board – FOB, quando o produto é retirado por transporte próprio ou de terceiro alugado, onde não há intervenção por parte da indústria e; condição Cost, Insurance and Freight – CIF, ou seja, o transporte é realizado pela própria indústria ou, empresa coligada. Na verdade, estes termos teriam que estar ligados a uma transação internacional. No caso CIF, a operação indica que está sendo cobrado o preço da mercadoria somado ao custo do seguro e frete internacional. Mas a terminologia é largamente usada no mercado interno.
O regulamento do IPI – RIPI, traz em seu artigo 118 § 1º, a obrigatoriedade do custo do transporte e outras despesas acessórias como o seguro para a cobrança do imposto, conforme instituído pela Lei Ordinária nº 7.798, de 10 de Julho de 1989. Ocorre, que o transporte não se encontra previsto na Tabela de incidência do imposto. Mesmo sendo, na condição CIF, cobrado por empresa coligada, não ocorre sua materialidade na fase de industrialização, e sim da circulação:
TRIBUTÁRIO. IPI. FRETE. O valor do frete não se insere na etapa da industrialização na qual incide o IPI, mas sim na etapa seguinte, ligada à circulação do produto[5].
O frete em operações internas, sendo irrelevante o tipo da operação, não compõe a base de cálculo do Imposto sobre Produtos Industrializados, sendo um equívoco tal imposição, nos termos da Lei Ordinária 7.798 de 10 de Julho de 1.989, que estabeleceu a cobrança, que grosso modo somente pode ser regulamentação de desembaraço aduaneiro (CTN artigo 46, I).
O Código Tributário Nacional – CTN – Lei nº 5.172, de 25 de Outubro de 1.966, é atualmente Lei Complementar, por força do disposto no artigo 7º do Ato Complementar nº 36, de 13 de Março de 1.967, assim, não pode uma lei hierarquicamente inferior, contrariar o disposto na Constituição Federal e, dispõe esta, que:
Art. 146 – Cabe a lei complementar:
II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes (Constituição Federal de 1.988);
A norma inferior deve se ater rigorosamente aos limites da norma superior, sendo que dispõe a Constituição Federal que somente por lei complementar estabelece-se normas gerais em matéria tributária. O frete é base de cálculo reservada constitucionalmente ao ICMS, não pode, portanto sofrer também a incidência do IPI, sob pena de invasão de competência praticada pela União nas atribuições dos Estados da Federação e do Distrito Federal, haja vista que o frete não se insere na etapa da industrialização e sim na etapa da circulação.
Com efeito, além da submissão do Estado ao império da lei, objetivando o interesse público ou protegendo os direitos e garantias individuais, o poder público restringe sua competência, impondo limitações.
Assim, dessa restrição à própria competência, são vedadas constitucionalmente:
a)Invasão de competência; e
b)Bitributação.
Portanto, a invasão de competência vem ocorrendo pela União, pessoa jurídica de direito público interno, sem competência para legislar e cobrar tributo de competência privativa dos Estados e do Distrito Federal. Sendo este o amplo entendimento da doutrina:
"Assim, ‘invasão de competência’, no presente caso, é uma pessoa jurídica de Direito Público Interno, não contemplada com a competência para legislar sobre dado tributo privativo de outro, passar a exigi-lo, ostensiva ou veladamente"[6].
Somente com o desembaraço aduaneiro de mercadoria importada, o frete compõe a base de cálculo do IPI, quando o produto for industrializado e de procedência estrangeira, conforme previsto no inciso I do artigo 46 do Código Tributário Nacional – CTN.
V – Conclusão:
Não há nos Tribunais Superiores, até o momento, questionamento sobre a constitucionalidade de o frete compor base de cálculo do IPI em operações internas. Até porque a situação concreta pode não ser imposição da Secretaria da Receita Federal, mas interpretação errônea por parte das empresas.
De outra forma, a invasão de competência em matéria tributária, proibida constitucionalmente, caracterizaria a total inconstitucionalidade, ocorrendo assim, a bitributação que ocorre quando, em decorrência de um único fato gerador, cobra-se duas vezes o tributo, ou o bis in idem, seja por imposição de uma única pessoa jurídica de direito público ou de duas:
"Bitributação (abreviado do prefixo latino bis, que equivale a dois ou duas vezes; e tributação, imposição, lançamento), como seu nome indica, exprime a exigência da mesma imposição fiscal por duas vezes".
"A expressão bis in idem significa tributo repetido (bis) sobre a mesma coisa (idem), isto é, a exigência de um imposto duas vezes".[7]
Com o advento do novo Sistema Tributário Nacional, o Imposto Sobre Transporte Rodoviário – ISTR, passou a integrar o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, de competência dos Estados e do Distrito Federal (art. 155, II, CF/88). Assim, quando se fala em limitações da competência tributária, deve-se entender a restrição de ação dentro do já restrito campo de competência.
A lei complementar coloca-se em superioridade se comparada à lei ordinária, pelo seu aspecto formal de exigência do quorum qualificado e quando esta lei aparece como sobrenorma ou estabelece normas gerais necessárias à edição da lei ordinária, sendo este o entendimento doutrinal:
Abaixo das leis constitucionais, localizou as complementares, seguidas imediatamente das ordinárias. A hierarquia ideal corresponde a esta gradação.
A principal conseqüência jurídica desta circunstância reside na superioridade da lei complementar sobre a ordinária. E esta gradação tem, em muitos casos, conseqüências também de caráter formal, como se verá.
Consiste a superioridade formal da lei complementar – como em geral das normas eminentes, em relação às que lhes são inferiores – na impossibilidade jurídica de a lei ordinária altera-la ou revoga-la. Nula é, pois, a parte desta que contravenha disposição daquela.
Inversamente, a lei complementar revoga e altera a ordinária, impondo em outros casos absoluto afeiçoamento desta àquela, pelo menos quanto ao espírito.[8]
Daí, o enorme equívoco que se encontra a lei 7.798/89, ao impor a ampliação da base de cálculo do Imposto sobre Produtos Industrializados, incorporando nela, as despesas com o frete, que não integram a operação.
TRIBUTÁRIO. IPI. FRETES. EMPRESAS INTERLIGADAS. LEI-7798/89. A exigência, criada pelo § 3, do art-4, da Lei-4502/64, conforme o art-15, da Lei-7798/89, de compor a base de cálculo do IPI com valores de fretes pertinentes a outras firmas, não se coaduna com o disposto no art-47, do CTN.[9]
NOTAS
1.Machado, Hugo de Brito – Curso de Direito Tributário – 2001 – Página 276 – Malheiros Editores Ltda.
2.Gallo, Antônio Felippe – Código Tributário Nacional – 1998 – Página 28 – Malheiros Editores Ltda.
3.Superior Tribunal de Justiça – STJ – Ministro José Delgado – Acórdão RESP 273205/RS; (2000/0083531-5).
4.Tribunal Regional Federal – 5ª Região – Pernambuco – 2ª Turma – Processo 91.05.05469-9 – Apelação Cível.
5.Tribunal Regional Federal – 4ª Região – Paraná – 1ª Turma – Processo 93.04.23859.5 – Remessa ex officio.
6.Oliveira, Fábio Leopoldo de – Curso Expositivo de Direito Tributário – São Paulo – Resenha Tributária – 1976.
7.Moraes, Bernardo Ribeiro de – Curso de Direito Tributário: Sistema Tributário da Constituição de 1969 – RT.
8.Ataliba, Geraldo – Lei Complementar Tributária – São Paulo – RT – 1991 – Página 19.
9.Tribunal Regional Federal – 4ª Região – Rio Grande do Sul – 1ª Turma – Processo 93.04.18334-0 - Unânime.
BIBLIOGRAFIA:
1 - Gallo, Antônio Felippe – Código Tributário Nacional e Legislação Complementar – 1998 – Malheiros Editores.
2 - Machado, Hugo de Brito – Curso de Direito Tributário – 19ª Edição – 2001 Malheiros Editores.
3 - Ichihara, Yoshiaki – Direito Tributário – 9ª Edição – Editora Atlas – 2000.
4 - Nunes, Vidal Serrano – Direito Tributário Comentado – 2ª Edição – 1995 – Editora Angelotti.
5 - Bonavides, Paulo – Curso de Direito Constitucional – 11ª Edição – 2000 Malheiros Editores.
6 - Falcão, Amílcar – Fato Gerador da Obrigação Tributária – 6ª Edição – 1995 - Editora Forense.