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Precatórios: a inconstitucionalidade da EC nº 62/2009, a esterilização do acesso à justiça e a ineficácia das execuções contra a Fazenda Pública

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Agenda 01/07/2013 às 09:10

Quando se retira a efetividade da decisão judicial, limitando-se o Poder Judiciário a fazer simples requisição para o pagamento, sem que possa por fim ao processo, satisfazendo o crédito, está-se diante de grave afronta ao principio da separação dos poderes.

Resumo: O objetivo do presente estudo é abordar a problemática do instituto do precatório como meio de pagamento das dívidas da Fazenda Pública decorrentes de sentenças transitadas em julgado em razão das alterações trazidas pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009. Nesta perspectiva, traz uma análise do regime de pagamento dos precatórios dentro da Constituição Federal de 1988, pontuando os principais aspectos inerentes à sua constitucionalização. Parte-se então para o estudo das Emendas Constitucionais que alteraram o regime de pagamento dos precatórios, até se chegar ao regime atual, instituído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009, que criou o chamado Regime Especial de Pagamento dos Precatórios, onde objetiva-se verificar a sua (in)constitucionalidade frente aos princípios constitucionais basilares do Estado Democrático de Direito. Por final, é avaliado o conteúdo da Emenda em relação à garantia constitucional do acesso à justiça.

Palavras-chave: Precatórios. Emenda Constitucional nº 62/2009. Inconstitucionalidade.


INTRODUÇÃO

O instituto do precatório sempre gerou polêmicas e intermináveis discussões acerca de sua aplicação. Ao longo do tempo, foi sendo necessário criarem-se regimes que adequassem, ao tempo em que instituídos, a forma de pagamento dos precatórios. Contudo, esses regimes não obtiveram a eficácia esperada, o que culminou no agravamento da situação da dívida pública.

Isto porque o poder constituinte acabou criando permissivos constitucionais para que a Fazenda Pública viesse a se tornar inadimplente por longo período de tempo.

Inicialmente, o art. 33 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) previa 8 (oito) anos para o pagamento, depois, a Emenda Constitucional nº 30, de 2000, ampliou esse prazo para 10 (dez) anos, e agora, a Emenda Constitucional nº 62, de 2009, ampliou-o para 15 (quinze) anos.

Em razão dessa celeuma, a Emenda Constitucional nº 62, de 2009, que instituiu a terceira moratória para o pagamento dos precatórios, veio a ser chamada por muitos de “Emenda do Calote”, e contra ela foram ajuizadas 4 (quatro) Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs), que tramitam no Supremo Tribunal Federal[1].

Estas Ações Diretas de Inconstitucionalidade ajuizadas contra a Emenda Constitucional nº 62, de 2009, têm como foco principal resguardar os princípios constitucionais basilares do Estado Democrático de Direito, que, conforme se verá no presente estudo, são meneados por ela.

Nesta perspectiva, procurar-se-á abordar o tema dos precatórios numa visão do atual Estado Democrático de Direito, através da analise das implicações que tal instituto tem no sistema jurídico e social atual.

Desta forma, será analisada sistemática do instituto do precatório como meio de pagamento da dívida pública, pontuando-se as Emendas à Constituição Federal de 1988 que trataram do instituto e suas disposições.

Por final, serão analisadas as disposições da Emenda Constitucional nº 62, de 2009, frente aos Princípios do Estado Democrático de Direito e frente à garantia constitucional do acesso à justiça.


1 EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA

Função precípua do Estado lato sensu é a de garantir a proteção jurisdicional aos direitos assegurados a todos que nele se encontrem. O atual sistema jurídico brasileiro criou uma série de mecanismos que visam garantir direitos e obrigações, dentre eles, o direito do credor de receber seu pagamento e a obrigação do devedor de pagar. Assim, entendemos por tutela jurisdicional a proteção que o Judiciário presta às partes no processo, em favor daquele a quem é reconhecido o direito quando findada a prestação da jurisdição.

Com maior precisão, conceitua o ilustre processualista Candido Rangel Dinamarco[2]:

Tutela jurisdicional é o amparo que, por obra dos juízes, o Estado ministra a quem tem razão num litígio deduzido num processo. Ela consiste na melhoria da situação de uma pessoa, pessoas ou grupos de pessoas, em relação ao bem pretendido ou à situação imaterial desejada ou indesejada. Receber tutela jurisdicional significa obter sensações felizes e favoráveis, propiciadas pelo Estado mediante o exercício da jurisdição.

Assim, toda pessoa que, detentora de um direito o tem reconhecido pelo Estado através da prestação jurisdicional, deve ter assegurada a satisfação da tutela jurisdicional conferida na sentença condenatória favorável.

Nascida então a tutela executiva para o vencedor da ação judicial, pelo reconhecimento do seu direito, e findada a fase de conhecimento do processo, inicia-se então fase processual executória, onde o objetivo é ver satisfeito o direito do credor.

Podemos definir a execução de que trata o Código de Processo Civil como uma intervenção do Estado, provocada pelo credor, para, quando atribuída uma obrigação a um responsável e este não a cumprir espontaneamente, utilizar-se de meios legais para garantir a satisfação do direito reconhecido.

1.1 Prerrogativas da Fazenda Pública em juízo

A Fazenda Pública possui tratamento diferenciado, pois age no interesse da coletividade, entretanto, estes privilégios é que tornam o processo mais demorado, burocrático e penoso. Neste sentido, afirma Maurício Santos Gusmão Júnior[3]:

A res publica a todos pertence e disso resulta a indisponibilidade dos seus interesses. A Fazenda, ao ser demandada em juízo, deverá perseguir o interesse público. Por isso, as normas processuais que a outorgam prazos dilatados e outras prerrogativas compatibilizam-se com os preceitos constitucionais. A Carta Magna, a começar pela exigência do precatório para pagamento de dívidas pecuniárias, deixou expresso a premência em tutelar o interesse público discutido no âmbito processual. O resultado da lide, a negligência daqueles que representam a Fazenda em juízo afetam a todos. É prejuízo de toda a sociedade. Não bastasse o respaldo do tratamento desigual na supremacia do interesse público sobre o particular, impende salientar que a Fazenda Pública responde a uma quantidade cada vez maior de ações, acrescentando-se a isso os entraves burocráticos que dificultam muito a atuação expedita, principalmente no que tange à prestação de informações por órgãos da estrutura administrativa, para subsidiar a defesa do Poder Público em juízo.

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Em contrapartida a esta afirmativa, Ezequias da Silva Leite[4] argumenta:

Vê-se, pois, que os malsinados privilégios fazendários estão na contramão da moderna máxima da efetividade processual, porquanto o processo não pode prejudicar o cidadão que tem razão, nem este pode sempre suportar unicamente os nefastos efeitos do tempo do processo.

O processo judicial contra a Fazenda Pública já é moroso por si só, na fase de conhecimento, tramitando por longo período de tempo até que seja sentenciado em definitivo, leia-se, transitado em julgado, para então, iniciar-se a fase de busca da satisfação do crédito do credor.

A situação da dívida pública quase impagável dos precatórios, em que se encontra a Fazenda Pública atualmente, justifica-se nas prerrogativas de que esta dispõe. E não se trata de novidade.

A impossibilidade de penhorar bens públicos foi trazida para o nosso ordenamento jurídico juntamente com a primeira aparição do que viria a se tornar o precatório atual, chamando-se àquela época de precatória, no art. 41, da Parte Quinta (Processo nas causas cíveis de ordem pública ou administrativa), do Decreto nº 3.084, de 05/11/1898[5], que aprovou a Consolidação das leis referentes à Justiça Federal, nos seguintes termos:

Art. 41. Sendo a Fazenda condemnada por sentença a algum pagamento, estão livres de penhora os bens nacionaes, os quaes não podem ser alienados sinão por acto legislativo.

A sentença será executada, depois de haver passado em julgado e de ter sido intimado o procurador da Fazenda, si este não lhe offerecer embargos, expedindo o juiz precatoria ao Thesouro para effectuar-se o pagamento.

Transitada em julgado a decisão, inicia-se a fase processual de execução. Mais uma vez então é de se deparar com as prerrogativas de que frui o Estado, tendo em vista que a legislação processual prevê classe de execução específica para este, qual seja, a “Execução contra a Fazenda Pública”, prevista nos artigos 730 e 731 do Código de Processo Civil Brasileiro.

Sobre o tema, cabe a lição de Humberto Theodoro Júnior[6]:

Os bens públicos, isto é, os bens pertencentes à União, Estado e Município, são legalmente impenhoráveis. Daí a impossibilidade de execução contra a Fazenda nos moldes comuns, ou seja, mediante penhora e expropriação.

Prevê o Código de Processo Civil, por isso, um procedimento especial para as execuções por quantia certa contra a Fazenda Pública, o qual não tem a natureza própria de execução forçada, visto que se faz sem penhora e arrematação, vale dizer, sem expropriação ou transferência forçada de bens.

Realiza-se por meio de simples requisição de pagamento, feita entre o Poder Judiciário e Poder Executivo, conforme dispõem os arts. 730 e 731 do Código de Processo Civil.

Veja-se, portanto, que a execução contra o Estado é tratada de forma diferenciada no ordenamento jurídico pátrio, dispondo o diploma processual que o pagamento da quantia devida pelo ente público far-se-á através da requisição do pagamento pelo juiz ao presidente do tribunal competente e observará a ordem cronológica de apresentação dos precatórios.

Destarte, o pagamento das dívidas da Fazenda Pública, após todo o trâmite processual, se dá através do sistema de precatórios.


2 PRECATÓRIOS

Trata-se de instrumento pelo qual o Poder Judiciário requisita, à Fazenda Pública, o pagamento da quantia pela qual esta foi condenada em processo judicial.

Nas palavras de De Plácido e Silva apud Romeu Giora Junior[7]:

Precatório. De ‘precatorius’, é especialmente empregado para indicar requisição, ou propriamente, a carta expedida pelos juízes da execução de sentenças, em que a Fazenda Pública for condenada a certo pagamento, ao Presidente do Tribunal, a fim de que, por seu intermédio, se autorizem e se expeçam as necessáias ordens de pagamento às respectivas repartições pagadoras.

De acordo com Lair da Silva Loureiro Filho:

É o ato pelo qual o juiz requisita ao Presidente do Tribunal competente a ordem de pagamento à Fazenda Pública, para efetuá-lo no processo executivo, ou ainda a técnica brasileira que permite a execução contra a Fazenda Pública por visar compelir o Estado-devedor a incluir no seu orçamento a verba necessária ao pagamento dos débitos decorrentes de decisão judicial, para efetuar o pagamento com obediência à ordem de apresentação das respectivas requisições[8].

Conforme se depreende dos conceitos acima expostos, não se trata de uma ordem para que a Fazenda Pública cumpra a decisão judicial condenatória, mas tão somente de uma simples requisição ao poder público, para que este inclua o débito em suas contas e o pague quando puder, ou quando lhe convier.

A sistemática funciona da seguinte maneira:

1.sendo procedente a sentença em ação judicial proposta contra a Fazenda Pública, o credor deve promover então a execução desta;

2.havendo o título executivo líquido e certo, o juiz fará uma requisição ao Presidente do Tribunal competente para que este ordene à Fazenda Pública o pagamento da quantia devida;

3.ordenado o pagamento, fica a Fazenda Pública compelida a pagar o débito ou então incluir no seu orçamento a verba necessária para efetuar o pagamento dos requisitórios judiciais;

4.feito isso, o pagamento se dará conforme a ordem cronológica de apresentação dos requisitórios, ou conforme as especialidades previstas nas normas que disciplinam este regime de pagamento, conforme será visto no decorrer do presente trabalho.

Àquele requisitório do juiz da ação condenatória da Fazenda Pública ao Presidente do Tribunal competente, para que este determine à Administração que efetue o pagamento, é que se chama “precatório”.

Tecnicamente, o precatório é o ofício requisitório do Presidente do Tribunal à Fazenda Pública para que esta inclua no seu orçamento as verbas destinadas ao pagamento de suas dívidas decorrentes de condenações judiciais.

Diante disso, como bem observado por Adilson Abreu Dallari[9]

é forçoso entender que existem duas apresentações de precatório: a primeira, ao Tribunal, para fixar a ordem cronológica dos pagamentos; a segunda, à fonte pagadora, para inclusão na proposta orçamentária.

Quanto a esta ordem seqüencial de atos necessária ao pagamento dos precatórios, observa o atual Ministro do Supremo Tribunal Federal, José Celso de Mello Filho (Constituição Federal Anotada, 1986) apud Dallari[10]:

O pagamento devido pela Fazenda Pública submete-se a uma ordem seqüencial de atos que condicionam a sua realização:

a)expedição de precatório ao presidente do Tribunal competente;

b)apresentação do precatório à entidade de direito público condenada;

c)observância estrita da ordem cronológica de apresentação do precatório.

Importante esclarecer que o precatório não incide sobre qualquer débito estatal, mas somente sobre o pagamento de créditos de terceiros decorrentes de sentença judicial.

É no texto constitucional que se encontra a disciplina especifica deste instituto, mais precisamente no artigo 100 da Constituição Federal de 1988 e nos artigos 33, 78, 86, 87 e 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

2.1Evolução histórica

O instituto do precatório na Constituição Federal de 1988 veio disposto no art. 100. Contudo, a Constituição Federal de 1988 (CF/88) trouxe consigo o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que, por sua vez, trouxe em seu art. 33 a primeira moratória para o pagamento das dívidas públicas, concedendo o prazo de 8 (oito) anos para a quitação, através de oito prestações anuais iguais e sucessivas,  dos precatórios vencidos até a data da promulgação da própria CF/88, com exceção daqueles de natureza alimentar.

Não obstante, ainda que haja inconstitucionalidade no art. 33 do ADCT, não há como reconhecê-la através do controle de constitucionalidade, uma vez que é parte integrante do Texto Constitucional originário.

Como bem observa José Afonso da Silva[11], “disposições transitórias só têm cabimento na transição de um regime constitucional para outro”. Esta é a finalidade do ADCT, que se trata de regramento de transição constitucional, e não de regime jurídico permanente.

Diante do que entendeu o Supremo Tribunal Federal, no RE 160486, de relatoria do Min. Celso de Mello, julgado em 11/10/1994[12], ainda que se possa vislumbrar certa incoerência do art. 33 do ADCT com o que dispõe o Texto Constitucional, não há como se declarar sua inconstitucionalidade.

Sendo assim, a primeira moratória instituída pelo Texto Constitucional não pôde sequer ser objeto de discussão, restando aos credores apenas esperar que o Estado cumprisse ao menos o prazo de 8 (oito) anos para o pagamento, o que não ocorreu.


3 REGIMES DE PRECATÓRIOS NAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS

O regime de pagamento dos precatórios vem sendo disciplinado, desde a Constituição Federal de 1988, por Emendas Constitucionais.

A Emenda Constitucional nº 20, de 1998, inseriu no art. 100 da CF/88 o § 3º, que estabeleceu a ressalva da aplicação do regime de expedição de precatórios às obrigações definidas em lei como sendo de “pequeno valor”. Contudo, há época, não havia ainda lei definindo quais seriam as obrigações consideradas de pequeno valor. A primeira definição neste sentido surgiu com a vigência da Lei nº 10.259/2001 (Lei dos Juizados Especiais da Justiça Federal), que estabeleceu que créditos de pequeno valor para a União, seriam aqueles iguais ou inferiores a 60 salários mínimos.

Posteriormente, a Emenda Constitucional nº 37, de 2002, definiu que seria dispensada a expedição de precatório para os débitos municipais que atingissem no máximo 30 salários mínimos e estaduais que atingissem no máximo 40 salários mínimos.

Diante da ineficácia da previsão constitucional para o pagamento dos precatórios no prazo máximo de 8 (oito) anos, no ano de 2000, foi editada a Emenda Constitucional nº 30 (EC nº 30/2000), que alterou a redação do art. 100 da CF/88 e acrescentou o art. 78 ao ADCT.

Ocorre que o art. 78, do ADCT, inserido pela EC 30/2000, instituiu a segunda moratória constitucional para o pagamento dos débitos da Fazenda Pública, esta de 10 (dez) anos. O parcelamento previsto no referido dispositivo, em verdade, criou uma nova moratória, quando ampliou para 10 (dez) anos o tempo para que fossem quitados os precatórios pendentes.

Foram excepcionados deste parcelamento os créditos de pequeno valor, os alimentares (isto porque, entende-se, deveriam ser pagos à vista); os do art. 33 do ADCT, que já deveriam ter sido pagos, haja vista o prazo de 8 (oito) anos já ter se esgotado; os que tinham seus respectivos recursos liberados ou depositados em juízo; e os precatórios pendentes na data de promulgação da Emenda à Constituição.

A EC 30/2000 manteve a preferência dos precatórios de natureza alimentícia, sendo admirável a intenção do legislador quando da sua edição, por esse motivo. Contudo, o poder reformador acabou por subverter a ordem de preferência no pagamento, uma vez que, ao criar as possibilidades dos §§ 2º e 4º do art. 78, do ADCT, fez com que o Poder Público optasse por pagar os demais créditos em preterição aos alimentícios, uma vez que para o adimplemento destes nenhuma espécie de “sanção” haveria. Assim, os créditos ditos preferenciais foram deixados de lado, tornando-se inadequado o regramento trazido pela Emenda em comento.

Por este motivo e por entender inconstitucional a Emenda Constitucional nº 30, de 2000, por afronta ao direito fundamental previsto no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal de 1988, que a Ordem dos Advogados do Brasil interpôs uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) em face desta emenda, que ainda tramita no Supremo Tribunal Federal, na qual foi proferida, em sede de medida cautelar, decisão favorável à sua inconstitucionalidade, suspendendo a eficácia do art. 2º da EC 30/2000.

Portanto, ainda pendente de julgamento a ADI nº 2.356, resta suspenso o art. 78 da Emenda Constitucional nº 30 de 2000.

Por sua vez, a Emenda Constitucional nº 37, de 2002, trouxe ao ordenamento jurídico mais uma inovação com relação aos precatórios, qual seja, a vedação da expedição de precatório complementar ou suplementar e do fracionamento do valor da execução. Assim, tornou inviável a quebra do valor para que fosse pago parte através de requisição de pequeno valor (RPV) e parte através de precatórios.

Por requisição complementar, entende-se aquela utilizada para requisitar a diferença de juros, atualização monetária e os critérios contidos na sentença. De outra parte, requisição suplementar é a expedida para o pagamento do valor embargado ou impugnado, após o trânsito em julgado.

Esta Emenda à Constituição acrescentou ainda ao ADCT os artigos 86 e 87, sendo que o primeiro determinou que os débitos cujos precatórias já haviam sido emitidos e estavam pendentes, bem como os de pequeno valor fossem pagos nos termos do caput do art. 100 da CF/88, conforme ordem cronológica de apresentação, excluindo destes a possibilidade de parcelamento, e ainda, dando-lhes a prevalência sobre os de maior valor.

3.1 A Emenda Constitucional nº 62, de 2009

Passados mais de 20 anos desde a promulgação da Constituição da República, em 1988, o problema referente ao pagamento dos precatórios permaneceu, e, ao contrário do que se esperava, a Dívida Pública só veio a aumentar no decorrer do tempo. As Emendas Constitucionais erigidas na tentativa de solução do problema do inadimplemento dos precatórios não desempenharam o resultado esperado, pelo contrário, somente trouxeram um emaranhado de dúvidas e discussões acerca do tema, mas nenhuma eficácia concreta no pagamento.

Então, em mais uma tentativa de resolver-se a problemática do pagamento dos precatórios, foi editada a Emenda Constitucional nº 62 de 2009, alterando o art. 100 da Constituição Federal e acrescentando o art. 97 ao ADCT, instituindo regime especial de pagamento de precatórios pelos Estados, Distrito Federal e Municípios.

As mudanças trazidas pela Emenda em comento foram tachadas, por muitos, como inconstitucionais, uma vez que ficou instituída a terceira moratória para o pagamento dos precatórios, mais uma mora institucionalizada, motivo pelo qual veio a ser chamada desde sua origem de “Emenda do Calote”.

Sobre o autor
Christian Luís de Oliveira Girardi

Advogado em Porto Alegre (RS). Especializando em Direito Tributário Aplicado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Graduado em Direito (Ciências Jurídicas e Sociais) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS. Pesquisador da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul - FAPERGS, atualmente participando do projeto "Direito Tributário e Análise Econômica do Direito".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GIRARDI, Christian Luís Oliveira. Precatórios: a inconstitucionalidade da EC nº 62/2009, a esterilização do acesso à justiça e a ineficácia das execuções contra a Fazenda Pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3652, 1 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24822. Acesso em: 18 nov. 2024.

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