Valor Econômico dias 11 a 14.10.2001 - p. B2
Recente decisão do STJ, em voto da lavra do eminente Ministro José Delgado, entendeu serem os provedores de acesso à Internet sujeitos, em suas atividades, ao ICMS, por prestarem serviços de comunicação.
Nada obstante o profundo respeito e admiração que tenho pelo Ministro José Delgado, convergindo em posições com a esmagadora maioria de suas teses jurídicas, não me parece que, sua inteligência sobre esta matéria, tenha refletido todos os aspectos que a questão enseja, talvez influenciado por Marco Aurélio Greco, a quem cita, por diversas vezes ao longo do voto condutor, o qual reflete, em seus estudos sobre a matéria, apenas a posição favorável ao Fisco. Tenho a esperança de que S.Exa., o Min. José Delgado, em posicionamento ainda não definitivo, possa reexaminar seu entendimento, à luz do que me parece fundamental na questão.
De início, se o constituinte destinou o campo das comunicações para incidência do ICMS (art. 155 inciso II), não é menos verdade que, em relação às telecomunicações, outorgou competência exclusiva à União para definir o que sejam serviços de tal natureza (art. 21, inciso XI da C.F.). Desta forma, tendo determinado que à União cabe declarar quais são os serviços de telecomunicações, somente sobre os serviços assim definidos em lei federal podem os Estados fazer incidir o ICMS.
A "contrário sensu", o que não for serviço de telecomunicações, mas servir apenas como suporte a tais atividades, não cabe aos Estados tributarem, por falta de competência impositiva sobre esses serviços que não são assim considerados por quem de direito. Por outro lado, se o serviço estiver vinculado às "telecomunicações", mas não for serviço de "telecomunicação", não pode tampouco ser considerado serviço de "comunicação", apenas em decorrência daquela vinculação. O que estiver relacionado com a telecomunicação ou é serviço de telecomunicação ou não é serviço de comunicação, à falta de "pertinência temática", se pudesse, no caso, fazer uso da expressão consagrada pela Suprema Corte.
Houve por bem, a União, com exclusiva, privativa e única competência, tanto para explorar a atividade quanto para legislar sobre a matéria, reconhecer e estabelecer que o "provedor de acesso" não exerce atividade de telecomunicação, prestando apenas um serviço paralelo, adicional ao de telecomunições, razão pela qual, apesar de ser utilizado apenas como auxiliar às "telecomunicações", não é serviço de "telecomunicação" (art. 61 § 1º da Lei 9472/97). E agiu bem, na medida em que os provedores são, eles próprios, usuários das linhas telefônicas --estas sim suporte material da prestação de serviços de telecomunicações— consistindo sua atividade em meros serviços de seleção e acesso, típicos de intermediação.
Ora, se a lei federal declara que os provedores de acesso não prestam serviços de "telecomunicações", como pretender que prestem serviços de "comunicação em geral", apenas pelo fato de estarem vinculados à atividade de "telecomunicação"? Admitir que os provedores exerçam atividades de "telecomunicações", apesar da lei federal dizer que não, é permitir que o legislador estadual invada área de exclusiva competência do legislador federal, em incursão de manifesta inconstitucionalidade.
Tal matéria foi discutida por todos os autores do livro "Tributação na Internet", da Editora Revista dos Tribunais, e foi objeto, no último 20/10, de exame no XXVI Simpósio Nacional de Direito Tributário do Centro de Extensão Universitária, com abertura proferida pelo Ministro José Carlos Moreira Alves do Supremo Tribunal Federal.
É de se notar que a esmagadora maioria dos autores entendeu que os provedores de acesso exercem atividade não sujeita ao ICMS, mas ao ISS, dependendo, para que seja tributada, de lei complementar que a coloque em lista de serviços. E há, no momento, no Congresso Nacional, projeto de lei complementar para incluir o serviço dos provedores de acesso na lista de serviços sujeito ao ISS, nos termos determinados pela Constituição Federal (art. 156, inciso III).