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Domicílio Tributário Eletrônico (DTE) e mudança da contagem dos prazos no processo administrativo tributário

A criação do DTE – Domicílio Tributário Eletrônico é um tema de vital para os contribuintes, mas que muitos ainda não perceberam a sua importância, pois a não observância dos novos prazos poderá implicar na perda de direitos de defesas, impugnações e recursos dos contribuintes.

Com o avanço tecnológico e o aperfeiçoamento dos sistemas de informática, o uso do papel vem se tornando cada vez mais obsoleto. No âmbito do direito, nos últimos anos o processo eletrônico passou a ser uma realidade na prática jurídica brasileira.

A criação do DTE – Domicílio Tributário Eletrônico é um tema de vital para os contribuintes, mas que muitos ainda não perceberam a sua importância, pois a não observância dos novos prazos poderá implicar na perda de direitos de defesas, impugnações e recursos dos contribuintes. Daí o nosso alerta para a necessidade do conhecimento e a correta observância das respectivas normas.

Para tanto, foi necessária a alteração da legislação processual vigente. A Lei nº 11.196/2005, por exemplo, alterou o Decreto nº 70.235/72, que rege o processo administrativo tributário federal, possibilitando a realização de atos processuais por meio eletrônico. No âmbito da legislação processual civil, a partir da edição da Lei nº 11.418/2006 também houve uma verdadeira revolução na legislação.

No âmbito tributário, a Receita Federal do Brasil, com objetivo de dar maior celeridade às comunicações entre o fisco e o contribuinte, por meio da Portaria SRF nº 259/2006, criou o Domicílio Tributário Eletrônico, ambiente virtual responsável por promover o envio de informações ao contribuinte, inclusive intimações para prática de atos processuais.

No entanto, nos termos do parágrafo 5º do art. 23 do Decreto nº 70.235/77 e parágrafos 1º e 2º do art. 4º da Portaria SRF nº 259/2006, a utilização do domicílio tributário eletrônico depende de expressa concordância do contribuinte. Por isso, mesmo com a criação do DTE, ainda subsiste o domicílio tributário convencional, motivo pelo qual as demais formas de intimação ainda continuam válidas.

Na legislação processual civil, a intimação consiste em um ato formal “pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo, para que se faça ou deixe de fazer alguma coisa”[1]. Ou seja, no processo, não basta que uma pessoa tome ciência de um ato processual, mas que essa ciência seja formalizada por um ato previsto na legislação processual.

No processo administrativo tributário, apesar de o Decreto nº 70.235/72 não conter um conceito legal definidor de intimação, parece-me que a acepção prescrita no diploma processual seja a mesma daquela prevista no código de processo civil. Ressaltando que qualquer ato processual somente será válido se o sujeito a quem ele é dirigido tiver tomado ciência do mesmo em prestígio ao contraditório e à ampla defesa.

Aliás, esse entendimento também pode ser extraído a partir da leitura do art. 26 da Lei nº 9.784/99, que trata do processo administrativo no âmbito da administração pública federal e aplicável subsidiariamente ao processo administrativo tributário em geral, inclusive para Estados e Municípios:

Art. 26. O órgão competente perante o qual tramita o processo administrativo determinará a intimação do interessado para ciência de decisão ou a efetivação de diligências.

Logo, quando a legislação processual tributária prescreve o vocábulo “ciência” como termo inicial para prática de um ato processual, obviamente, não se esta falando de um mero conhecimento de um ato processual, mas um conhecimento efetivado por uma intimação, consoanteos termos e as formalidades previstas na legislação processual[2].

Até a edição das normas que tratam da intimação eletrônica, tal conceito não comportava maiores discussões, pois as intimações eram efetuadas pessoalmente, mediante entrega de carta ou por meio de publicações. Assim a lei exigia a prova, pelo Fisco, de que o contribuinte havia sido intimado.

Porém, com o ingresso da intimação eletrônica no nosso ordenamento, fez-se necessário estabelecer um prazo para o termo inicial do aperfeiçoamento do ato processual das intimações, isto é, a lei estabeleceu um marco temporal específico para que o termo de intimação eletrônico produzisse eficácia jurídica.

No direito processual civil, a Lei nº 11.419/2006 não postergou a produção da eficácia do termo de intimação, pois considera feita a intimação a partir da realização da consulta eletrônica do teor da intimação:

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Art. 5º As intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do art. 2º desta Lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico.

§ 1º Considerar-se-á realizada a intimação no dia em que o intimando efetivar a consulta eletrônica ao teor da intimação, certificando- se nos autos a sua realização.

§ 2º Na hipótese do § 1º deste artigo, nos casos em que a consulta se dê em dia não útil, a intimação será considerada como realizada no primeiro dia útil seguinte.

§ 3º A consulta referida nos §§ 1º e 2º deste artigo deverá ser feita em até 10 (dez) dias corridos contados da data do envio da intimação, sob pena de considerar-se a intimação automaticamente realizada na data do término desse prazo. 

Contudo, conforme disposto no parágrafo 3º do art. 5º, na ausência de consulta da intimação, a referida norma criou uma modalidade de intimação ficta que ocorre após 10 (dez) dias do envio da intimação eletrônica.

Na seara do processo administrativo federal também foi criada, para os contribuintes que façam a opção pelo DTE, a intimação ou ciência presumida/ficta que ocorrerá na data prevista na lei independentemente de haver ou não a efetiva ou real ciência. A modernidade agindo em nome da agilidade e eficiência em detrimento da amplitude do contraditório e da ampla defesa. Contudo, o contribuinte que faz a opção pelo DTE deve estar alerta e conhecer as regras do sistema. É que a criação do DTE e a intimação presumida visam evitar burla ao sistema e algum contribuinte utilizar o expediente não consultar regularmente o seu DTE para fugir de intimações.

No processo administrativo tributário, o art. 23 do Decreto nº 70.235/72 dispôs de maneira diversa da norma civil: uma forma com as alterações da Lei nº 11.196/05, e outra forma a partir das alterações da Lei nº 12.844/13. Tal distinção é relevante exatamente porque terá repercussão sobre eventuais perdas de prazos de defesa e intempestividades.

Então, inicialmente deve-se analisar a situação dos contribuintes intimados, e eventualmente até com recurso caracterizado como intempestivo, sob a égide da Lei nº 11.196/05, com vigência a partir de 22.11.2005, até a edição da Lei nº 12.844/13 com vigência a partir de 19.07.2013.

Pois bem, para esse primeiro período, era assim a redação do Decreto nº 70.23572, com as alterações da Lei nº 11.196/05, sobre o inicio da eficácia do termo de intimação no processo administrativo:

Art. 23. Far-se-á a intimação:

(...)

III - por meio eletrônico, com prova de recebimento, mediante: (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005)

a) envio ao domicílio tributário do sujeito passivo; ou (Incluída pela Lei nº 11.196, de 2005)

b) registro em meio magnético ou equivalente utilizado pelo sujeito passivo. (Incluída pela Lei nº 11.196, de 2005)

§ 2° Considera-se feita a intimação:

(...)

III - se por meio eletrônico, 15 (quinze) dias contados da data registrada: (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005)

a) no comprovante de entrega no domicílio tributário do sujeito passivo; ou (Incluída pela Lei nº 11.196, de 2005)

Como pode ser observado, a norma em apreço criava um regime uniforme para o início da produção da eficácia do termo de intimação eletrônico, independentemente do ato de conhecimento (ciência) realizado pela parte intimada.

Na situação em que o contribuinte tomasse conhecimento (ciência) do termo de intimação no mesmo dia em que a intimação era enviada para o domicílio tributário eletrônico, o ato de jurídico de intimação será realizado, porém, sua eficácia jurídica somente se iniciará após os 15 (quinze) dias previstos na legislação.

Por outro lado, o mesmo dispositivo também justificava a chamada intimação ficta eletrônica (ficção legal) que possibilitava o reconhecimento da validade do termo de intimação, mesmo que faticamente o contribuinte não tivesse tomado conhecimento do ato processual que deveria ser intimado.

Tal regramento causava dúvidas aos operadores do direito, pois há uma tendência em equiparar os efeitos da intimação eletrônica na legislação processual civil ao processo administrativo tributário. Ou seja, para alguns operadores do direito, a abertura da intimação eletrônica no DTE possuía o condão de antecipar a fluência da eficácia jurídica da intimação e, consequentemente, o início da fluência do prazo para praticar um ato processual.

Outro argumento que vinha sendo utilizado para justificar a aplicação do entendimento exposto acima, seria que a aplicação literal da norma contida no art. 23 do Decreto nº 70.235/72, implicava na ampliação dos prazos processuais para os contribuintes optantes do DTE (os prazos de 30 dias poderiam chegar até a 45 dias) em detrimento daqueles que não havia optado (estes ficavam apenas com o prazo de 30 dias para recorrer), gerando uma quebra de isonomia com os demais contribuintes.

Não obstante os argumentos em contrário explanados acimaentende-se que a interpretação literal é a mais adequada para o tema em apreço, haja vista que a eficácia do termo da intimação (seja eletrônica ou não) é um conceito jurídico-positivo, possibilitando ao legislador estabelecer uma eficácia específica para cada subsistema do direito.

No caso do art. 23 do Decreto nº 70.235/72, o legislador claramente optou por postergar a eficácia jurídica da intimação eletrônica para o décimo quinto dia do registro da intimação no Domicílio Tributário Eletrônico, mas, ressaltando-se, esse entendimento só teve validade entre 22.11.2005 e 19.07.2013.

Com relação ao argumento da quebra de isonomia, entende-se que o tratamento diferenciado é justificado, pois todos os contribuintes podem utilizar o DTE. Sendo o tratamento diferenciado apenas um estímulo para que todos os contribuintes utilizem o DTE como domicílio tributário, melhorando a eficiência da comunicação no âmbito da Administração Tributária Federal tornando a relação Fisco e Contribuinte mais ágil e transparente.

Aliás, há posicionamento ainda mais benéfico para o contribuinte, segundo o qual o termo inicial da intimação somente se daria após 15 (quinze) dias da abertura do documento do domicílio tributário eletrônico e não da mera disponibilização na caixa postal no DTE do contribuinte. Nesse sentido, destaca-se trecho de recente decisão liminar proferida pela 14ª vara da Seção Judiciária do Distrito Federal no mandado de segurança nº 57771-96.2013.4.01.3400:

O Decreto 70.235, de 1972, dispõe que a intimação por meio eletrônica será feita com prova do recebimento, mediante envio ao domicílio tributário do sujeito passivo, devendo ser realizada com prazo de 15 dias a partir da data do comprovante de entrega (art. 23, inciso III, “a” e § 2º, inciso III, “a”). Já nos termos da Portaria 259, de 2006, considera-se domicílio tributário a caixa postal disponibilizada no Centro Virtual de Atendimento ao Contribuinte (e-CAC), desde que haja autorização do sujeito passivo (art.4º, inciso I, e § 1º e §2º - fls. 80-1).

2.- No caso, a própria Autoridade afirma que o Impetrante tomou conhecimento do ato vergastado em 29 de novembro de 2012 (“Intimação de Resultado de Julgamento”), as 16h41, mediante a abertura dos arquivos correspondentes no link relativo ao processo digital, tudo por meio do Centro Virtual de Atendimento ao Contribuinte (Portal e-CAC) (fls. 83).

3.- Assim, não há a menor dúvida de que foi em 29 de novembro de 2012 que a Impetrante foi devidamente intimada, momento esse que deve ser considerado como de termo inicial para recurso.

4.- Portanto, não procede a conclusão da Autoridade Impetrada no sentido de que: “Disponibilizada a intimação do resultado de julgamento em 15/10/2012, a ciência se verificou, por decurso do prazo legal, em 30/10/2012, de modo que o recurso voluntário deveria ter sido apresentado até 29/11/2012” (fls. 83).

5 - Nesse contexto, tem-se que o prazo inicial da intimação de 15 (quinze) dias teve como termo a quo o dia 29 de novembro de 2012 e, como termo ad quem, o dia 13 de dezembro de 2012, fluindo a partir daí início do prazo de 30 (trinta) dias para recurso, o qual encerrou-se, efetivamente, em 11 de janeiro de 2013. Assim, o recurso apresentado em 26/12/2012 é tempestivo (fls. 49).

A despeito dessa decisão, ainda sob recurso, o certo e seguro é que, para as intimações eletrônicas, efetuadas pelo fisco federal entre 22.11.2005 e 19.07.2013, deve-se considerar a realização da intimação apenas após 15 (quinze) dias do envio da intimação para o DTE do contribuinte, independentemente de ter havido ou não a abertura do documento em momento anterior.

E tanto tal interpretação estava vigente a partir de 22.11.2005 que a norma federal foi alterada, reduzindo a contagem alargada de prazo, que favorecia o contribuinte, pois o início do prazo recursal que começava, sempre, 15 dias após a disponibilização da decisão no sistema, passou a ter início, a partir de 19.07.2013, logo que o contribuinte acesse a decisão no sistema.

Com efeito, para esse segundo período, a partir de 19.07.2013 o regramento da matéria mudou com as alterações da Lei nº 12.844/13, ficando assim a norma de regência no que tange ao início do prazo para recorrer nos casos de intimação eletrônica:

Art. 23. Far-se-á a intimação:

(...)

§ 2° Considera-se feita a intimação:

(...)

III - se por meio eletrônico: (Redação dada pela Lei nº 12.844, de 2013)

a) 15 (quinze) dias contados da data registrada no comprovante de entrega no domicílio tributário do sujeito passivo;  (Redação dada pela Lei nº 12.844, de 2013)

b) na data em que o sujeito passivo efetuar consulta no endereço eletrônico a ele atribuído pela administração tributária, se ocorrida antes do prazo previsto na alínea a; ou (Redação dada pela Lei nº 12.844, de 2013)

c) na data registrada no meio magnético ou equivalente utilizado pelo sujeito passivo;  (Incluída pela Lei nº 12.844, de 2013)

Quer dizer: a partir de 19.07.2013, com as alterações da Lei nº 12.844/13, se o contribuinte não acessar o sistema eletrônico, o prazo recursal continuará começando a fluir só após 15 dias da disponibilização. Todavia, se o contribuinte acessar o sistema antes, a fluência do prazo já começará a partir daí.

Enfim, pela praticidade, o DTE tende a ir, paulatinamente, sendo mais utilizado pelos contribuintes. Porém, pela responsabilidade quanto à contagem de prazo, deve-se ter a preocupação com o início da fluência dos prazos recursais, sendo então relevante, a partir de 19.07.2013, o simples acesso ao sistema.

Repete-se aqui a necessidade de que os usuários de DTE estejam alertas para as novas regras, pois qualquer contagem equivocada poderá implicar em perdas de prazos e do direito de defesa e recursos administrativos.


Notas

[1] Art. 234 do Código de Processo Civil.

[2] Nesse sentido: Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão nº 1803-01.274. Julgado em 11/04/2012. Ementa: INTIMAÇÃO ELETRÔNICA. A intimação eletrônica somente é reputada como válida para ensejar repercussões no âmbito do processo administrativo fiscal se atendidas todas as condições que regem esta modalidade de ciência ao sujeito passivo ou administrado.

Sobre os autores
Mary Elbe Queiroz

Advogada sócia de Queiroz Advogados. Consultora da FocoFiscal. Pós-Doutora (Tese: Planejamento Tributário – procedimentos lícitos, o abuso, a fraude e a simulação) e Doutora em Direito Tributário. Mestre em Direito Público. Ex-Auditora da Receita Federal do Brasil. Presidente do IPET e do CEAT. Professora de cursos de pós-graduação. Palestras e livros publicados no Brasil e exterior.

Antonio Carlos F. de Souza Júnior

Advogado sócio de Queiroz Advogados Associados. Consultor da FocoFiscal.Mestre em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Especialista em Direito Tributário pelo IBET-SP. Professor do curso de Especialização em Direito Tributário do IBET/IPET.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

QUEIROZ, Mary Elbe; SOUZA JÚNIOR, Antonio Carlos F.. Domicílio Tributário Eletrônico (DTE) e mudança da contagem dos prazos no processo administrativo tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3789, 15 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25846. Acesso em: 22 nov. 2024.

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