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Fundamentos da metodologia científica na área jurídica

Agenda 20/12/2013 às 09:37

Em essência, a área jurídica é interdisciplinar, pois tem como modelo a própria sociedade e suas múltiplas ramificações; no mesmo diapasão segue a pesquisa científica nessa área de conhecimento. Apesar de encontrar-se fortemente enraizada a pesquisa qualitativa, nada impede a realização de pesquisas quantitativas.

Resumo: O objetivo deste trabalho foi oferecer bases para a pesquisa científica na área jurídica. A pesquisa científica na área jurídica apresenta particularidades. A abordagem qualitativa é a mais empregada na área jurídica, mas não é a única. O raciocínio indutivo ou o dedutivo são instrumentos de pesquisa científica. A abordagem adotada foi qualitativa e exploratória.

Palavras-chave: pesquisa, lei, ciência.


INTRODUÇÃO

A metodologia científica é matéria obrigatória na maioria das instituições de ensino superior. Porém, existem lacunas a serem preenchidas no entendimento dos fundamentos da metodologia científica em algumas áreas, mesmo quando se trata da interdisciplinaridade. É muito comum, por exemplo, um profissional da área de exatas não conseguir avaliar adequadamente um trabalho científico produzido em ciências sociais aplicadas. Pode acontecer que trabalhos produzidos em determinada área sejam rejeitados por revistas ou eventos científicos, pela simples razão de não terem sido avaliados por profissionais com visão interdisciplinar.

A importância da metodologia científica reveste-se de vários aspectos, que podem ser divididos em duas vertentes principais: durante a graduação e após a graduação. Durante a graduação a metodologia científica proporciona ao aluno desenvolver o pensamento científico, empregar a linguagem científica, interpretar projetos científicos, produzir projetos científicos, bem como, comunica-los de forma correta. Já quando profissional, o conhecimento da metodologia científica permite manter-se atualizado através da correta interpretação de textos científicos e técnicos. Assim a metodologia científica aperfeiçoa o aluno e o profissional, inclusive quando da realização de concursos ou elaboração de textos profissionais.

A aplicação da metodologia científica na área jurídica talvez seja um dos pontos mais polêmicos no universo da pesquisa científica. Nesse sentido, existem dificuldades em transpor conhecimentos da área jurídica para outras áreas, e vice-versa. Um exemplo disso é o valor da interpretação de uma lei: para um operador do direito pode equivaler a um trabalho de campo, mas para um profissional da área biológica pode ser entendido como uma revisão bibliográfica. Existem, portanto, questões de valores fundamentais na realização e interpretação da pesquisa científica interdisciplinar.

O objetivo deste trabalho foi o de colaborar com o entendimento da metodologia científica fornecendo alguns fundamentos na área jurídica.


DESENVOLVIMENTO

A pesquisa científica interdisciplinar tem sido considerada um avanço científico fornecendo respostas que a pesquisa unidisciplinar não tem saciado. Pouco compreendida e confusamente aplicada, a interdisciplinaridade tem sido confundida com multidisciplinariedade ou transdisciplinaridade. A interdisciplinaridade implica na transferência de conhecimento de uma disciplina (área) para uma outra. Assim, distingue-se da multidisciplinariedade que implica na reunião de áreas de conhecimento. Segundo Fazenda (2012), “quem habita o território da interdisciplinaridade não pode prescindir dos estudos transdisciplinares. O cuidado construído arduamente nos dois territórios precisa ser devidamente respeitado em suas limitações, mas principalmente nas inúmeras possibilidades que se abrem para uma educação diferenciada onde o caráter humano se evidencia”.

Na pesquisa científica na área jurídica - aqui entendida também como área do direito –é necessária uma abordagem interdisciplinar, não podendo ser limitada a questão legal, social ou factual. A abordagem interdisciplinar é aquela que permite ao pesquisador relacionar as várias nuances legais entre si e fatos de origens diversas. Dificilmente o pesquisador científico que está trabalhando na área jurídica poderá se limitar às normas, mas sim precisará incluir na sua pesquisa, muitas vezes, aspetos biológicos, sociais, físicos, ambientais, dente outros. Portanto, a pesquisa científica na área jurídica é interdisciplinar.

A pesquisa científica pode ser dividida em qualitativa e quantitativa, sendo quetambém pode ser executada uma pesquisa mista. Na área jurídica predomina a pesquisa qualitativa, talvez, até, por falta de conhecimento por parte do pesquisador jurídico em conseguir trabalhar quantitativamente.

Segundo Michel (2009) a pesquisa qualitativa estabelece uma relação entre o pesquisador e o seu estudo, sendo que essa relação modifica-se com o passar do tempo. Assim não há uma comprovação matemática nos moldes estatísticos, por exemplo, mas na apresentação de dados de forma coerente. Creswell (2010) estabelece que o valor da pesquisa qualitativa encontra-se na descrição que deverá ser específica e contextualizada em um local específico. Este autor acrescenta que repetir um estudo de caso em um outro, em procedimento qualitativo, requer uma boa documentação. A coleta de dados, continua, é realizada por meio de observações e entrevistas de documentos e materiais visuais. Appolinário (2011) apresenta a pesquisa qualitativa como aquela que as interações sociais são as fornecedoras dos dados que são analisados subjetivamente pelo pesquisador; é uma pesquisa de fenômenos.

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A pesquisa quantitativa parte do princípio de que é possível quantificar o alvo pesquisado, adotando no seu bojo os números. Assim, a quantificação está presente desde a coleta de informações até o tratamento dos dados (MICHEL, 2009). Creswell (2010) relaciona a pesquisa quantitativa a projetos de levantamento ou projetos experimentais. Assim, este autor esclarece que um projeto de levantamento apresenta uma descrição quantitativa (numérica) de tendências de uma população; a partir da interpretação dos dados é possível fazer generalizações. Na pesquisa experimental o foco é testar o que está sendo investigado sob o prisma de um controle pré-estabelecido. Corroborando com isso, encontra-se a pesquisa quantitativa como aquela na qual as variáveis são estabelecidas dentro de um controle e mensuradas numericamente; a pesquisa quantitativa investiga fatos (APPOLINÁRIO, 2011).

Quando um pesquisador científico está trabalhando exclusivamente com as normas legais poder-se-ia dizer que ele está realizando uma pesquisa qualitativa. Entretanto, não é raro que ele busque trazer para a sua pesquisa dados que julga indiscutíveis; nesse caso, ao ingressar na sua pesquisa com valores representados necessariamente por números (proporções, estatística, etc.) a sua pesquisa deixa de ser qualitativa e passa a ter uma abordagem mista. Normalmente é isso que o pesquisador científico e o operador do direito buscam – seria uma forma de se evitar discussões.

O pesquisador científico na seara jurídica pode também se deparar com duas formas de raciocínio: o indutivo e o dedutivo. A correta aplicação da indução ou dedução (ou ambas) faz parte da lógica experimental.

O raciocínio indutivo parte dos fatos (dados como fatos, experiências, empirismo) para chegar a uma conclusão ampliada ou geral; no raciocínio indutivo, se as premissas são verdadeiras, a conclusão terá grande probabilidade de ser verdadeira (MICHEL, 2009). Marconi &Lakatos (2010) mostram que o objeto da indução é levar a uma conclusão tendo esta conteúdo mais amplo do que os elementos que a elas conduziram. Appolinário (2011) esclarece que na indução infere-se que as afirmações particulares podem conduzir a uma conclusão, ou seja, se a análise das partes apontam para um sentido lógico, uma conclusão geral poderá ser estabelecida.

A dedução, por outro lado, parte de uma verdade geral para provar um fato particular. Nesse caso, uma verdade absoluta é o início e contempla toda a particularidade; disso resulta que a conclusão deverá ser verdadeira (MICHEL, 2009). Outra forma de se entender a dedução é pensar em conjuntos: se o conjunto maior contém um menor, o menor terá as características do maior. Para Marconi &Lakatos (2010) a dedução tem o propósito de explicar o conteúdo das premissas e não há graduações intermediárias nas certezas. A dedução parte de uma premissa universal (ou mais de uma) que conduz a uma conclusão particular; uma dedução é revestida de verdade quando suas premissas são verdadeiras (APPOLINÁRIO, 2011).

Embora o raciocínio indutivo seja empregado na área jurídica, é o raciocínio dedutivo que chama a atenção. É comum se tentar deduzir como aconteceu um ilícito. A dedução não produz nenhum conhecimento novo, tendo um caráter de esclarecimento. Por exemplo, um criminoso age todo dia 25 do mês de maio na lua cheia; hoje é dia 25 de maio e é lua cheia; portanto, esse criminoso agirá. Se nenhuma outra variável for incluída nesse exemplo, o criminoso agirá. Isso não é realidade, porém, o raciocínio dedutivo poderia ser aplicado assim: Todo humano é mortal; Maria é humana; logo, Maria é mortal. Este é um exemplo de raciocínio dedutivo perfeito, onde as variáveis são mínimas e controladas.

Para realizar este trabalho adotou-se a abordagem qualitativa, classificada em relação aos objetivos como exploratória (RICHARDSON, 1985; GIL, 2010). Na fase seguinte foi realizada uma pesquisa descritiva (KESTRING et al., 2001; SEVERINO, 2007).


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O profissional da área jurídica, como qualquer outro, precisa conhecer pesquisa científica até mesmo para aperfeiçoar-se durante a sua vida profissional.

A pesquisa científica na área jurídica (ou área do Direito) segue os padrões gerais internacionais da Ciência, porém, pode apresentar algumas particularidades.

Em essência, a área jurídica é interdisciplinar, pois tem como modelo a própria sociedade e suas múltiplas ramificações; no mesmo diapasão segue a pesquisa científica nessa área de conhecimento.

Na área jurídica encontra-se fortemente enraizada a pesquisa qualitativa, mas nada impede de se realizar pesquisas quantitativas ou mistas.

A correta aplicação da indução, dedução ou de ambas as formas de pensar dentro da pesquisa científica jurídica, pode determinar o sucesso ou não de uma pesquisa.


REFERENCIAS

APPOLINÁRIO, Fabio.  Dicionário de metodologia científica. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2011.

CRESWELL, John W.  Projeto de pesquisa. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010.

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes.  Interdiciplinaridade-Transdisciplinaridade: visões culturais e epistemológicas e as condições de produção. Interdisciplinaridade, São Paulo, v.1, n. 2, out. 2012. Disponível em: <http://www.pucsp.br/gepi/downloads/REVISTA2-GEPI-OUT12-2.pdf>. Acesso em: 28 jul 2013.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed., São Paulo: Atlas, 2010.

KESTRING, Silvestre; BRANCHER, Almerindo; SCHWAD, Aparecida B. Metodologia do trabalho acadêmico: orientações para sua elaboração. Blumenau: Acadêmica, 2001.

MARCONI, Mariana de Andrade; LAKATOS, Eva Maria.  Fundamentos de metodologia científica. 7. ed. Paulo: Atlas, 2010.

MICHEL, Maria Helena.  Metodologia e pesquisa científica em ciências sociais. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2009.

RICHARDSON, Roberto Jarry.Pesquisa social: métodos e técnicas. 1. ed., São Paulo: Atlas, 1985.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico. 23 ed. São Paulo: Cortez, 2007.


ABSTRACT: The objective of this study was to provide bases for scientific research in the legal area. Scientific research in the legal area presents particularities. The qualitative approach is most used in the legal area, but not  is unique. The inductive or deductive methods are instruments of scientific research. For this work, the method was qualitative and exploratory.

Keywords: research, law, science.

Sobre o autor
Anselmo Jose Spadotto

Advogado e Professor Universitário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SPADOTTO, Anselmo Jose. Fundamentos da metodologia científica na área jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3824, 20 dez. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26198. Acesso em: 22 dez. 2024.

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