Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Lei nº 8.167/2012 – os argumentos utilizados pelos atores legislativos envolvidos na aprovação da nova Lei de Ordenamento e Uso do Solo

Agenda 07/04/2014 às 11:12

O presente trabalho tem por objetivo analisar o contexto em que se deu a aprovação da Lei nº 8.167/2012 – Lei do Ordenamento e Uso do Solo do Município de Salvador e os argumentos utilizados pelos vereadores na sessão extraordinária 3ª Sessão Extraordiná

  1. Contextualização

O cenário da orla soteropolitana está mudando! Com a conquista de sediar a copa de 2014, diversas capitais brasileiras estão sendo alvo das mais diversas propostas de “urbanização” e desenvolvimento. É claro que um evento que atrai milhares de pessoas, como a copa do mundo, para o país sede, exige uma certa estrutura de mobilidade e acomodação. A orla de Salvador, que durante muitos anos resistiu, por meio de intervenção administrativa[1], ao apelo de grandes empreendimentos para elevar o gabarito da orla, hoje poderá ter sua paisagem radicalmente modificada pela aprovação da nova LOUOS. Sobacusaçõesde ilegalidade, a referida lei autoriza elevação em determinadas localidades da capital baiana. O que a equipe, através desta pesquisa, visa questionar é o seguinte: Por que, justamente agora, está lei foi aprovada? Como aconteceu a escolha dos locais em que a lei autoriza esta elevação? A lei aprovada sofre de ilegalidade?

Reportemo-nos à matriz geradora dos questionamentos sobre a LOUOS (lei do uso e ocupação do solo), que é o PDDU da copa. No dia 01 de Dezembro de 2011, o Ministério Público, através da promotoras Rita Tourinho, Cristina Seixas, Antonio Sergio Mendes, entrou com uma ação civil pública para que o Plano Diretor de desenvolvimento urbano para a copa tivesse a sua tramitação, na câmara dos vereadores, suspensa, sob a alegação de que não tinham acontecido audiências públicas suficientes para debater o assunto contido na lei 7.400/2008. Segundo eles, a elaboração e a tramitação do projeto não obedeceram às regras previstas no Estatuto da Cidade e no próprio Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Salvador (PDDU).

 O juiz da 5º vara da Fazenda Pública Gilberto de Oliveira, no dia 21 de Dezembro, autorizou a suspensão. A decisão liminar determinava que o presidente da Câmara Municipal se abstivesse de apresentar o projeto de lei ao plenário da casa para deliberação.

Dois artigos do então suspenso PDDU da copa foram incorporados à LOUOS, que foi votada no dia 29 de Dezembro de 2011. Estes artigos transferidos eram exatamente os que discorriam sobre a elevação do gabarito da orla de Salvador. A promotora Rita Tourinho pediu a nulidade da tramitação e entrou com uma ação de improbidade administrativa contra os 31 vereadores que votaram favorável à aprovação da LOUOS, além do presidente da Câmara Pedro Godinho e do prefeito João Henrique, que sancionou a lei.

A promotora declarou que os vereadores "afrontaram o princípio da harmonia dos poderes e a moralidade".:

“Enquanto cidadã, lamento muito uma ação dessa natureza. A Câmara nada mais fez do que comprovar que não está preocupada com a ação popular na votação dos seus projetos, mesmo os que possam contrariar norma constitucional, como ocorreu de modo concreto”.

Além da Ação Civil Pública também foi movida uma Ação Popular pelos vereadores da Oposição que votaram contra a aprovação da lei – Aladilce Souza, Andréa Mendonça, Gilmar Santiago, Marta Rodrigues, Olívia Santana e Vânia Galvão – e por cerca de 30 lideranças de movimentos sociais.

Segundo o presidente da câmara, Pedro Godinho como não recebeu “citação, notificação ou intimação judicial suspendendo a tramitação de quaisquer projetos”, a votação da Lei de Ordenamento e Uso do Solo (Lous), em sessão ocorrida no último dia 29, obedece os parâmetros legais, argumentou. Acontece que a citação foi expedida, no entanto por uma questão processual, o presidente da câmara tem que receber a citação pessoalmente, como o mesmo não foi encontrado, a citação não foi realizada.

O Tribunal de Justiça do Estado da Bahia publicou no dia 01 de fevereiro a suspensão da liminar, requerida pelo Ministério Público Estadual, que impedia a tramitação do Projeto de Lei Urbanística Municipal nº 428/2011. Conforme a decisão da então presidente do Tribunal de Justiça, a desembargadora Telma Britto, “a suspensão da tramitação ou a declaração de nulidade de projeto de lei pelo Poder Judiciário, antes de sua aprovação, afigura-se intromissão indevida em seara de competência exclusiva do Poder Legislativo, ao qual cabe deliberar a possibilidade e conveniência de converter-se a proposta legislativa em Lei". Isso posto, presentes os requisitos autorizantes do acolhimento do pleito, defere-se o pedido de suspensão dos efeitos da liminar na Ação Civil Pública nº 0325342-39.2011.805.001.8.0.0.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Para além de uma discussão dogmática constitucional, de admissibilidade do exercício fiscalizatório sobre o processo legislativo, os questionamentos levantados por pesquisadores do curso de Urbanismo da UNEB – Campus I – Salvador, versam sobre a necessária fundamentação técnica, amparada em laudos de especialistas, para qualquer iniciativa pública, no sentido de alteração da ocupação do solo da cidade, começando pelas produção e alteração normativa. Em entrevista informal, o professor Glauco, coordenador do Curso, faz críticas ao processo de aprovação da lei sem a necessária consulta popular, feita diretamente pela escuta das organizações e associações de moradores dos bairros que sofrerão com as modificações da LOUS.

Existe a intenção de aprovar e implementar um projeto de elevação do gabarito da orla, algo que vai ter fortes interferências sócio ambientais, mas sem um esforço de pesquisa sobre os impactos sociais, ambientais, econômicos e culturaisdessas medidas, para que se proponha uma discussão envolvendo os munícipes de maneira ampla.

Os argumentos dos vereadores que votaram contra a aprovação da LOUS com a liberação dos gabaritos, propugnam pela participação popular, inclusive com a defesa da Democracia participativa[2]. A exiguidade desse trabalho, entretanto, não dá conta de descobrir se esse conceito compõe um mero jogo de palavras, uma retórica politica simplesmente ou se comprometida com um planejamento urbanístico democrático e democratizador.

A partir da análise do estudo do professor Sampaio, sobre o desenvolvimento do urbanismo moderno de Salvador, é possível compreendermos que a forma urbana revelada pela cidade atualmente é produto de:

(...) práticas assentadas nas ‘atividades capitalistas especulativas’ emergirá a cidade moderna, fragmentada, numa ação combinada entre segregação espacial e especulação imobiliária. Eis aí parte da chave do entendimento da lógica dos movimentos que determinarão a nova forma-urbana na etapa seguinte: a industrialização moderna propriamente dita, alavancada pelo Estado[3].

A tipologia de ocupaçãode Salvador, segundo o referido professor revela que na luta de poder pela cidade vence quem detém o capital, verifica-se a reprodução do status quode quem pode mais.

Algo que foi bastante destacado pelos especialistas com os quais conversamos foi o fato de apenas uma determinada localização teve a elevação do gabarito autorizado. Neste sentido indaga-se: esta lei obedece ao principio da impessoalidade? E o principio da supremacia do interesse público? O beneficio da lei visa atingir o interesse publico ou de um determinado grupo de especuladores imobiliários?

Esclarecido o contexto da aprovação da Lous, passemos á análise dos argumentos sutilizados pelos vereadores da Câmara Municipal de Salvador para fundamentar sua aprovação/rejeição ao projeto.

  1. DOS VOTOS CONTÁRIOS Á APROVAÇÃO

Inicialmente, registre-se que foi com surpresa que verificamos que no início da votação da LOUS, a oposição, já se pressentindo derrotada, abriu mão de discutir o projeto. A líder Vânia Galvão juntamente com Gilmar Santiago e Marta Rodrigues (PT) e Aladilce Souza e Olívia Santana (PCdoB) registraram apenas seus entendimentos contrários, mas não quiseram promover o debate.

 

Aladilce Souza – PCdoB

Olívia Santana –PCdoB

Pedrinho Pepê – PMDB3

Sandoval Guimarães – PMDB

Alfredo Mangueira – PMDB

Batista Neves –PMDB

Gilmar Santiago – PT

Marta Rodrigues – PT

Vânia Galvão – PT

Ilegalidade1

 

-

-

-

-

-

-

-

falta de ampla consulta à Sociedade2

falta de ampla consulta à Sociedade

-

-

-

-

-

falta de ampla consulta à Sociedade

falta de ampla consulta à Sociedade

Posição partidária do PCdoB

exigüidade de tempo

-

-

-

-

-

-

exigüidade de tempo

ingerência indevida do Poder executivo

-

-

-

-

-

-

-

-

 

-

impactos na Cidade

-

-

-

-

-

-

impactos na Cidade

Obs1.: O que está posto sob o termo ilegalidade, diz respeito as emendas terem sido retiradas do PDDU que está suspenso por decisão judicial que seria, nas palavras da vereadora Alaldice Souza, “uma tentativa de burlar a justiça”.

Obs2.: A maioria dos vereadores, ao utilizar desse argumento, se refere a inexistência do Conselho da Cidade. Embora previsto, nunca foi implementado e mesmo assim, na mesma sessão legislativa em que se aprovou a LOUS, perdeu seu caráter deliberativo previsto originalmente para se tornar tão somente consultivo.

Obs3.: O posicionamento adotado pelos membros do PMDB serão abordados em tópico separado, e momento oportuno.

3. Dos votos dos membros do PMDB

Com exceção do vereador Everaldo Bispo, todos os membros do partido votaram contra todos os projetos da Ordem do Dia. “O PMDB resolveu fechar questão. Foi uma resolução do diretório estadual”. O líder governista Téo Senna não resistiu e deu uma cutucada nos peemedebistas. "Entendo a posição partidária ideológica do PMDB, que sempre está ao lado do Executivo de Salvador nas votações, mas hoje, por questões partidárias, está votando contra", disse.

A despeito do comportamento do vereador Everaldo, o presidente do PMDB na Bahia, deputado federal Lúcio Vieira Lima, prometeu dar uma suspensão ao parlamentar, "para não expulsá-lo". O parlamentar, por sua vez, se defendeu sob o argumento de que “a reunião na sede do PMDB foi convocada em cima da hora da sessão e que ele não tinha como mudar seu posicionamento, outrora tomado”.

4. VOTOS FAVORÁVEIS À APROVAÇÃO DO PROJETO

             

Adriano Meireles – PSC

-

-

-

necessidade de desenvolvimento da Cidade.

-

Alberto Braga – PSC

-

-

-

-

-

Heber Santana – PSC

-

-

-

-

-

Paulo Magalhães Júnior – PSC

-

-

-

-

Parecer favorável da CCJ2 da Câmara Municipal

Alan Castro – PTN

-

-

-

-

-

Carlos Muniz – PTN

-

-

-

-

-

Geraldo Júnior – PTN

-

legalidade da aprovação das emendas pela falta de notificação judicial acerca da suspensão do PDDU3

-

necessidade de desenvolvimento da Cidade.

-

Alcindo da Anunciação4 – PT

-

-

-

-

-


[1] O PLANURB – 1978, visava conter a verticalização, a substituição tipológica das edificações nos bairros tradicionais e orla oceânica (SAMPAIO, p.262).

[2] Conforme, Ata de Sessão da Câmara de Vereadores do Município de Salvador.

[3] SAMPAIO, P.100.

Obs1.: No que tange a expressão “moeda de troca” foi aqui utilizada para ilustrar o acordo existente. Segundo diversos vereadores, no sentido de que para que houvesse aprovação do Projeto relacionado ao metro da paralela (de interesse da oposição – PT), a situação condicionou a aprovação da LOUS. "Foi tudo combinado. Tão combinado que minutos antes a oposição se reuniu e decidiu votar com a situação do prefeito. Foi uma reunião fechada e eles decidiram até liberar os vereadores. Eu, Moiséis Rocha (PT), Henrique Carballal (PT) e Giovanni Barreto (PT) votamos a favor do executivo estadual e municipal. E, ficou definido que Gilmar Santiago (PT), Marta Rodrigues (PT) e Vânia Galvão (PT) votariam contra a matéria do Executivo municipal e somente a favor da pasta do governo", contou Alcindo ao site BOCÃO NEWS.

Obs2.: Comissão de Constituição e Justiça

Obs3.: A informação é contestada pela promotora Rita Tourinho. “Temos prova que a Câmara foi, sim, notificada”, disse. O oficial de Justiça responsável pela notificação emitiu certidão informando que a citação recebida pela advogada Maria das Graças, do setor jurídico da Câmara, “dando por citado o referido presidente”, bem como o município, na pessoa do chefe do gabinete da Procuradoria, Sérgio Landulfo.

Obs4.: MOISÉS ROCHA e ALCINDO DA ANUNCIAÇÃO, não se posicionaram em nenhum momento da sessão.

Depois da exaustiva sessão, os vereadores puderam, enfim, entrar em férias.

5. DAS DIFICULDADES ENCONTRADAS

Não encontramos o posicionamento de todos os edis, de modo que não utilizamos um nas tabelas. As atas são resumidas, apenas excertos, e não foi disponibilizada a gravação dos discursos completos na Sessão, motivo pelo qual além das atas disponibilizadas pela Câmara Municipal de Salvador, foi utilizado também declarações proferidas pelos agentes políticos em outras platarfomas midiáticas.

6. CONCLUSÃO

Infelizmente nosso sistema de democracia representativa não parece atender a seus escopo nem aos interesses de nossa sociedade. Infelizmente é o que Pedro Lenza chamou de Vicio de Decoro Parlamentar, caracterizado pela ingerência indevida de interesses privados no processo legislativo. O autor defende e nós com eles, que seria um hipótese para fundamentar um controle de constitucionalidade.

O estudo sobre o assunto não se encerra neste momento, até porque a ultima decisão judicial exposta acima não responde ás perguntas do projeto. A intenção do grupo, com esta pesquisa não é defender pontos de vista, mas recolher dados e confrontar com a realidade urbana da nossa cidade.

FONTES:

Sampaio, Antônio Heliodório Lima, Formas Urbanas: cidade real & cidade ideal contribuição ao estudo urbanístico da cidade de Salvador. Quarteto Editora. Salvador: 1999.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11 ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Editora Método, 2007.

http://www.cms.ba.gov.br/ (consultas realizadas entre os dias de 07 a 21 de Março)

http://www.bocaonews.com.br/noticias/politica/politica/26675,camara-aprova-lous-quot-com-a-cara-do-pddu-quot.html

http://www.bocaonews.com.br/noticias/politica/politica/27241,quot-por-mim-podem-me-expulsar-do-pt-mas-nao-serei-a-favor-disso-quot.html

Sobre a autora
Flavia Pimenta

Graduada em História pela UNEB; Atua como Professora na rede estadual de ensino médio (Bahia); Acadêmica em Direito, 10º semestre pela Universidade Estadual da Bahia. Cursa especialização em Metodologia do ensino da Educação Profissional (convênio SEC-BA/UNEB).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo elaborado pelos acadêmicos em Direito da UNEB -Salvador, como parte da avaliação da disciplina Seminário Interdisciplinar de Pesquisa: Flávia Pimenta; Júlia Caetano; Lívia Brito; Miúcha Laranjeira.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!